Resumo: Este artigo visa discriminar as medidas cabíveis quando a União inscreve, em Dívida Ativa, multas processuais aplicadas a autarquias e fundações públicas federais em decorrência de condenação judicial.
Palavras-Chave: Inscrição em Dívida Ativa da União. Multa processual. Condenação de autarquias e fundações públicas federais. Medidas cabíveis.
Abstract: This article aims to define reasonable measures when the Union subscribe, to outstanding debt, apllied procedural fines to federal public agencies and foundations as a result of judicial sentencing.
Keywords: Union outstanding debt inscription. Procedural fines. Condemnation of federal public agencies and foundations. Reasonable measures.
Por vezes, nos processos judiciais é aplicada a multa prevista no parágrafo único c/c inciso V, do art. 14, do Código de Processo Civil[1], incluídos pela Lei nº 10.358, de 2001, em razão de descumprimento reiterado de intimações para adoção de providências diversas pela autarquia ou fundação pública federal.
Tais multas são revertidas em favor da União, diferentemente das previstas nos arts. 18 e 461, § 4º, do mesmo diploma legal[2], que revertem em favor da parte e, por aquelas serem de competência da União, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional inscreve os débitos em Dívida Ativa, notificando a entidade devedora para pagamento, sob pena de ajuizamento de ações de execução fiscal.
Cumpre destacar que as consequências da inscrição do débito de autarquia ou fundação pública federal em Dívida Ativa, são graves, já que, sem certidão negativa de débito, a entidade estaria impedida de contratar com o Poder Público, receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, alienar ou onerar bens imóveis ou direitos a eles relativos, alienar ou onerar bens móveis incorporados ao ativo permanente, bem como contratar ou liberar parcelas previstas em contratos que envolvam recursos públicos.
Cumpre destacar a possibilidade de solução administrativa do conflito, por meio de petições ou recursos direcionados pela autarquia ou fundação pública, à Procuradoria da Fazenda Nacional, solicitando a reanálise da regularidade das dívidas inscritas, com base na Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal[3] e no art. 53 da Lei nº 9.784, de 1999[4].
Destaque-se que as reclamações e recursos administrativos têm o condão de suspender a exigibilidade do crédito, nos termos do inciso III do art. 151 do Código Tributário Nacional[5], o qual, entendemos, deve ser aplicado por analogia aos créditos não tributários[6].
Certamente as providências administrativas devem ser tomadas se ainda houver prazo para tanto, mas, se houver urgência, as medidas judiciais são imperiosas.
Neste diapasão, o art. 38 da Lei nº 6.830, de 1980[7], permite que a discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública seja feita fora do processo de execução, por mandado de segurança, ação de repetição do indébito ou ação anulatória do ato declarativo da dívida, esta precedida do depósito preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e multa de mora e demais encargos.
Apesar da lei exigir o depósito prévio para o ajuizamento de ação anulatória, tal exigência foi declarada inconstitucional por cercear o direito de acesso ao Poder Judiciário. Nesse sentido decidiu a Corte Suprema, culminando na edição da Súmula vinculante nº 28.[8]
O grande problema reside no fato de que o ajuizamento desta ação, a menos que se obtenha a tutela antecipatória, não suspende a exigibilidade do crédito, pois a hipótese não está prevista em nenhum dos incisos do art. 151 do CTN. De qualquer forma, nada impede que ela seja ajuizada com o objetivo de impugnar o lançamento, devendo ser demonstrada a existência de fumus boni iuris e periculum in mora, essenciais para a antecipação da tutela requerida.
Para tanto, os vícios da constituição do crédito (prova inequívoca do direito alegado) e as consequências gravosas da certidão positiva em nome da entidade (fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação) devem ser detalhadamente abordados na petição inicial.
Relativamente a possibilidade de impetração de Mandado de Segurança contra o ato ilegal da autoridade administrativa fiscal, deve ser ressaltado que a concessão de liminar também suspende a exigibilidade do crédito, nos termos do art. 151 do CTN. Cumpre registrar que a concessão de liminar em mandado de segurança impetrado contra o lançamento ou inscrição do crédito não está condicionada ao prévio depósito dos valores discutidos, se presentes os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora.
Todavia, ressalvamos que tanto a impetração de mandado de segurança, quanto a propositura de ação anulatória, importam em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto, nos termos do parágrafo único do art. 38 da Lei de Execuções Fiscais.
Resta, ainda, o ajuizamento de medida cautelar. Observamos que tal ação tem sido utilizada pelos contribuintes cujos débitos tributários já estão inscritos em dívida ativa, mas que ainda não são objeto de execução fiscal, com a pretensão de oferecer garantia no importe da dívida para, assim, obterem a certidão positiva com efeitos de negativa, fazendo da garantia uma espécie de antecipação da penhora a ser realizada na futura execução fiscal.
Pela leitura de decisões do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema[9], percebe-se que o ajuizamento de ação cautelar pelo sujeito passivo restou possível para, mediante oferta de caução ao débito a ser executado, obter certidão positiva de débitos com efeitos de negativa, independentemente da suspensão da exigibilidade do crédito tributário, ao fundamento de que a oferta da caução preservaria os interesses que a certidão positiva visa proteger.
Ademais aquela Corte entendeu que a oferta de caução nos autos de ação cautelar anterior à execução fiscal equivale à penhora, havendo mera antecipação do ato e que a medida seria a única saída ao contribuinte necessitado da certidão de regularidade fiscal que pretendesse contestar o débito e não quisesse, ou pudesse, realizar o depósito do montante integral da dívida.
Portanto, a princípio, o ajuizamento deste tipo de ação sem apresentação de garantia, seria inócua. Não obstante, entendemos que esta ação pode ser ajuizada, não como cautelar da futura execução fiscal, mas sim como cautelar de uma ação principal a ser ajuizada pela própria autarquia ou fundação pública, possibilitando a apresentação de uma garantia implícita de adimplemento futuro, que somente o ente público pode fornecer.
O doutrinador Luiz Emygdio F. da Rosa Jr., ensina que não se aplica na execução contra ente público a regra do art. 8º da LEF, pela qual o executado deve ser citado para pagar ou garantir bens à execução, porque esta regra diz respeito apenas ao devedor particular, sendo despicienda esta garantia quando o devedor for ente público[10]. Defendemos que o mesmo raciocínio deve ser aplicado referente à exigência de garantia a ser prestada nas ações cautelares ajuizadas por ente público visando a concessão de certidão positiva com efeito de negativa.
O fornecimento da certidão prevista no art. 206 do CTN[11] se justifica, assim, nos casos em que esteja comprovada a solvência do sujeito passivo, estando garantido o direito da Administração Tributária em caso de sucumbência do devedor nos processos judiciais e demais procedimentos questionadores da exigência fiscal.
Assim, quando o devedor for autarquia ou fundação pública federal, cujo orçamento é proveniente da própria União, entendemos possa ser ajuizada a ação cautelar com intuito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário, independentemente de oferta de caução.
Por fim, deve ser lembrado que, mesmo se tratando de crédito não tributário, por aplicação analógica do inciso V do art. 151 do Código Tributário Nacional c/c art. 273, inciso I e § 7º do CPC[12], a liminar concedida na ação cautelar suspende a exigibilidade do crédito.
Informações Sobre o Autor
Kelly Benício Bailão
Procuradora Federal. Especialização em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera – UNIDERP