MERCOSUL: Realidade e perspectiva

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No âmbito internacional, a Segunda
metade do século XX assistiu ao aparecimento de experiências de integrações
econômica, política e jurídica entre Estados, que embora já vividas no século
anterior, introduziram uma lenta mudança no conceito de soberania estatal, na
medida em que parcelas de competência antes exclusivas dos
Estados são atribuídas a organizações internacionais com finalidades e
formações as mais diversas.

No Continente Europeu, a experiência
mais marcante é iniciada com o fim da Segunda Guerra Mundial e a criação da
Comunidade Econômica do Carvão e do Aço – CECA, seguida pelas Comunidades
Econômica Européia – CEE – e Comunidade Européia de Energia Atômica – CEEA,
reunidas hoje sob a denominação de União Européia. Essa experiência demonstraria
que o movimento de formação de blocos econômicos regionais não se limita ao
estabelecimento de laços de cooperação e harmonia entre Estados, todavia, mais
além, caracteriza-se pela formação de um sistema de direito, com instituições,
fontes, princípios e conceitos singulares, aptos a engendrar, nas matérias sob
sua competência, uma harmonização jurídica entre os Estados-membros. Um dos
objetivos principais da consolidação desses blocos é substituir a concorrência
entre nações pela concorrência entre regiões, havendo estratégias de defesa
para a formação de outros blocos de mercado, garantindo a sobrevivência dos que
já existem.

A integração da América Latina fora
estimulada pela Conferência Interamericana de Buenos Aires, ocorrida em 1957,
onde se havia decidido conveniência de estabelecer gradual e progressivamente,
de maneira multilateral e competitiva, um mercado comum latino-americano. As
negociações evoluíram rapidamente, até que se instituiu, com o Tratado de
Montevidéu de 1960, a
Associação latino-americana de Livre Comércio – ALALC, formada pela Argentina,
Brasil, Paraguai, Uruguai, Colômbia, Chile, Equador, México e Peru; objetivava
a eliminação, até 1980, do maior número possível de restrições comerciais entre
os países membros. Vencido o prazo estimado, em agosto de 1980, todos os países
da ALALC, acrescidos da Bolívia e Venezuela, resolveram substituí-la pela
Associação Latino-Amerinana de Integração – ALADI,
que dotada de personalidade jurídica, àquela sucedeu em direitos e obrigações. Este último tratado, que permanece inalterado até hoje, tem
como finalidade o comércio intra-regional, a promoção e regulamentação do
comércio recíproco, através de acordos bilaterais, a complementação econômica e
o estabelecimento de modo gradual e progressivo de um mercado comum
latino-americano.

Após sucessivas tentativas de
cooperação para a formação de um mercado comum entre Brasil e Argentina,
recebendo a adesão do Uruguai e Paraguai, em 26 de março de 1991, esses quatro
países constituíram o Mercado Comum do Sul – MERCOSUL, com a assinatura do
Tratado de Assunção; este fundado na “reciprocidade de direitos e
obrigações entre os Estados-partes”
e situado, formal e juridicamente, na moldura de acordos parciais previstos
pela ALADI. Em dezembro de 1994, os Estados-partes
assinaram o Protocolo adicional ao Tratado de Assunção sobre a estrutura
institucional do Mercosul, o Protocolo de Ouro Preto, o qual marcou o final do
período de transição, passando o Mercosul a possuir personalidade jurídica de
Direito Internacional. Após cinco anos da entrada em vigor do Tratado de
Assunção, foi permitida a integração ao Mercosul de qualquer dos demais
signatários da ALADI, desde que com a aprovação unânime dos Estados-partes.
Foi o que fez o Chile e a Bolívia, tornando-se os novos parceiros
-sócios comerciais ou membros não plenos – do Mercosul.

O Tratado de Assunção tem como objetivo
principal, já definido, o de estabelecer um mercado comum entre os seus
Estados-membros. Todavia, a estratégia que se deve adotar para se alcançar o
nível de “Mercado Comum”, seguindo o exemplo da própria União
Européia, implica seguir a seguinte seqüência: zona de livre comércio
(já alcançada); união aduaneira (estágio atual do Mercosul), em que aplica-se a tarifa externa comum para os produtos das demais
zonas, isto é, de outros blocos ou países que não fazem parte do tratado; o mercado
comum
(passo seguinte), que reúne a livre circulação dos fatores de
produção, os seja, o trabalho e o capital, tendo como base a livre circulação
de mercadorias, pessoas capitais e serviços. Portanto, isto demonstra que os Estados-partes do Tratado de
Assunção propõem-se a criar um território econômico comum, no qual haja a livre
circulação de bens, serviços, capitais e pessoas, estabelecendo uma política
comercial e cambial comum em relação a terceiros, promovendo o bem estar
econômico e social de seus povos.

Dentre as metas previstas pelo Tratado
instituidor do Mercosul podemos enumerar algumas já alcançadas: a eliminação de
barreiras tarifárias e não-tarifárias no comércio interzona;
a adoção de uma Tarifa Externa Comum (TEC); a coordenação de políticas
macroeconômicas; a livre comércio de serviços, de mão-de-obra e de capitais.
Todas procurando ampliar os mercados através da integração como condição
para se acelerar o desenvolvimento econômico com justiça social. A TEC é vista
como o primeiro passo para a uniformização político-jurídica entre os membros.
No Mercosul, existe a Tarifa para 85% dos produtos, mas há uma lista de
exceções; em 2006 pretende-se não haver mais exceção quanto aos mesmos.

No tocante ao campo jurídico, o que se
pretende é criar um novo Direito, de cunho Regional, adaptado ao Neoliberalismo
e integrado ao Direito Internacional, o qual também abranja a área social. Na
atual conjuntura do Mercosul, suas normas não possuem o atributo da auto-executoriedade, dependendo de um processo de internalização nas legislações domésticas de cada
Estado-membro. Entretanto o que se percebe é que a tendência mundial, espelhada
da União Européia, é a superação das barreiras e o abandono da absoluta
soberania legislativa nacional, desregulamentando os
modelos jurídicos de cada Estado, surgindo o Direito Comunitário, visto como um
instrumento de integração abrigando as estruturas de organização
comunitária e as normas que regem sua operação. Em vista do exposto, podemos
afirmar que o Mercosul somente se transformará no pretendido “Mercado
Comum”, depois de efetuadas as necessárias e imprescindíveis reformas
constitucionais e alterações estruturais nos quatro países membros, o que
possibilitará a vigência de um Direito Comum entre as partes. É importante
frisar que a harmonização das legislações está prevista no capítulo I, artigo
primeiro do Tratado de Assunção que assim versa: “O compromisso dos
Estados Partes de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para
lograr o fortalecimento do processo de integração”.

Para Dalton Bertoldi,
do Grupo de Estudos MERCOSUL, há, como em qualquer organismo do porte,
vantagens e desvantagens, tanto para o Brasil, em particular, como para os
demais membros. Dentre as vantagens mencionadas estão: o Brasil conta
com um grande e desenvolvido parque industrial que supera os outros países do
bloco; a entrada de produtos dos outros países com baixo custo, ajuda para que
exista uma queda de preços já que há uma competição pelo melhor preço e
qualidade; os países do Mercosul começarão a despertar maiores interesses para
investimentos estrangeiros fazendo com que a economia de cada país cresça ainda
mais; dentre outras. No que se refere as desvantagens
aponta algumas, como: a agricultura Argentina que possui vantagens em relação à
brasileira (solos mais férteis); a demora decorrida do processo legislativo de
cada país (necessitando, como visto anteriormente, da uniformização dos instrumentos
jurídicos); a língua e a moeda, questões que se não for discutida poderá
tornar-se um problema para o desenvolvimento do Mercosul etc.

No tocante a cultura,
por haver vários contrates de país para país, torna-se alvo de
divergência entre os estudiosos. A minha posição é daqueles que afirmam que o
Mercosul não busca a superação das culturas nacionais, respeitando as de cada
país, sendo um traço marcante e não constituindo um entrave para a integração.
O que se pretende é compor um mercado de trabalho, criando formas de cooperação
para que venha a ter uma maior representação a nível internacional.

Em recente reportagem da revista Veja
(3 de fevereiro de 1999) com o título: “Surra no vizinho: crise brasileira
causa terremoto na eficiente economia Argentina”. Na oportunidade, o
diretor da Fiat na Argentina, Horacio Losoviz,
assustado com a situação, afirmou que “a desvalorização no Brasil criou
uma crise de confiança no Mercosul”. Isso tem a mostrar uma das
desvantagens do mundo globalizado, ou seja, o efeito em cadeia, em que o
rumo da economia de um país pode afetar drasticamente com a de outro, vizinho
ou não. Como exemplo, temos a Argentina, que previa um crescimento de seu PIB
para 1999 de +2,5%; com a desvalorização da moeda de um de seus maiores
compradores, esse percentual decresceu para  -3% (menos três por cento).

Porém, apesar das desvantagens
apontadas, o Mercosul é um dos mais importantes blocos econômicos do mundo
atual, formando o terceiro maior mercado consumidor do mundo, em virtude de sua
peculiar posição, dimensões territoriais e demográficas dos países-membros.

Atualmente, o governo norte-americano
procura ampliar o NAFTA país por país, evitando a sua
negociação com o Mercosul, ampliado e, em conseqüência mais forte do que os
quatro países individualmente considerados. Assim visualizando, o Mercosul,
embora não seja de fato e de direito um “Mercado Comum”, com todo os seu potencial para crescer, começa a incomodar, sendo
motivo de preocupação por parte do governo norte-americano, pois, como bloco,
poderia dificultar a formação da Área de Livre Comércio das Américas, nos
moldes desejados pelo governo norte-americano. Além do NAFTA,
a União Européia tem oferecido cooperação financeira e técnica com os países em
via de desenvolvimento da América Latina, com alguns instrumentos: capacitaç1ao
técnica, cooperação científica; promoção comercial e industrial, dentre outros.
De qualquer forma, a tem ela voltado uma atenção especial para o Mercosul; verdade
essa que em meados de 1995 fora firmado um protocolo
de intenções com os países deste para a instituição de uma associação
inter-regional de livre comércio, até aproximadamente 2002.

Visto posto, o Mercosul surge no
interior de um ambiente influenciado pelas novas estratégias continentais norte-americanas,
de um lado, e pela emergência do Japão e dos países do leste asiático como
poderosos ímãs, do outro. O Nafta e a Bacia do
Pacífico representam, assim, os balizamentos essenciais que demarcam o
horizonte do Mercosul.

Entretanto, apesar das dificuldades
econômicas, jurídicas e políticas peculiares a países em desenvolvimento, que
buscam sua adaptação aos tempos modernos, acredita-se que em pouco tempo, o
Mercosul exercerá papel preponderante junto aos demais países da região, como
pólo catalisador desta grande associação dos países das Américas, em prol do
desenvolvimento do comércio internacional. Destarte, precisamos,
com a efetiva participação dos segmentos da sociedade e demais entidades,
governamentais ou não, superar quaisquer divergências que possam impedir que o
sonho de integração da América Latina avance, trazendo vantagens ímpares para
os povos, consolidando a democracia e o acesso aos mercados competitivos de
cunho internacional.

 

Bibliografia

1.HUSEK, Carlos Roberto. Curso de direito internacional
público.
São Paulo: LTr,1998.
2. ed. p. 130 a 148.

2.MAGNOLI, Demétrio e ARAÚJO, Regina. Para entender o
Mercosul
. São Paulo: Moderna, 1994. 70 p.

3.SOARES, Esther Bueno.
Mercosul
: desenvolvimento histórico. São Paulo: Editora Oliveira Mendes,
1997. p.17 a 67.

4.Revista VEJA. Até onde vai o pânico. Editora Abril, 3 de fevereiro de 1999. 1583 ed. ano 32, nº 5.

5.Internet : http://www.softline.com.br/fox/mercosul

6.Internet: http://www.apriori.com.br/mercosul


Informações Sobre o Autor

Dijonilson Paulo Amaral Veríssimo

Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, advogado, especialista em Direito Público pela mesma Universidade. Procurador Federal de 2ª Categoria. Chefe da Procuradoria Regional do INSS em Brasília