Moral e direito, uma visão kantiana

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Resumo: Este trabalho visa fazer uma análise sobre Moral e Direito, tendo Immanuel Kant como principal referência. É um olhar crítico sobre os costumes e a importância deles para o renomado autor, bem como questões como ética, moral, direito e justiça, observando os imperativos categóricos e a Teoria do Direito em Kant.

Abstract: This paper aims to make an analysis of Moral and Law , and Immanuel Kant as the main reference . It is a critical look at the customs and their importance to the renowned author , as well as issues such as ethics, morality, law and justice , observing the categorical imperatives and legal theory in Kant.

Sumário: 1. Introdução. 1.1Costumes. 1.1.1Importncia dos Costumes. 2. Moral. 2.1O que é Moral. 3. Direito e justiça. 3.1Doutrina do Direito. 4. Immanuel Kant. 4.1Breve Biografia e Breve relato sobre o Pensamento Kantiano. 4.1.1Imperativo Categórico. 4.2A Moral em Kant. 4.2.1Moral do Dever. 4.2.2Filosofia Moral. 4.2.3Breve relato sobre a Ética em Kant. 4.3Teoria do Direito em Kant. 4.3.1O fundamento moral da Teoria do Direito em Kant. Conclusão. Referências.

1   Introdução

A proposta deste presente trabalho é fazer um estudo a respeito da visão kantiana sobre a Moral e a Filosofia do Direito. Um dos materiais a ser utilizado, dentre os vários, é a justificação da Metafísica dos Costumes, explicada por Immanuel Kant.

O que iremos fazer é uma distinção entre as características morais, jurídicas e dos costumes.

Serão expostos conceitos do pensar do Direito através da Moral, no que tange ao fundamento conceitual daquele, tendo o imperativo categórico como mandamento (que será detalhado posteriormente também), através da vontade autônoma.

Durante nossos trabalhos, veremos que a Fundamentação da Metafísica dos Costumes precisa de um senso do que é moral, senso este extraído da Inglaterra como isolamento do princípio da moralidade.

A moralidade, diria KANT, no livro ‘A Metafísica dos Costumes’, existe desde o senso comum, todavia o dever moral não pode ser experimentado, mas, sim, a priori. Assim, o estudo do senso comum reconhece o moral através de uma fundamentação, que não pode ser, senão, filosófica, que resulta em uma razão prática pura.

Após isso, neste trabalho, surge uma necessidade de comprovar que o Direito deriva em partes da moralidade, sendo que é necessário que ele possua todos os elementos desta moralidade.

Será analisado o problema da exterioridade do Direito, relacionada com a virtude exterior, não interpretada como imperativo hipotético, mas esclarecedora de arbítrios.

A coerção, que não pode vir de outro plano, senão, somente, do Estado, por fim, é apresentada como uma coerção autorizada e legitimada pela razão prática pura, com a finalidade de promover os Direitos Humanos, a liberdade e a autonomia dos povos.


A doutrina jurídica de Immanuel Kant é interpretada por esta coerção como uma espécie moral.

1.1Costume

Kant define como costume as regras da sociedade, estas regras são sempre generalizadas e prolongadas, através de práticas sociais constantes. Por isso, temos a impressão que nos é obrigatório atuar conforme dita os costumes.

Apesar de não ter uma coação estatal, não atender aos costumes implica em coerções implícitas por parte da sociedade, se é que podemos chamar isso de coerção. O direito procura ser efetivo e o costume procura ser válido, conforme nos diz Paulo Nader, “A lei é Direito que aspira a efetividade e o Costume a norma efetiva que aspira a validade”.

Segundo Tíffany Cabral:

“O costume jurídico caracteriza-se por dois elementos que o geram e justificam: o corpus ou consuetudo, que consiste na prática social reiterada do comportamento (uso objectivo, de acordo com a expressão longitemporispraescriptio) e o animus, que consiste na convicção subjectiva ou psicológica de obrigatoriedade desses comportamentos enquanto representativos de valores essenciais, de acordo com a expressãoopinio juris velnecessitatis.”[1]

Resumidamente, são dois os elementos básicos que os Costumes precisam ter:

Corpus (material): ação ou elemento constante, reiterado e uniforme de algo na sociedade.

Animus (psicológico): é uma convicção, dentre os indivíduos daquela sociedade de que esta ação é necessária e obrigatória.

Nós podemos dar diversos exemplos à respeito dos costumes. A forma como um indivíduo qualquer come uma sopa de macarrão em um restaurante é padronizada na sociedade.Se esta pessoa comer “sugando” o macarrão e fazendo barulho, coisa que não é, nem de longe, nada comum na nossa atual sociedade, o restaurante inteiro vai olhar com desaprovação e tecer os piores comentários possíveis a respeito desta pessoa.

Esta pressão que a sociedade exerce sobre os indivíduos é exterior a eles e representa como o costume é forte, mesmo nas nossas sociedades contemporâneas.

Outro exemplo, se alguém que não é médico quiser praticar medicina, vai ser enquadrado como exercício ilegal da profissão. O contexto histórico e também o cultural desta sociedade protege, juridicamente, algo que era defendido, anteriormente, pelos costumes.

1.1.1 Importância dos Costumes

Os costumes são fortes, muito fortes, dentro de uma sociedade. Estão presente em tudo na nossa vida, mas parece-nos que, à primeira vista não são capazes de revogar as leis.

Porém as leis nada são além da positivação dos costumes de uma sociedade, já que estes constituem uma realidade social vivenciada em uma determinada região, em um determinado espaço temporal.

A interpretação do Direito deve levar em conta, por óbvio, estas características sociais, que nada são, se não, um reflexo das ações e realidades da própria sociedade.

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Então, existem normas que são totalmente obrigatórias, apesar de não serem, de fato, escritas. Os costumes da sociedade ditam as regras.

Com o passar do tempo, estes costumes, que representam a própria sociedade são consolidados, e passam a ser definidas como lei, integrando-se ao ordenamento jurídico daquela região ou país.

A incentivação de normatizar as ações partidas de quem faz as leis, preencher os espaços que a lei não exara e auxilia no entendimento da lei, são formas que os costumes interferem no Direito. Portanto, desde o inicio da criação da lei, os costumes agem como fonte, tanto inspiradora como suplementar e interpretativa.

2 Moral

Tratamos de moral como o campo do conhecimento que é voltado à conduta humana.

2.1 O que é Moral

Define-se moral dentro de um conjunto de normas feitas,observando-seas ações tradicionais do dia-a-dia, junto com a educação, a cultura, e as demais influências sociais, que interferem nas condutas humanas dentro de uma determinada sociedade.

Este termo “Moral” vem do latim “morales”, que significa “relativo aos costumes”. É fundamental ressaltar que este termo tem origem na vontade romana de traduzir a palavra que vem do grego “êthica”, que aconteceu, porém, sem um êxito completo.

Como o termo “moral”, para a nossa sociedade atual, não traduz, sobremaneira, a ideia completa em “ética” grega, cria-se uma diferenciação entre os dois sentidos. Com a moral caracterizada através da interioridade dos atos de cada indivíduo, com outras palavras, é algo que cria uma ação, que não pode ser, senão humana, já que o ser humano é um sujeito moral, que tem a ver com a faculdade kantiana de desejar.

A ética, por sua vez, diz respeito as regras em sociedade, aos hábitos, costumes. Tem um conceito mais coletivo enquanto a moral é um conceito mais individual.

As pessoas fazem muita confusão a respeito de que significa a moral e o que é a ética. Apesar de serem conceitos próximos, são deveras divergentes, já que a ética, analisa e julga o comportamento relativo à moral de cada ser humano junto ao grupo do qual faz parte. Kant coloca que cada uma, moral e ética, buscam uma sociedade melhor, com um elevado bem-estar.

2.2Moral na filosofia

Kant faz uma abordagem filosófica do que é “moral”, com um significado bastante amplo, abrange todas as ações que não são físicas nos indivíduos que vivem em sociedade.

A ética abrange as condutas e atos sociais de cada indivíduo de uma maneira geral, por isso é um conceito mais amplo, já que cada indivíduo tem uma moral própria. Por conseguinte, a capacidade do indivíduo de ter uma ética individual não é, senão baseada em uma valoração da sociedade, e na medida em que esta se solidifica, criam-se ou modificam-se as leis. Logo, toda lei precisa de um embasamento ético e moral preexistente.

E esta moral só pode ter base na razão, já que não existe moral animal, visto que os animais não são agentes como os seres humanos, a identidade das pessoas modela uma identidade social, na medida que respeitamos e nos colocamos no lugar do outro, e a ação destes influem na nossa, o que torna os comportamentos uma lei universal, geral.

3 Direito e justiça

Uma nação justa, com um conceito de justiça bem elaborado na filosofia kantiana, ele define que a justiça, e só ela é que consegue manter uma paz duradoura.

Esta justiça é concebida, nos ensina SANTOS (2011), através de princípios balizadores, racionais e norteadores das relações individuais, ou entre estes e o Estado através de umbinômio ético e jurídico no pensamento de Kant.

Justiça, esta que também precisa estar em conformidade a leis externas, sejam através de princípios racionais a priori ou leis positivas.

SANTOS (2011)aduz um pouco da visão de Immanuel Kant a respeito da justiça e do direito:

“Com a ideia de justiça, Kant entrona os parâmetros racionais no fundamento da ordem política e jurídica, e o faz fornecendo especial relevância ao trabalho dos cientistas jurídicos, que devem cultivar-se na via do esclarecimento para, mediante o uso público da sua razão, alumiar mudanças na sociedade em direção a uma sociedade civil que administre universalmente o direito, que proporcione a máxima liberdade e resguarde os limites desta liberdade, garantindo que a humanidade desenvolva plenamente as suas melhores disposições.”

3.1 Doutrina do Direito

Kant trabalha bastante sobre o que é a vontade, o arbítrio, e o conceito de liberdade, que permeia os princípios das capacidades e determinações que orientam a ação humana de acordo com a razão, para ele essa é uma ideia de legalidade e essas são as leis morais, e como tal são diversas de leis físicas ou naturais. (CRISTÓVAM, 2011[2]).

Kant coloca as leis físicas/naturais como leis descritivas, que relacionam o cotidiano dedeterminado indivíduo à realidade que o circunda. As leis jurídicas/morais são no âmbito do dever ser, como nos é ensinado. Se A é B, então A deve ser B. Levam-se em conta as ações que o indivíduo executa externamente, se são legítimas ou não. Dessa forma o direito e a ética permeiam as relações jurídicas dos indivíduos, e quando estes estão de acordo com elas, podemos dizer que há legalidade na ação.

As leis são exteriores ao indivíduo, ou seja, este indivíduo é compelido a executar as leis jurídicas conforme o dever, já que, caso tenha uma conduta diversa, poderá ser sancionado pelas suas ações. Para Kant, o que deve ser levado em conta é a capacidade, ou seja, a vontade, já que esta vontade só pode ser determinada pela razão.

A divergência entre legislação moral e legislação jurídica mora, portanto, no motivo. Na jurídica qualquer ato é um dever, mas só porque há uma pressão estatal com um sancionamento caso seja diverso a ação do indivíduo. Já quando a legislação é moral, a ideia do dever está no próprio princípio que determina o agir do agente. O dever é interior e exterior.

A sanção, explicaCRISTÓVAM (2011),que existe no tocante às leis morais ganha outra forma: “A noção de sanção ganha outra conotação no que toca às leis morais. Segundo as leis morais, determinadas ações são permitidas ou proibidas, e dentre aquelas permitidas, ou seu contrário, algumas são obrigatórias, resultando o dever cujo cumprimento traz subjetivamente um prazer e a violação uma pena de espécie particular (o sentimento moral)”

4 Immanuel Kant

4.1 Breve Biografia

Immanuel Kant, pai da filosofia crítica, nasceu no dia 22 de abril de 1724, em Köenigsberg, Prússia Oriental, (onde atualmente fica a Alemanha). Filho de um negociante.

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Teve educação protestante luterana, baseada no pietismo, pelo qual a religião baseia-se, principalmente, em uma consciência autônoma, tradição piedosa e misericordiosa.

No ensino superior, teve uma educação racionalista, lia Rousseau e Hume, de onde aprender o poder interior da consciência moral. (SERRETTI, 2012). Lá se formou em filosofia e matemática, e posteriormente foi professor, na Universidade de Köenigsberg.

Se analisarmos a obra de Kant, veremos que ela foi dividida na fase pré-crítica e crítica conforme trata SANTANA[3].

A primeira refere-se à filosofia dogmática, já que as ideias lá são completamente indiscutíveis, já que são tomadas como certas. Estudando as ciências naturais e a física de Isaac Newton.

Ainda segundo SANTANA, a outra fase é a que discute a “letargia dogmática” iniciada com a filosofia de Hume. As obras publicadas por Kant, em destaque a Crítica da Razão Pura (publicada em 1781),são bastante estudadas ainda nos dias de hoje, e evidenciam o“contra-senso de se estabelecer um princípio filosófico que estude a essência dos seres antes que se tenha antecipadamente averiguado o alcance de nossa capacidade de conhecimento”, nas palavras de Santana.

Já SERRETTI, 2012, demonstra de forma ímpar a essência de cada obra redigida por Kant:

“Por ser racionalista, Kant reagiu ao dogmatismo, que desconhece a razão. Em sua obra fundamental, Crítica da Razão Pura (1781), indaga sobre aspossibilidades da razão no processo de conhecimento, enquanto no livro, Crítica da Razão Prática (1788) se preocupa com o estabelecimento dos limites da razão e do campo ético. Para o direito, especialmente importante é seu trabalho intitulado Fundamentos da Metafísica dos Costumes (1797), cuja primeira parte é dedicada aos princípios metafísicos do direito.”

Kant foi um expoente na filosofia moderna, morreu aos 80 anos, no ano de 1804. Porém o Kantismo continua vivo, e reapareceu com os neokantistas já em meados do século XIX.

4.1.1 Imperativo Categórico

O imperativo categórico, de Immanuel Kant, determina a ação dos indivíduos através da premissa e de uma máxima que o agente daquela determinada sociedade executa esta ação baseada no que ele quer ver transformado em lei universal. Ou seja, ele age de acordo com o que ele gostaria que fosse feito a todas as outras pessoas. Ou aquela frase de senso comum de não fazer para os outros o que você gostaria que não fizessem para você.

Kant coloca que é imperativo, já que ordena e se trata de um dever moral. Demonstra relações entre leis jurídicas e morais. Se fosse algo hipotético, seria “no caso de a ação ser apenas boa como meio para qualquer outra coisa, ou seja, em vista de algum propósito possível ou real” (MARTINELLI, 2012).

E categórico, já que todas as pessoas daquela sociedade são atingidas, independente de vontade, é exterior a elas. Para Kant, somente o imperativo categórico equivale a uma lei prática.

Kant elimina a ideia de que a contextualização irá definir a que é certo ou errado, faz isso batendo de frente contra o relativismo moral.

Para ele, o utilitarismo não é válido, os fins nunca podem justificar os meios porque às vezes fazemos algo que tem um resultado diverso e desvirtuado do que pretendíamos, e seria um erro moral basear o nosso julgamento tendo como principal foco os resultados.

Dessa forma, Kant aduz que devemos agir pelos chamados “princípios universais” e que cada ser humano é um fim em sim mesmo, e nunca deve ser usado como meio para outra vontade.

“A vontade não está, pois, simplesmente submetida à lei, mas o está de tal maneira que possa ser também considerada legisladora ela mesma, e precisamente por isso então submetida à lei, de que ela mesma pode ser considerada como autora”.(Kant, 2004, p. 62).

4.2 Moral em Kant

O princípio da formalidade é o que caracteriza a moral kantiana, interessa o deferência à lei moral daquela sociedade, não a vontade do indivíduo, a razão faz com que o ser humano aja de acordo com o imperativo categórico, o dever-ser e dever-agir que guia toda a ação humana em sociedade. A moral, para Kant define-se em um princípio universal e fundamental de que, a partir dele, todas as ações humanas nos são derivadas.

A moral, segundo Kant, regula a forma como as pessoas agem em sociedade, e esta moral é relacionada com a moralidade e com os bons costumes. São todas as formas de agir, em conjunto e isoladamente, que a sociedade, mesmo que de forma implícita, estabelece a partir de cada indivíduo que nela vive. Parte-se da consciência que cada um distingue sobre o que é bom e o que é mau, o que é justo e o que não o é.

Os princípios da moralidade são inúmeros, apenas como exemplo podemos citar: respeito ao próximo, a honra, a correção de atitudes, o cumprimento os deveres de cidadão determinam o sentido de cada indivíduo em sua vida moral em sociedade. Estes valores, Kant coloca como sendo regentes universais, transformadores das condutas e relações humanas em relações saudáveis e harmoniosas.

Ou seja, a moral regula e determina o comportamento dos indivíduos, orientando-os a agir de acordo com as normas jurídicas instituídas pela própria sociedade da qual eles fazem parte. Cada indivíduo tem, de acordo com uma regulação social, uma própria moral.

Kant nos ensina, de maneira maestral, quando fala de lei moral e liberdade que:

“A lei moral, na sua pureza e autenticidade (e é exatamente isto que mais importa na prática, não se deve buscar em nenhuma outra parte senão numa filosofia pura, e esta (Metafísica) tem que vir portanto em primeiro lugar, e sem ela, não pode haver em parte alguma uma filosofia moral; e aquela que mistura os princípios puros com os empíricos não merece mesmo o nome de filosofia.”

Já Beckencamp, 2006[4], reforça toda esta ideia a respeito de lei moral, demonstrando e nos guiando para a importância para este estudo na vida em sociedade.

“Os intérpretes de Kant chegaram a um consenso pelo menos em relação ao que seria sua posição definitiva em termos de fundamentação moral: seria a posição apresentada na analítica da Crítica da razão prática. Esta posição pode ser caracterizada por três teses:

1. o fundamento último de toda filosofia moral é a consciência da lei moral como um fato da razão;

2. não é possível nenhuma dedução da lei moral a partir de outra instância qualquer;

3. A partir da lei moral é possível estabelecer a efetividade da liberdade.”

As leis que a sociedade entende como “lei moral” são absolutas, ou seja, imperativos categóricos que regem o que fazer ou não fazer, tendo sob égide o dever. Como imperativo categórico, estas leis não admitem condição, já requerem ações subjetivas necessárias e absolutas.

A legislação moral, assim como a legislaçãojurídica, só tem validade sobre seres humanos livres, que tenham vontades e razão, e esta razão uma razão prática, que pode submetê-lo. A finalidade central do Direito, em Kant, é a liberdade total, extrema. Porém esta liberdade depende de uma lei universal que rege as vontades e os arbítrios.

Para Kant, o Direito não visa à segurança, ou mesmo a igualdade, mas sim esta liberdade extrema referida, mas é claro, para seres dotados de razão, por conseguinte, esta liberdade criará uma situação de igualdade próxima e fará com que a segurança seja algo efetivo na sociedade, pois cada sujeito nela perceberá, como uma visão de senso comum, que a liberdade de uma acaba quando começa a liberdade do outro.

4.2.1 Moral do Dever

A moral, em Kant, não consta de dogmas religiosos, pois é universal e a religião é limitada às pessoas que a pregam. A intenção de agir conforme as vontades de um Deus não é visada como orientadora do dever. MARTINELLI, 2012 define intenção e dever em Kant.

“Intenção e dever (em Kant) dependem do sujeito epistemológico (eu transcendental) e não do eu psicológico (indivíduo). Para Kant, o sujeito transcendental trata-se de uma maquinaria (aparelho cognitivo) subjetiva, universal e necessária (presente em todos os homens, em todos os tempos e em todos os lugares). Assim, todo ser saudável possui tal aparato, formado por três campos: a razão, o entendimento (categorias) e a sensibilidade (formas puras da intuição-espaço e tempo).”[5]

Para Kant, a faculdade de ideias rege os atos em relação ao dever, conforme as vontades do indivíduo, porém pautadas pela moral definida em sociedade. No imperativo categórico de Kant, para haver uma liberdade, precisa, a priori, haver um dever de liberdade imposto pela sociedade e uma necessidade de ação individual baseada na lei.

Martinelli, 2012, ainda aduz que, em Kant, a vontade do indivíduo não é levada em consideração, pois toda e qualquer inclinação é ignorada em observação ao dever, e dever este, baseado em uma máxima geral, uma lei prática, ligada à vontade.“O valor moral da ação não reside no efeito que dela se espera, pois o fundamento da vontade é a representação da lei e não o efeito esperado (uma boa vontade não é boa pelo que promove ou realiza, mas pelo simples querer, em si mesma).”

Para Kant, ainda segundo Martinelli, a ética é uma ética ligada ao dever, uma coerção da razão contida em cada indivíduo, que trabalha com o dever e o dever de liberdade. A forma como o indivíduo absorve o dever acaba com as aspirações pessoais, as vontades individuais e qualquer outro sentimento pessoal, esse fato é tido “tido como princípio supremo de toda a moralidade”.

4.2.2 Filosofia Moral

A filosofia moral é trabalhada por Kant nos livros: Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785), Crítica da Razão Prática (1788) e Crítica do Julgamento (1790).

O imperativo categórico, trabalhado anteriormente, explica muito desta filosofia moral de Immanuel Kant, baseada naquelas 3 formulações básicas:

“§ A primeira formulação (a fórmula da lei universal) diz: "Age somente em concordância com aquela máxima através da qual tu possas ao mesmo tempo querer que ela venha a se tornar uma lei universal".

§ A segunda fórmula (a fórmula da humanidade) diz: "Age por forma a que uses a humanidade, quer na tua pessoa como de qualquer outra, sempre ao mesmo tempo como fim, nunca meramente como meio".

§ A terceira fórmula (a fórmula da autonomia) é uma síntese das duas prévias. Diz que deveremos agir por forma a que possamos pensar de nós próprios como leis universais legislativas através das nossas máximas. Podemos pensar em nós como tais legisladores autônomos apenas se seguirmos as nossas próprias leis”. (2012)[6]

4.2.3 Breve relato sobre a Ética em Kant

Bastante brevemente falando, toda a ética de Kant só pode ser centrada na noção que cada indivíduo, particularmente, tem do dever, através das capacidades individuais.

Como este conceito de dever é bastante forte em Kant, as vontades de cada indivíduo devem ter como objetivo a liberdade dos homens, o que é esta liberdade não é definida genericamente em Kant, mas ele nos dá a ideia de que esta liberdade deve ser sempre postulada. E é esta postulação que torna, segundo Kant, o homem, homem.

O conceito de Dever, para Kant, também permeia os conceitos de felicidade e virtude, sendo que estes só podem existir caso estejam em função de um conceito postulado de dever.

4.3 Teoria do Direito em Kant

“Direito e faculdade de obrigar significam, portanto, uma coisa só.” (KANT, 2003, p. 409).

A diferença entre Direito e Moral em Kant, é feita sobre o prisma formal, não material.

Segundo SERRETTI, 2012, Kant pensava diferente dos jusnaturalistas, e definia o Direito natural de forma diversa de um preceito indiscutível da natureza, já que se dava para explicar através da razão e que o Direito é algo obrigatório como defensor da liberdade humana, afinal a liberdade, e só ela é o Direito Natural básico dos seres humanos.

Qualquer outro Direito Natural básico ao ser humano, como a moradia, direito à educação, à saúde, na concepção de Kant, deriva desta liberdade. O Direito positivo só pode encontrar uma razão de ser, um fundamento de validade na razão humana, e ela leva, como dito anteriormente, à liberdade. O legislador deve, para obedecer ao Direito Natural, exarar obedecendo a este principal direito.

Immanuel Kant faz os seguintes questionamentos: “O que é jurídico? O que é justiça?”

Ainda segundo Serretti (2012), o jurídico concorda com a norma positivada. Para Kant o que é justo é importante “O critério de justo ou injusto não pode ser encontrado na análise empírica (experimental) do direito positivo, do ordenamento jurídico, mas tão somente na razão, a partir do princípio da liberdade.”

O Direito, segundo Kant, é uma relação, uma coexistência dos arbítrios, estes, por sua vez, significam o desejo de ação + a capacidade do agente de agir e um criador de uma regulação formal, já que não depende do indivíduo, mas da relação dele com o jurídico. O que retorna àquela ideia do imperativo categórico.

Esta coexistência de arbítrios, que só o direito pode proporcionar, já que exterioriza as vontades, e cria limites ao lado “animal” do ser humano, já que o lado racional não carece de limites, ele, por si só, reflete a melhor condição social possível, a razão não determina uma vontade que sobrepuja algo anterior que seja bom, dentro da premissa que, pensando com a razão, pensamos e nos colocamos na situação do outro.

Por isso o direito é importante, o Direito garante que a liberdade de um, que é fundamental, não acabe com a liberdade do outro.

Mas como o Direito poderá fazer com que o lado “animal” do ser humano não ultrapasse a razão deste indivíduo?

Para isso temos a força coercitiva do Estado, é através da coerção social que o Estado, investido em poder para isso, garante que todos tenham a liberdade sem reduzir a liberdade do outro, ou seja, sem que aja uma não-liberdade por uma das partes.

O indivíduo adere ao Direito porque tem consciência que é o certo a se fazer e sabe que a intervenção estatal, através da coerção, é uma não-liberdade que atua contra um agente que está fazendo outra não-liberdade, anulando-a e restabelecendo a liberdade geral, garantindo às outras pessoas o gozo deste direito primordial.

Logo, a função da justiça e de servir de base para forçar os homens a exercerem a sua liberdade e a agirem de forma a respeitarem a liberdade dos outros.

“Daí podemos concluir que tudo que impede a liberdade é injusto e tudo que afasta o obstáculo à liberdade é justo. A coação que alguém exerce contra a ação justa de outro é um obstáculo à liberdade. Assim o obstáculo ao obstáculo à liberdade, exatamente porque restaura o bem maior do homem e critério definidor, a liberdade, é justo. A coação é ética. O contrato social legitima a coação e a liberdade (como direito humano fundamental) legitima o contrato social; por estar a coação a serviço da liberdade, é justa. Isso nos trás o princípio da liberdade como critério de validade das leis jurídicas.”(SERRETTI, 2012)

4.3.1 O fundamento moral da Teoria do Direito em Kant

Direito, para Immanuel Kant trata-se: “o conjunto das condições sob as quais o arbítrio de um pode ser reunido com o arbítrio do outro segundo uma lei universal da liberdade”.

Precisamos lembrar, antes de tudo, que Kant é filho do seu tempo, vivia no século XVIII, na mesma época da Revolução Francesa, do iluminismo; um pensamento totalmente liberal de Estado e não existe, ainda, a força dos Direitos Sociais do Direito e do Estado, presente no Sec. XIX, e presente, sobretudo nos dias de hoje.

Já consolidamos a ideia de que Kant cria uma lei universal de liberdade, baseada na moralidade e na razão e de que os imperativos da fundamentação são essenciais e definem a conduta a ser realizada.

A doutrina do Direito não pode se basear de imperativos hipotéticos, deve, pois sim, ter uma base fundada nas determinações a priori, tal qual como a ética e a moral.

Dessa forma, não há como o Direito ter vínculo com, por exemplo, com uma visão cristã de mundo. A religião não irá interferir na forma como o Direito é fundamentado, pois ele o é através de determinações a priori. Para Kant, “apenas uma razão legislativa purificada dos aspectos antropológicos pode fundamentar o princípio do Direito. Somente as propriedades da razão pura estão disponíveis para determinar o conceito não empírico do Direito. Além disso, legalidade, universalidade, formalidade e necessidade racional compõem o seu conceito na medida em que estrutura o valor potencial do Direito não distinto, por fim, do próprio imperativo categórico”. (SOUZA, 2012).

Por fim, Joãosinho BECKENKAMP (2009, pg.78), nos ensina que se analisarmos a fundamentação do Direito em si como uma sequencia de autorizações da razão prática pura, teremos o Direito advindo da moral, ou então, uma doutrina de Direito Natural se dando como uma “das duas partes da filosofia prática ou moral de Kant”.

E o caráter categórico e incondicional da lei da moralidade, vale inclusive para o Direito, já que ele também é baseado em princípios práticos a priori da razão, e não meramente de uma legislação positiva à revelia das exigências da razão prática pura. (SOUZA, 2012).

CRISTÓVAM (2011) faz uma excelente contribuição para o pensamento Kantiano:

“Um dos traços distintivos do pensamento kantiano acerca da moral e do Direito é o caráter propositivo de sua metafísica dos costumes. Não há preocupação com o ser (o que é), mas sim com o que pode ser (o dever ser). A doutrina de Kant acerca do Direito e da moral é prescritiva (propositiva). Não é a realidade que se constitui em fator de modificação e transformação do homem enquanto ser racional; pelo contrário, o homem enquanto ser dotado de razão é que pode agir na realidade, no mundo do ser.”

5 Conclusão

Com base em tudo o que estudamos neste presente trabalho, podemos afirmar que Kant é um dos expoentes no mundo todo no estudo do Direito e da Filosofia, ele explica como ninguém a questão da filosofia moral e explica também, com uma forma de visão um tanto quanto liberalista, afinal, ele, como todos nós, é filho do próprio tempo.

Para ele a função do Direito é garantir a liberdade, que é o principal direito humano, já que este é fundamental para a garantia de todos os outros direitos humanos e sociais.

Tudo isto é explicado através dos imperativos categóricos, que norteiam a ação moral dos indivíduos em sociedade. Vimos que a razão domina o ser humano e que o Direito é imprescindível para combater a falta de razão, o empirismo e o instinto animal das pessoas. Kant ensina também, conforme analisado, que o Direito não se funda nem imperativos hipotéticos técnicos nem em imperativos hipotéticosassertóricos, já que estes imperativos contem empirismo na sua determinação de conceito.

Concluímos, também, que o conceito de Direito, que concorda com uma razão prática, é absorvido pela moral dos indivíduos e não tem elementos empíricos na construção da filosofia popular e é o Direito Natural que autoriza a moralidade dos indivíduos.

Ou seja, o Direito duma sociedade é autorizado pela moral daquela sociedade, já que esta é fundamentada, principalmente, na vontade racional dos indivíduos.

“O Direito é, portanto, conforme analogia à moralidade da Fundamentação, autônomo, postulado internamente (ainda que manifestado externamente) sendo as leis promulgadas constituídas pela liberdade dos sujeitos e, deste logo, fundamentado sob imperativos categóricos. Ou seja, ao conceito de direto não cabe um fundamento empírico.” (SOUZA, 2012).

Porém, conforme já fora explicado anteriormente, não podemos fazer nenhum estudo a respeito do Direito sem verificarmos como este direito vai ser aplicado.

Ora, para que o Direito possa ser válido e opere, é extremamente necessário haver algum tipo de coerção. Esta coerção só pode ser algo ético e não é, simplesmente, uma prerrogativa de um uso da força pelo Estado, ela é mais que isso. É esta coerção que garante que a não-liberdade não seja exercida, essa não-liberdade é a ação de pessoas que tentam impedir ou interferir na liberdade de outras. Então a coerção é algo que defende a liberdade.

Então, a não-liberdade por parte do Estado, para impedir que o indivíduo, irracionalmente (já que se fosse racional, optaria por defender a liberdade, explica Kant), tente exercer não-liberdade nos outros indivíduos, anula os dois negativos e recria um ambiente de liberdade.

Resumidamente, podemos definir o Direito como algo que é coercível, exerce uma liberdade externa, é bilateral, pois vincula duas pessoas, garante direitos e impõe deveres, é heterônoma, pois é criada por muitos e determinadas a muitos e é, por fim exigível.

E a moral na sociedade, nós definimos como algo que é incoercível, que refere-se à liberdade interna, é unilateral, autônoma e, por fim, não é exigível aos indivíduos.

Para Kant, a função do Direito é a garantia da liberdade externa e tudo que impede a liberdade é injusto. Já que o homem tem instintos e não é só racional, porém, a liberdade, como se trata de um princípio presente na moral, não pode delegar ao Direito preceitos diversos da abrangência de competência deste, a partir de experiências externas à vontade autônoma dos indivíduos.

Referencias
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Notas:
[1] "Fontes do direito internacional privado" TrabalhosFeitos.com. <http://www.trabalhosfeitos. com/ensaios/Fontes-Do-Direito-Internacional-Privado/669548.html> Acessado em: 12/04/14

[2]CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. A doutrina do Direito de Emmanuel Kant. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3020, 8 out. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/20165>. Acesso em: 8 abr. 2014.

[3] SANTANA, Miriam Ilza. Immanuel Kant. Disponível em: <http://www.infoescola.com/biografias/immanuel-kant/> Acessado em: 14/04/2014

[4] BECKENCAMP, Joãosinho. Conceito de liberdade na filosofia critica kantiana. Kant e-prints. Campinas, Série 2, v. 1, n.1, p. 31-56, jan.-jun. 2006.

[5]MARTINELLI,Neiva da Silva. A moral do dever em Kant. 2012.Disponível em <http://meuartigo.brasilescola.com/filosofia/a-moral-dever-kant.htm> Acessado em: 14/04/2014

[6]"Filosofia." TrabalhosFeitos.com. 11 2012 <http://www.trabalhosfeitos.com/ensaios/Filosofia/487509.html>. Acesso em: 15/04/2014


Informações Sobre o Autor

Antonio Moreno Boregas e Rêgo

Graduando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais; Graduado no Curso Superior de Tecnologia em Segurança Pública pela Academia de Polícia Militar; Pós Graduando em Docência em Ensino Superior pela SENAC; Policial Militar do GATE com curso de Aperfeiçoamento Profissional em Operações Especiais e em Contraterrorismo


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