Resumo: O presente artigo tem por finalidade analisar os reflexos da decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal, tema nº 334 em sede de repercussão geral, por meio do Recurso Extraordinário 630.501, no qual em sessão plenária de 14.03.2013, tendo sido provido em parte ao autor, tendo importante destaque, o reconhecimento do direito ao benefício mais vantajoso ao segurado do Instituto Nacional de Seguridade Social. O tema é deveras polêmico, tendo em vista a aplicação do prazo decadencial em revisar os benefícios previdenciários, muito embora o foco principal deste estudo será a não aplicação do prazo decadencial nas ações de melhor benefício. A limitação de prazo para rever a concessão ou indeferimento de benefícios não existia até a vigência da Lei de Benefícios, instituída pelo artigo 103, Lei nº 8.213/91 dada pela redação da MP 1.523-9, discutido amplamente no cenário jurídico acerca da inconstitucionalidade desta nova limitação ao direito fundamental. O direito à Previdência Social é expressamente reconhecido na categoria de direitos humanos, portanto, considerado fundamental e imprescritível. No entanto o foco será em torno da retroação da DIB conhecida como concessão do melhor benefício. O objetivo deste estudo é chamar a atenção dos operadores do direito quanto à necessidade da realização do distinguishing nas decisões do Pretório Excelso.
Palavras-chave: Artigo Científico; Prazo decadencial; não aplicação da decadência; artigo 103 da Lei 8.213/91; concessão do melhor benefício; retroação da DIB, distinguishing.
Abstract:This article aims to analyze the effects of the decision taken by the Supreme Court, issue No. 334 in place of general repercussion, through the Extraordinary Appeal 630,501, which in plenary on 03.14.2013 and was provided in part by Author having important highlight the recognition of the right to benefit most advantageous to the insured of the National Social Security Institute. The topic is quite controversial, with a view to applying the statutory period to review the social security benefits, even though the main focus of this study is not to apply the statute of limitations in the best benefit actions. The limitation period to review the granting or denial of benefits did not exist until the term of the Benefits Act, introduced by Article 103, Law No. 8,213 / 91 given by the wording of the MP 1523-9, widely discussed in the legal scenario the unconstitutionality of this new limitation on the fundamental right. The right to social security is expressly recognized in the category of human rights therefore considered fundamental and inalienable. However the focus will be around the feedback of DIB known as granting the best benefit. The aim of this study is to draw the attention of law enforcement officers on the need for realization of the decisions of distinguishing Praetorium Exalted.
Keywords: Scientific article; statute of limitations ; non-application of decay; Article 103 of Law 8.213 / 91 ; Award best benefit ; retrogression of DIB , distinguishing.
Sumário: Introdução. 2. Prescrição e E Decadência em matéria previdenciária. 3. Repercussão geral – Decadência: Tema 313 – Supremo Tribunal Federal. 4. Da não aplicação do instituto da decadência nas ações de concessão do melhor benefício. Conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O tema do presente trabalho é atual e ainda palco de grande polêmica e dissenso na seara do Direito Previdenciário, qual seja, o instituto da decadência. No entanto, como o assunto é polêmico e muito extenso, nos atentaremos apenas às ações de concessão do melhor benefício, denominadas de Retroação da DIB, onde não há a incidência do prazo decadencial.
A preocupação do legislador com a preservação e as estabilidades das relações jurídicas, cinge-se na decadência, com o objetivo de assegurar o direito do autor em modificar ou extinguir atos de uma relação jurídica, mas respeitadas as limitações temporal impostas.
Como será discorrido ao longo do trabalho, o instituto da decadência no campo dos Direitos Sociais, ainda é de grande polêmica, pois houveram várias mudanças na legislação das quais puderam surgir vários questionamentos e tremenda insegurança jurídica aos filiados ao regime da previdência social.
O grande marco pautasse na edição da regra prevista no artigo 103 da Lei de Benefícios, onde até então inexistia a limitação de prazo para o segurado revesse seu benefício, ou seja, não havia prazo decadencial, apenas era previsto a prescrição sobre as parcelas que surgiriam, caso existissem diferenças a serem apuradas, era assim respeitado o quinquênio legal, para o cômputo dos valores atrasados.
Somado a todo este contexto, a grande controvérsia sobre a existência da decadência nas ações de retroação da DIB (Data do Início do Benefício) tese do melhor benefício, onde buscasse a garantia do aposentado de exercer seu direito de ter uma nova RMI (Renda Mensal Inicial) calculada, com base em novo PBC (Período Básico de Cálculo), outros SC (Salários de Contribuição), culminando em nova RMI, direito garantido na forma da nova redação trazida pela Lei 9.528/97, ao artigo 122 da Lei 8.213/91 , do qual vejamos:
“Se mais vantajoso, fica assegurado o direito à aposentadoria, nas condições legalmente previstas na data do cumprimento de todos os requisitos necessários à obtenção do benefício, ao segurado que, tendo completado 35 anos de serviço, se homem, ou 30anos, se mulher, optou por permanecer em atividade”.
Muito embora, a Previdência Social, entendesse que a previsão legal de data de início do benefício para que o segurado possa exercer seu direito, ou seja, fixação da DIB (Data Início do benefício) , seja na data do desligamento do emprego ou na data de entrada do requerimento do benefício, trazida no artigo 29 da lei. 8.213/91.
Com o preenchimento dos pressupostos, no entanto, cabe ao segurado, ação de concessão do melhor benefício, chamada de retroação da DIB, (data início beneficio) aos segurados que, preenchidos todos os requisitos à concessão de benefício na data do requerimento administrativo há a possibilidade de um novo cálculo apurado, utilizando-se todos os períodos onde o segurado poderia, tendo já preenchido tais requisitos, usufruir de melhor cálculo de benefício, ou seja, sua renda mensal inicial seria mais vantajosa do que a concedida na RMI !
Assim por demais discussões que geraram diversas situações reais acerca do tema, a questão do direito a concessão do melhor benefício, chegou às portas do Supremo Tribunal Federal, e é objeto de exame necessário em Repercussão Geral, chamado de tema 334, trazido por força do Recurso Extraordinário de nº 630.501, em 14.03.2013, destacando-se o desastroso voto do Ministro Barroso, onde o recurso foi parcialmente provido, reconhecendo-se o direito ao segurado em obter o melhor cálculo, decorrendo assim em benefício mais vantajoso ao segurado da Previdência Social, tendo este já preenchido as condições para a concessão de benefício previdenciário.
Mas infelizmente, após exaustivas reflexões acerca do tema, constatamos que na prática, o que se vê ainda nas decisões em nossos tribunais, são as diversas sentenças de improcedência e outras em muitas das vezes, a não análise do mérito por entender o Magistrado que há decadência, não importando todo o conteúdo que se traz no corpo da petição, as únicas palavras lidas, são as datas da concessão do benefício, ou seja, a DIB, e se o lapso temporal ultrapassado é decenal até a data da interposição da demanda, não se avança nesta seara!!!
Portanto a tentativa neste ensaio é somente trazer temas de reflexão: numa primeira fase, um breve histórico sobre a decadência, tendo a limitação imposta ao direito de revisão dos atos de concessão de benefício previdenciário; num segundo momento, a tese do melhor benefício, a legislação, artigos 103 e 122 da Lei 8.213/91, temas 313 e 334 de grande relevância em sede de repercussão geral nos Recursos Extraordinários respectivamente, 626.489 e 630.501, juntamente com breves destaques acerca de institutos que nos trazem a análise de precedentes, tais como: distinguishing[1], ratio decidend[2] obter dicta,[3] ferramentas utilizadas no Direito Processual Brasileiro como fonte do direito inovações inclusive trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, Lei 13.105/2015
Necessário a cada leading case, seria a correta utilização do distinguishing[4] pelos nossos Magistrados, Desembargadores e por todas as esferas no âmbito da Justiça Federal e Corte Superiores, no intuito único de poder assegurar ao aposentado (segurado) o direito de a qualquer tempo, rever seu benefício, pois o acesso à Previdência Social é expressão maior do direito e garantia fundamental e sua violação afronta a preservação à garantia constitucional de direitos humanos !
2.PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA
Na esfera dos Direitos Sociais, os institutos da prescrição e decadência encontram-se profundamente relacionados com a dimensão temporal de satisfação de direito não reconhecido especificamente na esfera administrativa. Com o decurso do tempo, o chamado lapso temporal, poderá este acarretar determinados efeitos sobre a relação jurídica. Por força do instituto da decadência opera-se a extinção do direito, o qual, não poderá ser reclamado tanto na via administrativa, quanto na via judiciária. No entanto a prescrição refere-se às diferenças que poderão existir caso haja o acolhimento ao pedido de concessão, revisão ou restabelecimento de um benefício previdenciário, referente aos últimos 5 (cinco) anos.
Quanto a questão da prescrição, o posicionamento é relativamente tranquilo quanto a esse ponto. A prescrição é quinquenal, em regra. Sabe-se, no entanto que o direito a um benefício é imprescritível, ou seja, o fundo do direito a determinado benefício é imprescritível.
No que tange as regras aos benefícios previdenciários do Regime Geral da Previdência Social, as normas fundamentais que disciplinam decadência e prescrição são as do artigo 103, caput, e parágrafo único, da Lei 8 213/91.[5]
Mas antes de iniciarmos a discussão sobre a devida aplicação do instituto nas ações de concessão do melhor benefício de suma importância, traçarmos uma breve resenha histórica acerca da evolução legislativa do instituto da decadência.
Pois bem, com a Medida Provisória de nº 1.523-9 de 27.06.1997, conferiu-se nova redação ao art. 103 da Lei nº 8.213/91, onde pela primeira vez foi prevista a existência de um prazo decadencial no âmbito do direito previdenciário brasileiro.[6]
Essa regra que não contemplava o prazo decadencial perdurou até 27.06.1997, quando a MP nº 123-9 foi publicada e modificou a redação do referido dispositivo.[7]
Tal medida provisória foi convertida em Lei nº 9.528 de 10.12.1997, a qual vigorou até o advento da Lei nº 9.711 de 20.11.1998, que diminuiu para cinco anos o prazo de decadência na revisão dos atos de concessão de revisão por iniciativa do segurado.[8] Este prazo, entretanto, foi novamente ampliado para 10 anos pela Medida Provisória nº 138/2003, com vigência a partir de 20.11.2003, convertida na Lei nº 10.839/2004.[9]
Com esta nova legislação, grandes polêmicas e questões que não houveram esclarecidas, eis que a Lei 10.839/2004 não foi expressa ao esclarecer como deveriam serem tratado os fatos já ocorridos antes de seu ingresso no mundo jurídico.
Desta forma o Superior Tribunal Federal na análise do Agravo Regimental no Agravo nº 1398170/PR sob a relatoria do Desembargador Convocado do TJ/RJ Adilson Vieira Macabu, publico no DJE 04.08.2011, tinha firmado o entendimento no sentido de que, aos benefícios concedidos anteriormente à nova norma (Lei nº 9.528/97) não ocorreria o prazo decadencial, podendo tais benefícios, serem revisados a qualquer tempo.[10]
Todavia, por conta do direito intertemporal esse entendimento deixou de ter guarida no Superior Tribunal de Justiça, quando ficou incompatível com o entendimento do Superior Tribunal federal sobre questões em casos semelhantes.
Fixado também nova controvérsia acerca das novas mudanças, eis que, na Lei. 8.213/91 no seu art. 103 (com redação atual da Lei nº 10.839/04) absolutamente idêntica à lei 9.784/99 em seu artigo 54, que instituiu o prazo de decadência de 05 (cinco) anos para a Administração Pública rever seus atos.
Eis que a controvérsia novamente foi sanada através do julgamento do MS nº 9.112/DF sob o comando da Ministra Eliana Calmon, publicado no DJE em 14.11.2005, onde o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o tema pela primeira vez ratificou a grande celeuma na forma de que, agora a Administração pública terá prazo de 05 (cinco) anos para rever seus atos, contados na incidência a partir de janeiro de 1999, respeitados as garantias constitucionais, o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.[11]
Contudo para ratificar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e por fim a discussão in causu, sedimentou-se o entendimento de que para todos os casos, aplicável o prazo de 10 (dez) anos para rever o benefício, tendo como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, no julgamento do Recurso Extraordinário 626.489 de Relatoria do Min Roberto Barroso, julgado em 16.10.2013).[12]
Desta forma, verifica-se que antes das modificações normativas, não existia prazo para o segurado rever seu benefício, mas a partir de 1 de agosto de 1997, o prazo de 10 (dez) anos será computado como marco final para que o segurado assegure seu direito a rever a concessão do seu benefício.
Thiago Faggioni e Fabrício Barcelos Vieira [13] afirmam que esta sucessão legislativa resultou no seguinte contexto histórico:
– até 27.06.1997 – não havia previsão legal de prazo decadencial, ou de prescrição de fundo de direito, para a revisão dos atos de instituição dos benefícios previdenciários;
– de 28.06.1997 a 20.11.1998 – tais revisões passam a estar sujeitas a prazo decadencial de 10 (dez) anos;
– de 21.11.1998 a 19.11.2003 – as revisões sujeitam-se a prazo decadencial de 05 (cinco) anos;
– a partir de 20.11.2003 – tais revisões voltam a se submeter a prazo decadencial de 10 (dez) anos.
Mas, esse prazo decadencial não se opera ao tema trazido neste estudo, pois a ação de concessão ao melhor benefício, não se trata de revisão da RMI e é nesta seara que encontramos vasto campo para as mais diversas decisões, muitas delas, errôneas.
3. REPERCUSSÃO GERAL – DECADÊNCIA : TEMA 313 – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O Recurso Extraordinário nº 626.489 julgado pelo Plenário do Supremo tribunal Federal instaurou grande “repercussão geral equivocada” quando por uma grande infelicidade foi objeto de apreciação o tema “revisão do ato de concessão”.
Eis que, o debate sobre a decadência, no caso concreto “demandaria análise de legislação infraconstitucional” análise esta que cabe, como é sabido, mas muito bom relembrar, ao Superior Tribunal de Justiça, órgão que detém monopólio da ultima palavra, quanto à interpretação de legislação federal.[14]
O Superior Tribunal de Justiça é conhecido como “guardião da Carta Constitucional”, e foi criado com a precípua função de manter a integridade do ordenamento jurídico através de sua interpretação acerca da lei federal.
Desta forma não caberia ao Superior Tribunal Federal a pacificação do tema.
No entanto a manifestação do STF envolvendo a decadência do direito à revisão do ato de concessão do benefício ficou conhecida por todos, no Recurso Extraordinário nº 626.489, sob a guarda do ilustre relator, Ministro Roberto Barroso, julgado na sessão de 16.outubro.2013, ocasião em que se concluiu pela constitucionalidade da fixação de um prazo decadencial para a revisão do ato de concessão do benefício, estabelecendo, outras diretrizes, senão vejamos:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDENCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.DECADÊNCIA. 1.O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse em evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário.3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como prazo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição. 4.Inexiste direto adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido.” (RE 626489, Relator Min.Roberto Barroso, Tribunal Pleno).[15]
O que aconteceu a partir de então, foi a utilização desta r. decisão como precedente sem o devido distinguishing, como preceitua José Antônio Savaris.[16]
Por certo, o objeto de julgamento do RE 626.489 foi a questão da incidência da decadência prevista na MP1.523/97 aos benefícios concedidos antes de sua vigência, do qual já falamos em tópico anterior.
Pois bem, o Supremo Tribunal Federal já consolidou entendimento de que realmente tem natureza infraconstitucional à controvérsia trazida sobre a decadência ao pedido de revisão relativo aos benefícios concedidos após a edição da MP nº 1.523-9 de 27.06.1997. Neste sentido segue ementa do ARE 704.398/RS, julgado sob a relatoria do Ministro Luis Roberto Barroso:
“EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PEDIDO DE REVISÃO. BENEFÍCIO CONCEDIDO APÓS A EDIÇÃO DA MP Nº 1.523/97. DECADÊNCIA. MATÉRIA DE NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. CONTROVÉRSIA ACERCA DO TERMO “REVISÃO” DO ART. 103 DA LEI Nº 8.213/1991. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que é de índole infraconstitucional a controvérsia quanto à decadência do pedido de revisão dos benefícios concedidos após a edição da MP nº 1.523/97. Precedentes. Situa-se no plano da legalidade, e não da constitucionalidade, a controvérsia trazida pela parte recorrente, referente à interpretação do termo “revisão” constante no art. 103 da Lei nº 8.213/1991. Embargos de declaração conhecidos como agravo regimental a que se nega provimento.”[17]
O professor e advogado Guilherme Pfeifer Portanova, destaca e assevera em artigo publicado [18] acerca do tema que o RE 626.489 do STF apenas proferiu parecer acerca DE QUANDO COMEÇA e não O QUE COMEÇA ao tratar do tema da decadência, tecendo grandes observações, e destas também coadunamos, de que o tema em discussão está longe de se encerrar no âmbito dos direitos sociais, conforme veremos no seguinte tópico.
4. DA NÃO APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DECADÊNCIA NAS AÇÕES DE CONCESSÃO AO MELHOR BENEFÍCIO
O presente trabalho científico objetiva desenvolver o questionamento e o raciocínio jurídico acerca do tema.
Mas para que tenhamos êxito é necessário uma análise dos precedentes trazidos em repercussão geral a aplicação do princípio da igualdade, ou seja, não se pode tratar iguais de maneira diferente, ou seja, tratar os igualmente os iguais e os desiguais na medida de suas desigualdades.
Desta forma, a aplicação do distinguishing é extremamente necessário, no caso da aplicação do artigo 103 da Lei nº 8.213/91, pois identificar as circunstâncias fáticas diversas de cada caso na prática, e ter como consequência a constatação de que “ o direito evidenciado no precedente não deve regular o caso sob julgamento”. [19] (MARINONI, 2016, p.231).
O artigo 103 da Lei 8.213/91, onde foi inserido a decadência, deve ser analisado com muito critério, eis que restringe direitos, e portanto na aplicação onde apenas o segurado requer revisão do ato de concessão de seu benefício.
Na tese da retroação da DIB para obtenção de novo benefício, o prazo decadencial não deve ser aplicado, pois ao contrário do que se aduz, não estaremos discutindo a RMI calculada no benefício concedido, não estamos falando de revisão da RMI, erro comum ao analisar essa ação.
O objeto das ações de retroação da DIB é a concessão do melhor benefício, é a busca pelo segurado de uma proteção social mais efetiva, mediante retroação do período básico de cálculo para momento anterior à data do requerimento administrativo, quando os pressupostos para sua concessão já se encontravam aperfeiçoados, como bem nos esclarece o nobre professor, doutrinador e Juiz José Antônio Savaris.[20]
“…quanto a esse problema, que a ação que busca a retroação da data de início do benefício não impugna os critérios de cálculo ou as demais circunstâncias analisadas pelo INSS. Não se trata, a rigor, de revisão do ato de concessão do benefício. Antes, o que se pretende é o reconhecimento do direito adquirido ao melhor benefício incorporado anteriormente à DER (data de entrada do requerimento administrativo), com cálculo de nova renda mensal, sendo que apenas os efeitos financeiros – do benefício mais vantajoso – coincidem com a data do requerimento administrativo do benefício de que é titular o segurado.”[21](grifo nosso)
A tese da retroação da DIB (data início do benefício) tem perfeita aplicação em casos onde no momento da concessão do benefício o segurado já preenchia todas as condições a concessão de benefício, e tendo direito adquirido poderá ter seu benefício recalculado de modo mais vantajoso sob a vigência da mesma lei, consideradas todas as possíveis datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde o inicio do preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício.
É da lavra do voto da Min. Ellen Gracie [22] na discussão acerca do tema, RE 630.501, em sede de Repercussão Geral, que trazemos a baila:
“Cumpridos os requisitos mínimos (tempo de serviço e carência ou tempo de contribuição e idade, conforme o regime jurídico vigente à época), o segurado adquire o direito ao benefício.
Não é por outra razão aliás que o § 1º do art. 102 da Lei 8.213/91 incluído pela Lei 9.528/97, por exemplo, reconhece: “A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos”. É que a alteração posterior nas circunstâncias de fato (por exemplo, a cessação dos recolhimentos por longo período, com a perda da qualidade de segurado) não suprime o direito já incorporado ao patrimônio do titular.
O segurado pode exercer o seu direito assim que preenchidos os requisitos para tanto (assim que adquirido) ou fazê-lo mais adiante, normalmente por optar em prosseguir na ativa, inclusive com vista a obter aposentadoria integral ou, atualmente, para melhorar o fator previdenciário aplicável.”
Errôneo, portanto chamar a tese do melhor benefício de “revisão de benefício”, tendo em vista a presente ação não versar sobre vícios no ato concessório da aposentadoria ao segurado, o que se busca na verdade é a substituição da apuração da renda mensal inicial (RMI), onde retroagindo à data de início do benefício (DIB) para uma data anterior à data em que foi realizado o requerimento do benefício previdenciário, o segurado, obtenha uma renda inicial mais vantajosa.
Importante destacar que não se confunde a data do início do pagamento, pois esta fica condicionada a manifestação de vontade do segurado em via administrativa, na forma dos artigos 49 e 54 da Lei nº 8.213/91, com a data do cálculo da renda mensal inicial dos pagamentos da aposentadoria.
É com muita propriedade e sabedoria que o professor e brilhante advogado Guilherme Pfeifer Portanova [23] elucida essa questão, conforme destacamos abaixo:
“Primeiramente, no que tange a este tópico, temos que ter bem claro que não se discute na ação concessória de melhor benefício, nenhuma das três hipóteses que caracterizariam a REVISÃO DE RMI (leia-se do “ato de concessão” – artigo 103), segundo a melhor doutrina pátria e a própria lei de benefícios (8.213/91),pois, nesta ação, não se quer acrescer tempo, revisar índices de correção, nem muito menos o percentual do cálculo da RMI (restrição atuarial, coeficiente de cálculo ou fator previdenciário).”
Trazendo esclarecedoras observações acerca da ação ao melhor benefício, a Ministra Ellen Gracie Northfleet[24], na condução do seu voto, foi extremamente feliz, ao pontuar os efeitos da tese do melhor beneficio, onde declara claramente que a mesma não se trata de revisão do ato de concessão original, mas sim, da concessão de outro beneficio (fundo do direito imune a prazo decadencial), com outra RMI, com outro PBC, e com outros salários de contribuição. [25]
A tese do melhor benefício encontra grande similaridade com a tese da desaposentação, como preceitua e esclarece Guilherme Pfeifer Portanova [26]:
“Também não podemos nos olvidar quanto à similaridade do Tema 334/RE 630.501 (DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO) com a tese da DESAPOSENTAÇÃO (Tema 502/STF), no que tange ao fato de dependerem de requerimento do titular (direito potestativo) e de não terem parcelas vencidas, ou seja, atrasados, até porque não há crítica alguma no ato concessório, e por isso, não caberia a condenação ao pagamento de atrasados, as chamadas parcelas vencidas.”
É sabido e notório que nos casos de desaposentação não há mais o que se falar acerca da aplicação da decadência, eis que o Superior Tribunal de Justiça, guardião e intérprete da lei, pacificou o posicionamento na forma do Recurso Especial em controvérsia repetitiva nº 1.348.301/SC, julgado em casos de desaposentação, pacificando o entendimento de que não se aplica o prazo decadencial, previsto na regra do artigo 103 da Lei 8.213/91, nas ações de desaposentação.
As duas teses tem identificação quando verificamos que na tese do melhor benefício, estamos falando numa espécie de desaposentação pretérita, eis que o que se busca em ambas, é um benefício mais vantajoso, cancelamento de benefício atual e deferimento de benefício mais vantajoso, contudo na retroação da DIB o que se busca é a concessão de um benefício com data anterior a atual.
Hoje em dia a busca da retroação da DIB para os benefícios atuais, talvez não nos pareça muito vantajoso, mas quando falamos de décadas anteriores, a realidade muito distinta da atual: a economia oscilava muito, a inflação era muito alta, a instabilidade muito grande, as várias mudanças na legislação poderiam ser fatais em questão de cálculo de RMI aos aposentados.
E a Autarquia previdenciária não era capaz, aliás, como ainda não é hoje, de realizar o que a lei assegura, qual seja, orientar o segurado para que ele tenha acesso ao benefício mais vantajoso. Dever insculpido não apenas nos princípios da moralidade, da eficiência e da publicidade insculpidos no artigo 37 da CF/88.
Mas também da observância da legalidade, porquanto a orientação consta hoje do artigo 687 da IN 77/2015 [27] (antiga IN 45/2010, artigo 621).
Assim, não faz sentido imputar ao segurado os efeitos de falha que decorreu da atuação defeituosa da administração por uma interpretação extensiva do enunciado normativo do caput do artigo 103 da Lei 8.213/91.[28]
Ademais no julgamento AgRg no REsp 1407710, trouxe uma nova luz no horizonte previdenciário, provocou o reconhecimento de que “o prazo decadencial não poderia alcançar questões que não foram aventadas quando do deferimento do benefício e que não foram objeto de apreciação pela Administração.”[29]
“PREVIDENCIARIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA, NÃO OCORRÊNCIA. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 103 DA LEI 8.213/91.1.hipotese em que se consignou que a “decadência prevista no artigo 103 da Lei 8.213/91 não alcança questões que não restaram resolvidas no ato administrativo que apreciou o pedido de concessão do benefício. Isso pelo simples fato de que, como o prazo decadencial limita a possibilidade de controle de legalidade do ato administrativo, não pode atingir aquilo que não foi objeto de apreciação pela Administração”. 2. O posicionamento do STJ é o de que, quando não se tiver negado o próprio direito reclamado, não há falar em decadência. In casu, não houve indeferimento do reconhecimento do tempo de serviço exercido em condições especiais, uma vez que não chegou a haver discussão a respeito desse pleito. 3. Efetivamente, o prazo decadencial não poderia alcançar questões que não foram aventadas quando do deferimento do benefício e que não foram objeto de apreciação pela Administração. Por conseguinte, aplica-se apenas o prazo prescricional e não o decadencial. Precedentes do STJ. 4. Agravo Regimental não provido.” (AgRg no REsp 1407710/PR, Rel. Ministro Herman Benjamim, segunda Turma, Julgado em 08.05.2014, DJe 22.05.2014) (grifo nosso)
É, portanto da lavra extraída do r. julgamento sob a Relatoria do Desembargador Ministro Daniel Machado da Rocha que trazemos a assertiva de que houve a chancela, pelo C. STF, no julgamento do RE 630.501/RS acerca da tese do direito a benefício calculado de modo mais vantajoso, sob a vigência da mesma lei, consideradas todas as datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos para a jubilação: [30]
“Garantiu a corte constitucional, a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial (RMI) possível no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional, a contar da DER.”
Transcrevo ementa do referido julgamento:
“APOSENTADORIA – PROVENTOS – CÁLCULO. Cumpre observar o quadro mais favorável ao beneficiário, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais. Considerações sobre o instituto do direito adquirido, na voz abalizada da relatoria – ministra Ellen Gracie-, subscritas pela maioria.” (RE 630501, Relator(a): Min. Ellen Gracie, Relator(a) p/Acórdão: Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 21.02.2013, DJe-166 DIVULG 23.08.2013 PUBLIC 26.08.2013 Repercussão Geral – Mérito EMENT VOL-02700-01 PP-0057).
Outra questão controversa seria a possibilidade ou não de rever parcelas em atraso, o que também na lavra do voto da Ministra Ellen Gracie [31], restou pacificado que, “considerada foi à natureza do direito ao melhor benefício de caráter potestativo e que por isso, impõe ao sujeito passivo um dever de sujeição, mas não de prestação imediata, e que, portanto, enquanto não houver o requerimento, leia-se, ajuizamento da ação ou pedido administrativo, não há uma lesão, portanto, não há que se falar em decadência”.
Restando o entendimento de que, somente após este requerimento administrativo ou judicial é que começam a fluir tais institutos de prescrição e decadência.
Destacando que o ponto crucial não é o trecho final “respeitada à prescrição e decadência”, mas sim, “a partir do requerimento”. (Portanova, 2016)
Guilherme Pfeifer Portanova, assevera ainda que:
“Deliberou-se ainda, como mais uma ratio decidendi, que para tanto seria necessária à prévia provocação do segurado perante o INSS apontando qual a data mais conveniente, daí decorrendo a consequência de não se falar em parcelas vencidas até então; valendo-se das palavras da I. Relatora, Ministra Ellen Gracie, tem-se que: “Os pagamentos, estes sim, não retroagem à nova DIB, pois dependentes do exercício do direito” – p. 10 do correspondente voto.”. SENTENÇA / 5000577-27.2014.404.7121/RS impondo-se lembrar que a Previdência Social é um direito social assegurado no artigo 6º da Constituição Federal. Entendimento afeiçoado ao disposto no artigo 122 da Lei 8.213/91, ao artigo 56 do Decreto 3.049/99, ao Enunciado 1 divulgado pela Portaria MTPS 3.286, de 27/11/73, e ao Enunciado Nº 5 do CRPS. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 630.501 (Rel. Min. Ellen Gracie, DJe de 23.11.2010, tema 334), reconheceu repercussão geral da controvérsia objeto da discussão nestes autos. Confira-se, a propósito, a ementa do referido julgado:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO ADQUIRIDO AO MELHOR BENEFÍCIO. Tem relevância jurídica e social a questão relativa ao reconhecimento do direito adquirido ao melhor benefício. Importa saber se, ainda que sob a vigência de uma mesma lei, teria o segurado direito a eleger, com fundamento no direito adquirido, o benefício mais vantajoso, consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido, desde quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação. Repercussão geral reconhecida, de modo que restem sobrestados os recursos sobre a matéria para que, após a decisão de mérito por esta Corte, sejam submetidos ao regime do art. 543-B, § 3º, do CPC”.
.Assim, tecidas algumas observações acerca do tema, chegamos a constatação de que não há que se falar em decadência para a concessão do melhor benefício, tese conhecida como retroação da DIB, pois partimos do pressuposto, primeiro que o tema decadência bem controverso, extingue direitos; segundo, não poderia influir tal prazo acerca das questões ainda não ventiladas na esfera administrativa, ademais, como vimos exaustivamente, não estamos pleiteando revisão de RMI, não, o que se está requerendo é uma análise, que por certo não foi realizada na concessão do benefício, por parte do ente administrativo, que tinha esse dever. No entanto, não se pode perpetuar possíveis ofensas ao direito adquirido, direito fundamental e o segurado, lado mais frágil desta relação, se ver totalmente lesado por ter aguardado certo tempo para pleitear aquilo que nem deveria ser pleiteado, caso a Previdência Social, tivesse realizado trabalho satisfatório.
Portanto, não há que se falar em decadência diante das ações de concessão do melhor benefício, pois estaríamos perpetrando verdadeira ofensa à ordem social, à garantia ao direito fundamental inclusive ofensa à própria qualidade de vida do segurado, com escopo maior em princípio da dignidade da pessoa humana.
CONCLUSÃO
É imprescindível que, diante dos argumentos expostos, que os operadores do direito se conscientizem de que os precedentes acerca dos temas polêmicos são deveras importante contudo, uma incorreta interpretação ou a inexatidão do distinghishing pode causar dano irreversível não só ao aposentado ou pensionista, mas sim a uma imensa categoria de segurados.
Tendo em vista os aspectos observados, e diante de tantas possibilidades de revisão do benefício previdenciário, a constatação que chegamos é que o advogado ao decidir por uma tese jurídica, saiba exatamente, o que se está pleiteando e antes de bater as portas do judiciário, faça um grande estudo acerca do tema e das decisões atuais, inclusive se a questão esta sob repercussão geral nas cortes superiores.
Pois com tantas controvérsias acerca de temas tão importantes no cenário dos direitos sociais, a atualização das informações pode ser de grande valia na correta apreciação das demandas e possibilidade de triunfo.
A decadência pode ter o condão de cercear direitos e a ofensa ao direito fundamental do segurado, se não sanado, pode tornar-se perpétuo, causando danos irreparáveis por toda uma vida.
Notas
Informações Sobre os Autores
Vanusa Rodrigues
Advogada e Pós-Graduanda em Direito da Seguridade Social pela Faculdade Legale. Pós graduada em Direito e Relações do Trabalho pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo
Carlos Alberto Vieira de Gouveia
Carlos Alberto Vieira de Gouveia é Mestre em Ciências Ambientais e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais; Vice-Presidente para a área Previdenciária da Comissão Direitos e Prerrogativas e Presidente da Comissão de Direito Previdenciário ambas da OAB-SP Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Previdenciário da Faculdade Legale