Resumo: O presente artigo tratará sobre a legislação pertinente à oferta de produtos e serviços no comercio eletrônico. Sabemos que o comércio eletrônico está crescendo e ampliando seu mercado consumidor, com a criação de novos sites (e suas vitrines virtuais) a cada segundo. Não devemos permitir que as mídias publicitárias eletrônicas veiculem ofertas enganosas, com imagens ilusórias e palavras falsas para atrair o usuário. Para análise do tema, faremos uma pequena abordagem sobre o e-commerce e os contratos eletrônicos, já que essas são a forma de consolidação do negócio realizado em ambiente virtual. Abordaremos o Código Civil, mas principalmente o Código de Defesa do Consumidor, já que o intuito é explicitar somente o negócio realizado entre consumidor e fornecedor, formando a chamada relação de consumo. Queremos, com isso, mostrar que as regras que defendem os consumidores contra abusos na oferta publicitária são plenamente aplicáveis nas vitrines das lojas virtuais.
Palavras-chave: contrato eletrônico, consumidor, comércio eletrônico, e-commerce.
Abstract: This article will deal on the legislation to offer products and services in electronic commerce. We know that electronic commerce is growing and expanding its consumer market with the creation of new sites (and their storefronts) every second. We must not allow electronic media advertising deals convey misleading and deceptive images with false words to attract the user. For analysis of the topic, do a short approach on e-commerce and electronic contracts, as these are the way to consolidation of the business conducted in the virtual environment. We will discuss the Civil Code, but especially the Code of Consumer Protection, as the intent is to explain only the business conducted between consumer and supplier, forming the so-called consumer relationship. We would, thus, showing that the rules that defend consumers against abuses in the advertising offers are fully applicable in the windows of storefronts.
Keywords: electronic contract, consumer, electronic commerce, e-commerce.
Sumário: 1. Introdução. 2. Os contratos de consumo no comércio eletrônico. 2.1. Comércio eletrônico. 2.2 contratos eletrônicos. 2.3. Contratos eletrônicos de consumo. 3. Oferta e publicidade. 3.1. Codigo de defesa do consumidor da defesa dos internautas consumidores. 3.2. Provedor de serviço. 3.3. Intermediador de venda.4. Conclusão.
1 INTRODUÇÃO
O mundo está se transformando. A cada dia, novas tecnologias são criadas, modificadas, lançadas e utilizadas na facilitação da vida moderna pelo homem. Casas inteligentes, carros que não precisam de motorista e tantas outras inovações estão surgindo, isso se somente nos referirmos ao “mundo real”.
Quando nos direcionamos ao mundo não-real, composto de bits e bytes, acessados por mecanismos próprios – ou adaptados a isso, como o telefone celular – nos depararemos com mudanças incontáveis que ocorrem segundo a segundo.
Novas ferramentas de gerenciamento de sistemas, sites (ou saites, como alguns doutrinadores mais integrados com a nova ordem mundial defendem), blogs, perfis de relacionamento, comércio eletrônico, e-mail, comunicação instantânea são uma pequena parte da infinidade de recursos que estão a um click de distância.
A cada instante esses recursos são atualizados, fazendo surgir desde novas ferramentas até simples alteração do layout. Tudo isso, basicamente, em uma clara tentativa de diminuir distancias entre as pessoas e facilitar diversos tipos de transações negociais.
O computador, portanto, tornou-se a peça fundamental nesse mundo globalizado, em que as fronteiras são destruídas no o simples arrasto do mouse, uma conversa em um chat ou o envio de um e-mail.
O direito, como regulador da vida em sociedade, não pode ficar de fora dessa evolução. Necessária é sua participação para que o “mundo virtual” não se torne uma “terra de ninguém”, sem uma ordem jurídica capaz de organizar as inúmeras relações que ocorrem a cada instante.
O ramo em que o direito se faz mais presente é na questão das relações negociais, principalmente no que tange aos contratos realizados no comércio eletrônico.
Um dos maiores problemas que surgem em função do comércio eletrônico é a oferta. Quantos consumidores já não se depararam com um produto diferente ao adquirido na loja virtual?
Tentaremos ao longo deste artigo expor os principais pontos sobre os contratos eletrônicos de consumo e a oferta dos produtos no e-commerce, observando, para isso, o Código de Defesa do Consumidor.
2 OS CONTRATOS DE CONSUMO NO COMÉRCIO ELETRÔNICO
2.1 COMÉRCIO ELETRÔNICO
O ambiente virtual vem facilitando a aproximação das partes para a formação dos mais diversos tipos de contratos, desde contratação de serviços até aquisição de produtos. Surge, então, o comércio eletrônico (e-commerce), pela necessidade do homem em agilizar suas relações.
A expressão “comércio eletrônico” abrange duas palavras com sentidos bastante específicos: comércio, enquanto atividade mercantil clássica que não se diferencia pela forma como é praticada; e eletrônico, que diz respeito ao instrumento utilizado para as transações.
Miguel Pupo Correia (1999) define comércio eletrônico como a:
“[…] utilização de tecnologias de informação avançadas para aumento de eficiência de relações entre parceiros comerciais para desenvolvimento de vendas de bens e prestações de serviços, quer entre empresas, quer ao consumidor final.” (CORREIA, 1999)
Na seara jurídica, Fábio Ulhoa Coelho nos mostra que a definição de comércio eletrônico vai muito além da natureza do bem ou serviço negociado. Tanto na venda de mercadoria não virtual (televisor, livro, CD etc.) como na de bens virtuais (download de softwares, músicas etc.), se o negócio se realiza em estabelecimento virtual, há de se entender por eletrônico. In verbis:
“Comércio eletrônico é a venda de produtos (virtuais ou físicos) ou a prestação de serviços realizados em estabelecimento virtual. A oferta e o contrato são feitos por transmissão e recepção eletrônica de dados. O comércio eletrônico pode realizar-se através da rede mundial de computadores (comércio internetenáutico) ou fora dela.” (COELHO, 2003, v. 3, p. 32)
Diante das definições acima transcritas, entendemos que há comércio eletrônico sempre que houver manifestação de vontade voltada ao negócio jurídico com a finalidade de aquisição de bens ou prestação de serviços entre pessoas ausentes, utilizando tecnologias de informação e de comunicação, através do processamento e transmissão eletrônicos de dados.
Embora ainda restem dúvidas sobre os direitos existentes nesse tipo de comércio, estudos comprovam o aumento dos internautas consumidores no Brasil. Segundo pesquisa realizada pela empresa eBit, o número de internautas consumidores vem crescendo a cada ano. Entre os anos de 2001 e 2010, houve um aumento de 1,1 milhões para 23 milhões de consumidores. Além disso, o faturamento também cresceu assustadoramente, de 0,54 bilhões para 13,60 bilhões, ainda em previsão para 2010. [1]
Portanto, observamos que a tendência do comércio eletrônico é aumentar sua demanda, principalmente pela celeridade no atendimento – e no recebimento – para aquisição dos produtos e serviços, cujo documento que confirma a realização do negócio jurídico é o contrato eletrônico.
2.2 CONTRATOS ELETRÔNICOS
O conceito de contrato é proveniente da doutrina civil e sua origem remonta ao Direito Romano, sendo uma das instituições mais antigas existentes, evoluindo sempre, de acordo com a demanda da sociedade.
César Fiúza (2004, p. 360) conceitua o contrato como:
“[…] todo acordo de vontades entre pessoas de Direito Privado que, em função de suas necessidades, criam, resguardam, transferem, conservam, modificam ou extinguem direitos e deveres de caráter patrimonial, no dinamismo de uma relação jurídica.”
Precisamos ressaltar, antes de tudo, que os meios eletrônicos (em especial a Internet) não criaram novos tipos de contrato. Em absoluto. O que ocorreu foi o surgimento de uma nova forma de contratação, cujo objetivo é diminuir as distâncias entre os contratantes, economizar tempo gasto na elaboração do contrato e, mais do que tudo, aumentar os lucros.
Dessa forma, enquanto contrato é aquele negócio realizado em um meio físico, com o uso de papel e tinta, os contratos eletrônicos são “os negócios jurídicos que utilizam o computador como mecanismo responsável pela formação e instrumentalização do vínculo contratual.” (in ROVER, 2000, p. 197)
Não somente, podemos dizer que os contratos eletrônicos, de uma maneira simplista, é um mero formulário, com termos preestabelecidos, cláusulas iguais a todos os contratantes, enfim, um contrato de adesão, caracterizado pela inexistência da liberdade de convenção, preestabelecimento, unilateralidade da estipulação, uniformidade, rigidez e abstração das cláusulas gerais.
É de se observar que potencial modificação de uma cláusula não desnatura o fato de que o ato de assinatura desse tipo de contrato restringe-se a um mero click em um botão que o contratado insere em sua página, como “ok”, “aceito”, “concordo”, “comprar”, “adquirir” ou outros termos utilizados com o mesmo sentido.
Ressalte-se que os contratos eletrônicos devem seguir as mesmas regras endereçadas para os contratos físicos, respeitando os princípios (boa-fé, autonomia da vontade) e disposições (requisitos de existência e validade, momento de formação) inseridas no Código Civil.
2.3 CONTRATOS ELETRÔNICOS DE CONSUMO
Para que ocorra a proteção do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), as partes devem estar enquadradas no conceito que a norma trouxe para consumidor e fornecedor, instituindo, assim, a chamada relação de consumo.
Consumidor, na acepção legal do termo, “é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” (CDC, art. 2º). Percebemos o esforço da lei em mostrar que consumidor é somente aquele que contrata serviços para consumo final, ou seja, em benefício próprio ou de outrem, para uso “não profissional”, sem destinação econômica de lucratividade.
Ressaltamos que qualquer pessoa física ou jurídica será amparada pelo código, se adquirir serviços e produtos como destinatário final, para seu uso pessoal, sem qualquer objetivo profissional.
Se para se enquadrar como consumidor é necessária uma contratação de serviços ou produtos de uso pessoal, a figura do fornecedor se encaixa exatamente nas relações negociais com o intuito lucrativo, conforme define o art. 3º do CDC.
A internet somente foi lançada na Brasil, como meio de comercialização de produtos e serviços, em 1994, com a edição da Portaria nº 295, de 20.07.1995 pelo Ministério das Telecomunicações, que permitiu aos provedores de acesso[2] a comercialização do acesso à rede.
Portanto, não é porque um negócio está sendo realizado através de um meio diferente, com a utilização de tecnologias diversas e inovadoras para a contratação de um produto ou serviço (cuja abertura da internet, como meio de comercialização, somente ocorreu em 1994, com a edição da Portaria nº 295, de 20.07.1995 pelo Ministério das Telecomunicações, que permitiu aos provedores de acesso[1] a comercialização do acesso à rede), que o Código de Defesa do Consumidor (criado em 1990, portanto, bem anterior ao início dessa febre “virtual” entre os consumidores) deixará de ser aplicado.
Ao contrário, o Código de Defesa do Consumidor mostra-se extremamente atual para combater os problemas que surgem com o aumento das compras realizadas on-line, defendendo o consumidor contra as arbitrariedades das lojas virtuais
3 OFERTA E PUBLICIDADE
A oferta é considerada sinônimo de marketing, que, para Ada Pellegrini (2007, p.256) significa “[…] todos os métodos, técnicas e instrumentos que aproximam o consumidor dos produtos e serviços colocados à sua disposição no mercado pelos fornecedores.” (GRINOVER, 2007, p.256).
Embora utilizados normalmente como sinônimos, a propaganda e publicidade são diferenciadas com base no fator econômico. Enquanto a publicidade possui objetivo comercial, a propaganda visa um fim religioso, ideológico, filosófico, político, econômico ou social.
Como a legislação consumerista cuida somente da publicidade, exatamente em virtude do objetivo que esta possui em promover o lucro de alguma atividade comercial, nosso estudo se baseará somente nos pontos referentes à publicidade no ambiente virtual.
Este é o maior problema encontrado na internet: a publicidade realizada com imagens falsas, retocadas e palavras extremamente atrativas, com a descrição de um produto ou serviço de uma perfeição espetacular. Tal ocorre pelo próprio conceito de publicidade:
“[…] o conjunto de comunicações controladas, identificáveis e persuasivas, transmitidas através dos meios de difusão, com o objetivo de criar demanda de um produto ou produtos e contribuir para a boa imagem da empresa.” (COHEN, 1986, p. 49)
Embora não exista uma legislação especifica a ser aplicada ao abuso das formas de publicidade, o Código de Defesa do Consumidor abarca bem essa temática.
O art. 36 exige que a publicidade seja veiculada de uma forma que o consumidor a identifique como tal e o art. 37 proíbe qualquer publicidade enganosa ou abusiva.
A doutrina de Ada Pellegrini Grinover (2007, p. 317-319) identifica os príncipios, além dos já citados, cuja função é nortear a atividade publicitária. Vejamos:
– identificação da publicidade, com a impossibilidade da publicidade clandestina, nem a subliminar, devendo ser imediata e fácil, conforme observado no art. 36, caput do CDC;
– vinculação contratual, exposto nos arts. 30 e 35;
– veracidade, conforme o art. 37, §1º;
– não-abusividade, ou seja, uma forma de reprimir a publicidade enganosa, observando que não se pode confundir com a publicidade abusiva, pois esta nem sempre prejudica economicamente o consumidor, nos termos do art. 37, §2º;
– inversão do ônus da prova, cabendo ao fornecedor demonstrar que suas afirmações são verdadeiras, consoante art. 38;
– transparência da fundamentação da publicidade, a facilidade na exposição de seus termos, com base em elementos fáticos e científicos, positivada art. 36;
– correção do desvio publicitário, caso ocorra, ao lado de sua reparação civil e repressão administrativa e penal, deverá haver a correção do seu mau impacto sobre os consumidores, chamado de contrapropaganda, observado no art. 56, XII e
– lealdade, combatendo todos os abusos praticados no mercado de trabalho, nos termos do art. 4º, VI e resguardado no art. 37.
De todos esses, devemos observar dois princípios em particular: vinculação e transparência.
O princípio da vinculação requer que a informação deverá ter sido veiculada, ou seja, o consumidor deverá ter tomado conhecimento da mesma, bem como a precisão na mensagem, no sentido de objetividade e um mínimo de concisão.
O segundo princípio, o da transparência, torna-se crucial já que a informação é oferecida em dois momentos: antecedendo ou acompanhando o bem de consumo (quando o consumidor irá decidir sobre a aquisição ou não do bem) e no momento da contratação (com as condições formais em que será celebrado o contrato de consumo).
Além disso, o princípio da boa-fé, como norteador de todos os contratos, é outro princípio de crucial importância, sem o qual não há negócio que se sustente sem a confiança dos consumidores.
3.1 CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR DA DEFESA DOS INTERNAUTAS CONSUMIDORES
Uma empresa virtual coloca certo produto em sua “vitrine”, contudo, o consumidor ao adquiri-lo, depara-se com uma terrível constatação: a apresentação desse produto não corresponde à realidade.
Esses são alguns casos que podem ocorrer na comercialização virtual: o consumidor adquire um produto que promete fazer algo – e não o faz; recebe o objeto com uma quantidade ou qualidade inferior ao anunciado; não recebe o produto no prazo prometido pela loja; mudança unilateral no preço do produto/serviço. Nesses casos, bem como em inúmeros outros, o CDC incide de forma completa e – por não dizer assim – arrebatadora, vejamos:
“Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.”
Aqui nos deparamos com a linguagem clara e atual do CDC, que não se limita a um tipo de forma e meio de comunicação, mas para qualquer das formas, incluindo a internet.
Não somente, o CDC ainda especifica o próprio conteúdo da oferta, segundo art. 31, em complementação ao art. 30, deverá conter todas as informações relativas a preços, condições de pagamento, prazos de entrega, características, qualidades, quantidade, dentre outros dados.
O capítulo do CDC referente à responsabilidade civil por vício do produto ou serviço (arts. 18 ao 25) introduz a questão da responsabilidade do fornecedor de produto não somente pelos vícios existentes de qualidade ou quantidade, mas também “[…] aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza […]”.
Na esfera penal, comete crime quem faz “afirmação falsa ou enganosa,” ou omite “informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços”, incorrendo nas mesmas penas quem patrocinar a oferta (CDC, art. 66). Como também o CDC reprime quem faz ou promove “publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva.” (CDC, art. 67).
Além do mais, recorrendo à doutrina civil, nos casos em que há oferta ad incertam personam, como no caso da Internet, o Código Civil, em seu art. 429 enfatiza que “a oferta ao público equivale a proposta quando encerra os requisitos essenciais ao contrato, salvo se o contrário resultar das circunstâncias ou dos usos.”
Por força desse artigo, a oferta pública torna-se vinculante, o que obriga o proponente quando a informação estiver suficiente clara e eficiente para tornar real a atividade comercial.
Observemos, à guisa de ilustração, a ementa retirada do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, cujo julgamento ocorreu em 17/05/2010:
“TJRJ – 0017666-26.2007.8.19.0208 – APELACAO – 1ª Ementa DES. VERA MARIA SOARES VAN HOMBEECK – Julgamento: 17/05/2010 – PRIMEIRA CAMARA CIVEL AÇÃO DECLARATÓRIA DE VALIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C INDENIZATÓRIA. COMPRA REALIZADA ATRAVÉS DE SITE NA INTERNET. VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA. PREÇO PROMOCIONAL. CANCELAMENTO UNILATERAL. ALEGAÇÃO DE ERRO NO PREÇO DIVULGADO. CARÁTER VINCULATIVO. PRINCÍPIO DA CONFIANÇA. VALIDAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. DECISÃO MONOCRÁTICA COM FULCRO NO ART. 557, CAPUT, DO CPC, QUE NEGA SEGUIMENTO AO RECURSO.”
De forma geral, a publicidade tem como objetivo a expansão dos negócios de quem a utiliza. No caso acima transcrito, a empresa alegou erro no sistema, sem comprovar falhas.
Um sistema computadorizado não é isento de falhas, ao contrário, inúmeros fatos podem ocorrer e desestabilizar o sistema, desde a ação de hackers até falha na programação do software utilizado.
Dessa forma, a empresa deve arcar com eventuais falhas em seu sistema já que o risco é inerente ao empreendimento, não desobrigando, portanto, o cumprimento da oferta.
E o CDC não encerra esse assunto aqui. Se o consumidor se deparar com esse problema, poderá recorrer ao art. 35 do CDC:
“Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:
I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;
II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;
III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.”
Similar técnica foi utilizada também no art. 20, em que se refere aos prestadores de serviço e vícios existentes após a prestação do serviço, indicando alternativas para o consumidor que seja lesado não somente por vícios de qualidade, mas também por disparidades com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo exigir a reexecução dos serviços, restituição da quantia paga ou abatimento proporcional do preço (incs. I ao III).
Portanto, o consumidor não se encontra em nenhum segundo desprotegido das relações realizadas nos e-commerce.
Contudo, existem alguns casos que podem dificultar o exame claro do CDC, tal como exposto anteriormente. São os provedores de serviço e intermediadores de venda onde persiste a dúvida se pertencem ou não à cadeia de consumo. Fato a ser esclarecido nas próximas linhas.
3.2 PROVEDOR DE SERVIÇO
Interessante fato que ocorre – e confunde – a cabeça da maioria das pessoas é a questão do provedor de serviços. Muitos consideram que o serviço pelo qual ele é contratado teria relacionamento com os produtos ou serviços inseridos no ambiente virtual. Tentaremos esclarecer esse fato.
O provedor de serviço é um prestador de serviços, cuja função é servir de elemento de ligação entre os usuários da internet – como elemento obrigatório e imprescindível.
“[…] Assim, provedor de acesso é a instituição que se liga à internet, partindo de um “ponto-de-presença” ou outro provedor, para obter conectividade IP e repassá-la a outros indivíduos e instituições, em caráter comercial ou não.[…] (VASCONCELOS, disponível em < http://www.apmp.org.br/index.php/pecas-juridicas/artigos/520-analise-da-responsabilidade-do-provedor-de-acesso-a-internet>)”
Pelo simples fato de interligar o usuário ao mundo virtual, o provedor de serviço tende a ser responsabilizado por disponibilizar o conteúdo que circunda pela internet ao usuário. Contudo, o mesmo não fiscaliza o conteúdo que o internauta disponibiliza ou acessa na internet, ou estaria maculando o princípio constitucional da privacidade (art. 5º, X, CF).
A única responsabilidade que o provedor possui é “prover” uma conexão de qualidade ao usuário, para que este possa se interligar ao conteúdo disponibilizado no ambiente virtual. Além de suporte técnico ou demais serviços contratados pelo usuário.
3.3 INTERMEDIADOR DE VENDA
Se é certo que não há responsabilização do provedor quanto ao conteúdo inserido na internet, muita confusão ainda existe na doutrina e jurisprudência acerca da responsabilidade do intermediador de venda.
Uma empresa disponibiliza em sua loja virtual vários produtos, pertencendo a diferentes vendedores, através dos quais recebe uma comissão pela inserção do produto na vitrine e também com sua venda.
São esses os pontos que pretendemos tocar: comissão recebida pela empresa e o desconhecimento da existência e qualidade dos produtos colocados por diversas pessoas.
Vejamos uma jurisprudência favorável à responsabilização dessas empresas intermediadoras de venda:
“EMENTA: COMPRA E VENDA PELA INTERNET. CONSUMIDOR. COMÉRCIO ELETRÔNICO. AQUISIÇÃO DE PRODUTO PELO SITE DA MERCADO LIVRE. MÁQUINA FOTOGRÁFICA ADQUIRIDO NO SITE DA CO-RÉ DC GOULART SHOP. PRODUTO NÃO ENTREGUE. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. I. A autora adquiriu uma câmera fotográfica da empresa ré “DC Goulart”, através do site “Mercado Livre“, uma vez que averiguada a situação da empresa e esta demonstrou confiabilidade. Todavia, após realizada a compra, a ré “Mercado Livre” alegou que não fosse realizado o negócio, pois a empresa estava sob suspeita. II. Ocorre que, mesmo tendo efetuado o depósito integral do valor do produto, este não foi entregue, em decorrência do fechamento da empresa. III. Os fornecedores de produtos e serviços, integrantes da cadeia de consumo são solidariamente responsáveis pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo, conforme refere o parágrafo único do art. 7º, CDC. IV. Dever de restituir a parte autora os valores desembolsados com a aquisição da câmera fotográfica, que nunca chegou às mãos do consumidor. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.” (Recurso Cível Nº 71002261097, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Leandro Raul Klippel, Julgado em 25/03/2010, TJRS)
Segundo o julgamento colacionado acima, houve uma oferta de um produto, adquirido pelo consumidor e que nunca chegou às mãos deste. A idéia é responsabilizar todos da cadeia de consumo como solidariamente responsáveis, principalmente pelo fato de que a empresa recebeu uma comissão, antes mesmo de iniciada a venda (assim que o vendedor insere seu produto no site, deve pagar um valor para que seja acessível a todos).
Contudo, tal entendimento não é uniforme, vejamos posição contrária:
“TJRJ – 0032070-42.2008.8.19.0210 – APELACAO – 1ª Ementa DES. SIDNEY HARTUNG – Julgamento: 12/05/2010 – QUARTA CAMARA CIVEL
APELAÇÃO CÍVEL – INDENIZATÓRIA – DANO MATERIAL E MORAL – SITE DE APROXIMAÇÃO COMERCIAL – MERCADO LIVRE – Negociação direta do consumidor com o vendedor mediante depósito direto em conta corrente. – Produto não entregue. – Fraude. – Não utilização da ferramenta de segurança (MercadoPago) disponibilizada pelo site. – Sentença de improcedência, reconhecendo a culpa exclusiva do consumidor. – Apelo autoral. – QUANTO AO AGRAVO RETIDO: REJEIÇÃO – Agravo retido, interposto pelo réu, em face da decisão interlocutória determinativa de inversão do ônus da prova. Presença dos pressupostos, insculpidos no art. 6º, VIII, do CDC, necessários ao deferimento da inversão do ônus da prova. – Atuação do consumidor apelante como causa exclusiva do dano, diante da inobservância das ferramentas de segurança fornecidas pelo réu. – Incidência da excludente de responsabilidade do fornecedor, prevista no art. 14, § 3º, II, do CDC, tendo em vista a realização de depósito direto na conta corrente do vendedor, por conta e risco do demandante, como alertado pelo sítio de vendas. – Precedentes jurisprudenciais, inclusive desta E. Câmara. – Manutenção da sentença. – Aplicabilidade do disposto no art. 557, caput, do CPC – REJEIÇÃO DO AGRAVO RETIDO. NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO.”
Assim, levaram-se em consideração que o consumidor atuou culposamente ao adquirir o produto, inobservando as ferramentas de segurança fornecidas pela empresa, inclusive esta estampa em seu site que não tem responsabilidade pelos produtos anunciados pelos vendedores.
A dúvida persiste: o intermediador de vendas tem responsabilidade pelos produtos inseridos em sua loja virtual?
Parece-me que esta resposta ainda está longe de ser respondida, mas devemos levar em consideração o fato de que a empresa recebe comissão por cada venda efetuada, o que seria uma espécie de cadeia de consumo diferente das que estamos acostumados a ver (fabricante – fornecedor – consumidor, por exemplo). Aqui seria: vendedor (intermediador) – consumidor.
É lógico que uma empresa só tenha benefícios e nunca seja responsabilizada por qualquer ato que diga respeito a seu negócio (e que ocorra em seu estabelecimento virtual)?
Claro que também não podemos negar a responsabilidade dos consumidores que adquirem produtos de forma impensada, sem avaliar de quem compra e utilizar a segurança que a empresa oferece.
O mais razoável seria proporcionalizar essa responsabilidade, no sentido de compensar o valor da indenização se a empresa provar que houve irresponsabilidade por parte do consumidor ao desrespeitar regras de segurança básicas da internet.
Dessa forma, o Direito não pode ser usado como ferramenta para proteção dos lucros arbitrários dessas empresas, como também não pode proteger um consumidor que não se resguardou de iminentes riscos de compras on-line, tão em comento nos dias atuais.
4 CONCLUSÃO
A cada instante um novo ponto de acesso à internet é disponibilizado no Brasil e no mundo. Com isso, o usuário encontra facilidades a um click do mouse, desde acesso a notícias em tempo real, vídeos, rádios, até aquisição de produtos e serviços através do e-commerce.
Percebemos ao longo do trabalho que o consumidor brasileiro não está desprotegido contra os abusos veiculados na mídia eletrônica no tocante à publicidade. Se um vendedor oferta determinado bem, a um determinado custo, deverá manter sua palavra e cumprir a proposta oferecida ao consumidor – em respeito ao Código Civil e ao Código de Defesa do Consumidor.
Caso não haja cumprimento da oferta veiculada, os arts. 20 e 35 do CDC trazem alternativas, à escolha do consumidor, para que este tenha em mãos o produto contratado, conforme escrito na mídia publicitária.
Outro ponto interessante é a questão do provedor de serviço. Sendo este imprescindível para o acesso de qualquer um ao mundo virtual, não há sentido em responsabilizá-lo pelo conteúdo que seu contratante disponibiliza, já que não é sua função – nem poderia ser – fiscalizar tudo o que foi inserido na internet.
Os intermediadores de venda ainda são um caso complicado a se vencer. Embora parte da doutrina sustente sua não responsabilização, não vejo porque deixá-lo de fora da cadeia consumerista, se recebe lucro pela prestação do serviço, em razão das vendas realizadas pelos usuários cadastrados em seu domínio.
Não é porque o contrato não se utiliza do papel, que há menos direitos em torno dele. Ao contrário, da mesma forma que as tecnologias evoluem, o Direito se esforça para acompanhar essa evolução, embora não de forma célere como as mudanças que ocorrem no mundo virtual, mas da melhor forma possível para defender os consumidores vulneráveis nesse mundo de novas tecnologias.
Mestranda em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba, com ênfase em Direito Econômico; Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Estadual Vale do Acaraú; Graduada em Direito pela Universidade Estadual Vale do Acaraú; Integrante do Projeto Rondo – CE do Programa Direito e Cidadania pela Universidade Estadual Vale do Acaraú
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