O acesso à Justiça e a efetividade da tutela jurisdicional como Direito Fundamental

Resumo: O presente trabalho aborda o acesso à justiça como direito fundamental onde sem a sua concretização realça a impossibilidade dos direitos serem reconhecidos e resguardados. Uma vez sendo garantido o direito fundamental ao acesso à justiça imprescindível se mostra que tal resolução da lide seja resolvida de forma e tempo razoável sob pena de cerceamento do direito fundamental ao acesso à justiça pois esse não reside apenas no ato inicial mas se de toda a fase processual.

Palavras Chave: Acesso à Justiça. Direito Fundamental ao Acesso à Justiça. Efetividade Processual. Razoável duração do processo.

Abstract: This paper addresses the access to justice as a fundamental right without which their achievement highlights the impossibility of rights be recognized and safeguarded. Since being granted the fundamental right to access to justice is essential shows that such a resolution of the dispute is resolved and reasonable time under penalty of restriction of the fundamental right to access to justice because this is not only the initial act but if all the procedural stage.

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Keywords: Access to Justice. Fundamental Right to Access to Justice. Procedural effectiveness. Average duration of the process.

Sumário: Introdução; 1. Direito Fundamental como requisito imprescindível para o indivíduo; 2. Evolução do acesso à Justiça; 3. O acesso à Justiça na Declaração Universal de Direitos Humanos; 4. Direito Fundamental a um processo em tempo razoável; 5. Conclusão

INTRODUÇÃO

É mister ressaltar que o direito fundamental ao acesso à justiça constitui meio imprescindível para a segurança jurídica na consecução da tutela jurisdicional que o indivíduo pretende em razão da violação de seus direitos, visto ser ele o motivador principal da ruptura da inércia Estatal. Assim, demonstra-se que a sua respeitabilidade deve ser realizada de forma efetiva, bem como disponibilizada a qualquer indivíduo que tenha seu direito lesado ou esteja sobre ameaça. Isto ocorre em razão do princípio da inafastabilidade do judiciário o qual o Estado se responsabiliza em analisar todas as lides surgidas na sociedade a fim de substituir a vontade das partes e impor a vontade do ordenamento jurídico em busca do controle judicial e da segurança jurídica. Será observado também neste presente trabalho a inserção do direito fundamental ao acesso à justiça ao rol de direitos humanos elencados na Convenção Americana de Direitos Humanos. Todavia, o acesso à justiça por si só não produz os efeitos efetivos da prestação jurisdicional, pois apenas alberga condições para que o indivíduo alcance a máquina judiciária. Necessita-se, portanto, que o processo seja resolucionado em tempo razoável, ou seja, que a tutela jurisdicional ocorra em tempo razoavelmente ágil para o tipo de procedimento adotado, haja vista que a morosidade degrada de forma crucial a expectativa do cidadão quanto à tutela jurisdicional a qual aguarda, bem como infringe o direito fundamental a duração razoável do processo.

1. Direito Fundamental como requisito imprescindível para o indivíduo

Direito fundamental é o direito imprescindível para o ser humano e para o ordenamento jurídico. Trata-se de uma categoria fundamental que deriva da própria condição humana, erigindo o homem como pilar essencial na construção de um Estado Democrático Social de Direito (AGRA, 2009, p.127). Sua essencialidade consiste em proteção ao homem, como desenvolver e assegurar a dignidade da pessoa humana proclamada na Constituição Federal de 1998, sendo considerados como direitos invioláveis que de forma alguma podem ser suplantados, gozando de supremacia e de aplicação imediata[1]. Assim, constituindo uma carga valorativa mais intensa.

São considerados essenciais para o ordenamento jurídico, pois as normas e princípios, em sua aplicação, têm como alvo primordial o homem, sujeito de direito e deveres que sem sua respectiva inserção como alvo direto das normas não haveria necessidade em se falar em ordenamento jurídico nem no seu reconhecimento, visto que não haveria sujeitos para sua devida aplicação. Ficaria, portanto, algo vago e sem possibilidades de aplicação sujeitando-se apenas aos marcos teóricos, abstendo o respectivo sujeito do objetivo pretendido pela norma. Neste mesmo sentindo preleciona Gregorio Peces-Barba Martínez Os direitos fundamentais são o conjunto de normas de um ordenamento jurídico que formam um subsistema deste, fundado na liberdade, na seguridade, na solidariedade, expressões da dignidade do homem, que forma parte da norma básica material de identificação do ordenamento jurídico, e constituem um setor da moralidade procedimental positivada, que legitima o Estado Social de Direito” (MARTÍNEZ, 1999, p. 469).

Contudo, não se fundamenta sua imprescindibilidade apenas em razão da vedação de o Legislativo produzir normas que inflijam esses preceitos ou que venham a suprimir tais direitos, por serem cláusulas pétreas não podem ser alteradas pelo Poder Reformador, mas sim por elevar considerações a respeito das prerrogativas valorativas dos cidadãos porque são consideradas as normas mais importantes do ordenamento jurídico só podendo ser alterada através do Poder Constituinte.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem assevera que os direitos fundamentais são proclamados por declaração, ou seja, eles pré-existem a todas as normas, instituições políticas e sociais, não podendo ser retirados ou restringidos pelas instituições governamentais, que por outro lado devem proteger tais direitos de qualquer ofensa e disponibilizar os meios para que, em caso de violação, seja realizada a devida reparação de forma efetiva.

O direito fundamental afasta, portanto, o fundamento clássico de que sua existência decorria apenas do Estado e que sua atuação consistia em situação de prerrogativa Estatal.

Os Direitos Fundamentais são assegurados por meio de procedimentos formais direcionados para que suceda a devida tutela jurisdicional. No entanto, para ocorrer à proteção é necessário que sejam assegurados, de forma efetiva, todos os meios inerentes ao procedimento que visam assegurar a tutela de tais direitos. Contudo, é mister ressaltar a relevância e a importância de garantir o acesso à Justiça de todos os cidadãos, pois sem a garantia deste acesso tornam-se inapropriados e irrelevantes, até mesmo utópico, a proteção dos direitos. O acesso à justiça é o principal e fundamental dos direitos do ser humano a ser efetivamente assegurado, pois é pelo seu exercício que serão reconhecidos os demais (ANNONI, 2012, p. 17). Destarte, em razão do acesso à justiça ser a garantia de que o indivíduo pleiteará seus direitos lesionados, evidencia-se seu grau de importância perante o ordenamento jurídico, onde sua inobservância e desrespeito enseja prejuízos não só para aquele determinado momento, momento inicial, mas sim impossibilidades futuras de proteção a direitos. Deve ser encarado como requisito fundamental de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos (CAPPELLETTI, 2002, p.12). É, portanto, primordial para que a parte interessada na demanda seja legitimada para se manifestar no decorrer processual e para que o processo seja iniciado.

Em razão da inafastabilidade da tutela jurisdicional proclamada no art. 5º, XXXV, Constituição Federal de 1988, deve-se assegurar de forma eficiente o acesso à justiça, pois sem o respectivo acesso não há que se falar em tutela jurisdicional. No entanto, esse acesso deve ser acessível a todos, sem restrições, mesmo sabendo que este não está disponível para determinadas classes, seja pela falta de conhecimento, seja em razão da cultura não ser tipicamente voltada para romper a inércia do Judiciário, bem como por pessoas carentes não possuírem condições para decorrer no procedimento da máquina judiciária.

O Direito ao acesso à Justiça transcorreu por uma grande evolução no tocante à proteção estatal. Tal Direito era considerado como Direito natural e por isso acreditavam que não era necessária uma tutela Jurisdicional de proteção. Sua preservação exigia apenas que o Estado não permitisse que eles fossem infringidos por outros. Todavia, há obstáculos que perduram até hoje, como por exemplo, o alto valor das custas judiciais. Houve também grandes avanços, como a criação da assistência judiciária gratuita, através dos defensores públicos, os quais substituíram os advogados particulares que prestavam serviços públicos ao Estado. Todos esses avanços, que serão analisados adiante, tornaram a justiça mais acessível, contudo, não foram sanados todos os problemas que, atualmente, afetam a proteção do direito fundamental ao acesso à justiça.

2. Evolução do acesso à Justiça

Durante o século dezoito e dezenove, nos estados liberais burgueses, os procedimentos adotados para solução de litígios concerniam acerca da filosofia essencialmente individualista[2]. Não obstante o acesso à Justiça ser considerado como direito natural, ele refletia sob o prisma do plano meramente formal, ou seja, a igualdade proclamada no texto formal não produzia eficácia material.

A desigualdade social refletia no trâmite processual, pois os que detinham poder econômico para enfrentar os altos custos constituíam primazia diante das classes menos favorecidas, porque aqueles eram passíveis de acompanhar os ritos processuais de altos níveis até o trânsito em julgado, sendo as custas pagas referentes a cada ato processual desenvolvido no decorrer do processo. Como alude Danielle Annoni, “só tinha acesso à Justiça, no sistema do laissez-faire, quem podia enfrentar seus custos e suas delongas, haja vista que o papel do Estado era tão somente permitir que o cidadão tivesse acesso à Corte de Justiça, a fim de propor a ação ou de se defender dela. Não cabia ao Estado senão administrar a aplicação da vingança privada. O Direito ao acesso à Justiça era o direito de acesso formal, mas não efetivo. Correspondia à igualdade formal, mas não à efetiva” (ANNONNI, 2005, p. 113).

Esses fatores, diferença entre litigantes ao potencial acesso ao processo e à disponibilidade de recursos para enfrentar processos dilatórios, não eram reconhecidos como problemas. As reais preocupações se valiam no tocante a construção abstrata de sistemas de normas, alcançando, todavia, o limite de julgar as normas de procedimento de acordo com sua validade histórica e de sua operacionalidade em situações hipotéticas, repelindo as preocupações reais da sociedade. Contudo, desvia-se do modelo ideal de efetividade. Coligado deveria está o procedimento formal com a realidade social a qual está inserida, pois a não adaptação e não adequação do procedimento à sociedade levaria a um procedimento ineficaz para determinadas classes, bem como inacessível. São nesse diapasão os ensinamentos de Boaventura de Sousa, “daí a constatação de que a organização da justiça civil e, em particular, a tramitação processual não podiam ser reduzidas à dimensão técnica, socialmente neutra, como era comum serem concebidas pela teoria processualista, devendo investigar-se as funções sociais por elas desempenhadas e, em particular, o modo como as opções técnicas no seu seio veiculavam opções a favor ou contra interesses sociais divergentes ou mesmo antagônicos (interesses de patrões ou de operários, de senhorios ou de inquilinos, de rendeiros ou de proprietários fundiários, de consumidores ou de produtores, de homens ou de mulheres, de pais ou de filhos, de camponeses ou de citadinos, etc., etc)” (SANTOS, 2006, 167 e 168).

No entanto, com o crescimento da sociedade do Laissez-faire, o conceito de direitos humanos começou a sofrer uma transformação radical. A sociedade passou a exigir uma atuação positiva do Estado para garantir os direitos de forma efetiva. Não apenas para conhecê-los, mas sim para garantir sua real efetivação. Esta transformação se deu em razão do reconhecimento dos direitos sociais, onde evoluiu o pensar dos cidadãos para requerer do Estado algo que anteriormente, de forma aparente, mostrava-se incapaz. Esses direitos são reconhecidos como direito de segunda dimensão[3] o qual tem o objetivo de dar um caráter de universalidade às prerrogativas fundamentais dos cidadãos, revogando a concepção individualista. Revela, portanto, a criação da garantia Constitucional de os cidadãos clamarem por seus direitos afim de romper com a inércia Estatal em proveito da concretização dos preceitos para atender às necessidades da sociedade, proporcionando a retirada da igualdade proclamada no plano formal e permitindo a consubstanciação da esfera material.

O acesso afetivo à justiça passou por grandes transformações, pois os grandes processualistas, ao longo do tempo, pesquisaram formas as quais poderiam ser solucionadas a fim de disponibilizar um efetivo acesso à justiça para todas as classes, não expurgando determinada classe social ou determinado povo.

A primeira solução, conhecida como a primeira onda, incrementou a assistência Judiciária para os pobres de forma a garantir o acesso à Justiça para essas classes desprovidas de patrimônio e de conhecimento, este constituído tanto pela cultura quanto pela falta de oportunidade de conhecer os mecanismos adotados pelo Judiciário, os quais levam a uma estagnação social. Esta inovação concerne, hodiernamente, em razão da complexidade dos procedimentos Judiciais e dos seus atos, bem como na indispensabilidade do advogado na administração da Justiça, conforme preleciona o art. 133 da Constituição Federal de 1988[4]. É mister ressaltar a garantia da prestação Judiciária de forma gratuita elencada em nossa Carta Magna em seu art. 5º, LXXIV, dispondo que “o Estado prestará assistência Jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (redação dada pela Lei nº 1.060/65).

Contudo, tal avanço não proporcionou um acesso efetivo à Justiça, solucionando apenas o patrocínio na causa, pois o principal empecilho consiste nos altos custos Judiciais, em que beneficia aqueles cidadãos constituídos de poder e recursos para enfrentar a máquina Judiciária e suas delongas. Aqui não nos referimos apenas aos valores cobrados para impetrar uma determinada ação, mas sim no tocante aos gastos ligados intrinsecamente e extrinsecamente ao processo em razão da sua morosidade na tentativa de solucionar o caso, tornando a resolução de litígios muito dispendiosa. Além do elevado valor das custas judiciais – certo que o Estado remunera o Juiz e seus auxiliares – que é variável de acordo com o valor da causa e da instância a qual foi impetrada a ação, ressalta-se também o avultoso empecilho para as pessoas economicamente grágeis no que condiz ao ônus da sucumbência.  A penalidade para o vencido em países que adotam o princípio da sucumbência é aproximadamente duas vezes maior, pois terá o ônus de pagar os custos de ambas as partes, que ao depender do risco da causa poderá lhe custar muitos mais do previsto, uma vez que os honorários advocatícios podem variar muito[5].

Portanto, é considerado como um grande obstáculo visto que o interessado, ao imaginar romper com a inércia Judiciária, deverá se precaver acerca do valor que terá que arcar caso não seja vencedor. Fica plenamente evidenciado o temor perante causas que versem sobre valores jamais negociáveis para o mesmo, bem como as causas de pequenos valores que sobrepõe custas elevadíssimas. Em uma pesquisa realizada por Boaventura de Sousa foram elencados os altos índices dos valores cobrados a título de custas Judiciais na Justiça Cível de vários países, como por exemplo nos EUA. Ele ressaltava como primordial o alto custo das causas que versam sobre valores pequenos. “Estes estudos revelam que a justiça civil é a cara para os cidadãos em geral, mas revelam sobretudo que a justiça civil é proporcionalmente mais cara para os cidadãos economicamente mais débeis. É que são eles fundamentalmente os protagonistas e os interessados nas ações de menor valor e é nessas acções que a justiça é proporcionalmente mais cara, o que configura um fenómeno da dupla vitimização das classes populares face à administração da justiça” (SANTOS, 2006, p. 168).

Muitos almejam acionar a máquina judiciária, até mesmo com grandes chances de obter resultado favorável, porém preferem abdicar, pois em meio as dúvidas, estas constituídas em razão do julgador obter pensamentos variáveis adaptando-os a legislação vigente, optam por prevenir e assegurar seu patrimônio. Com isso resplandece seu elemento configurador à limitação ao acesso à Justiça e o seu descrédito diante a sociedade.

Em consonância com os elementos supracitados é realçada a segunda barreira. Esta se mostra como ponto principal quando se cogita tratar de acesso à Justiça. As partes compõem um marco essencial no desenrolar processual, mas sua principal essencialidade consiste na fase pré-processual onde deve-se tomar conhecimento da existência de seu Direito. formalizada mediante a transgressão das normas Jurídicas ou de violações dos seus próprios direitos. Surte, portanto, a disparidade entre determinadas sociedades.

Nessa fase pré-processual é necessário ter plena capacidade jurídica pessoal, ou seja, reconhecimento dos prejuízos sofridos no tocante à violação de seus direitos. Ela aborda as inúmeras barreiras que precisam ser pessoalmente superadas, antes que um direito possa ser efetivamente reivindicado através do aparelho Judiciário.

É de suma importância o reconhecimento da existência de um direito juridicamente exigível, visto que na procura de efetivar o acesso à Justiça, deslumbra-se a necessidade de conhecer quais meios serão utilizados para assegurar o direito violado. Isto não se resume apenas aos cidadãos com menos recurso, mas pode-se afirmar que os mais afetados são exatamente eles. “Estudos revelam que a distância dos cidadãos em relação à administração da justiça é tanto maior quanto mais baixo é o estrato social a que pertecem e que essa distância tem como causas próximas não apenas factores económicos, mas também factores sociais e culturais, ainda que uns e outros possam estar mais ou menos remotamente relacionados com as desigualdades económicas. Em primeiro lugar, os cidadãos de menores recursos tendem a conhecer pior os seus direitos e, portanto, a ter mais dificuldades em reconhecerum problema que os afecta como sendo problema jurídico. Podem ignorar os direitos em jogo ou ignorar as possibilidades de reparação jurídica” (SANTOS, 2006, p. 170).

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Além desse reconhecimento, é imprescindível a alteração no comportamento psíquico dos cidadãos, pois muitos sequer pensam em buscar o Judiciário para solucionar seus conflitos. Apesar da falta de conhecimento jurídico nas sociedades, outro ponto relevante se perfaz no tocante aos conceitos constituídos pela própria comunidade, onde os procedimentos são considerados complicados, há um alto nível de formalismo, os ambientes dos tribunais intimidam, entre outros.

Esses fatores entrelaçam-se com o meio social ao qual o cidadão vive, visto que a probabilidade de uma pessoa, que convive em um meio social o qual não sonda questões jurídicas nem conhecem profissionais da seara jurídica, propor uma ação é ínfima.

Em um terceiro momento, a progressão na busca do efetivo acesso à Justiça, refere-se à representação dos direitos difusos. Estes foram, sem dúvidas, causadores de uma verdadeira revolução, pois o processo civil era desempenhado e analisado sob o prisma litigioso entre duas partes, restando ao Estado decidir os interesses particulares individuais existentes naquela controvérsia. Jamais passava do litígio particular. Era o que descriminava o §4º do art. 150 da Constituição Federal de 1967: “A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual”.

No entanto, no decorrer dos anos e na agrupação dos seres vivos como uma cadeia social inserida em uma sociedade, surgiram os direitos difusos, conhecidos como direitos de terceira dimensão. Nessa evolução histórica os sujeitos da relação de direitos passaram a ser a coletividade ou interesse coletivo, passando a titularidade a ser difusa, coletiva, transindividual, ou seja, falece o critério individual e cria-se o sujeito social. Em palavras suscita o Supremo Tribunal Federal a se posicionar acerca da fundamentabilidade dos direitos difusos e o conceitua, onde argumenta que “o Direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas num sentido verdadeiramente mais abrangente, a própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade”.

Destarte, sendo o cidadão sujeito dos direitos difusos, seu agir, para proteção do direito supracitado, poderá ensejar grandes avenças: o interesse de um indivíduo em utilizar uma área ecologicamente reservada para investir comercialmente, com o intuito de gerar rendas e empregos para aquela determinada sociedade a qual não contém nenhum tipo de comércio e com seu índice de desemprego ferozmente elevado, buscando associar a comunidade para desenvolver o negócio de forma participativa. Observa-se que há um interesse individual sobre o coletivo, o qual se fundamenta em ajudar aquela determinada sociedade a se desenvolver economicamente. Surgi, no entanto, um antagonismo de interesses. De um lado poderá estar reunida toda a comunidade e de outro apenas o investidor ou, o investidor será aprovado por grande parte da comunidade e a outra parte se mostrará resistente para não haver alterações.

É mister ressaltar que para alguns dos cidadãos que fazem parte da sociedade não haverá mínima importância em se construir um grande investimento dentro de uma área ecologicamente correta. Partindo desse pressuposto, que o interesse é variável dentro da mesma comunidade, se pode concluir que a mesma intenção se valeria para uma futura disputa Judicial, rebelando-se como fruto de uma relação litigiosa apenas se houvesse um prejuízo próprio e não coletivo.

Outrora em uma ação coletiva exigia-se a legitimação de todos que faziam parte daquela determinada sociedade. No entanto, fora combatido esse método. Pois sua aplicabilidade não demonstrava resultados satisfatórios em razão de certos fatores, como por exemplo, o não compromisso dos interessados em comparecer as reuniões, bem como a falta de conhecimento combinada com a inexperiência, prejudicando, portanto, os demais interessados, visto que a legitimidade da ação coletiva condizia na reunião de todos prejudicados. Nesse mesmo diapasão, preleciona Mauro Capelleti que “outra barreira se relaciona precisamente com a questão da reunião. As várias partes interessadas, mesmo quando lhes seja possível organizar-se e demandar, podem estar dispersas, carecer da necessária informação ou simplesmente ser incapazes de combinar uma estratégia comum. Esse problema é mais exarcerbado pelo, assim chamado, ‘livre-atirador’ – uma pessoa que não contribui para a demanda, mas não pode ser excluída de seus benefícios” (CAPPELLETTI, 2002, p. 27).

Por tratarem de direitos públicos, era imprescindível depositar sua confiança na Máquina Pública, a qual se mostrara várias vezes ineficaz, pois a custódia desses direitos era inerente a órgãos públicos que em alguns sistemas jurídicos mundiais, como por exemplo na Alemanha, sofreram pressões políticas. Outra barreira existente na proteção dos direitos difusos condizia ao ato judicial de citação e o direito de ser ouvido. Esse entrave reporta-se na dificuldade de todos titulares de um direito difuso comparecer em juízo, bem como da ouvida de cada um deles. Tomamos por exemplo os interessados na preservação do meio ambiente. Uma vez que os titulares desse direito são todos os cidadãos. Nota-se o descompasso e a incongruência de ser ter em juízo todos aqueles interessados na demanda, haja vista que por ser um número exuberante, torna-se impossível a resolução do conflito em tempo razoável, seja em razão da ausência de alguns legitimados, seja em razão da delonga em ouvir todos e de aguardar a citação de cada um. Por isso a representação dos direitos difusos devem ser reverenciadas sem a formalização legitimista a qual garante validade aos atos quando praticados por aquelas determinadas pessoas legitimadas ao processo, tornando-se inválidos os atos quando não praticados com as representações completas.

3.  O acesso à Justiça na Declaração Universal de Direitos Humanos

Em um Estado Democrático de Direito é vedada a autotutela. Por isso em conformidade com o inciso XXXV do art. 5º da Carta Magna de 1988, toda ameaça ou lesão de qualquer direito deve ser apreciada pelo Poder Judiciário. Com isso o Estado avoca para si a responsabilidade de solucionar os conflitos sociais, substituindo, portanto, as partes e impondo o direito para resolucionar o litígio. Com isso denota-se a importância de se elaborar normas de procedimento em conformidade com a realidade social, pois estando em consonância com as necessidades sociais haveria a facilitação de um acesso à Justiça de forma mais efetiva.

Com expressas proteções no plano internacional, os Direitos Humanos são fundamentados na sua imprescindibilidade para o cidadão. No entanto, para eles serem protegidos é necessário que seja disponível um acesso efetivo à tutela jurisdicional.

Em razão do acesso à justiça ser pré-judiciário, o qual consiste no meio ao qual se procura proteger os direitos, sem a sua devida concretização não há que se cogitar em proteção judicial ou em tutela judicial. São, portanto, direitos humanos anteriores ao Estado e inerentes a todo ser humano. Destarte, ele deve ser a garantia fundamental para romper com a inércia Estatal e para assegurar uma futura proteção do Estado.

A Declaração Universal de Direitos Humanos em seu art. 8º garante a todos uma proteção Judicial efetiva de todos aqueles atos que violem os direitos fundamentais[6].  Em consonância a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica – dispõe que todos “têm direito a uma proteção Estatal dos atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição, pela lei ou pela própria convenção”. Evidencia-se, portanto, a magnitude da proteção ao acesso à Justiça, visto compor o rol dos Direitos Fundamentais e por serem a garantia básica inerente a todos os cidadãos para se obter a tutela Jurisdicional, além de sua aplicação ser imediata.

A garantia ao acesso à Justiça é constituído por mecanismos processuais que escoam em vários métodos e procedimentos a serem utilizados e respeitados pelo indivíduo. Todavia, por ser considerado como Direito Fundamental e gozar de proteção internacional, em razão da sua imprescindibilidade para se chegar a uma tutela judicial, seu alcance deve ser facilitado para todos os cidadãos de forma a garantir plena efetividade em seu exercício, visto que, de acordo com a Declaração Universal de Direitos Humanos, cabe ao Estado garantir tais direitos sob pena de representação e sanção no âmbito internacional.

Contudo, denota-se que a função primordial do Estado está em garantir a proteção aos Direitos Fundamentais para que se possa manter a ordem e a segurança jurídica. “Cabe ao Estado de Direito, precipuamente, a garantia dos direitos fundamentais do cidadão, e o acesso à justiça, não há quem duvide, é o mais essencial dos direitos do ser humano, bem como a vida, pois, é por meio dele que é possível ao cidadão materializar os demais, ou, ao menos, ser justamente ressarcido do prejuízo que o vitimou” (ANNONI, 2002, p. 35).

A inserção do acesso à Justiça no rol dos direitos fundamentais manifesta sua importância no que concerne a proteção dos direitos, pois ausente a sua garantia incongruente seria ressaltar a importância da tutela jurisdicional. Como obter tutela jurisdicional sem o devido acesso à Máquina Judiciária? Sem dúvida, sua proteção se faz primordial perante qualquer outra para que as demais sejam garantidas e protegidas.

4. Direito fundamental a um Processo em tempo razoável

Antes de tecer qualquer comentário sobre o tema se faz mister ressaltar que a problemática tratada neste ponto se rebela perante todos os ordenamentos jurídicos mundiais, cobiçando todos os juristas em deparar-se com fórmulas constituídas de soluções pertinentes para garantir uma prestação jurisdicional célere e eficiente. Como o anseio e a ideologia social se refletem na resolução de seus casos de forma mais célere possível, com mecanismos ágeis visando atender determinado fim e propor a Justiça in caso, nada mais oportuno do que tratar deste elemento garantidor que visa uma Justiça mais efetiva persistente em resolver os casos de forma mais justa e eficiente.

O Estado avocou para si o direito-dever de solucionar os conflitos da sociedade e a realizar a tutela jurisdicional. Esta jurisdição fora constituída para pacificar as contendas sociais, proteger e garantir os direitos do sistema jurídico pátrio. Mas para isso se faz necessário garantir os procedimentos adequados que visem o acesso ao devido processo legal, o qual hodiernamente encontra-se inserido em nossa Carta Magna em seu art. 5º, LIV. Todavia, não basta que sejam assegurados os meios formais inerentes a tutela jurisdicional, de maneira alguma são eles isoladamente suficientes para uma efetiva prestação jurisdicional, visto que os meios utilizados exteriorizam-se muitas vezes de forma inoperante em razão das suas complexidades e das suas delongas.

Destarte, a essencialidade de um procedimento justo e efetivo consiste na descomplicação de suas normas complexas visando com isso uma maior proximidade com a sociedade para encarar a realidade a qual está transitando. Essas normas muitas vezes dão caráter distinto dos quais foram constituídas, pois vez ou outra são utilizadas para corroborar com a morosidade judicial, ou seja, uma determinada norma que regulamenta o trâmite processual pode contribuir para uma melhor justiça procedimental como também colaborar para dificultar o impulso no decorrer do processo. É o caso, por exemplo, das reconvenções que são impetradas incidentalmente no processo, garantindo uma oportunidade de aplicar a justiça naquele determinado momento, o qual se encontrou injustiçado, em razão da oposição encontrada na demanda. Por outro lado deve-se observar o obste deprecado na celeridade processual em razão da oportunidade de o julgador realizar mais uma análise de um outro pedido diferente daquele na inicial, sendo em seguida reaberto um prazo para que o autor se manifeste sobre a referida reconvenção. Com isso revela a sensibilidade e a cautela que o legislador deve adotar ao elaborar as normas em nosso ordenamento jurídico, bem como identificar os efeitos práticos que as mesmas podem alcançar.  

Não obstante, as legislações serem elaboradas com base na realidade social faz-se necessário se ter como elementos constitutivos os princípios norteadores no ordenamento jurídico pátrio, principalmente aqueles elencados como princípios constitucionais. Estes se realçam de forma abundantemente superior em razão da superioridade da Constituição Federal sobre as demais legislações, pois as demais ingressam o sistema infraconstitucional e esta integra o topo da pirâmide Kelsiana (KELSEN, 2009, p. 56). Contudo, a importância dos princípios para elaboração das legislações consiste sob o prisma panorâmico que eles possuem, e da ponderação dos fatos sob a égide legal, pois ao passo que as normas compõem seus sistemas com aplicação sob a forma de “ser ou não ser” os princípios contemplam as possibilidades de se medir o caso de forma a proporcionar a equação adequada para resolução sua resolução. Isto se dá em razão da abstração e generalidade peculiares aos princípios que em razão desta performance não regulam situações jurídicas específicas. Portanto, difere-se das normas-regras que são constituídas com o fim de realizar a regulação direta de determinada situação específica, realçando, no plano conflituoso, uma aparente antinomia, pois uma vez surgida tal situação deverá outra norma-regra ser criada para assim derrogar a anterior e valer-se como inserida no ordenamento jurídico (ÁVILA, 2005, p. 36).

Essas sistemáticas são de suma importância para que, com a elaboração de normas condizentes com a sociedade e com os meios mais ágeis, se possa alcançar, através de um processo legal, a tutela jurisdicional de forma mais célere e efetiva. Com a inserção de elementos que visem a dar uma maior seguridade e estabilidade aos cidadãos ao utilizarem a máquina Judicial e seus meios procedimentais, os princípios colhem forças para sua fiel aplicação e garantias futuras de um processo adequado resolucionado em um tempo razoavelmente justo para as partes.

Destarte, em razão dessas circunstâncias, os princípios, ao nortearem o ordenamento jurídico pátrio, criaram regras para amenizar a morosidade judicial e buscaram proporcionar uma prestação jurisdicional mais adequada de forma mais econômica e célere.  

4. CONCLUSÃO

Visto à essencialidade de manter-se, para todos os cidadãos, um acesso efetivo à justiça com a obtenção de uma resolução célere da lide ora pleiteada, considerado como direito fundamental, o qual se perfaz sobre os demais, faz-se necessário, nos casos em que o processo não for conduzido em tempo razoável, apurar a responsabilidade do evento ocorrido e os danos ocorridos pela omissão estatal no seu exercício de dever agir nos litígios, pois lhe fora consagrado o poder de albergar todos os conflitos judiciais desvendados por meio do princípio da inafastabilidade estatal.

Todavia, hodiernamente não vem ocorrendo resultados favoráveis concernentes a tutela jurisdicional, pois a morosidade estar se perfazendo no decorrer do processo, bem como na finalidade a qual se pretende. Mesmo com o direito fundamental de ser ter o processo julgado em tempo razoável, mostra-se infrutífera as possíveis soluções hábeis e efetivas. Não se fala apenas em rapidez tampouco agilidade na busca da tutela judicial, mas sim de efetivação na própria atividade judiciária, seja ela no procedimento adotado no processo e nas leis processuais ou na consecução de tutela jurisdicional efetiva.

Em síntese, a maneira correta de se aferir a efetividade de um dado sistema processual é relacioná-lo com o direito material que instrumentaliza e, principalmente com a ordem constitucional na qual está imerso. Nesse diapasão, o processo deve estar apto a pôr em prática as normas e princípios constitucionais, como se exemplificou a partir do devido processo legal e da necessidade de tempo razoável para a prestação jurisdicional. Ademais, não basta apenas que a tutela jurisdicional se verifique. Há, outrossim, que tutelar aos fins colimados socialmente. Diante do Estado Social e Democrático de Direito que se vivencia hodiernamente, emerge a imprescindibilidade de o processo estar conectado com a realidade, os valores e os anseios verificados na sociedade em que se insere. Em isso se verificando, contribuirá para a prevalência da justiça e, em última análise, do bem-estar coletivo.

 

Referências
AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 6ª ed.
AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 5 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009
ANNONI, Danielle. Direitos humanos & acesso à justiça no direito internacional. 1 ed. Curitiba: Juruá, 2005.
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Notas:
 
[1] Sua aplicabilidade imediata acontece por força do art. 5º, §1º da Constituição Federal de 1988.

[2] Esta liberdade alberga a primeira dimensão dos direitos fundamentais, a qual garante a liberdade aos indivíduos com total abstenção do Estado. Como bem definia a atuação Estatal, nos séculos XVIII e XIX, perante aos jurisdicionando, onde sua essencial função era de não permitir que o Direito ao acesso à justiça fosse infringido por outros. Para mais aprofundamentos CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. (Tradução: Ellen Gracie Northfleet). Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris. 2002.

[3] Denominação mais adequada a título de uma geração não excluir a outra, mais sim de acrescentar e complementar cada uma ao rol de evoluções.

[4] “O advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

[5]  Essa variação pode ser levada em consideração a complexidade do serviço realizado, bem como do sistema geográfico que o advogado está inserido. Mesmo tratando de causas patrocinadas pela Justiça gratuita há de se falar em verbas sucumbênciais de acordo com o art. 12 da Lei  nº 1.060/1950 e precedentes: REsp 743.149-MS, DJ 24/10/2005; REsp 874.681-BA, DJ 12/6/2008; REsp 728.133-BA, DJ 30/10/2006; AgRg no Ag 725.605-RJ, DJ 27/3/2006, e REsp 594.131-SP, DJ 9/8/2004. REsp 1.082.376-RN, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 17/2/2009. 

[6] “Todo o homem tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”. A adoção da palavra remédio realça uma garantia do cidadão em se proteger de atos praticados de formas ilegais pelo Estado. Isto acontece, por exemplo, na utilização do mandado de segurança contra ato ilegal do Estado. Utilizamos proteção por entender ser a forma mais adequada, pois conforme preleciona este artigo que deverá receber dos tribunais o remédio efetivo contradiz com a natureza dos remédios utilizados em nossa Carta Magna, visto que eles são utilizados pelo próprio interessado e não recebido pelo Estado.


Informações Sobre o Autor

Eugo Rilson de Lima Oliveira

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Advogado Sócio do escritório Oliveira Vila Nova Advogados. Pós-Graduando em Direito Público pela Faculdade ASCES e Direito Constitucional Aplicado pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus


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