O aço e a defesa comercial

O Brasil se aproxima de rodadas de
negociação muito importantes no plano internacional. A próxima reunião da OMC,
a realizar-se em Doha, Qatar
em novembro, será um grande desafio para a  diplomacia brasileira.
Entretanto, vale ressaltar que o sucesso destas negociações depende muito de um
esforço conjunto que deve ser realizado entre o Itamaraty,
empresários e negociadores. A agenda de Doha
ainda não está fechada, e além disto, estas tratativas tomaram um contorno especial ultimamente, pois
elas serão fundamentais, especialmente para a definição de parâmetros de
discussão para a ALCA, com a possibilidade de inserção do debate acerca de
regras comuns, impondo limites para as barreiras comerciais de cada país.

A defesa comercial de um país é
realizada diante de uma série de mecanismos, que, dependendo da sua forma de
aplicação podem ser considerados abusivos, ou seja, prejudiciais ao comércio e
podem levar o país que se sente lesado a formular uma denúncia perante a OMC, que depois de avaliações pode aplicar sanções,
como no caso das medidas compensatórias. Os diversos países do globo, inclusive
os 142 participantes da OMC, adotam alguns mecanismos de defesa da indústria
nacional, que resumidamente podem ser classificados como medidas antidumping, subsídios e salvaguardas. O dumping ocorre
quando o preço de produto importado é menor que o preço praticado no mercado do
país exportador. Logo, o país cria barreiras ou taxas elevadas de importação
para inibir a entrada de concorrência. Os subsídios podem ser considerados uma
contribuição pecuniária ou de outra ordem que o Estado concede a qualquer
empresa ou particular, configurando uma espécie de ajuda, o que no comércio
internacional auxilia na redução do valor dos produtos exportados, tornando-os
mais competitivos. As medidas de salvaguarda são aplicadas quando um produto é
importado em grande volume prejudicando o mercado de fabricantes domésticos.
Esta medida busca diminuir o impacto das importações no mercado nacional até
uma futura adequação da indústria a estas novas regras.

O debate sobre a proteção da indústria
do aço sempre foi um assunto delicado na política norte-americana. O setor
começou a receber benefícios estatais diante da política econômica
intervencionista americana da década de 40. Como resultado desta política, a
indústria americana do aço constituiu um dos mais bem articulados grupos de
lobby com o escopo de não perder esses benesses. Este grupo atua com vistas a
criar medidas que inibam a importação, baseado em subsídios e medidas antidumping. Sua base é caracterizada pelo conhecido
“triângulo do aço”, constituído por empresas, sindicatos e políticos que visam
constituir barreiras que inibam da livre concorrência com agentes externos em
seu país. Apesar de a chamada “bancada do aço” não ser tão numerosa quanto se
imagina, constituiu-se como uma das mais articuladas e inteligentes,
inserindo-se nas mais importantes comissões da Câmara dos Deputados dos EUA.

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Como resultado desta articulação
consistente, nenhum presidente americano conseguiu suportar a pressão da
“bancada do aço”. Até aqueles que tinham como orientação econômica as teses da
Escola de Chicago, baseadas na liberdade econômica e livre comércio, como
Ronald Reagan, não conseguiram acabar com o paternalismo inserido nesta
indústria. Bush parecia ser o primeiro presidente que enfrentaria o problema
com coragem, pois tem sua política baseada na abertura das barreiras que
interferem no livre comércio. Contudo, o poder da “bancada do aço” pareceu mais
forte, uma vez que o presidente necessita destes votos para a aprovação do TPA
(Trade Promotion Authority – antigo fast track) no Congresso. O TPA é de fundamental importância
para as negociações comerciais norte-americanas conduzidas pelo executivo.

Apesar de o Brasil ser extremamente
mais protecionista que os EUA, (a alíquota média de importação americana está
em torno de 3% e no Brasil este número chega a 16%). Sob os olhos da ITC (International Trade Commision), o aço produzido no Brasil já está sofrendo com
as barreiras para entrar em solo americano. Políticas antidumping,
subsídios e sobretaxas são um reflexo da atitude de
defesa comercial americana, além da recente decisão do Eximbank
de cortar financiamentos. Antes de entrar em litígios internacionais, cabe ao
Brasil realizar uma inteligente articulação que possa derrubar medidas
protecionistas que inibem o livre comércio. A simples imposição de barreiras a
produtos americanos de nada adianta, pois somente cria mais receio de ambos os
lados. A interconexão entre os tabuleiros da OMC e ALCA é a saída mais
inteligente para ambos os países implementarem regras claras de defesa
comercial que viabilizem o livre comércio e derrubem barreiras protecionistas.


Informações Sobre o Autor

Márcio C. Coimbra

advogado, sócio da Governale – Políticas Públicas e Relações Institucionais (www.governale.com.br). Habilitado em Direito Mercantil pela Unisinos. Professor de Direito Constitucional e Internacional do UniCEUB – Centro Universitário de Brasília. PIL pela Harvard Law School. MBA em Direito Econômico pela Fundação Getúlio Vargas. Especialista em Direito Internacional pela UFRGS. Mestrando em Relações Internacionais pela UnB.
Vice-Presidente do Conil-Conselho Nacional dos Institutos Liberais pelo Distrito Federal. Sócio do IEE – Instituto de Estudos Empresariais. É editor do site Parlata (www.parlata.com.br) articulista semanal do site www.diegocasagrande.com.br e www.direito.com.br. Tem artigos e entrevistas publicadas em diversos sites nacionais e estrangeiros (www.urgente24.tv) e jornais brasileiros como Jornal do Brasil, Gazeta Mercantil, Zero Hora, Jornal de Brasília, Correio Braziliense, O Estado do Maranhão, Diário Catarinense, Gazeta do Paraná, O Tempo (MG), Hoje em Dia, Jornal do Tocantins, Correio da Paraíba e A Gazeta do Acre. É autor do livro “A Recuperação da Empresa: Regimes Jurídicos brasileiro e norte-americano”, Ed. Síntese – IOB Thomson (www.sintese.com).


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