Resumo: O presente trabalho tem por objetivo tecer uma breve análise a respeito da possibilidade de concessão do Benefício de Prestação Continuada aos Estrangeiros residente no país, passando por uma análise da assistência social no Brasil e sobre as disposições constitucionais no que se refere ao tema para que sejam garantidos os mínimos sociais e assim a Dignidade da pessoa Humana.
Palavras Chave: Previdência. Mínimos sociais. Dignidade da Pessoa Humana.
Abstract: This study aims to weave a brief analysis about the possibility of granting the Continued Benefit to resident foreign in the country, through an analysis of social assistance in Brazil and on the constitutional provisions with regard to the subject to be guaranteed social minimum and thus the Dignity of the Human person
Keywords: Welfare. Minimum Social. Dignity of human person.
Sumário: Introdução. 1.A compreensão dos Direitos Sociais na Constituição de 1988. 2.A Constituição e a Previdência. 3.Critérios para caracterização dos beneficiários do Benefício de Prestação Continuada e suas controvérsias. 4.Da garantia dos Mínimos Sociais. Conclusão. Referências
Introdução
O fenômeno da migração é antigo, tão antigo quanto a humanidade, os povos sempre se movimentaram em busca de agua, comida em abundância, de melhores condições de vida e sobrevivência.
A migração é responsável por importantes configurações políticas, sociais e econômicas na sociedade atual. Este assunto não apenas ganhou destaque nos últimos anos, como também se faz urgente e necessária uma discussão mais aprofundada do tema devido à grande quantidade de imigrantes que chegam ao Brasil neste período histórico político. Em nosso país a situação dos estrangeiros é regulamentada pelo Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/80).
Mas a discussão aqui pretendida não se refere a haver ou não um regulamento, mas o quanto se preocupou o legislador com a Dignidade da pessoa Humana e com a adequação aos preceitos constitucionais quando o tema atinge nossos cofres, mais especificamente se o Imigrante residente no país tem Direito a concessão do Benefício de Prestação Continuada, benefício assistencial previsto na Lei Orgânica da Assistência Social.
1.A compreensão dos Direitos Sociais na Constituição de 1988
Nossa Constituição de 1988 foi a primeira na história constitucional brasileira a prever os direitos sociais básicos e de caráter geral, bem como um extenso elenco de direitos dos trabalhadores, igualmente previstos no capítulo dos direitos sociais. O artigo 6º mostra-se mais amplo e evidencia o compromisso da Constituição e do Estado com a Justiça Social, comprometimento este reforçado pelo título I da CF, que contém o princípio da dignidade da pessoa humana que é fundamento do próprio Estado Democrático de Direito. (CANOTILHO, 2003, p. 534).
Os direitos existem, entretanto, sua operacionalização não é a esperada pelos que mais necessitam do acesso integral e facilitado desses direitos, apesar das legislações sociais e da Constituição de 1988, a qualidade de vida da população não melhorou conforme o esperado. Segundo Couto: “O resultado demonstra que apenas em 1986, com o Plano Cruzado, e no início do plano Real, em 1993, houve uma relativa melhoria para a população em geral” (COUTO, 2010, p.142).
“Os anos de 1990 até os dias de hoje têm sido de contra-reforma do Estado e de obstaculização e/ou redirecionamento das conquistas de 1988, num contexto em que foram derruídas até mesmo aquelas condições políticas por meio da expansão do desemprego e da violência.(BEHRING, 2011, p.147)”.
Ocorre que a política governamental que se formou após a Constituição Federal de 1988 centrou-se novamente no capitalismo e argumentava-se que as garantias constitucionais, principalmente no que se refere aos direitos sociais, dificultavam o governo e a estabilidade econômica do país, alegando-se inclusive que se teria um país ingovernável se as políticas sociais fossem levadas a cabo. Dessa forma, passou-se a ter um retrocesso no campo dos direitos sociais, prova disso é a Lei Orgânica da Assistência Social, Lei 8.742/93 que foi promulgada em 1993 após reinvindicação da sociedade civil e ação do Ministério Público e o Benefício de Prestação Continuada previsto na citada lei, apenas passou a viger em 1996, três anos após sua promulgação.
No período 1995 a 1999, governo de Fernando Henrique Cardoso, houve ainda maior boicote aos direitos sociais.
“Uma das características desse período é a retomada da matriz da solidariedade, como sinônimo de voluntarismo e de passagem da responsabilidade dos programas sociais para a órbita da iniciativa privada, buscando afastar o Estado de sua responsabilidade central, conforme a Constituição de 1988, na garantia desses direitos”. (COUTO, 2010, p.150).
Fica claro que havia total interesse na ruína da Constituição de 1988, pois esta teria garantido “muitos” direitos sociais que acabaram por se tornar um entrave ao crescimento econômico capitalista que buscava a expansão do mercado e um grande problema para a elite dominante que teria de conviver de forma mais “proporcional” com os marginalizados.
Nas palavras de Canotilho: Defender o cumprimento do texto constitucional, mormente naquilo que ele tem de social e compromissório, não significa defender a tese de um país autárquico. (CANOTILHO, p.149)
Dessa forma, o Estado liberal e os direitos sociais devem ser contrabalançados, na busca de construirmos um Estado que busque garantir os direitos sociais não apenas ratificando convenções, mas de forma intervencionista e que possua em seu arcabouço políticas públicas distributivas, de forma a garantir os direitos sociais e consequentemente as garantias fundamentais previstas no texto constitucional de 1988 e não um Estado baseado em seletividade e desigualdade.
2.A Constituição e a Previdência
No que tange a seguridade social, os deveres do Estado para com a matéria apareceram pela primeira vez no Brasil no inciso XXXI do artigo 179 da Constituição de 1924 sob o conceito de socorros públicos e institucionalizava o assistencialismo do Estado imperial, então conhecido como caridade. (SIMÕES, 2009, p.95)
A Constituição Federal de 1988 com seus contundentes avanços, em seu artigo 194 prevê a reunião das políticas da previdência, da saúde e da assistência social, referindo-se a universalidade e os sujeitos protegidos, vejamos:
“Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I – universalidade da cobertura e do atendimento;
II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
III – seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;
V – eqüidade na forma de participação no custeio;
VI – diversidade da base de financiamento;
VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).”
O artigo 194, ainda traz em seu bojo o “caráter democrático e descentralizado da administração” que significa a participação de todos os envolvidos no processo devendo as políticas públicas e os direitos sociais da seguridade social refletir o interesse da população. (COSTA, 2013, p.112).
A Constituição Federal trabalha com a lógica de que as políticas e direitos sociais devem ser ampliados e que estes são de responsabilidade do Estado.
“Enquanto os direitos de liberdade nascem contra o superpoder do Estado- e, portanto, com o objetivo de limitar o poder-, os direitos sociais exigem, para sua realização prática, ou seja, para a passagem da declaração puramente verbal à sua proteção efetiva, precisamente o contrário, isto é, a ampliação dos poderes do Estado. (BOBBIO, 2004, p. 67).”
Entretanto, assistência social foi a última área da assistência social a ser regulada. Tendo a saúde sua Lei Orgânica aprovada em 1990(Lei 8.080), a previdência social teve a lei que instituiu os planos de custeio e benefícios aprovados em 1991(Lei nº 8.2012 e 8.213) e, por fim, a assistência social foi regulamentada apenas em 1993. (COUTO, 2010, p. 171).
Nos artigos que seguem até o 204 trazem em seu bojo o tripé da seguridade: a saúde é direito de todos e dever do Estado; a previdência será devida mediante contribuição, enquanto a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição (COUTO, 2010, p.159).
Um dos objetivos da CF de 1988 é erradicar a pobreza e a marginalização prevendo em seu artigo 203 os objetivos da assistência social.
“Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;
II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;
III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;
IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;
V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.(citação)”.
Além disso, pode-se destacar o princípio da proibição de retrocesso social que se formula considerando-se não somente o conceito de mínimo existencial, mas, também, o de núcleo essencial do direito fundamental, proibindo o retrocesso dos direitos fundamentais sociais.
“O núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas legislativas (“lei da segurança social”, “lei do subsídio de desemprego”, “lei do serviço de saúde”) deve considerar-se constitucionalmente garantido, sendo inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam, na prática, numa “anulação”, “revogação” ou aniquilação” pura a simples desse núcleo essencial.
Não se trata, pois, de proibir um retrocesso social captado em termos ideológicos ou formulado em termos gerais ou de garantir em abstrato um status quo social, mas de proteger direitos fundamentais sociais sobretudo no seu núcleo essencial. A liberdade de conformação do legislador e inerente auto-reversibilidade têm como limite o núcleo essencial já realizado, sobretudo quando o núcleo essencial se reconduz à garantia do mínimo de existência condigna inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana. (CANOTILHO, 2003, p. 339-340).”
Dessa forma, a partir do princípio da proibição do retrocesso, o legislador fica adstrito ao limite do núcleo essencial, tendo de respeitar os direitos fundamentais quando da modificação das normas.
“Os direitos sociais sob a forma de instituição da instrução pública e de medidas a favor do trabalho para os “pobres válidos que não puderam consegui-lo”, fizera, fazem a sua primeira aparição no título I da Constituição Francesa de 1791 e são reafirmados solenemente nos artigos 21 e 22 da Declaração dos Direitos de junho de 1793. (BOBBIO, 2004, p. 206).”
Nesse interim, cabe mencionar que hoje temos a Assistência Social que é política da Seguridade Social, não depende de contribuição e que garante o atendimento às necessidades básicas dos menos favorecidos.
Garantida na Constituição de 1988, em seu artigo 203: “a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, um direito de todos e dever do Estado”.
As diretrizes, objetivos e o funcionamento da Assistência Social foram estabelecidos na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), lei 8.742/93, que regulamenta os artigos 203 e 204 da Constituição Federal.
Nesse contexto, podemos destacar que nossa constituição previu que todos seriam beneficiados pelo amparo assistencial, não apenas os brasileiros, mas sim todos, inclusive para os imigrantes residentes no país.
Entretanto, o que se vê são diversos entendimentos e distorções do que consta em nossa Constituição, pois alguns retiram da leitura do art. 1º da LOAS que a nacionalidade é requisito para a concessão do BPC, uma vez que a Assistência Social é, apenas, direito do cidadão brasileiro. Vejamos:
Lei nº 8.742/93, Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), em seu artigo 1º prevê:
“A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.”
O Decreto nº 6.214, de 2007 em seu artigo 7º que regulamenta atualmente o referido benefício, tem redação similar àquela inicial, e assim preconiza:
Art. 7º É devido o Benefício de Prestação Continuada ao brasileiro, naturalizado ou nato, que comprove domicílio e residência no Brasil e atenda a todos os demais critérios estabelecidos neste Regulamento.
Dessa forma, apenas aos brasileiros natos ou naturalizados e que residam em território nacional é devido o BPC. Aos estrangeiros residentes não, mesmo que estejam fora do sistema previdenciário do seu país de origem.
Ainda, utiliza-se o argumento de que não há tratados internacionais firmados pelo Brasil acerca da cooperação no que tange a Assistência Social, desta forma, não pode haver a concessão do referido benefício tendo em vista que os Brasileiros que residem em outros países não terão essa proteção, além de não haver previsão de custeio, o que oneraria demasiadamente os cofres públicos.
Certamente o legislador quando colocou a expressão “Cidadão” quis dizer toda e qualquer pessoa residente no território nacional, pois se assim não o foi, os incapazes e os menores de idade não poderiam ser abrangidos pelo BPC, pois o exercício da cidadania se dá através do voto e os incapazes e menores de dezoito anos não o podem fazer.
Dessa forma, resta claro que nossa Constituição prevê o amparo assistencial a todos aqueles residentes no país, mas o tema ainda está em discussão e existem diversas decisões conflitantes, mas tem-se estabelecido de forma majoritária o direito do estrangeiro residente no país ao BPC.
O Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral, porém, até o presente momento não houve julgamento.
“Ementa
ASSISTÊNCIA SOCIAL – GARANTIA DE SALÁRIO MÍNIMO A MENOS AFORTUNADO – ESTRANGEIRO RESIDENTE NO PAÍS – DIREITO RECONHECIDO NA ORIGEM – Possui repercussão geral a controvérsia sobre a possibilidade de conceder a estrangeiros residentes no país o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Carta da República.Decisão: O Tribunal reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, vencido o Ministro Cezar Peluso. Ministro MARCO AURÉLIO Relator.”
4.Da Garantia dos Mínimos Sociais
Os direitos sociais garantidos na Constituição Federal de 1988 muitas vezes apresentam-se de forma “programática”, pois não são garantidos pelo governo através das políticas públicas. Entretanto é inconcebível que acreditemos que há na lei um verdadeiro “monstro”, uma ordem que não é para ser cumprida, ou que seja apenas uma sugestão. Não restam dúvidas de que “o texto constitucional foi permeado de normas programáticas, dependendo, no mais das vezes, das ações concretas do Executivo e do Legislativo para serem concretizadas materialmente”. (COSTA, 2010, p.46).
O Benefício de Prestação Continuada da LOAS, veio para garantir o mínimo existencial, os chamados mínimos sociais, que no Brasil estão relacionados diretamente com a pobreza, digo, com a miséria absoluta, para garantir a sobrevivência do ser humano strictu senso e não a vida latu senso.
Segundo Pereira: A garantia dos mínimos sociais no Brasil tem conotação de menor, de menos, em sua acepção mais ínfima, enquanto se falarmos de básico, expressamos algo fundamental, principal, primordial. Dessa forma, a autora afirma que o princípio instituidor da LOAS é o básico e não o mínimo, pois qualifica necessidades a serem satisfeitas, atendimentos a serem prestados. “Em outros termos, enquanto o mínimo nega o ótimo de atendimento, o básico é a mola mestra que impulsiona a satisfação básica de necessidades em direção ao ótimo.” (PEREIRA, 2011, p. 26-27).
“Por conseguinte, o direito à satisfação otimizada de necessidades, a partir da garantia das condições básicas como exigência fundamental para essa otimização, constitui o cerne de todas as justificações das políticas sociais públicas, concluindo a assistência, e a meta a ser alcançada e defendida por todos aqueles que acreditam que a condição de vida dos pobres deve ser crescentemente melhorada. Em suma, a satisfação otimizada de necessidades deverá visar simultaneamente à melhoria da eficiência da política social e da equidade social. (PEREIRA, 2011, p. 35)”.
A busca da garantia dos mínimos sociais em uma sociedade capitalista passa pelo entendimento do que são as necessidades básicas, pois para muitos as necessidades básicas derivam das vontades subjetivas dos sujeitos, relacionadas a falta ou privação de algo, preferências por determinado bem ou serviço, movida pelo consumismo e expectativa de ter algo a que se julga merecedor de fato. (PEREIRA, 2011, p.30-40).
“Na base dessas concepções está uma forte justificação de feição ética-partilhada tanto por progressistas como por liberais e conservadores-que expressa a convicção de que é moralmente mais consistente equiparar necessidades a preferências subjetivas, porque só os indivíduos ou grupos particulares sabem dos seus carecimentos e, por isso, são mais capazes que as instituições coletivas de traçar os objetivos e prioridades que melhor lhes convêm. Há, aqui, de ambas as partes, uma rejeição implícita ou explícita à ingerência em nome do predomínio do mercado na regulação das necessidades sociais, tidas como preferências individuais, os progressistas, identificados com as esquerdas, temem o autoritarismo e o paternalismo do Estado. (PEREIRA, 2011, p.40)”.
Entretanto, os mínimos sociais são a garantia das necessidades básicas, dos direitos previstos constitucionalmente, como a dignidade da pessoa humana e o direito a saúde. Dessa forma, podemos concluir que as necessidades básicas não são preferências individuais como nossa sociedade capitalista quis incutir como pensamento geral, mas sim são objetivas e universais, pois os indivíduos de qualquer cultura sofrerão sérios prejuízos decorrentes de sua não satisfação. (PEREIRA, 2011, p.68).
Diversas correntes rejeitam a ideia de que existem necessidades humanas básicas, fala-se que cada indivíduo sabe o que é necessário para si e, também, que cada cultura demanda necessidades específicas. Dessa forma não se podendo falar em necessidades humanas básicas de forma geral. Essa rejeição a uma uniformização e definição de quais necessidades seriam básicas a todo ser humano, anda de mãos dadas com um ceticismo geral sobre a possibilidade de se ter no campo teórico um corpo de conhecimento objetivo e coerente sobre a matéria. (PEREIRA, 2011, p.38).
“Na base dessas concepções está uma forte justificação de feição ética-partilhada tanto por progressistas como por liberais e conservadores-que expressa a convicção de que é moralmente mais consistente equiparar necessidades a preferências subjetivas, porque só os indivíduos ou grupos particulares sabem dos seus carecimentos e, por isso, são mais capazes que as instituições coletivas de traçar os objetivos e prioridades que melhor lhes convêm. Há, aqui, de ambas as partes, uma rejeição implícita ou explícita à ingerência em nome do predomínio do mercado na regulação das necessidades sociais, tidas como preferências individuais, os progressistas, identificados com as esquerdas, temem o autoritarismo e o paternalismo do Estado. (PEREIRA, 2011, p.40)”
Diante desse ceticismo a concretização dos direitos é dificultada por tendências de interpretação de necessidades que se confundem com noções de uma sociedade consumerista e de necessidades subjetivas de cada ser humano, a inespecificidade das necessidades determina formas de satisfação confusas e voluntaristas que não concretizam direitos”. (PEREIRA, 2011, p. 39).
“Há muitas inconsistências na defesa do princípio da satisfação de preferências individuais e da soberania do consumidor, pois isso equivaleria a supor que os indivíduos seriam as únicas autoridades a saber o que é melhor para si. Essa suposição revela-se insustentável pelo seguinte motivo: tais indivíduos precisariam ser dotados de conhecimentos e racionalidades excepcionais para suprir a ausência de conhecimentos e racionalidades coletivas, que existem de fato e constituem a melhor referência para a formulação de políticas públicas”. (PEREIRA, 2011, p. 50-51).”
Conclusão
Para que se tenha garantidos os mínimos sociais, deve-se combater a miséria através de uma ação positiva do Estado para a proteção dos indivíduos e garantia de seus direitos, indo muito além da ratificação de tratados e programas de transferência de renda.
Além disso, devemos deixar de pensar que as políticas públicas de promoção a saúde, educação e os programas sociais de erradicação da miséria, tais como o bolsa família não deveriam existir, pois, conforme o conhecido ditado popular: “deve-se ensinar a pescar e não dar o peixe”, deixar de pensar apenas em quantas pessoas são atendidas por programas sociais para considerar quantas pessoas, de fato, deixaram a miséria e a total exclusão social. O combate a miséria e uma ação positiva do Estado para a proteção dos indivíduos e garantia de seus direitos.
“Moveu-nos, principalmente, uma forte preocupação com os impactos perversos que uma concepção restritiva e relativa de necessidades básicas pode acarretar ao já combalido sistema de proteção social brasileiro. Sim, porque tal concepção, uma vez legitimada, justificará toda sorte de atentados contra a proteção social pública, produzindo as seguintes consequências: dará margem ao domínio do mercado e da espontaneísta iniciativa privada no processo de provisão de bens e serviços básicos à população, acompanhado do rechaço aos direitos sociais, à universalização do atendimento, ao profissionalismo, à liberdade positiva (que requer o comprometimento do Estado com a satisfação de necessidades) e ao controle democrático. (PEREIRA, 2011, p.182)”.
A provisão de mínimos sociais no Brasil assume a forma de uma resposta isolada que se dá através de programas como o bolsa família, que busca retirar o país da miséria através de um plano emergencial de controle da pobreza extrema e da marginalização dessa população que acaba refletindo diretamente na violência urbana e na vida da das classes dominantes.
Dessa forma, para a real efetivação do que prevê nossa Constituição e para que haja uma vida digna, respeitando-se o princípio da dignidade da pessoa humana, fica claro que o BPC deve ser estendido aos estrangeiros residentes no país.
Informações Sobre o Autor
Patricia Moraes Bicca
Advogada formada em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande-FURG