Resumo: O Código de Processo Civil brasileiro vem sofrendo seguidas alterações para cumprir o seu principal papel: concretizar o direito material. Não é à toa que alguns se referem ao aludido código como “lei adjetiva civil”, pois para que serviria algo adjetivo se não para seguir o principal? Portanto, aquele deve ser adaptado de forma a assegurar a materialização mais eficaz deste. Assim, o processo para ser efetivo deve entregar a posição jurídica de vantagem a quem de direito na relação processual em um tempo razoável, de modo a garantir o exercício do contraditório pelas partes e manter a credibilidade do Estado em relação aos seus jurisdicionados. Em suma: o processo deve ter uma duração razoável. Seguindo nesta esteira, diversas leis foram editadas nos últimos dois anos com o objetivo de dar uma maior celeridade ao processo, visando atender a, agora, garantia constitucional a uma duração razoável do processo estabelecida pela Emenda Constitucional 45/2004. Dentre as diversas leis editadas, ressalta-se a 11.232/05, de 22 de dezembro de 2005, que unificou os processos de conhecimento e de execução em um só processo sincrético de fases cognitiva e executiva. Esta alteração, segundo as exposições de motivos do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP, elaborador do anteprojeto da lei, buscou garantir efetivamente o direito no mundo real das partes de forma mais célere em um único processo, malgrado seja mais técnico, no plano teórico, ter dois processos distintos para pretensões distintas: uma de ter reconhecido o direito e a outra de efetivar o direito reconhecido. Assim, para chegar-se à unificação acima vislumbrada, a lei alterou o conceito de sentença para prolongar a atuação do juiz – não encerrando mais a sua jurisdição. Desta forma, com base nas alterações perpetradas pelo referido diploma legal, abre-se a possibilidade do cabimento de uma sentença parcial de mérito, apta a fragmentar o julgamento da causa e conceder mais rapidamente o pedido ou parte dele que não depender de dilação probatória.[1]
Palavras-Chave: reformas do CPC; efetividade e celeridade da prestação jurisdicional; atos do juiz; sentença parcial de mérito; fragmentação do julgamento da causa.
Abstract: The Code of Brazilian Civil Process is suffering following alterations to accomplish his main role: to render the material right. It is not at random that some refer to the mentioned code as “civil adjectival law”, because so that it would serve something adjective if not to follow the main? Therefore, that should be adapted from way to assure the most effective materialization of this. Like this, the process to be effective should give the juridical position of advantage to who of right in the procedural relationship in a reasonable time, in way to guarantee the exercise of the contradictory for the parts and to maintain the credibility of the State. In short: the process should have a reasonable duration. Proceeding in this mat, several laws were edited in the last two years with the objective of giving a larger velocity to the process, seeking to assist the constitutional warranty of a reasonable duration of the process established by the Constitutional Amendment 45/2004. Among the several edited laws, it is emphasized to 11.232/05, of December 22, 2005, that unified the knowledge processe and de execution processe in only one process composed of cognitive phase and executive phase. This alteration, according to the exhibitions of reasons of the Brazilian Institute of Procedural Right – IBDP, maker of the project of the law, looked for to guarantee the right indeed in the real world of the parts in a swifter way in a single process, although is more technical, in the theoretical plan, the existence of two different processes for different pretensions: one of having recognized the right and to another of executing the recognized right. Like this, to arrive to the unification above glimpsed, the law altered the sentence concept to prolong the judge’s performance – not containing more his jurisdiction. This way, with base in the alterations perpetrated by the referred legal diploma, it is reasonable to talk about a partial sentence of merit, capable to fragment the judgement of the cause and to grant the request more quickly or it leaves of him that not to depend on probatory delay.
Keywords: reforms of CPC; effectiveness and velocity of the installment of the jurisdiction; the judge’s actions; partial sentence of merit; fragmentation of the judgement of the cause.
Sumário: 1. Introdução. 2. Emenda Constitucional 45 e as recentes reformas do CPC. 2.1. Emenda constitucional 45 de 08 de dezembro de 2004. 2.2. Recentes reformas do Código de Processo Civil. 3. ATOS DO JUIZ. 3.1. Análise inicial. 3.2. Dos atos do juiz. 3.2.1. Despacho. 3.2.2. Decisão interlocutória. 3.2.3. Sentença. 4. Sentenças parciais e decisões interlocutórias de mérito. 4.1. Breves considerações. 4.2. Sentenças parciais. 4.3. Decisões interlocutórias de mérito. 5. Sentença parcial de mérito. 5.1. Breves considerações. 5.2. A sentença parcial de mérito e o espírito das recentes reformas. 5.2.1. Anteprojeto de estabilização da tutela antecipada. 5.2.2. Anteprojeto do Código de Processos Coletivos. 5.3. Algumas posições doutrinárias sobre o tema. 5.4. Recurso cabível. 5.5. Efetivação da sentença parcial de mérito. 6. Conclusão. Bibliografia.
1 INTRODUÇÃO
Desde que o Estado retirou do indivíduo o poder de auto-tutela com fins de garantir o bem comum e a paz social, passou a exercer as funções administrativa, legislativa e judicante.
A administrativa consiste na gestão da máquina pública, com a prestação de serviços públicos e o controle de pessoal. A legislativa, por sua vez, se consubstancia no regramento de conduta por meio de normas abstratas e genéricas aplicadas a todos. Por fim, a judicante é caracterizada com o exercício da jurisdição, quando a defesa dos interesses particulares é garantida através de uma suscitação ao Estado, o único com o poder de dizer o Direito.
Analisando-se todas essas funções, é possível se extrair que a administração e a deliberação são exercidas, em regra, sem necessidade de provocação do poder público. Entretanto, à mesma conclusão não se pode chegar em relação à jurisdição, visto que esta nada mais é do que uma resposta dada a um conflito de interesses.
Desta forma, para alcançar o bem comum e a paz social, almejados quando da constituição do Estado, esta resposta não deve se limitar a apenas no dizer o Direito, mas deve ser eficaz, mantendo a credibilidade do ente estatal face a quem tem o direito e desestimulando aquele que não o tem a deduzir pretensões infundadas ou a resistir a pretensões de outrem injustamente.
O poder público ao exercer a jurisdição não pode ter uma posição neutra em relação às partes, sendo apenas mero espectador, e sim agir de modo a influir no resultado rápido do conflito e assegurar uma duração razoável da via de suscitação do conflito, ou seja, do processo, garantindo, com isso, a almejada paz social.
Com base nesses ideais, o Código de Processo Civil brasileiro vem sofrendo seguidas alterações para cumprir o seu principal papel: concretizar o direito material. Não é a toa que alguns se referem ao aludido código como “lei adjetiva civil”, pois para que serviria algo adjetivo se não para seguir o principal? Portanto, aquele deve ser adaptado de forma a assegurar a materialização mais eficaz deste.
O processo para ser efetivo deve entregar a posição jurídica de vantagem a quem de direito na relação processual em um tempo razoável, de modo a garantir o exercício do contraditório pelas partes e manter a credibilidade do Estado em relação aos seus jurisdicionados. Em suma: o processo deve ter uma duração razoável.
Partindo-se desta premissa, as alterações antes mencionadas atingem diretamente a duração do processo com o fito de torna-lo efetivo. Vários são os exemplos, como as mudanças relativas aos recursos de agravo; a instituição do procedimento monitório, com influência do Código de Processo Civil italiano; a possibilidade de antecipação do julgamento feita em uma cognição sumária por meio da tutela antecipada; a criação dos juizados especiais com o escopo de abreviar o tempo de duração das causas de menor complexidade etc.
Seguindo nesta esteira, diversas leis foram editadas nos últimos dois anos com o objetivo de dar uma maior celeridade ao processo, visando atender a, agora, garantia constitucional a uma duração razoável do processo estabelecida pela Emenda Constitucional 45/2004.
Dentre as diversas leis editadas, ressalta-se a 11.232/05, de 22 de dezembro de 2005, que unificou os processos de conhecimento e de execução em um só processo sincrético de fases cognitiva e executiva. Esta alteração, segundo as exposições de motivos do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP, elaborador do anteprojeto da lei, buscou garantir efetivamente o direito no mundo real das partes de forma mais célere em um único processo, malgrado seja mais técnico no plano teórico ter dois processos distintos para pretensões distintas: uma de ter reconhecido o direito e a outra de efetivar o direito reconhecido.
O aludido diploma legal para atingir o seu mister, precisou alterar, também, o conceito de sentença que era extraído pela combinação do parágrafo 1° artigo 162, com o artigo 269 e com 463, todos Código de Processo Civil, pois, para permitir um processo com fases cognitiva e executiva, cada um com uma sentença, o conceito deste ato não poderia ser mais o modo pelo qual o juiz põe termo ao processo sob pena de ser o legislador da reforma atécnico.
Desta forma, com base nas alterações perpetradas pelo referido diploma legal, abre-se a possibilidade do cabimento de uma sentença parcial de mérito, apta a fragmentar o julgamento da causa e conceder mais rapidamente o pedido ou parte dele que não depender de dilação probatória.
Para justificar o cabimento deste tipo de sentença, será preciso, primeiro, abordar as recentes reformas da lei processual civil. Posteriormente, discorrer-se-á sobre os atos do juiz, cuja distinção conceitual entre sentença e decisão interlocutória não é ta clara, principalmente no tocante à existência de sentenças parciais e de decisões interlocutórias aptas a produzir coisa julgada. Feitas estas observações, proceder-se-á a análise da sentença parcial de mérito.
2 EMENDA CONSTITUCIONAL 45 E AS RECENTES REFORMAS DO CPC
Como se sabe, a Emenda Constitucional 45, de 08 de dezembro de 2004, foi elaborada com o objetivo de promover a reforma do judiciário.
Entretanto, esta emenda não trouxe em seu bojo apenas alterações constitucionais, mas também previu, em seu artigo 7º, que o Congresso Nacional deveria instalar, imediatamente após a sua promulgação, uma comissão mista destinada à elaboração de projetos de lei que visassem alterar a legislação federal, objetivando tornar mais amplo o acesso à justiça e mais célere a prestação jurisdicional.
2.1 Emenda constitucional 45 de 08 de dezembro de 2004
A supramencionada emenda constitucional foi apresentada à Câmara dos Deputados no ano de 1992 sob o número de PEC 96-A/1992, pelo então Deputado Federal Hélio Bicudo, e tinha por escopo a alteração da estrutura do poder judiciário.
A tramitação nas casas legislativas ocorreu de forma lenta até a ascensão do governo neoliberal à presidência da república que, por ver o judiciário como fora de contexto mundial devido à falta de rapidez e uniformidade dos pronunciamentos judiciais, o que causava insegurança no mercado para investimentos, passou a instigar mudanças para ajustar as condutas do Poder Judiciário aos interesses governamentais neoliberais.[2]
Por outro lado, em que pesem os interesses neoliberais na reforma do judiciário, não menos importantes eram as críticas feitas em relação à estrutura anterior do Judiciário. Kiyoshi Harada, já no ano de 1999, alertava que a imagem do mencionado poder era deveras maculada devido à morosidade da prestação jurisdicional, seja pela inadequação das normas processuais ou pela massificação da justiça e da estrutura do Poder Judiciário.[3] Desta forma, já era, naquela época, imperioso o enxugamento dos órgãos da máquina judiciária com vistas a atingir uma prestação jurisdicional mais eficiente.
Embora seja importante a contextualização, vale ressaltar que não se pretende neste tópico abordar todas as alterações perpetradas pela Emenda 45, sob pena de se fugir do tema proposto. A própria matéria desta reforma constitucional seria suficiente para ser abordada em um trabalho especificamente dirigido a este fim. Assim, serão explorados apenas os pontos que serviram de base para as reformas infraconstitucionais.
Inicialmente, como bem asseverado por Sérgio Bermudes, as normas constitucionais não bastam por si só para alcançar o objetivo que almejam, mas dependem da capacidade dos operadores do direito de molda-las às imposições da realidade, com fins de tirar o melhor proveito do novo quadro.[4]
Assim, a título de exemplo, não basta a Emenda Constitucional 45 acrescentar o inciso LXXVIII ao artigo 5° da Constituição da República, assegurando a todos uma duração razoável do processo, sem que os meios que garantam a celeridade de sua tramitação sejam regulados pela legislação infraconstitucional, ou seja, que possibilitem tirar o melhor proveito do novo quadro.
Em tempo, este inciso acrescentado pela reforma nada mais fez do que positivar o entendimento de Marinoni acerca do tema. O processualista paranaense já extraía que a todos deveria ser garantida uma duração razoável do processo – de modo que não prejudicasse o autor que tivesse razão – da combinação do inciso XXXV do mesmo artigo 5° [5] com o artigo 8° da Convenção Americana sobre Direitos Humanos[6] (ratificado e em vigor no Brasil).[7]
Com base nisso, toda pessoa tem o direito a ser ouvida com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, eis que a demora do processo só beneficia o réu que não tem razão e gera o descrédito no Poder Judiciário.[8]
Nesta esteira, ainda que a duração razoável do processo já estivesse implicitamente disposta na carta republicana, conforme o entendimento de Marinoni, tal disposição constitucional não tinha total efetividade em sua plenitude, seja pela mora do legislador infraconstitucional, pela deturpação das normas já existentes pelos operadores do direito ou pela inadequação da máquina judiciária, culminando na morosidade da prestação jurisdicional.
Com efeito, foi neste ínterim que a Emenda Constitucional 45 previu a instalação pelo Congresso Nacional de uma comissão mista destinada, à elaboração de projetos de lei que visassem alterar a legislação federal, objetivando tornar mais amplo o acesso à justiça e mais célere a prestação jurisdicional. E, por esta razão, foi celebrado um acordo entre os chefes de todos os poderes com vistas a garantir maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional, o que foi denominado como Pacto do Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano.
2.2 Recentes reformas do Código de Processo Civil
O Pacto do Estado em favor de um Judiciário mais rápido e republicano serviu de norte para as últimas reformas do Código de Processo Civil, prevendo em um de seus tópicos a reforma do sistema recursal e dos procedimentos por meio de regras capazes de agilizar e simplificar os julgamentos sem prejuízo das garantias individuais.
Como bem apontado por Ada Pellegrini, o objetivo das reformas foi o da celeridade, englobando a simplificação, a desformalização e a democratização do processo, com fins de alcançar o desideratum de um processo de resultados.[9]
Desta forma, a primeira lei promulgada foi a 11.187, de 19 de outubro de 2005, com fins de limitar-se o direito à esfera recursal, evitando que tal direito seja um obstáculo à prestação da tutela jurisdicional[10] com o prolongamento do tempo de duração do processo. Assim, a referida lei veio para re-regulamentar recurso de o agravo, visto que a matéria já havia sido tratada em alterações anteriores da Lei Adjetiva Civil, pelas Leis 9.139/95 e 10.351/01.[11]
A imperiosidade da alteração deste recurso manejado contra as decisões interlocutórias se deveu tamanho a sua incidência nos tribunais, ficando estes sobrecarregados e privados de julgar o mérito das demandas.
Na seqüência, veio a Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, cujo anteprojeto de lei foi elaborado pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP[12], objetivando alterar os dispositivos atinentes ao cumprimento de sentença que condena ao pagamento de quantia certa, com fins de permitir a execução da sentença na mesma relação processual cognitiva, apontando a execução como “calcanhar de Aquiles” do processo.
Antes dessa lei o bem da vida pleiteado não era alcançado após o encerramento de um longo processo de conhecimento, porque a sentença ali proferida não tinha eficácia executiva. Desta forma, caso o devedor não cumprisse voluntariamente o julgado, o autor deveria promover outro processo, agora de execução do título executivo que obtivera no processo de conhecimento, para poder exercer efetivamente o seu direito reconhecido anteriormente, cabendo novamente recursos e prolongando ainda mais o tempo processual.
Com isso, foi dado fim à dicotomia do processo de conhecimento e do processo de execução, dando lugar a um processo misto, sincrético, unindo-se a cognição à efetivação ou à execução do julgado.[13]
Outra lei modificadora foi a 11.276, de 7 de fevereiro de 2006, determinando que o juiz não receberá o recurso quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Em outros termos, instituiu a chamada súmula impeditiva de recursos (súmula vinculante), tendo por objeto garantir a efetividade no inciso LXXVIII do artigo 5° da Constituição da República, isto é, de assegurar a todos uma razoável duração do tempo processual no âmbito judicial, visto que a restrição da possibilidade recursal acelera, pelo menos em tese, a entrega da prestação jurisdicional.
Em seguida veio a Lei 11.277, de 07 de fevereiro de 2006, acrescentando o artigo 285-A ao Código de Processo Civil, estabelecendo que o juiz poderá julgar improcedente o pedido de plano e sem a citação do réu quando, em casos semelhantes, a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência.
Um ponto digno de nota nesta reforma é a previsão do parágrafo 1° do artigo 285-A que dispõe sobre a possibilidade de o magistrado exercer o juízo de retratação no caso de apelação interposta contra a decisão prevista no caput, excepcionando o previsto no artigo 463 do Código de Processo Civil[14] e fragilizando ainda mais o antigo conceito de sentença como ato pelo qual o juiz põe termo ao processo.[15]
Posteriormente, veio Lei 11.280, de 16 de fevereiro de 2006, que alterou uma variedade de artigos, tratando, por conseguinte, de diversos assuntos. Só a título de demonstração, na sua exposição de motivos diz o mencionado diploma legal que procede a alteração de dispositivos concernentes à incompetência relativa, meios eletrônicos, prescrição (alterando inclusive o artigo 194 do Código Civil), distribuição por dependência, exceção de incompetência, revelia, carta precatória e rogatória, ação rescisória e vista dos autos.
A Lei 11.341, de 07 de agosto de 2006, por sua vez, procedeu a modificação da redação do parágrafo único do artigo 541 do Código de Processo Civil a fim de permitir a prova do dissídio jurisprudencial pela citação do repositório de jurisprudência oficial ou credenciado e ainda pela reprodução de julgado disponível na internet.
Já a Lei 11.382, de 06 de dezembro de 2006, veio como uma “segunda etapa” da Lei 11.232/05, alterando os dispositivos atinentes à execução de título executivo extrajudicial, e, assim como ela, também teve o seu anteprojeto de lei elaborado pelo Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP[16].
Dentre os principais destaques, foi permitido ao oficial de justiça realizar a avaliação e a penhora numa mesma oportunidade; acabou-se com a necessidade de se garantir o juízo para o oferecimento de embargos à execução; concedeu-se ao devedor o direito de requerer o parcelamento do débito exeqüendo; deu nova disciplina aos meios executórios, cabendo agora a alienação por iniciativa particular, a adjudicação e a hasta pública.
A Lei 11.418, de 19 de dezembro de 2006, veio para regulamentar o parágrafo 3° do artigo 102 da Constituição Federal, dispondo sobre a repercussão geral que deverá ser demonstrada em preliminar do recurso extraordinário, sob pena de inadmissão liminar do recurso.
Por fim, a última lei foi a 11.441, de 04 de janeiro de 2007, que teve por escopo permitir que os casos de inventário e de partilha em que não haja testamento ou interesse de incapaz, estando os herdeiros em acordo, bem como os casos de separação e de divórcio consensual, possam correr na via administrativa, com fins de desafogar a máquina judiciária de certos procedimentos de jurisdição voluntária.
3 ATOS DO JUIZ
Como se sabe, o juiz é o órgão do Estado competente para o exercício de sua função jurisdicional, ou seja, a de dizer o direito, desde quando foi retirada do particular a possibilidade de defender os seus interesses através do exercício da autotutela.
Assim, com a adoção pelo ordenamento pátrio da teoria do órgão, como bem discorreu Celso Antonio Bandeira de Mello[17], em relação à atuação dos agentes públicos, o juiz deve ser investido pela lei de um poder jurídico para que a sua vontade, ou, no caso, o seu entendimento, seja imputado como se fosse tida pela própria pessoa jurídica estatal.
Sob esta ótica, é possível identificar o Código de Processo Civil como a lei que confere, no campo civil, tais poderes ao juiz, haja vista dispor, em um rol taxativo, sobre a atuação do agente do órgão jurisdicional, visando garantir uma maior segurança jurídica tanto em relação à previsibilidade dos atos do juiz, quanto aos instrumentos capazes de requerer a modificação de tais atos por órgão de instância superior.
3.1 Análise inicial
Os poderes conferidos ao juiz pela lei instrumental civil comportam várias classificações na doutrina, diferindo, basicamente, na nomenclatura. Humberto Theodoro Júnior os classifica como decisórios e não decisórios, havendo sempre nos primeiros um conteúdo de deliberação ou de comando; enquanto que nos últimos apenas função administrativa ou de polícia judicial.[18] Já Alexandre Câmara os define como administrativos e jurisdicionais, dividindo estes últimos ainda em poderes meio e poderes fim.[19]
Analisando as classificações utilizadas pelos dois doutrinadores, adota-se a elaborada pelo jurista mineiro, apenas por ser mais pragmática. Assim, com base na classificação adotada, dentre os poderes do juiz, identificamos os não decisórios, ou seja, que não influem no deslinde da questão litigiosa, tais como o ato de presidir a audiência, de disciplinar o funcionamento do cartório da vara onde atua etc, fazendo com que a doutrina os entenda como atos administrativos do processo.[20]
Tal visão dos poderes não decisórios do juiz se aproxima da concepção do direito liberal clássico – a qual defendia que o Estado não deveria intervir na esfera dos particulares – de um juiz inerte, neutro que não interfere no processo.[21] Desta forma, tais poderes limitar-se-iam à ordem do processo.
Os poderes decisórios, sob um outro giro, também foram atingidos pela teoria liberal supramencionada, não sendo utilizados, inicialmente, para que os juízes interviessem no processo, mas apenas para que estes aplicassem a lei ao caso concreto. Porém, com o tempo, a tese de neutralidade do juiz foi derrubada, pois, como bem criticou Marinoni, não é possível ter “um juiz despido de vontade consciente e que este não deve se importar com o resultado da instrução (…) como se a busca do material adequado para sua decisão fosse problema exclusivo das partes”.[22]
Destarte, com o abandono da tese do direito liberal clássico, entendeu-se que o interesse público na realização da justiça sobrepõe-se ao interesse das partes, devendo o agente público responsável pela função jurisdicional influir no resultado rápido e justo do processo a fim de garantir a segurança jurídica. Desta maneira, modernamente, os atos decisórios conferidos por lei ao juiz são o modo pelo qual deve influir no processo.
Tais atos, seguindo a linha de Theodoro Júnior, se dividiriam, ainda, em decisórios propriamente ditos e executivos.[23] Os primeiros serviriam à fase cognitiva do processo, quando do dizer do direito, enquanto que os últimos à fase executiva, quando da efetivação da entrega do bem da vida à parte que tem razão. Para melhor explorar o tema proposto, discorrer-se-á apenas sobre os atos decisórios propriamente ditos, pois, como está disposto topograficamente na Lei Adjetiva Civil, os atos processuais são o Título IV do Livro I que dispõe justamente sobre o processo de conhecimento ou sobre a fase cognitiva – terminologia usada para alinhar-se à reforma feita pela Lei 11.232/05.
Com isso, elenca o Código de Processo Civil, em seu artigo 162, a classificação dos atos do juiz, sendo eles os despachos, as decisões interlocutórias e as sentenças.
3.2 Dos atos do juiz
3.2.1 Despacho
O despacho é um ato decisório residual do juiz, ou seja, tudo aquilo que não for sentença ou decisão interlocutória. A própria lei assim o identifica quando prevê, no §3º antes mencionado artigo 162, que “os despachos são todos os demais atos praticados pelo juiz no processo, de ofício ou a requerimento da parte, a cujo respeito a lei não estabelece outra forma”.
Como aponta Ovídio Baptista, “os despachos são provimentos judiciais de simples impulso processual, por meio dos quais o juiz provê a respeito do andamento do feito”.[24] Já Misael Montenegro Filho o entende “como o pronunciamento que nem põe termo ao processo nem impõe qualquer prejuízo a uma das partes do embate judicial, apenas tratando de garantir a marcha processual sem qualquer apreciação – superficial ou total – do mérito”.[25]
Porém, é imperioso ressalvar nestes argumentos o tema sobre o despacho saneador, que, apesar da nomenclatura, tem natureza de decisão interlocutória, haja vista analisar, ainda que superficialmente, a presença das condições da ação e dos pressupostos processuais.
Por estas razões, Moacyr Amaral entende o despacho saneador como decisão interlocutória por resolver uma questão processual.[26] Neste mesmo sentido, Ovídio Baptista entende tal despacho como a mais importante decisão interlocutória.[27] Já Carreira Alvim, por sua vez, prefere a classificação em despachos de mero expediente e despachos interlocutórios, alocando, dentre estes últimos, o despacho de rejeição de extinção do processo (de natureza saneadora).[28]
3.2.2 Decisão interlocutória
A decisão interlocutória, por sua vez, é o ato pelo qual o juiz resolve uma questão incidente no processo, como claramente disposto na lei, distinguindo-se dos despachos porque elas são, em regra, capazes provocar algum gravame às partes[29]; e, por outro lado, das sentenças porque a solução da aludida questão incidente não leva ao encerramento do feito.[30] Entretanto, como será demonstrado mais adiante, esta última distinção torna-se tênue com a decisão interlocutória prevista no parágrafo 6° do artigo 273 do Código de Processo Civil.
Ademais, faz-se mister ressaltar que a tutela jurisdicional provisória – necessária para que o Estado cumpra o compromisso assumido de não apenas reparar lesão que alguém tenha sofrido no seu direito (tutela reparatória ou sancionatória), mas também de evitar que tal lesão venha a ocorrer (tutela preventiva)[31] – é prestada por meio de decisões interlocutórias, eis que a adoção de medidas acautelatórias[32] nada mais é do que uma questão incidente resolvida no processo. Entretanto, tal incidente não se limita a uma questão meramente processual[33], como, por exemplo, o indeferimento de produção de uma determinada prova, mas atinge o mérito porquanto se presta a antecipar o gozo do direito vindicado ou garantir uma futura execução.[34]
Desta forma, segundo Montenegro Filho, dependendo de sua função no processo, a tutela provisória pode ser de duas espécies: a medida cautelar e a tutela antecipada e, se qualificam a desatar alguma questão incidente sem encerrar o processo.[35]
A medida cautelar é utilizada para assegurar o objeto principal da lide, visando melhor aparelhar o processo a fim de cumprir seus objetivos.[36] Tal decisão interlocutória pode ser requerida pela parte tão logo seja necessária uma medida acauteladora do objeto principal, podendo, inclusive, ser deferida pelo juiz sem a audiência das partes, como disciplinado no artigo 798 do Código de Processo Civil.
Como bem observou Zavascki, na medida cautelar o resultado prático não guarda relação de pertinência com a satisfação do direito e sim com a sua garantia, e sua duração será limitada no tempo, não sendo sucedida por outra de mesmo conteúdo ou natureza (isto é, por outra medida de garantia), razão pela qual a situação fática por ela criada será necessariamente desfeita ao término de sua vigência.[37]
Já a tutela antecipada é aquela que antecipa “a eficácia que a futura sentença poderá produzir no campo da realidade dos fatos”[38], com base em prova inequívoca colacionada aos autos, visando uma melhor distribuição do tempo processual entre as partes litigantes. Seguindo os ensinamentos de Zavascki:
“… a medida antecipatória tem lugar quando urgente é a própria satisfação do direito afirmado (…), havendo, em sentido lato, execução antecipada como um meio para evitar que o direito pereça ou sofra dano (execução de segurança) (…), e com efeitos que podem ser perpetuados no tempo, pois destinada a ser sucedida por outra de conteúdo semelhante, a sentença final de procedência, cujo advento consolidará de modo definitivo a situação fática decorrente da antecipação.”[39]
Essas duas tutelas, por serem categorias do gênero medidas urgentes[40], são fungíveis entre si, de acordo com o parágrafo 7° do artigo 273 da Lei Adjetiva Civil e com a interpretação feita Dinamarco. O referido dispositivo legal preceitua que pode o juiz conceder um provimento antecipado quando houver pedido de natureza cautelar. Já o doutrinador, ao defender a possibilidade de concessão de medida cautelar quando pleiteado um provimento antecipado, assim argumenta:
“O novo texto não deve ser lido somente como portador da autorização a conceder uma medida cautelar quando pedida a antecipação de tutela. Também o contrário está autorizado, isto é: também quando feito um pedido a título de medida cautelar, o juiz estará autorizado a conceder a medida a título de antecipação de tutela, se esse for seu entendimento e os pressupostos estiverem satisfeitos. Não há fungibilidade em uma só mão de direção. Em direito, se os bens são fungíveis isso significa que tanto se pode substituir um por outro, como outro por um”.[41]
3.2.3 Sentença
A sentença, por fim, segundo a redação dada pela lei 11.232/05 ao §1º do artigo 162, é o ato pelo qual o juiz decide na forma dos artigos 267 e 269, resolvendo ou não o mérito. Esta nova definição fez com que a sentença deixasse de ser o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, com vistas a permitir a reunião dos processos de conhecimento e de execução em um processo sincrético de fases cognitiva e executiva.[42]
Este é o principal ato decisório do juiz e, por esta razão, o mais complexo. Deve ser analisado quanto à espécie, à estrutura, aos vícios e de acordo com a ação de que provém.[43]
São duas as espécies de sentença: a terminativa e a definitiva. Para melhor compreendê-las, é importante lembrar primeiro que o autor, ao deduzir em juízo uma pretensão resistida, buscando uma posição jurídica de vantagem, formula dois requerimentos: o primeiro é o de receber um provimento jurisdicional, já o segundo é de receber o bem da vida perquirido judicialmente. Com isso, a satisfação deste caberá ao réu se ela não decorrer da própria natureza da sentença (como nos casos de sentença declaratória ou sentença constitutiva), enquanto a satisfação daquele – caso haja direito ao julgamento de mérito – cabe ao Estado-Juiz.[44]
Concluindo o magistrado que não há direito ao julgamento do mérito da causa, rejeitando então a primeira das pretensões, seu pronunciamento acaba aí: extingue o processo sem resolução de mérito, sem afirmar ou negar se o autor tem direito ao bem da vida que pretende. Por outro lado, acolhendo esta primeira pretensão (ao julgamento do mérito), passará então a julgar o mérito da causa, seja pela procedência, seja pela improcedência do pedido. Essas são as linhas da teoria da pretensão bifronte propostas em sede doutrinária por Dinamarco.[45]
Desta forma, tem-se a sentença terminativa, disposta no artigo 267, que não aprecia a relação material, ou seja, não resolve o mérito. Neste sentido, ressalta Fux:
“… frustrada a análise do mérito pela existência de impedimentos processuais como a falta das condições da ação ou dos pressupostos processuais, a sentença será meramente formal, denunciadora de patologia processual, gerando um pronunciamento meramente terminativo. Diz-se ‘terminativa’ a sentença, porquanto o processo termina, mas não resolve o litígio entre as partes, na medida em que a questão de fundo resta sem solução”.[46]
Neste caso, opera-se, em regra, apenas a coisa julgada formal, e, na visão de Misael Montenegro, não se permite “a rediscussão dos elementos da ação no bojo da relação processual finda, sem se afastar, contudo, a possibilidade de esses elementos serem agitados em outra demanda judicial”.[47]
A sentença definitiva, por sua vez, é aquela em que há o enfretamento do pedido formulado pelo autor[48], operando-se a coisa julgada material, cuja definição dada por Moacyr Amaral revela que:
“O comando emergente da sentença se reflete fora do processo em que foi proferida, pela imutabilidade de seus efeitos. A vontade da lei, que se contém no comando emergente da sentença, e que corresponde à expressão da vontade do Estado de regular concreta e definitivamente o caso decidido, tornou-se indiscutível, imutável, no mesmo ou em outro processo. O comando emergente da sentença, tornado imutável, adquire autoridade de coisa julgada a impedir que a relação de direito material decidida, entre as mesmas partes, seja reexaminada e decidida, no mesmo processo ou em outro processo, pelo mesmo ou outro juiz ou tribunal”.[49]
Faz-se mister ressaltar que há exceção quanto à produção de coisa julgada material na sentença definitiva, ocorrendo nos casos em o pedido for julgado improcedente por falta de provas na Ação Civil Pública, na Ação Popular e na Ação Coletiva de defesa do consumidor, quando se produzirá apenas coisa julgada formal por força do disposto no artigo 16 da Lei 7347/85, do artigo 19 da Lei 4.717/65, e do inciso I do artigo 103 do Código de Defesa do Consumidor, respectivamente.
Dentro desta análise de sentença quanto a sua espécie, Dinamarco faz algumas observações quanto o tipo de coisa julgada que se opera, analisando-se as falsas carências de ação e as falsas ilegitimidades ad causam.[50]
As primeiras dizem respeito ao julgamento do processo sem resolução de mérito com base na ausência de supostas condições da ação, proferindo-se uma sentença terminativa, quando, segundo defendido por Dinamarco, deveria ser proferida uma definitiva. Um exemplo citado pelo doutrinador é a falta de direito líquido e certo quando da impetração do mandado de segurança, devendo ser entendida como falta de prova dos fatos alegados pelo impetrante e culminar na improcedência da demanda e não a sua inadmissibilidade.[51]
As segundas também são caracterizadas pela prolação de sentença terminativa no lugar de uma definitiva, mas embasando-se em uma suposta ilegitimidade da parte. Dinamarco exemplifica com o caso de uma ação movida em face de dono de veículo que consta nos registros oficiais, mas que comprova que o havia vendido antes. Nestes termos, para o doutrinador, o dono tem a obrigação de indenizar pelos fatos da coisa, mas o não-dono não, sendo o ex-dono um não-dono.[52]
Já Leonardo Greco[53], por sua vez, com base da teoria da asserção (in statu assertionis), rebate essas duas observações feitas por Dinamarco, argumentando que as condições da ação e a legitimidade devem ser entendidas como presentes pela própria afirmação do autor no momento da propositura da demanda, pois o seu direito à tutela jurisdicional é incondicionado. Desta forma, a análise das condições da ação e da legitimidade são “juízo sobre as questões de direito material, mas não de mérito, que parte da situação fática concreta relatada pelo autor para fundamentar a sua pretensão e do qual decorre, em caso positivo, a mera admissibilidade do julgamento do direito material”.[54]
Todavia, apesar de defender a aferição das condições da ação a partir da asserção, Greco ressalva que tal análise não deve ser absoluta, porque, se a demanda for totalmente infundada, o autor pode ser julgado carecedor da ação “para não submeter o réu ao ilegal constrangimento de ter de defender-se e de perder o pleno gozo do seu direito decorrente da litigiosidade, sem uma causalidade adequada”.[55]
A sentença pode, ainda, ser classificada de acordo com a ação de que provém. Porém, tal classificação comporta duas correntes. A primeira adota a teoria quinária[56], a qual identifica a existência de sentenças declaratórias, constitutivas e condenatórias, mandamentais e executivas. Já a segunda corrente adota a teoria ternária[57] que reconhece apenas a existência das três primeiras apontadas pela primeira teoria, estando as duas últimas dentro do conceito da sentença condenatória.
A sentença declaratória elimina um estado de incerteza, só produzindo, após o seu trânsito em julgado, efeitos que retroagem à data da propositura da ação.[58] Nesta sentença, o bem da vida é alcançado sem a necessidade de execução[59] da parte declaratória, cabendo somente da parte condenatória como, por exemplo, a condenação em custas e honorários.
Com base nessas considerações, é possível afirmar que toda a sentença de improcedência será declaratória[60], pois elide um estado de incerteza levantado pelo autor, tendo ela também efeitos retroativos.
Já a sentença constitutiva é aquela que cria, modifica ou extingue a relação jurídica[61], só gerando, em regra, após o trânsito em julgado, efeitos que não retroagem à data da propositura da ação. Assim como ocorre na sentença declaratória, na parte constitutiva da sentença o bem da vida é entregue sem necessidade de execução.[62]
Como bem observou Moacyr Amaral Santos, em alguns casos previstos em lei, pode a sentença constitutiva ter efeitos retroativos, como aquelas que anulam o ato jurídico por incapacidade relativa do agente, ou por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Tais sentenças podem, ainda, ter efeitos especiais, como a de interdição que produz efeitos ex nunc a partir da sentença, mesmo que não tenha ocorrido o trânsito em julgado.[63]
A sentença condenatória, por sua vez, nas palavras de Carreira Alvim, é aquela que “impõe ao réu o cumprimento de uma obrigação, ou seja, condena o réu a uma prestação”.[64] Por esta razão, o bem da vida só será alcançado se houver execução, pois parando o processo na fase cognitiva, esta sentença terá característica de declaratória.[65]
Neste caso, os efeitos podem ser produzidos antes do trânsito em julgado com a promoção de uma execução fundada em decisão provisória, conforme denominação de Marinoni.[66]
Outrossim, a sentença mandamental é aquela que prevê um mandamento dirigido ao réu para que este cumpra o determinado na decisão. Com efeito, a coerção é focada para vontade do réu e não para o resultado. Luiz Fux, ainda que se adira à teoria ternária, bem salientou que:
“São as sentenças mandamentais que, ante o seu descumprimento, acenam ao destinatário com o delito de desobediência, criminalizando o comportamento omissivo diante da ordem judicial, sem prejuízo dos meios de coerção que a acompanham para fins de atingimento daquilo que a decisão judicial ordena. Assim, são as sentenças emergentes das ações mandamentais como o mandado de segurança, as cautelares constritivas de bens e restritivas de direitos, bem como as decisões de antecipação de tutela com as características pertencentes da restrição e constrição”.[67]
Importante asseverar a diferenciação entre as espécies de sentença feita por Pontes de Miranda, apontando o nobre jurista que:
“Na ação mandamental pede-se que o juiz mande, não só declare (pensamento puro, enunciado de existência), nem que condene (enunciado de fato e valor); tampouco se espera que o juiz por tal maneira fusione o seu pensamento e o seu ato que dessa fusão nasça a eficácia constitutiva (…) No mandado, o ato é o ato que só o juiz pode praticar, por sua estatilidade.”[68]
Por fim, a sentença executiva consiste na sub-rogação do Estado-juiz para a conduta do réu, quando este não der cumprimento ao julgado voluntariamente. Na visão de Pontes de Miranda, executivas são aquelas sentenças com o fim de restituir (sentenças resitutivas) ou extrair valor (sentenças extrativas) que está no patrimônio do demandando e pô-lo patrimônio do demandante.[69] Porém, a doutrina moderna vai além da mera transferência de valores de um patrimônio para o outro, exemplificando que a sentença concessiva de despejo, a que condena o réu a emitir uma declaração de vontade, ou a que condena nas obrigações de fazer, não-fazer e entrega de coisa, terão, também, um viés de auto-executoriedade, haja vista a sua eficácia se manifestar na própria relação de conhecimento sem necessidade de processo próprio de execução.[70]
Sob um outro giro, a sentença, quanto à estrutura, possui requisitos formais elencados no artigo 458 do Código de Processo Civil, que são o relatório, a fundamentação (motivação) e o dispositivo (decisão, conclusão).
O relatório é a exposição da história relevante do processo nos dizeres de Pontes de Miranda, como bem lembram Moacyr Amaral e Carreira Alvim. O jurista mineiro ainda complementa, apontando que:
“… constitui parte da sentença onde são identificadas as partes, resumidas as pretensões de cada uma delas (o pedido do autor e a defesa do réu), ressaltando aí o juiz os incidentes surgidos no curso do processo, salientando o teor da controvérsia que será decidida.”[71]
Moacyr Amaral entende que a falta de relatório torna a sentença nula, por ser condição de sua validade, ou seja, é um requisito essencial.[72] Fux acrescenta ainda que se impõe a cassação desta sentença pela instância superior.[73]
Ovídio Baptista, por sua vez, menciona que é através dele que as partes podem aferir se o julgador examinou com a atenção os autos e a fundamentação jurídica de cada litigante.[74]
Já a fundamentação é requisito constitucional, sob pena de nulidade, previsto no inciso IX do artigo 90 da Carta Magna, sendo o momento em que o juiz externa o seu entendimento sobre o “acerto ou desacerto das teses das partes, explicitando os fundamentos de fato e de direito que lhe formaram a convicção”[75], com o objetivo de demonstrar ao vencido do que ele pode recorrer.[76] A verdade dos fatos, estabelecida como fundamento, e os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença, não fazem coisa julgada, conforme previsão dos incisos I e II do artigo 469 da lei instrumental civil.
A ausência de fundamentação, segundo Fux, também acarreta na nulidade da sentença, “posto não se admitir um salto do relatório à decisão”.[77]
Finalmente, a parte dispositiva da estrutura é a conclusão do juiz, “onde reside o comando que caracteriza a sentença como ato de vontade”[78] do órgão jurisdicional. Por esta razão, como salienta Moacyr Amaral, a sentença sem dispositivo é ato inexistente.[79] Carreira Alvim menciona que a parte dispositiva da sentença deve guardar coerência com a fundamentação, sob pena de comprometer a validade e a eficácia da sentença.[80]
Fux mais uma vez, em seus sábios ensinamentos, argumenta que “a sentença sem conclusão é uma não-sentença, uma sentença inexistente. A inexistência persiste ainda que se possa inferir a que conclusão teria chegado o juiz”.[81]
O último ponto a ser abordado acerca das sentenças é a sua classificação quanto aos seus vícios. O juiz, ao proferir a sentença, deve observar o chamado princípio da adstrição ou da congruência ao pedido das partes. Desta forma, não pode ir “além do que fora pleiteado em juízo, sob pena de eventual reconhecimento de nulidade de seu pronunciamento judicial”.[82] As situações que excepcionam este princípio são os casos de verbas vincendas não pleiteadas pelas partes no momento da propositura da demanda, de custas processuais, de juros legais, de correção monetária, dos honorários advocatícios, e da multa (em detrimento da parte vencida) por eventual litigância de má-fé, os quais o juiz poderá conceder ainda que não constem do pedido das partes.[83]
Assim, a classificação da sentença quanto aos seus vícios se dá nos casos em que há os julgamentos ultra petita, extra petita e citra petita.
O julgamento ultra petita ocorre quando o juiz “confere à parte mais do que foi por ela pleiteado”[84], tendo “eficácia reduzida no que toca à parte inoficiosa, podendo o tribunal podar o excesso e aprecia-la quanto ao mérito”.[85] Uma hipótese deste tipo de julgamento é quando há o pedido de pagamento de um mês de pensão alimentícia e a sentença condena ao pagamento de dois meses.
Extra petita será o julgamento em desacordo com o pedido autoral, “conferindo-se à parte pedido ou parcela do pedido diferente do que fora pleiteado”.[86] Um exemplo é o pedido de pagamento de aluguéis atrasados julgado procedente para despejar o inquilino.
Por derradeiro, o julgamento citra petita se dá quando o juiz profere a sentença sem analisar, ainda que implicitamente, todos os pedidos e todos argumentos das partes. Nestes casos, ressalta Fux:
“A decisão (citra petita), porque omissa, pode ser complementada por força da interposição de embargos de declaração. Entretanto, se a parte assim não proceder, não é lícito ao tribunal contemplar pedido sobre o qual a sentença tenha se omitido, porque isso equivaleria julgar a pretensão, diretamente na instância (ad quem), com violação do princípio do duplo grau de jurisdição”.[87]
4 SENTENÇAS PARCIAIS E DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS DE MÉRITO
Passadas as considerações sobre os atos do juiz, analisa-se neste capítulo algumas peculiaridades sobre dois destes atos, quais sejam a sentença e a decisão interlocutória.
4.1 Breves Considerações
Quanto à sentença, mostrar-se-á que, mesmo com a redação antiga do parágrafo 1° do artigo 162 do Código de Processo Civil antes da alteração introduzida pela Lei 11.232/05, a sentença, em alguns casos, não era o ato pelo qual o juiz punha termo ao processo, tendo este conceito legal recebido muitas críticas por parte da doutrina, como será demonstrado mais adiante.
Já em relação à decisão interlocutória, será abordada apenas a tutela antecipada, onde se demonstrará que, após a adição, pela Lei 10.444/02, do parágrafo 6° ao artigo 273 da Lei Instrumental Civil, abriu-se uma nova possibilidade de concessão de tutela que independe de prova inequívoca e de verossimilhança, ou do abuso do direito de defesa do réu, sem que esteja condicionada à possibilidade de sua reversão. A tutela antecipada, prevista no mencionado parágrafo 6°, será concedida quando um dos pedidos, ou parcela deles, se mostrar incontroverso, por meio de cognição exauriente.[88]
Por fim, discorrer-se-á sobre a possibilidade de operar coisa julgada nessas decisões interlocutórias de mérito, abordando o entendimento de que esta decisão seria, na verdade, uma sentença parcial.[89] Em relação à coisa julgada, examinar-se-ão os argumentos sobre a possibilidade de produzi-la[90], bem como a impossibilidade[91], e, ainda, sobre o entendimento de que deveria produzir-se coisa julgada, mas não produz por uma questão de política legislativa.[92]
4.2 Sentenças parciais
O conceito de sentença, anterior à Lei 11.232/05, foi objeto de diversas críticas por parte da doutrina, eis que a sentença era definida como o ato pelo qual o juiz punha termo ao processo. Entretanto, a relação processual podia ser alongada com a impugnação da sentença mediante recurso, levando a matéria para o segundo grau de jurisdição para que este se posicionasse pela ratificação do ato judicial ou pela sua reforma.[93]
Barbosa Moreira, ao analisar a antiga definição de sentença, salienta que o conceito de sentença não era baseado de acordo com o seu conteúdo, mas tão somente de acordo com a posição do artigo no Livro I, que trata do processo de conhecimento, olvidando-se dos demais livros sobre os procedimentos especiais, do processo de execução e do processo cautelar. Desta forma, o doutrinador conclui que seria mais exato “dizer que a extinção do processo de conhecimento se dava com o trânsito em julgado da sentença.[94]
Ainda nesta esteira, Fux atestava que o que se encerrava com a sentença era o procedimento de primeiro grau, pois os recursos faziam da decisão apenas uma “possibilidade de sentença”.[95]
Assim, é possível perceber que, tecnicamente, o processo não terminava com a prolação da sentença, mas tão somente encerrava a fase de primeiro grau. O que encerrava o processo, na verdade, era o esgotamento das vias impugnativas e o advento da coisa julgada formal.[96]
Ademais, a própria lei se contradizia ao prever em seu artigo 915 o procedimento especial de prestação de contas. Tal procedimento é composto por duas fases, sendo a primeira a de verificar se existe ou não o direito de exigir a prestação de contas afirmado pelo demandante; e a segunda que só se instaura se ficar acertada a existência da obrigação do demandado de prestar contas, destinando-se à verificação destas e do saldo eventualmente existente em favor de qualquer dos sujeitos da relação jurídica de direito material.[97] Assim, são proferidas sentenças sucessivas que não acarretam o termo do processo. Como bem salienta Alexandre Câmara:
“É certo que o Código de Processo Civil, em seu artigo 915, §§ 1° e 2°, denomina tal provimento de sentença. Não é menos certo, porém, que este provimento não põe termo ao ofício de julgar do magistrado (ou, para usar a linguagem do Código, não põe termo ao processo). Assim, à luz da definição de sentença contida no artigo 162, § 1°, do CPC, não se poderia considerar este ato como sentença. (…)
O exame do mérito da causa, neste feito, foi dividido em duas fases, correspondendo, a cada uma delas, uma fase do procedimento. Assim, sendo, o pronunciamento judicial que encerra a primeira fase contém a decisão da primeira questão de mérito e funciona como chave de abertura da segunda fase do procedimento. Tem-se, pois, uma cisão do julgamento do mérito.(…)
O que se tem, repita-se, é uma cisão do julgamento do mérito, o que nos leva a considerar que, em verdade, o que se tem na hipótese é provimento que deve ser considerado como ‘sentença parcial’.”[98]
Para Ovídio Baptista, a fase destinada a declarar se o autor tem o direito de exigir contas é objeto de uma sentença incidental de mérito, de natureza declaratório-condenatória.[99] Assim, o mérito é fracionado para ser tratado por meio de duas sentenças condenatórias.[100] O processualista atenta para o fato de que, ainda que sejam sucessivas as sentenças, as fases da ação de prestação de contas não podem ser consideradas como ações autônomas, pois como define o doutrinador:
“A circunstância de ser condição para que se inicie o procedimento da segunda fase, a ocorrência do trânsito em julgado da sentença proferida a respeito da questão prévia, não permite afirmar que a fase preliminar – destinada a decidir se o demandado está ou não obrigado a prestar contas – seja uma ação autônoma. Se ela o fosse, certamente não seria uma ação de prestação de contas, mas apenas uma ação de pura declaração sobre o dever de prestá-las.”[101]
Outrossim, o artigo 285-A, acrescentado pela Lei 11.277/06, mitigou mais ainda o conceito de sentença como ato que encerra o processo. Este artigo prevê o julgamento antecipado nas demandas de massa, quando a matéria se tratar exclusivamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência. Assim, tal hipótese de julgamento superantecipado da lide[102] também excepciona o princípio da inalterabilidade da sentença previsto no artigo 463 da lei de ritos[103], haja vista ser prevista, no parágrafo 1° do artigo 285-A, a faculdade do juiz, em caso de apelação, de não manter sentença e determinar o prosseguimento da ação nos casos do caput do mesmo dispositivo.
Por fim, no direito alemão, Luiz Rodrigues Wambier, aponta, ao estudar a liquidação de sentença, uma sentença similar à parcial de mérito ora comentada, definindo-a como uma “sentença interlocutória”, haja vista o procedimento de liquidação se dividir em dois momentos, determinando-se, no primeiro, o fundamento do pedido e, no segundo, fixando-se o seu aspecto quantitativo. O jurista, ao discorrer sobre o código alemão com base na doutrina de Leo Rosenberg, assim discorreu:
“… o provimento definitivo só acontecerá depois que já se tiver fixado o quantum da obrigação. (…)
O que pode ocorrer, com base no permissivo legal constante do § 340 da ZPO, é que o procedimento se desdobre em dois momentos consecutivos, um relativo à determinação do fundamento do pedido e outro concernente à fixação do seu aspecto quantitativo. Segundo esse dispositivo, sempre que a ação contenha discussão quanto ao fundamento e o valor do pedido, o juiz poderá se pronunciar primeiramente a respeito do fundamento.
Nessa hipótese, há uma primeira decisão, que se pode denominar sentença incidental, ou sentença interlocutória, e que se torna definitiva quanto ao fundamento do pedido.
Regra geral, tais sentenças interlocutórias se limitam a resolver questões incidentais de natureza processual, de modo que, no dizer de Leo Rosenberg, preparam e facilitam a sentença definitiva. Nesses casos do § 304, todavia, as sentenças interlocutórias como que assumem características diferenciadas e especiais, pois efetivamente decidem o fundamento do pedido”.[104]
Tal definição de sentença interlocutória também encontra guarida na doutrina italiana de Alfredo Rocco, defendendo o processualista que “quando o magistrado decide um único ponto do mérito, que está maduro para decisão, tem-se uma sentença interlocutória de mérito; esta sentença no direito comum se chamava interlocutiones vim definitivam habentes”.[105]
4.3 Decisões interlocutórias de mérito
As chamadas decisões interlocutórias de mérito são proferidas por meio de tutela antecipada concedida quando um ou mais pedidos cumulados, ou parcela deles, se mostrar incontroverso, conforme disciplinado no parágrafo 6° do artigo 273 do Código de Processo Civil.
Esta modalidade de antecipação de tutela foi acrescentada pela Lei 10.444/02 com fundamentos na doutrina de Marinoni. O processualista já apontava a necessidade de uma tutela antecipada fundada na incontrovérsia parcial da demanda, além das que eram fundadas na situação de urgência (antecipação assecuratória), com base no inciso I do artigo 273, e no abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (antecipação punitiva), com base no inciso II do referido dispositivo.[106]
Com efeito, segundo o jurista paranaense, não haveria razão para prolongar a efetivação da parte incontroversa do direito até o fim da instrução da parte controversa, visto que, sendo assim, haveria a imposição irracional do ônus do tempo processual ao autor que tem razão, agravando o dano marginal causado pelo processo.[107]
Entretanto, deve-se atentar para o fato de que não precisa haver a cumulação de pedidos para que seja concedida a tutela antecipada com base no referido dispositivo. Diversamente do que já fora defendido por Tucci[108], não só apenas a simultaneidade ou multiplicidade de pretensões daria azo à antecipação da parte incontroversa, mas também o pedido único que, por sua natureza, pode ser decomponível.[109]
Zavascki salienta que tal interpretação literal reduziria indevidamente a virtualidade do que fora pretendido pelo legislador com a reforma, sendo perfeitamente possível a concessão da tutela do parágrafo 6° do artigo 273 sobre parcela de um pedido único que seja jurídica e materialmente suscetível de divisão.[110]
A leitura do parágrafo 6°, segundo Dinamarco, deve ser de modo a garantir a sua máxima efetividade, estando coerente com “os pilares sistemáticos do processo civil de resultados”[111], pois a “existência de pedidos cumulados pelo autor é apenas uma das hipóteses em que, a teor do que está na lei, se admite parcial antecipação de tutela”.[112]
Pois bem. Visto que a tutela antecipada concedida em relação à parte incontroversa da demanda pode ser deferida não somente no caso de pedidos cumulados como também no caso de pedido único, que seja em sua natureza divisível ou decomponível, resta determinar o campo de incidência desta tutela discorrendo sobre o que se entende por incontrovérsia.
Como exposto no capítulo anterior, o Estado exerce a sua função jurisdicional de dizer o direito a partir do momento em que tirou do indivíduo o poder de autotutela na defesa de seus interesses. Entretanto, como se extrai dos argumentos de Rogéria Dotti Doria, o Estado por ter chamado para si o poder decisório, deve, por isso, refletir, investigar e examinar as provas para proferir o julgamento.[113]
Desta forma, a análise dos fundamentos jurídicos deduzidos pelas partes do processo, bem como das provas que porventura vierem a ser produzidas, acarreta em uma maior duração do processo para a decisão da controvérsia posta em juízo.
Sobre o momento da instauração da controvérsia, Dinamarco, com arrimo na doutrina de Carnelutti, discorreu desta maneira:
“Ponto é fundamento. Cada afirmação contida na petição inicial é um ponto. Quando um ponto das alegações de uma parte é contrariado pelo adversário, esse ponto deixa de ser pacífico, tornando-se controvertido e assim erigindo-se em questão – donde se vê que a questão é sempre gerada pela controvérsia lançada por uma das partes ao negar o que a outra afirmara.”[114]
Com base nesses esclarecimentos, o doutrinador paulista conclui que quando o fato afirmado pelo autor for negado pelo réu a controvérsia gera uma questão de fato. Por outro lado, caso não haja tal negação, não haverá também questão alguma a respeito e o ponto, por ser pacífico, será presumido verdadeiro, sendo, por esta razão, incontroverso.[115]
Sob um outro giro, Teori Albino Zavascki[116], cujo entendimento foi seguido por Athos de Gusmão Carneiro[117], acrescenta que para haver incontrovérsia não basta que o réu não impugne os pontos levantados pelo autor, mas que o juiz se convença de que o alegado é verossímil, eis que o magistrado é o terceiro figurante da relação processual.
O jurista exemplifica citando o caso de não haver controvérsia sobre um determinado pedido, mas mesmo assim o juiz entender que tal pedido é manifestamente descabido.[118]
Zavascki ressalva também que o pedido pode ser incontroverso ainda que haja contestação, mas quando os fundamentos desta sejam evidentemente descabidos ou improcedentes. Tal avaliação deve ser feita pelo juiz sob o pálio de critérios estipulados no próprio ordenamento jurídico, não devendo ser consideradas como sérias, por exemplo, as contestações contra um fato notório ou que goze de presunção legal, e, podendo de igual maneira ser consideradas, quando contrárias ao entendimento dominante das decisões proferidas por tribunais superiores.[119]
Marinoni e Doria também concordam que a concessão da tutela antecipada pode ser pautada quando a incontrovérsia advier de uma ausência de ataque do réu às teses formuladas pelo autor, mas que esta não é a única hipótese.
Com efeito, Marinoni defende que se o réu se limitar a alegar um fato extintivo, modificativo ou impeditivo reconhecerá, em regra, a existência dos fatos constitutivos, não sendo a sua exceção substancial indireta capaz de gerar uma questão controvertida.[120] Tal exceção será provavelmente infundada, indicando a probabilidade do direito do autor (fumus boni iuris) e a probabilidade de insucesso do réu[121]. Para tanto, há de se considerar a contestação em seu aspecto global verificando-se se o fato foi aceito como verdadeiro, e, por isso, deve ser entendido como incontroverso..[122]
Doria, por sua vez, lembra que o artigo 302 do Código de Processo Civil determina a manifestação precisa do réu sobre os fatos narrados na inicial, sob pena de presumirem-se verdadeiros.[123] Com base neste dispositivo é que o juiz fixa os pontos controvertidos para a posterior apreciação no julgamento, e, não havendo discussão entre as partes a respeito de um fato ou de uma parte do pedido, deve ser concedida a tutela antecipada da parte que afigura-se como incontroversa.
Estes dois últimos juristas aventam, ainda, que, assim como os casos de não impugnação precisa dos fatos alegados na inicial, o reconhecimento parcial do pedido pelo réu também ensejaria a concessão da tutela prevista no parágrafo 6° do artigo 273, haja vista não existir controvérsia quanto à parte reconhecida.[124]
Outro ponto a ser explorado, em relação ao tema, é o próprio cabimento da tutela prevista no dispositivo antes mencionado, de forma tal a tentar responder seguinte pergunta: qual foi a ratio do legislador ao acrescentar mais uma hipótese de concessão de tutela antecipada através da alteração do Código de Processo Civil pela Lei 10.444/02?
A resposta, ao contrário do que possa parecer inicialmente, é bem simples. Em poucas palavras, o objetivo foi aproximar o direito processual do direito material[125], eis aquele é o instrumento de realização da justiça tendente à pacificação dos conflitos sociais por meio da efetivação prática deste.[126] Assim, antes da aludida reforma, havia a situação absurda de o réu reconhecer ou deixar de contestar um dos pedidos ou parcela deles e o autor ser obrigado a esperar até o final da instrução de todo o processo para poder gozar de uma posição jurídica de vantagem que não era controvertida desde o começo da demanda. Como bem salientou Doria, neste caso, faltava aos processualistas a objetividade e a simplicidade dos leigos, os quais jamais perdem de vista o campo do direito material.[127]
Entretanto, as críticas não se limitam à questão prática. Dinamarco aponta que o juiz já estava autorizado a antecipar o próprio julgamento da causa, com base no inciso I do artigo 330, se a incontrovérsia abrangesse todos os fatos relevantes.[128] Ora, com mais razão poderia antecipar a parte não controvertida, pelo adágio de quem pode mais, pode menos. No primeiro caso, o processo seria encerrado com a prolação da sentença; enquanto que, no segundo, conceder-se-ia a tutela antecipada do parágrafo 6° do artigo 273, prosseguindo a instrução da parte controvertida.
Como bem salienta Marinoni, a tutela antecipada, em geral, é utilizada para melhor distribuir o tempo do processo entre autor e réu, sendo ele suportado pela parte que necessita da instrução da causa.[129] Assim, estando provados os fatos constitutivos como determina o artigo 333, cabe ao réu suportar o ônus do processo com a concessão de tutela antecipada em favor do autor. Com base nesses argumentos, conclui o processualista que, com mais razão, deve a demora do processo correr contra réu nos casos de uma parte incontroversa da demanda, pois:
“… se o processo admite a cumulação de pedidos, mas não aceita a fragmentação do seu julgamento, ele está agravando a situação do autor que tem razão, uma vez que a definição do pedido que não requer mais instrução dilatória poderia ser feita de forma tempestiva apenas quando não houvesse cumulação. Em outras palavras: a cumulação de pedidos seria um atentado contra a tempestividade da tutela jurisdicional! (…)
Portanto, e nesta linha, a tutela antecipatória do art. 273, § 6°, é o único remédio capaz de evitar que o autor seja prejudicado, além da média usual, pelo tempo de demora do processo.[130]
A discussão sobre o cabimento desta tutela importa também a abordagem sobre a cognição em que ela é deferida. Inicialmente, vale lembrar a lição de Kazuo Watanabe sobre a possibilidade de se analisar a cognição em dois planos distintos: o vertical e o horizontal. No primeiro a cognição será sumária ou exauriente, variando de acordo com a profundidade da análise da questão pelo juiz; enquanto que no segundo a cognição será plena ou parcial, dependendo de sua extensão.[131]
A cognição no plano horizontal, segundo o processualista paulista, é medida de acordo com as questões levantadas no processo. Assim, estabelecendo-se sobre todas as questões, a cognição será horizontalmente ilimitada; ao passo que, a contrario sensu, se eliminada a cognição de toda uma área de questões, será horizontalmente limitada.[132] Exemplo de cognição limitada seria as limitações das matérias de defesa na contestação do divórcio.[133]
Já no plano vertical a cognição será medida de acordo com a limitação do conhecimento do juiz. Assim, sendo a cognição superficial ela será sumária; enquanto que se não houver limitação à perquirição do juiz, a cognição será exauriente.[134] Exemplo de cognição sumária ou superficial se dá nos casos de medidas liminares e da tutela antecipada.[135]
Desta forma, de posse destes ensinamentos, Marinoni destaca que a tutela que antecipa a parte incontroversa da demanda é concedida em cognição exauriente, eis que “garante a realização plena do contraditório de forma antecipada, não permitindo a postecipação da busca da verdade e da certeza”. A cognição sumária, em contra partida, realizada como regra nas demais tutelas antecipadas, é menos aprofundada em sentido vertical, não permitindo, com isso, ao magistrado declarar a existência ou a inexistência do direito.[136]
Por estas razões, defende o processualista de vanguarda que a tutela com base no parágrafo 6° do artigo 273 tem aptidão para produzir coisa julgada material, pois não faltam provas para a elucidação da matéria fática, havendo um juízo capaz de permitir a declaração da existência do direito, e não de mera probabilidade. Entretanto, não pode gerar coisa julgada por uma questão de política legislativa.[137]
Doria também entende a tutela da parte incontroversa da demanda como peculiar em relação às demais previstas no artigo 273. A autora sustenta que a tutela antecipada, que foi concebida inicialmente no processo civil pátrio, visou atender às medidas urgentes a serem tomadas por meio de uma cognição sumária fundada em juízo de probabilidade e que se limitasse a analisar a fumaça do bom direito, e não o próprio direito.[138]
Desta forma, por ser a tutela antecipada concedida, em regra, por cognição sumária, é também regra que ela possa ser revogada a qualquer tempo e não seja apta a produzir coisa julgada material, como disposto no parágrafo 4° do artigo 273.
Porém, a tutela concedida com base no parágrafo 6° é a exceção a essas regras, pois, como já visto, há a realização plena do contraditório e não é necessária a produção de mais nenhuma prova, sendo a tutela concedida com base no desaparecimento da controvérsia em uma cognição exauriente. Como bem ressalta Doria, a cognição será exauriente pois não há mais provas a serem produzidas e a lide, nesta parte, foi examinada em toda a sua profundidade.[139]
Dinamarco também defende que são dispensados o periculum in mora ou o fundado receio de dano irreparável o de difícil reparação, assim como não são proibidos os efeitos irreversíveis, pois, neste último caso, na antecipação com fundamento na incontrovérsia, a probabilidade de acerto é superlativamente grande. O doutrinador paulista, ainda que não admita a possibilidade de produção de coisa julgada[140], lembra dos casos de julgamento antecipado da lide em que não há nenhuma outra parcela do pedido para ser decidida depois, sendo, desta forma, todo o julgamento antecipado sem nenhuma preocupação com os riscos da irreversibilidade.[141]
Já Fredie Didier Jr. é enfático ao defender a possibilidade de produção de coisa julgada material, concordando com Marinoni que a tutela é concedida com base em cognição exauriente, e vai além: denomina que a antecipação da parte incontroversa como um “julgamento antecipado parcial” ou, ainda melhor (como ele mesmo diz), como “resolução parcial do mérito”, ainda que ocorra por meio de uma decisão interlocutória.[142]
O processualista baiano defende que a própria natureza jurídica do instituto é de resolução parcial do mérito e não de antecipação dos efeitos da tutela, apontando que sua topografia estaria errada no artigo 273, sendo, na verdade, a sua correta alocação entre os artigos 329 e 331 que tratam do julgamento antecipado da lide.[143]
O jurista entende que tal decisão, por ser definitiva, é apta a ficar imune com a coisa julgada material, haja vista desgarrar-se da parte da demanda que resta a ser julgada, ou seja, por ser uma decisão absolutamente autônoma. Para o autor, esta foi a melhor alteração legislativa operada pela reforma operada pela Lei 10.444/02, que somente atingirá os almejados resultados se for reconhecido o erro topográfico e se o instituto for aplicado com a finalidade de fracionar a resolução do mérito.[144]
Didier Jr., desta forma, mais a frente, conclui:
“Se o art. 273 prevê uma tutela antecipada atípica, genérica, inominada, bastando o preenchimento de seus requisitos, qual seria a utilidade de o legislador dizer que, quando parte do pedido é incontroversa, seria possível a antecipação de tutela? Se apenas se tratasse de uma decisão provisória, essa menção seria ociosa, pois a situação em análise enquadrar-se-ia à perfeição na hipótese de abuso do direito de defesa (inc. II) – realmente, a permanência da defesa do réu, no caso, seria manifestamente abusiva em razão da incontrovérsia.”[145]
Daniel Mitidiero, por sua vez, concorda com o posicionamento do processualista baiano sobre a capacidade de operação de coisa julgada das decisões consubstanciadas no parágrafo 6° do artigo 273, mas discorda que este ato do juiz seja uma decisão interlocutória, pois a classificação das decisões judiciais se dá pela definitividade do pronunciamento judicial, de modo que se admitam as sentenças completas e sentenças parciais.[146]
Por estas razões, o processualista gaúcho aloca a tutela antecipada concedida sobre a parte incontroversa da demanda na categoria das sentenças parciais de mérito, eis que resolve da maneira fracionada o mérito da causa.[147]
Por fim, Athos de Gusmão Carneiro discorda da possibilidade da produção de coisa julgada material nos casos da tutela em comento porque, neste caso, há um provimento judicial sobre apenas uma parte do mérito, mas sem a capacidade de pôr termo ao processo.[148] Assim, o processualista argumenta:
“Melhor, portanto, a nosso sentir, manter o antigo e prestigiado princípio da unidade da sentença, cujo rompimento demandaria norma induvidosa. (…)
… entendemos que a melhor solução (…) será manter sob o caráter de antecipação propriamente dita a antecipação de tutela das parcelas ou pedidos não contestados, portanto sem a formação de coisa julgada, subsistindo a possibilidade de sua alteração ou revogação na pendência da demanda. A decisão interlocutória será confirmada, ou não, na sentença a ser prolatada após o contraditório pleno.”[149]
Diante de tantas posições sobre a possibilidade de se produzir coisa julgada ou não, é imperiosa uma breve análise sobre o assunto.
Como bem leciona Liebman, a autoridade da coisa julgada não é o efeito da sentença, mas uma qualidade, um modo de ser e de manifestar-se seus efeitos, quaisquer que sejam, vários e diversos, consoante as diferentes categorias de sentenças.[150] Desta forma, a função da coisa julgada – no caso, como define o doutrinador mais adiante, da coisa julgada substancial – seria impedir todo juízo diferente que contradiga ou contraste os efeitos produzidos por uma sentença precedente.[151]
Com base nestes ensinamentos, se demonstra mais acertada a posição de Marinoni, pois, em que pese ser concedida em cognição exauriente, a tutela sobre a parte incontroversa da demanda não pode produzir coisa julgada por uma questão de política legislativa.
Como leciona Leonardo Greco[152], recebendo o apoio de Barbosa Moreira[153], o pronunciamento conclusivo da fase cognitiva do processo é elemento comum às sentenças. Por esta razão, não caberia à tutela antecipada concluir o processo, haja vista ser ela provisória, como discorrido no capítulo anterior.
Sendo assim, a tutela do parágrafo 6° do artigo 273 não só não é capaz de produzir coisa julgada, como também não se trata de um julgamento parcial como defendido por Mitidiero.
A tese de Didier Jr. sobre o erro topográfico do referido ato do juiz está correta, pois realmente tal hipótese deveria ser incluída nos casos de julgamento antecipado da lide, onde se poderia ter a coisa julgada. Mas daí concluir que, apesar do aludido erro do legislador, teria o efeito desta tutela a mesma qualidade do efeito de uma sentença vai uma distância muito grande.
Por questão de política legislativa ou de erro topográfico – não importa – a tutela acrescentada pela Lei 10.444/02 não é suscetível de imunidade pela coisa julgada. Pense-se, por exemplo, no caso de ser ela concedida e o processo, ao final, ser extinto sem resolução de mérito. Admitir-se que sobrevirá a coisa julgada da parte incontroversa nestes casos é subverter em muito o disposto no artigo 162.
Por fim, não se pode olvidar a lição de Zavascki sobre o convencimento do juiz para a concessão de tal tutela, como já mencionado antes. Sendo o magistrado um terceiro figurante da relação processual, ele não só deve ser convencido sobre a verossimilidade da parte incontroversa da demanda – como exposto claramente pelo processualista –, como também pode ser convencido do contrário posteriormente.
5 SENTENÇA PARCIAL DE MÉRITO
Abordados os temas relevantes nos capítulos anteriores, que servem de premissa para as exposições deste último capítulo, discorrer-se-á sobre o cabimento da sentença parcial de mérito após a promulgação da Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que alterou os dispositivos atinentes à sentença constantes do parágrafo 1° do artigo 162, do artigo 269 e 463 do Código de Processo Civil.
5.1 Breves considerações
Inicialmente, vale a pena definir o que se entende por sentença parcial de mérito. Ao contrário do que se possa pensar inicialmente, não se trata de provimento parcial de mérito quando o autor tem reconhecido parte de seus pedidos formulados em juízo, sendo ao mesmo tempo vencedor e vencido.
Também não se trata aqui de mera sentença parcial ou incidental, nem muito menos de uma sentença similar à sentença interlocutória de liquidação própria do ordenamento alemão, como visto no Capítulo 3 deste trabalho, mas de uma sentença apta a fracionar o julgamento da demanda.
Na verdade, a decisão interlocutória de mérito, a qual Fredie Didier Jr[154] entendia como apta a produzir coisa julgada, é que se aproxima em muito do que se pretende denominar de sentença parcial de mérito. É ali que se deitam as raízes de seu fundamento.
A produção de coisa julgada da decisão baseada no parágrafo 6° do artigo 273 da lei instrumental, pretendida pelo doutrinador baiano, não tinha a possibilidade de ocorrer justamente pelo fato de se estar diante de uma decisão interlocutória que, ainda que seja satisfativa ao antecipar os efeitos de uma futura e provável sentença de procedência, tem caráter de provisório, ou seja, pode ser revogada posteriormente pelo juiz.
Entretanto, como a sentença parcial de mérito ainda não pode ser aplicada de maneira efetiva, pois, como se verá adiante, não é regra o recebimento da apelação apenas no seu efeito devolutivo. Assim, tal sentença caberá quando nos casos em que houver parte incontroversa na demanda, com base na combinação dos artigos 273, §6º, 330, I e 162, §1º, todos do CPC. Esta parte incontroversa não será necessariamente devido à não-contestação pelo réu, mas, ainda que haja contestação, por ser prescindível de dilação probatória.
5.2 A sentença parcial de mérito e o espírito das recentes reformas
Como visto no primeiro capítulo deste trabalho, ocorreram recentemente mudanças constitucionais e infraconstitucionais com fins de agilizar a prestação jurisdicional do Estado. Assim, a Emenda Constitucional 45 veio para alterar a estrutura judiciária e determinar, através do seu artigo 7°, que fosse criada uma comissão para promover as alterações nas leis processuais, sendo, para tanto, celebrado o chamado “Pacto do Estado em favor de um judiciário mais rápido e republicano”.
Dentre as reformas procedidas no Código de Processo Civil, é possível perceber que elas possuem duas características básicas: mudar a forma de atuação dos órgãos do poder judiciário, que podem ser vistas como voltadas para dentro; e abreviar o tempo processual dos procedimentos já existentes, ou seja, voltadas para fora.
Explica-se. A Lei 11.187/05, por exemplo, se incumbiu de tornar o agravo retido como regra e o agravo de instrumento como exceção, pretendendo, logicamente, acelerar a prestação jurisdicional. Mas a que custo? Garantindo uma maior efetivação do direito material pela nova regra processual ou diminuindo o trabalho dos tribunais? Ao que parece, a segunda resposta a que se afigura mais plausível.
Não que seja tal reforma pautada em interesses escusos, pois é nobre a intenção do legislador de fazer com que os tribunais se ocupem de casos cada vez mais relevantes e prestigiem a atuação do magistrado de primeiro grau, evitando que o processo pare até o julgamento do agravo em sua forma instrumental. Entretanto, não se pode deixar de apontar que o caráter desta reforma é voltado para dentro, ou seja, para o judiciário.
A súmula impeditiva de recursos, instituída pela Lei 11.276/06 e a sentença tipo, prevista no artigo 285-A inserido pela Lei 11.277/06, são também exemplos de reformas voltadas para dentro do âmbito do judiciário, eis que visam reduzir o trabalho dos magistrados para que estes se ocupem com casos mais relevantes. Igualmente, a regulamentação do parágrafo 3° do artigo 102 da Constituição Federal, feita pela Lei 11.418/06, determinando que seja demonstrada, em preliminar, a repercussão geral do recurso extraordinário.
Por outro lado, têm-se as reformas voltadas para fora, ou seja, que garantem uma maior efetividade do direito material pleiteado em juízo. Assim, com essas características, é que se fundam as leis 11.232/05 e 11.382/06 que visam acelerar a concretização, no mundo dos fatos, da entrega do bem da vida reconhecido no mundo do direito. Não é à toa que, nas exposições de motivos de ambas as leis, reconhece-se que a execução é o “calcanhar de Aquiles” do processo civil brasileiro.
Com base nessas exposições, é perfeitamente cabível a sentença parcial de mérito após a Lei 11.232/05, pois esta lei traz uma reforma voltada para fora, visando uma maior efetividade e celeridade da prestação jurisdicional, objetivo este que pode ser alcançado com aquela sentença.
Essa lei veio por encerrar com a dicotomia do processo de conhecimento e do processo de execução, dando lugar a um processo misto, sincrético, unindo-se a cognição à efetivação ou à execução do julgado.[155] Entretanto, para que se procedesse à união dos processos em comento, fazia-se necessária a alteração de alguns dispositivos do código, de modo a permitir a coexistência das fases cognitiva e executiva no mesmo processo. E uma dessas modificações foi justamente a alteração do conceito de sentença como ato pelo qual o juiz punha termo ao processo e encerrava ali o seu ofício.
Como bem ressaltado por Humberto Dalla, a alteração do conceito de sentença teve por escopo adequar o diploma à técnica processual, dispondo que tal ato do juiz só encerra a primeira etapa do procedimento e não o ofício jurisdicional do magistrado. Na verdade, o que encerra o processo é o encerramento da fase executiva ou de cumprimento de sentença.[156]
Desta forma, as disposições sobre a sentença no código sofreram alterações nos artigos 162, § 1º, 267, 269 e 463 do Código de Processo Civil, passando ser esta decisão o ato do juiz que define uma controvérsia, superando-se, preclusivamente, determinada fase processual, diferenciando-se da decisão interlocutória pelo fato de que nesta não haveria a definitividade da prestação jurisdicional ao contrário daquela.[157]
Por estas razões, e possível alocar a sentença parcial de mérito que fragmenta o julgamento da causa como inserida no espírito das recentes reformas e, inclusive, como será demonstrado mais à frente, com as reformas que se pretende realizar.
5.2.1 O Anteprojeto de estabilização da tutela antecipada
O Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP elaborou mais um anteprojeto de lei (sendo, como já visto, também responsável pela elaboração dos anteprojetos das Leis 11.232/05 e 11.382/06) com fins de reformar o Código de Processo Civil e atender o pretendido na Emenda Constitucional 45/2004, ou seja, garantir um tempo razoável de duração do processo.
A reforma operada por esse anteprojeto[158] tem por escopo a alteração da redação dos parágrafos 4° e 5° do artigo 273 da lei instrumental civil e pelo acréscimo dos artigos 273-A, 273-B, 273-C e 273-D, visando permitir a estabilização da tutela antecipada.
Com a reforma pretendida, passa a ser permitido, primeiramente, a concessão de uma tutela antecipada antes da instauração de um processo principal, do mesmo modo que ocorre no processo cautelar, como se observa pela leitura do artigo 273-B que se intenciona acrescentar.[159]
Mais precisamente, o ponto central do referido projeto de lei, que visa a estabilização da tutela antecipada, é permitir que esta decisão interlocutória tenha força de coisa julgada. Para tanto, é preciso que a decisão esteja preclusa e que o interessado na sua reforma não aja dentro dos prazos estabelecidos nos artigos 273-B e 273-C.
No primeiro caso, que é justamente a possibilidade de se requerer uma antecipação de tutela antes de um processo principal, será facultado, no prazo de sessenta dias, após preclusa a decisão, ao réu propor demanda que vise a sentença de mérito, em caso de concessão, e ao autor propor demanda que visse à satisfação integral da pretensão, em caso de antecipação parcial. Caso os interessados não se manifestem no prazo estabelecido, determina o parágrafo 2° do artigo 273-B que a medida antecipatória terá força de coisa julgada nos limites da decisão proferida.
Já no segundo caso, quando for pleiteada a tutela antecipada no curso do processo principal, será facultado ao interessado requerer, em trinta dias após a preclusão da decisão, o prosseguimento do processo, com fins de obter o julgamento de mérito, sob pena de ter a medida antecipatória força de coisa julgada nos limites da decisão proferida, conforme disciplinado no parágrafo único do artigo 273-C.[160]
Por fim, traz o já mencionado projeto de lei no artigo 273-D[161] a possibilidade de a coisa julgada alcançada pela concessão da tutela antecipada não perder a sua eficácia ainda que o processo (principal ou não) seja extinto sem julgamento do mérito, salvo se for reconhecida a carência de ação e que tal reconhecimento seja conflitante com a decisão proferida.
Vale ressaltar por último as palavras de Ada Pellegrini, autora do anteprojeto, sobre as reformas pretendidas:
“Se o ponto definido na decisão antecipatória é o que as partes efetivamente pretendiam e deixam isso claro por meio de atitude omissiva consistente em não propor a demanda que vise à sentença de mérito (em se tratando de antecipação em procedimento antecedente) ou em não requerer o prosseguimento do processo (quando a antecipação é concedida no curso deste), tem-se por solucionado o conflito existente entre as partes, ficando coberta pela coisa julgada a decisão antecipatória, observados os seus limites”.[162]
As inovações deste projeto de lei são realmente significativas, e um ponto se aproxima da sentença parcial de mérito: o caso de a antecipação parcial no mesmo processo. Ora, se o autor consegue apenas a tutela antecipada parcial de um dos pedidos formulados ou do pedido decomponível e o interessado (autor ou réu) não der prosseguimento ao feito, a decisão terá força de coisa julgada. Isso nada mais é do que uma sentença parcial de mérito com a fragmentação do julgamento da causa.
A única diferença entre os dois institutos é que na tutela parcialmente antecipada estabilizada exigir-se-á uma inércia das partes para que se opere a coisa julgada de parte da demanda, enquanto que na sentença parcial de mérito tal coisa julgada pode ocorrer independentemente da atuação das partes, estando sujeita apenas à apreciação do juiz.
Não haveria sentido permitir uma decisão que seria uma verdadeira sentença parcial de mérito na prática pela vontade das partes e não permitir igualmente pela apreciação do juiz.
5.2.2 O anteprojeto do Código de Processos Coletivos
O anteprojeto do Código de Processos Coletivos é de lavra da professora Ada Pellegrini Grinover, elaborado após amplo debate no IBDP[163]. Não se pretende esmiuçar todos os pontos deste anteprojeto, mas alguns pontos merecem destaque.
Incorporando o espírito das recentes reformas da lei instrumental civil, o código de processos coletivos vem no afã de garantir maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional.
Desta forma, é interessante o que dispõe o artigo 3° do pretendido código, quando prevê que, para a defesa dos direitos e interesses indicados nele, são admissíveis todas as espécies de provimentos capazes de propiciar a sua adequada e efetiva tutela.
Ora, em que pese o artigo fazer menção aos direitos e interesses indicados no futuro código coletivo, é possível concluir que a sentença parcial de mérito seria um dos provimentos capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela dos direitos.
Em outro ponto importante, o projeto de código prevê, em seu artigo 14, o recebimento do recurso tão somente no efeito devolutivo, podendo o juiz, com a devida ponderação dos valores em jogo, conceder o efeito suspensivo excepcionalmente.
Assim, com base nas reformas já procedidas na legislação infraconstitucional e nas que ainda se pretende realizar, cuja intenção é otimizar a prestação jurisdicional, tem-se como perfeitamente cabível a sentença parcial de mérito que fragmenta o julgamento da causa como meio de alcançar tais objetivos.
5.3 Algumas posições doutrinárias sobre o tema
Em um outro momento, é imperioso rebater as algumas críticas feitas pela doutrina acerca da impossibilidade do cabimento da sentença parcial de mérito, bem como realçar o ponto de vista dos que a defendem.
Primeiramente, Leonardo Greco argumenta que a sentença encerra toda a fase cognitiva do processo, havendo ou não julgamento da pretensão de direito material. Posteriormente, aponta que há uma fragilidade em sua tese acerca da impossibilidade do cabimento da aludida sentença após a nova redação dada pela Lei 11.232/05 ao artigo 269 do Código de Processo Civil.
Por fim, exemplifica o seu entendimento com o caso de uma ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos, onde descaberia a marcação de “uma primeira audiência para colher as provas sobre a paternidade, decidi-la em uma sentença parcial e, em caso positivo, marcar depois disso uma nova audiência para instruir e ao final decidir o pedido de alimentos”. Assim, entende como remota a hipótese de sentença parcial, relegando-a a casos que independem de dilação probatória, como a parte incontroversa da demanda e de questões puramente de direito.[164]
Porém, com respeito ao entendimento do professor, tal exemplo não ilide o cabimento da sentença defendida neste trabalho, pois, como se verá mais adiante, houve um caso semelhante ao do referido exemplo em que foi proferia uma sentença que fragmentou o julgamento da causa. Porém, se faz necessário, primeiro, traçar algumas linhas acerca da cumulação de pedidos, que pode se dar de maneira simples, sucessiva ou alternativa.
Na cumulação simples os pedidos são formulados independentemente, podendo o juiz julgar todos improcedentes ou procedentes, ou apenas algum ou alguns procedentes.[165] Com efeito, os pedidos são absolutamente independentes entre si, ou seja, não há nenhuma ligação entre eles, sendo possível uma decisão diferente para cada demanda cumulada.[166] É o caso, por exemplo, de uma ação para a cobrança de duas dívidas, sendo uma oriunda de contrato de mútuo e a outra de contrato de compra e venda.[167]
Já a cumulação sucessiva se dá quando houver um pedido formulado em segundo plano que somente poderá ser apreciado se o primeiro for julgado procedente, sendo este prejudicial daquele.[168] Como exemplo, tem-se a ação de investigação de paternidade cumulada com a ação de petição de herança, caso em que o segundo pedido só poderá ser apreciado se o primeiro for julgado procedente.[169]
Por fim, a cumulação alternativa é justamente o oposto da cumulação sucessiva, haja vista se tratar de pedidos cumulados de tal modo que um deles é o principal e o outro “para a eventualidade de não ser possível o acolhimento do primeiro”.[170] Exemplificando, seria a hipótese de pedido para condenar o réu a uma obrigação entregar coisa e, no caso de tal condenação ser impossível, por ter a coisa perecido, a conversão em perdas e danos.[171]
Pois bem. Feitas estas breves e importantes exposições, volta-se aos argumentos de Leonardo Greco.
Os pedidos de reconhecimento da paternidade e de alimentos, seguindo o exemplo do professor, estão no processo em cumulação sucessiva, ou seja, a apreciação do segundo pedido só poderá ser efetuada com a concessão do primeiro.
Igualmente ao exemplo de Greco, houve, na prática, um caso de cumulação sucessiva de pedidos, sendo o primeiro para desconstituir uma transação judicial e o segundo cominatório para obrigação de não-fazer[172].
Tratava o processo de uma ação de um condomínio contra um dos condôminos para anular o acordo judicial celebrado entre o dois, que permitia a este estacionar dois veículos na garagem do prédio. O pedido pautava-se no fato de que o síndico anterior, que celebrara tal acordo, não teve a devida autorização da Assembléia Geral para tanto. Assim, o autor pleiteou a desconstituição da transação judicial e o pedido cominatório para que o réu se abstivesse de estacionar os seus dois veículos do modo que vinha procedendo.
O juiz de primeira instância julgou improcedentes os pedidos formulados, entendendo pela coisa julgada, eis que o síndico agiu dentre os poderes que lhe foram concedidos. O autor apresentou o recurso de apelação que teve como relator sorteado o juiz convocado Pedro Luiz Pozza.
Este magistrado entendeu que assistia razão à parte autora na parte que ela alegava que o síndico não tinha poderes específicos para celebrar a transação impugnada e, por isso, reformou a sentença nessa parte. Quanto ao pedido cominatório, entendeu que demandaria dilação probatória e, por esta razão, deveria ser apreciado pelo juízo singular.
Assim, com base nesses argumentos, fragmentou o julgamento do recurso para resolver parcialmente o mérito, afastando a coisa julgada e determinando a instrução e o julgamento somente da parte cominatória.
Em uma outra crítica digna de nota, Humberto Theodoro Júnior destaca que a nova redação do parágrafo 1° do artigo 162 do Código de Processo Civil dada pela Lei 11.232/05 perenizou a diferença entre os conceitos de sentença e de decisão interlocutória. Com efeito, o processualista mineiro ressalta que, anteriormente à reforma:
“Sentença e decisão interlocutória se diferenciavam pelo fato de que a sentença sempre solucionava uma questão que punha fim ao processo (com ou sem resolução do mérito da causa), enquanto a decisão interlocutória nunca encerrava o processo, pois apenas ‘resolvia questão incidente’ (que também poderia envolver, ou não, temas de mérito)”.[173]
Com base nestes argumentos, o doutrinador conclui que a sentença e a decisão interlocutória distinguiam-se pelos efeitos processuais produzidos, e não pelo conteúdo decisório de cada ato. Assim, o sistema recursal era bem simples: a sentença deveria ser atacada por meio de apelação e a decisão interlocutória por meio de agravo.[174]
Entretanto, com a nova redação do parágrafo 1º do artigo 162, a sentença nem sempre encerra o processo – visto que pode haver a necessidade de alguns atos judiciais mesmo depois de resolvido o mérito da causa –, passando a ser apenas um dos atos do juiz que implica algumas situações previstas no artigo 267 ou no artigo 269.
Quanto às hipóteses de extinção do processo sem resolução de mérito, com base no 267, Theodoro Jr. não vislumbra nenhuma complicação, eis que o processo será aí extinto. No entanto, quanto à resolução de mérito, o processualista aponta alguns casos em que será apreciada uma questão de mérito com base no artigo 269, mas que tal ato decisório, por si só, não poderá ser considerado sentença.[175]
Como exemplo o doutrinador aponta os casos de exclusão de um litisconsorte na fase de saneamento; o acolhimento da decadência e da prescrição de parte dos direitos disputados, sem apreciar totalmente a demanda; a rejeição da ação declaratória incidental, da reconvenção e da denunciação da lide, antes de dar curso à demanda principal.
Destarte, continuando nos argumentos de Theodoro Jr., o ato do juiz para ser classificado como sentença é aquele apto a encerrar o processo (artigo 267) ou a resolver por inteiro o objeto principal posto em juízo (artigo 269), ou seja, todos os pedidos da inicial devem ser resolvidos, positiva ou negativamente. Assim, se o pronunciamento não analisar o feito em toda a sua extensão e deixar outras questões para a solução final do processo, estar-se-ia diante de uma decisão interlocutória.[176]
Por fim, o referido processualista argumenta que os casos que comportariam a prática de outros atos após a prolação de sentença são excepcionados pelo próprio legislador, como as hipóteses de condenação genérica quando a liquidação da sentença será efetuada por decisão interlocutória.[177]
Pois bem. Após a exposição da tese Theodoro Jr., pode-se perceber grande similitude como os argumentos sustentados por Leonardo Greco, evidenciando-se quando ambos defendem que a sentença deve encerrar toda a fase cognitiva do processo, com o julgamento da pretensão de direito material em sua totalidade.
Todavia, o processualista mineiro aponta que há casos em que o legislador excepciona expressamente o cabimento de atos após a sentença, devendo estes serem encarados como decisão interlocutória, enquanto que Greco admite a sentença parcial nos casos que independem de dilação probatória, como a parte incontroversa da demanda e de questões puramente de direito. Feitas estas comparações, volta-se aos argumentos de Theodoro Jr.
Com todo o respeito que tal posicionamento merece, o ponto de vista de Theodoro Jr. não é completo. Como visto no Capítulo 2 deste trabalho, foi acrescentado, pela Lei 10.444/02, o parágrafo 6° ao artigo 273 da lei de ritos, prevendo a antecipação da tutela dos pedidos que se demonstrarem incontroversos, haja vista não ter sentido fazer o autor esperar toda a instrução da parte controvertida do processo para poder exercer o direito da parte incontrovertida. Raciocínio semelhante deve ocorrer quanto às sentenças parciais de mérito.
Tendo o autor formulado uma cumulação simples de pedidos (ou um pedido decomponível) ou cumulação sucessiva e, havendo prova suficiente de uma parte da demanda, não há porque fazê-lo esperar o resultado da instrução da parte não provada.
Foi exatamente nestes termos que o juiz Pedro Luiz Pozza, agora como titular da 5ª Vara de Fazenda Pública da comarca de Porto Alegre, proferiu a sentença parcial de mérito defendida neste trabalho.[178]
Neste processo, o autor ingressou em juízo pretendendo a reparação dos danos morais e materiais que alegara ter sofrido com a sua exoneração do cargo de Diretor Administrativo do Instituto Rio Grandense do Arroz – IRGA. Segundo sustentou, o cargo que exercia não era de livre exoneração, dependendo, para tanto, da representação do Governador do Estado do Rio Grande do Sul e da aprovação de 2/3 dos conselheiros do instituto, razão pela qual teria sido a sua demissão ilegal. Por ter um direito líquido e certo, antes de mover a ação indenizatória, impetrou mandado de segurança, logrando êxito em receber a segurança pleiteada e voltou a ocupar o cargo.
Assim, com base nessas alegações, pleiteou o ressarcimento dos danos materiais evidenciados com os gastos de honorários advocatícios, quando da impetração do referido mandamus, e a reparação pelos danos morais suportados com a repercussão do ocorrido pela mídia e na cidade onde residia.
O juiz Pedro Pozza, diante destes fatos, entendeu que era imperiosa uma resolução parcial do mérito, haja vista estar devidamente comprovado o dano material suportado com o gasto com honorários advocatícios, cabendo o julgamento antecipado com base no inciso I do artigo 330 do Código de Processo Civil, e depender o dano moral de dilação probatória.
O magistrado gaúcho defendeu o cabimento da sentença parcial de mérito com base na alteração, pela Lei 11.232/05, do parágrafo 1° do artigo 162, do artigo 269 e do artigo 463, todos da lei instrumental civil. No primeiro dispositivo suprimiu-se a assertiva de que a sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo; do segundo, a de que o processo é extinto com a decisão sobre o mérito; e do terceiro, a de que o juiz encerra o seu ofício jurisdicional ao prolatar a sentença.
Com efeito, a antiga redação dos referidos dispositivos é que servia como óbice para a resolução parcial do mérito, que agora é perfeitamente cabível pelo fato de o juiz não mais extinguir o processo e nem muito menos terminar a sua atuação ao decidir sobre o mérito.
Cândido Dinamarco, por sua vez, ao analisar o parágrafo 6° do artigo 273 da Lei Adjetiva Civil, lamentava por não ter o legislador autorizado um parcial julgamento antecipado do mérito com base no inciso I do artigo 330 do referido diploma legal, como ocorre no direito italiano nos artigos 277, 2ª parte e 278 da legislação processual deste país.[179]
O doutrinador paulista asseverava, ainda, que era necessário desmistificar o dogma existente no ordenamento jurídico pátrio da unidade do julgamento, haja vista pretenderem as recentes reformas do Código de Processo Civil agilizar o processo com medidas pragmáticas.[180]
Nesta mesma esteira, Marinoni também destaca o artigo 278 da lei instrumental civil italiana como uma das hipóteses de cabimento de uma sentença parcial de mérito. Como bem explica o doutrinador, o referido dispositivo alienígena dispõe sobre os casos de condenação genérica em que se pode, desde logo, condenar o devedor ao pagamento de uma provvisionale nos limites da quantia que já está provada.[181] Assim, esta provisional seria concedida por meio de uma sentenza parziale di merito, conforme entendimento da doutrina italiana de Luigi Montesano.[182]
Desta forma, o órgão julgador parte da certeza sobre o an debeatur para a concessão da tutela provisional nos limites que da quantia já provada. Com efeito, tem-se, nesses casos, cognição exauriente tanto sobre o an debeatur (direito) quanto sobre a quantia objeto da provisional, malgrado seja parcial a condenação.[183]
Assim, para defender seus argumentos sobre a utilidade da provisional, o processualista paranaense repisa os seguintes ensinamentos de Proto Pisani:
“Quanto à utilidade prática do instituto em exame, a provisional é instrumento idôneo para superar seja a lentidão dos processos, seja a particular dificuldade de se demonstrar o completo importe do dano; portanto, o instituto pode assegurar ao autor a possibilidade de obter, antes da pronúncia definitiva de mérito que exaure e fecha o processo, ao menos parte do que busca, em relação à qual a prova já é suficiente”.[184]
Por fim, Marinoni ressalta que “se é injusto obrigar o autor a esperar a realização de um direito evidente, a defesa, como é óbvio, não pode postergar a sua realização”.[185]
5.4 Recurso cabível contra a sentença parcial de mérito
Uma grande questão que logo se põe em discussão quando se propõe a sentença parcial de mérito é quanto ao recurso apto a atacar tal decisão.
À primeira vista, poder-se-ia concluir, por lógica, que o recurso é o de apelação, eis que se está diante de uma sentença que, conforme dispõe o artigo 513 do Código de Processo Civil, deve ser impugnada mediante este recurso.
Entretanto, não se pode olvidar que as recentes reformas processuais tornaram mais tênue a linha divisória dos conceitos de sentença e de decisão interlocutória, como bem discorreu Humberto Theodoro Jr. em argumentos já expostos.[186]
Com efeito, para demonstrar a dificuldade do tema, tem-se, por exemplo, a decisão que não acolhe a impugnação da fase de execução de título executivo judicial que é tida como decisão interlocutória e, assim, atacada por meio de agravo de instrumento (Artigo 475-M, parágrafo 3°, primeira parte); enquanto que, por outro lado, sendo acolhida a impugnação e extinguindo-se a execução, a decisão é tida como sentença e será impugnável por meio de apelação (Artigo 475-M, parágrafo 3°, in fine).
Assim, tem-se que no curso da fase de execução em que há impugnação do réu, se há acolhimento da tese de defesa, o ato do juiz terá natureza de sentença; no entanto, se os argumentos da defesa forem rechaçados, este ato do juiz terá natureza de decisão interlocutória. Malgrado seja lógica essa solução, o fato de que, a maneira de apreciação do mérito que irá determinar a natureza do ato do juiz, ainda que mantenha a substância de sentença, traz uma inovação muito grande no nosso ordenamento jurídico.
Por estas razões, saber qual o recurso cabível contra a sentença parcial de mérito não é tarefa das mais fáceis, ainda se forem lembrados os argumentos do entendimento já visto de Theodoro Jr., quando diz o processualista que toda a decisão do juiz que deixa para apreciar uma outra questão futuramente no processo é interlocutória, e não sentença.[187]
Para Daniel Mitidiero a sentença parcial de mérito deveria ser impugnada mediante agravo de instrumento, tendo este recurso, na verdade, a substância de uma apelação e, por esta razão, admitir-se-iam embargos infringentes na forma do artigo 530 do Código de Processo Civil, assim como sustentação oral (artigo 554 CPC), sendo necessário revisor (artigo 551 CPC), e podendo fazer coisa julgada (artigo 485 CPC). Neste caso, eventuais recursos interpostos às instâncias especial e extraordinária não ficariam retidos nos autos.[188]
Mitidiero justifica o seu posicionamento fazendo uma analogia à sentença que decide a liquidação. Conforme dispõe o artigo 475-H da lei de ritos, da decisão que decide a liquidação caberá agravo de instrumento. Para o mencionado processualista, esta disposição da lei não desnatura a natureza de sentença do provimento, sendo, inclusive, suscetível de ação rescisória.[189] Por isso, conclui que da sentença parcial de mérito cabe agravo de instrumento, assim como da sentença de liquidação.
Por outro lado, para José Maria Tesheiner, o recurso da sentença parcial de mérito deveria ser o da apelação que, no entanto, deveria ser processada em instrumento próprio, havendo uma separação dos processos, sob o pálio do inciso III do artigo 115 da lei instrumental civil.[190]
Por fim, tem-se o posicionamento do próprio magistrado de vanguarda que prolatou tal sentença. Segundo a fundamentação de sua sentença parcial de mérito, o juiz Pedro Pozza esclareceu que o recurso cabível é o de apelação na forma do artigo 513 do CPC, ainda que não tenha sido o processo extinto. Porém, salientou que deveriam ser formados autos suplementares com a cópia das folhas mais importantes dos autos.
O referido magistrado embasou o seu entendimento na doutrina de Chiovenda, defendendo que nos casos de processos reunidos ou de demandas cumuladas e apenas um deles tiver pronto para julgamento, a sentença, embora definitiva, é parcial, não havendo razão prática para não se permitir o imediato apelo de tal sentença. Com isso, a outra parte da demanda prosseguiria normalmente independente da parte apelada.[191]
Fica claro que o juiz prolator da sentença defendida neste trabalho tem o mesmo entendimento de Tesheiner, eis que determinar a formação de autos suplementares nada mais é do que processar a apelação em instrumento próprio. Feita a análise destes argumentos, passa-se à conclusão.
Primeiramente, por se tratar aqui de uma sentença, tem-se que o recurso apto a impugnar esta decisão do juiz é o de apelação. Como bem ressaltaram Leonardo Greco e Humberto Theodoro Jr., a sentença encerra a fase cognitiva do processo, só que neste caso estaria resolvida apenas parte da demanda. E por ser sentença cabe apelação, e não agravo.
Sob um outro giro, a “apelação por instrumento” também não parece a melhor solução, pois contraria implicitamente o espírito das recentes reformas processuais que visaram garantir uma maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional. Tome-se como exemplo a Lei 11.187/05 que tornou o agravo retido como regra e o agravo de instrumento como exceção. Esta medida teve por escopo desafogar os tribunais do julgamento deste recurso que, como já visto, representava a maior parte dos processos.
Assim, com o cabimento de apelação por instrumento da sentença parcial de mérito, os tribunais continuarão abarrotados de processos, eis que, assim sendo, passarão a julgar duas ou mais apelações – dependendo de quanto a demanda for fragmentada –referentes ao mesmo processo. Com isso, a sentença defendida neste trabalho não alcançaria a praticidade almejada, eis que seria bem melhor ter a sentença nos moldes como é entendida – como ato que resolve todos os pedidos formulados – porque, assim, só caberia uma apelação.
Desta forma, as sentenças parciais de mérito que possam ser prolatadas ao longo do processo, como sentenças que são, devem ser atacadas por apelações que subirão juntas, como uma sentença comum, ainda que haja fragmentação do julgamento.
5.5 Efetivação da sentença parcial de mérito
Determinado qual o recurso cabível contra a sentença defendida neste trabalho, outra questão se apresenta: se de todas as sentenças parciais de mérito prolatadas cabem tantas apelações quanto for fragmentado o julgamento que, no entanto, subiriam juntas, qual seria o benefício de admitir-se tais decisões? A resposta não é uniforme, pois depende do tipo de cumulação existente na ação.
Sendo a cumulação sucessiva são desnecessárias outras medidas. Lembrando os exemplos citados anteriormente, tais como a ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos, e o pedido de desconstituição de acordo judicial cumulado com pedido cominatório, extrai-se que o único modo de resolução parcial da demanda é com a procedência do pedido prejudicial. Obviamente não caberia uma sentença parcial do pedido formulado sucessivamente sem a apreciação daquele que lhe é prejudicial.
Assim, deferido o pedido prejudicial, como o reconhecimento da paternidade ou a desconstituição da transação judicial, como nos exemplos, o bem da vida já é entregue ao autor sem necessidade de outros atos, ficando ele no aguardo da instrução do outro pedido.
Já nos casos de cumulação simples ou se o pedido único for decomponível, o bem da vida deve ser garantido ao autor com o recurso sendo recebido, em regra, apenas no efeito devolutivo.
Porém, enquanto o a regra for o recebimento da apelação no chamado “duplo efeito”, a sentença parcial de mérito será concedida com base na combinação dos artigos 273, §6º, 330, I e 162, §1º, do Código de Processo Civil, considerando-se o pedido que não dependa mais de dilação probatória como incontroverso. Assim esta sentença, por não ser mais o ato do juiz que põe termo ao processo, e diferentemente da tese de Fredie Didier sobre a possibilidade de produção de coisa julgada da tutela antecipada do parágrafo 6º do artigo 273 da lei de ritos, fragmenta o julgamento da causa e é apta a produzir coisa julgada.
Foi justamente nestes termos que decidiu o juiz Pedro Pozza. No exemplo concreto, quando foram cumulados os pedidos de indenização por danos materiais e por danos morais, de nada adiantaria que o recurso do réu, contra a sentença parcial que concedeu o primeiro pedido, fosse recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo, pois obter-se-ia o mesmo resultado julgando os dois pedidos em uma única decisão.
Assim, com vistas a garantir a efetividade de sua decisão, o magistrado, ao fragmentar o seu julgamento, entendeu o pedido de indenização de danos materiais como incontroverso, eis que estava devidamente comprovado. Por esta razão, fundamentou a sua decisão na combinação dos artigos 330, I com 273, parágrafo 6°, ambos da lei processual.
Muito embora a sentença parcial de mérito seja concedida com a referida combinação de artigos acima, é necessário, para garantir-se a sua efetividade, inverter a ordem de preferência do efeito do recebimento do recurso prevista no artigo 520 do Código de Processo Civil, tornando apenas o efeito devolutivo como regra e excepcionando os casos de recebimento no efeito suspensivo.
Neste sentido, Ada Pellegrini, em histórico oportuno, leciona que, antes, o ordenamento processual pátrio não atribuía qualquer valor à sentença de primeiro grau, tendo a apelação sempre o efeito suspensivo. A execução provisória, por sua vez, nem poderia ser identificada como tal, eis que só prosseguia até a penhora dos bens, possuindo, na verdade, caráter de medida cautelar de arresto. Este quadro só foi ser alterado com as reformas processuais de 1996 e de 2001.[192]
Ainda segundo a autora, não só o recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo – podendo o juiz conceder o efeito suspensivo somente para evitar dano irreparável à parte, do mesmo modo que a sistemática adotada pelo ordenamento italiano – como também as normas sobre a execução provisória revalorizam a sentença de primeiro grau.[193]
Já Alexandre Câmara lembra que o recebimento do recurso apenas no efeito devolutivo não é de todo estranho ao ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que é adotado nos Juizados Especiais Cíveis (artigo 43 da Lei 9.099/95). O doutrinador carioca ressalta, ainda, que este é o melhor sistema, pois tanto possibilita a produção imediata dos efeitos da sentença quanto destimula a interposição de recursos com fins protelatórios. Desta forma, o fato de os recursos recebidos de regra no efeito suspensivo é uma mera formalidade necessária para se chegar ao segundo grau de jurisdição.[194]
Por fim, Marinoni assevera que se a sentença de primeiro grau fosse dotada de executividade imediata, a tutela antecipatória final prevista no inciso VII do artigo 520 da Lei Adjetiva Civil seria desnecessária. Ele aponta que é contraditório o fato de caber no nosso ordenamento uma antecipação dos efeitos de uma sentença de mérito e não caber a execução imediata da sentença nos casos em que a tutela antecipada é admitida.[195]
O processualista paranaense ao debater, em 1993, o anteprojeto da tutela antecipatória muito bem ressaltava que:
“Quando a questão de mérito foi unicamente de direito, ou quando não houver a necessidade de produção de provas, o julgamento antecipado do mérito poderia encontrar efetividade se fosse viável a ‘execução provisória’ da sentença fora dos casos previstos no art. 520. Ora, se é possível ‘execução provisória nas hipóteses dos incs. do art. 273, com maior razão deveria ser possível a execução provisória da sentença fundada nos mesmos motivos expostos nos referidos incisos.”[196]
Neste sentido, tem-se o Projeto de Lei número 30/2005 que, recentemente, foi encaminhado para publicação, já sendo aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal[197].
Com a nova redação do referido dispositivo, a lei processual deixa de dispor um rol para os casos de recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo, invertendo a ordem, passando a dispor os casos excepcionais de recebimento no efeito suspensivo.
Por todo o exposto, a sentença parcial de mérito que fragmenta o julgamento da demanda terá a sua efetividade garantida com o recebimento do recurso apenas no efeito devolutivo. Todavia, enquanto não houver a alteração nos efeitos de recebimento do recurso com a publicação da referida lei, permanecerá sendo concedida com base na parte incontroversa da demanda prevista no parágrafo 6° do artigo 273, da forma procedida pelo magistrado do Rio Grande do Sul.
6 CONCLUSÃO
Como visto neste trabalho, a Emenda Constitucional 45, de 08 de dezembro de 2004, objetivou a reforma do judiciário com vistas a garantir maior efetividade e celeridade à prestação jurisdicional. Esta intenção ficou explícita com o inciso LXXVIII, acrescentado ao artigo 5º da Constituição Federal, garantindo a todos uma duração razoável do processo.
Contudo, para alcançar o mister pretendido, a aludida reforma constitucional não bastava em si mesma, devendo, para tanto, ser seguida de outras reformas infraconstitucionais no âmbito do direito processual – civil e penal, mas, neste trabalho, somente o primeiro interessa – para que fosse otimizado o tempo processual.
Tais reformas infraconstitucionais foram previstas na própria Emenda 45, determinando, em seu artigo 7º, que fosse criada uma comissão mista para a elaboração de anteprojetos de lei sobre o objeto da reforma constitucional. Assim, foi celebrado um pacto pelos chefes dos três poderes que foi denominado como ”pacto em favor de um judiciário mais rápido e republicano”.
Neste pacto, foram apontadas as reformas do sistema recursal e dos procedimentos como um dos meios de tornar mais amplo o acesso à justiça e mais célere a prestação jurisdicional.
No âmbito do sistema recursal, modificou-se o agravo que passou a ser recebido, como regra, em sua forma retida; previu-se a súmula impeditiva de recursos; determinou-se a demonstração, em preliminar, da repercussão geral do recurso extraordinário como requisito de sua admissibilidade.
Já nos procedimentos, unificou-se os processos de conhecimento e de execução em um só, gerando um processo sincrético de fases cognitiva e executiva; concedeu-se ao credor o direito de nomear bens do devedor à penhora, dispondo outros meios executórios que não a hasta pública; transferiu-se para esfera administrativa determinados casos de jurisdição voluntária.
No que concerne à unificação dos processos de conhecimento e de execução, fez-se necessária a alteração do conceito do ato do juiz denominando como sentença. Assim, alterou-se a redação dos artigos 162, §1º, como ato que põe termo ao processo, e 463, que determinava que o juiz encerrava o seu ofício ao prolatar a sentença, ambos do Código de Processo Civil. Só com tais modificações é que seria possível conceber o processo sincrético vislumbrado.
Desta forma, com a nova redação do parágrafo 1º do artigo 162, do mesmo diploma legal, não pondo mais a sentença termo ao processo, defende-se a possibilidade de ser concedida uma sentença parcial de mérito, em moldes parecidos do que se tem notícia no direito italiano, apta a fragmentar o julgamento da causa quando houver cumulação de pedidos ou quando o pedido for, por sua natureza, decomponível. Essa sentença se fundamentaria na combinação dos artigos 162, §1º, 269, 273, §6º, 330, I e 463, todos da lei processual.
Esta sentença é vista como um dos meios de se alcançar o mais amplo acesso à justiça e a maior celeridade da prestação jurisdicional almejados na reforma constitucional do judiciário, visto que é capaz de otimizar a entrega do bem da vida pleiteado em juízo ao autor que tem razão.
Assim, o pedido cumulado ou parte dele, que não depender mais de dilação probatória, deve ser encarado como incontroverso e ser julgado antecipadamente por sentença, de modo parecido com que ocorre na tutela antecipada concedida sobre a parte incontroversa da demanda.
É necessária a combinação do dispositivo atinente à tutela antecipada para fundamentar a sentença parcial de mérito pelo fato de que, no ordenamento jurídico pátrio, a regra do recebimento do recurso de apelação ainda é em seus efeitos devolutivo e suspensivo. Caso tal combinação não fosse feita, não seria possível garantir a efetividade da sentença defendida neste trabalho, eis que, malgrado haja uma fragmentação no julgamento da demanda, as apelações das as sentenças proferidas subirão juntas.
Igualmente entende-se que o recurso cabível de tal sentença é o de apelação simples, na forma como é conhecida, e não o de “apelação por instrumento”. A apelação por instrumento próprio não caberia porque ela abarrotaria os tribunais da mesma forma que acontecia quando o agravo retido não era a regra. Nem muito menos caberia o recurso de agravo de instrumento, pois a sentença parcial de mérito mantém a sua natureza de sentença, e não sendo decisão interlocutória.
Por todo o exposto neste trabalho, defende-se que a hipótese de uma sentença apta a fragmentar o julgamento da causa, nos casos já citados, pode trazer uma maior concretização do direito material, permitindo que o pedido já provado seja concedido mais rapidamente ao autor que tem razão.
Bibliografia
Informações Sobre o Autor
Rodrigo Lessa Vieira
Advogado formado pela Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, com Pós-Graduação em Direito Público pela Universidade Gama Filho e sócio do escritório Wanderley & Lessa Advogados