1. Acessibilidade ao Serviço Público
Tem-se como acessibilidade o conjunto de normas e princípios que disciplinam o ingresso de pessoas no serviço público.
Na redação originária da CF/88, o acesso a cargo, emprego e função pública era apenas aos brasileiros, não fazendo distinção entre natos ou naturalizados (art. 37, I).
Com a EC nº 11/96, as universidades e instituições de pesquisa científica e tecnológica passaram a poder admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros na forma da lei (art. 207). No âmbito federal, a Lei nº 9.515/97 disciplinou a questão, inserindo o § 3º no art. 5º da Lei nº 8.112/90.
A partir da EC nº 19/98, os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos legais, assim como aos estrangeiros, na forma da lei (art. 37, I).
Em ambos os casos, a lei a disciplinar a contratação deverá ser de cada ente da Federação.
Acertadamente o STF tem considerado inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido (Súm. nº 685).
Também não tem se admitido que leis estaduais ampliem as hipóteses de dispensa de concurso público para ingresso no serviço público.
“A exigência de concurso público para a investidura em cargo garante o respeito a vários princípios constitucionais de direito administrativo, entre eles, o da impessoalidade e o da isonomia. O constituinte, todavia, inseriu no art. 19 do ADCT norma transitória criando uma estabilidade excepcional para servidores não concursados da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que, quando da promulgação da Carta Federal, contassem com, no mínimo, cinco anos ininterruptos de serviço público. A jurisprudência desta Corte tem considerado inconstitucionais normas estaduais que ampliam a exceção à regra da exigência de concurso para o ingresso no serviço público já estabelecida no ADCT Federal. Precedentes: ADI 498, Rel. Min. Carlos Velloso (DJ de 9-8-1996) e ADI 208, Rel. Min. Moreira Alves (DJ de 19-12-2002), entre outros” (STF – TP – ADI nº 100 – Rel. Min. Ellen Gracie – j. 9/9/2004 – DJ 1º/10/2004).[1]
Além da regra fundamental, os requisitos de acesso podem ser divididos em objetivos e subjetivos, sendo os primeiros os relacionados com as funções do cargo ou emprego, v.g., concurso de provas e títulos, testes físicos etc., e os segundos dizem respeito à pessoa do candidato, como, por exemplo, boa conduta, aptidão profissional, entre outros.
Certo é que “nenhum requisito subjetivo pode discriminar o candidato em razão de suas condições estritamente pessoais, como raça, cor, credo religioso, credo político, forma estética, sexo e idade …”.[2] Contudo, algumas exceções no que tange ao sexo e idade são admitidas quando decorrentes da limitação imposta pela natureza ou necessidade da função a ser exercida.
Diz Bandeira de Mello:[3] “Observou-se que tal requisito, como regra, não pode ser exigido. Isto porque haverá hipóteses nas quais do fator idade pode resultar uma específica incompatibilidade com algum determinado cargo ou emprego, cujo satisfatório desempenho demande grande esforço físico ou acarrete desgaste excessivo, inadequados ou impossíveis a partir de certa fase da vida. Não se tratará, pois, de uma pretendida limitação indiscriminada e inespecífica – inadmitida pelo Texto Constitucional – mas, pelo contrário, da inadaptação física para o satisfatório desempenho de certas funções, como conseqüência natural da idade.
Tais hipóteses serão raras e excepcionais, mas não são de excluir.”
2. Concurso Público
Iniciado com Napoleão, na França, o processo de seleção de candidatos a cargos públicos é, nas palavras de José Cretella Júnior,[4] “assim, processo de provimento exigido pela regra jurídica constitucional, o concurso é para nós definido como a série complexa de procedimento que o Estado empreende para apurar as aptidões pessoais apresentadas por quem se empenha ingressar nos quadros do serviço público, submetendo o candidato seus trabalhos, títulos e atividades a julgamento de comissão examinadora.”
O concurso público de provas ou de provas e títulos é fator denotador da exigência da moralidade, da impessoalidade e da eficiência,[5] sendo requisito indispensável para a investidura em cargo ou emprego público, excetuando-se as hipóteses de cargo de provimento em comissão. A exceção é justificável, pois deve ser considerada a confiança que deve presidir a escolha do nomeando, além do caráter temporário do exercício e a própria demissão ad nutum dos ocupantes de tais cargos.[6]
Além disso, com o concurso público, o Constituinte pretendeu assegurar a igualdade entre os participantes e garantir que os aprovados sejam pessoas capazes e competentes. Para isso, dois requisitos são indispensáveis: a) o concurso é público, não podendo ser restringido a determinado grupo, como quando apenas aqueles que já são servidores podem participar (concursos internos);[7] b) o resultado deve ser obtido de modo objetivo, com critérios claros, para que não haja dúvida sobre a aprovação de alguns e reprovação de outros.
As regras do concurso são definidas em lei de cada ente da Federação e seguirão os parâmetros fixados no edital. O STF entendeu que “em face do princípio da legalidade, pode a Administração Pública, enquanto não concluído e homologado o concurso público, alterar as condições do certame constantes do respectivo edital, para adaptá-las à nova legislação aplicável à espécie, visto que, antes do provimento do cargo, o candidato tem mera expectativa de direito à nomeação ou, se for o caso, à participação na segunda etapa do processo seletivo” (STF – RE nº 290.346 – Rel. Min. Ilmar Galvão – j. 29/5/2001 – DJ 29/62001).
O STJ editou a Súm. nº 266, esboçando seu entendimento de que “o diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público.” Analisando caso concreto, o STF entendeu também dessa forma.[8]
Além dos cargos de provimento em comissão, há na CF outras exceções, como a nomeação dos membros dos tribunais de contas da União; do 1/5 Constitucional que é composto de membros do Ministério Público e de advogados nos tribunais; dos membros do STF; STJ; TSE e STM (arts. 73, § 2º, 94, 101, 104, parágrafo único, XII, 107, 111-A, I, 119, II, 120, III, e 123). Outra exceção constitucional é a contratação emergencial (art. 37, IX, CF), quando normalmente se tem apenas um processo seletivo.
Na vigência da CF/67, apenas a nomeação para cargo público possuía como requisito constitucional à aprovação em concurso público (art. 97).
Assim, a relação de emprego com a administração iniciada antes da CF/88, ainda que sem concurso público, é válida.[9]
“Não se mostra razoável a pretensão de subordinar, ao preceito do art. 37, II, da Constituição, o vínculo empregatício estabelecido antes de sua promulgação” (STF – AI nº 254.417-AgR – Rel. Min. Octavio Gallotti – j. 28/3/2000 – DJ 16/6/2000).[10]
Atualmente, a exigência do concurso público envolve tanto os cargos como os empregos públicos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego (art. 37, II, CF). O ingresso no serviço público sem aprovação em concurso público implica nulidade do ato e punição da autoridade responsável (art. 37, II e § 2º), por ato de improbidade administrativa, nas esferas civil, administrativa e penal.
“Concurso público: não mais restrita a sua exigência ao primeiro provimento de cargo público, reputa-se ofensiva do art. 37, II, CF, toda modalidade de ascensão de cargo de uma carreira ao de outra, a exemplo do ‘aproveitamento’ e ‘acesso’ de que cogitam as normas impugnadas (§§ 1º e 2º do art. 7º do ADCT do Estado do Maranhão, acrescentado pela EC 3/90)” (STF – TP – ADI nº 637 – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – j. 25/8/2004 – DJ 1º/10/2004).
“Conforme sedimentada jurisprudência deste Supremo Tribunal, a vigente ordem constitucional não mais tolera a transferência ou o aproveitamento como formas de investidura que importem no ingresso de cargo ou emprego público sem a devida realização de concurso público de provas ou de provas e títulos” (STF – TP – ADI nº 2.689 – Rel. Min. Ellen Gracie – j. 9/10/2003 – DJ 21/11/2003).
“O Supremo Tribunal Federal tem repelido, por incompatíveis com o texto da Lei Fundamental, as normas legais que, independentemente de concurso público, possibilitam o aproveitamento, nos quadros funcionais de entidade federada diversa (como o Distrito Federal), de servidor que ocupa cargo em outra pessoa política (União, Estados-Membros e Municípios)” (STF – TP – ADI nº 980-MC – Rel. Min. Celso de Mello – j. 3/2/1994 – DJ 13/5/1994).
“Configuração, ainda, de inconstitucionalidade material, por contemplarem hipóteses de provimento de cargos e empregos públicos mediante transferência indiscriminada de servidores, em contrariedade ao art. 37, II, do Texto Constitucional Federal” (STF – ADI nº 483 – Rel. Min. Ilmar Galvão – j. 25/4/2001 – DJ 29/6/2001).
“É certo que, no julgamento das ADIs 1.591, Rel. Min. Octavio Gallotti, e 2.713, Rel. Min. Ellen Gracie, este colendo Tribunal entendeu que o aproveitamento de ocupantes de cargos extintos nos recém-criados não viola a exigência da prévia aprovação em concurso público, ‘desde que haja uma completa identidade substancial entre os cargos em exame, além de compatibilidade funcional e remuneratória e equivalência dos requisitos exigidos em concurso’. Sucede que, à luz dos textos normativos hostilizados, resta patenteado que o cargo efetivo de carcereiro em nada se identifica com o de detetive” (STF – TP – ADI nº 3.051 – Rel. Desig. Min. Carlos Britto – j. 30/6/2005 – DJ 28/10/2005).
“Transformação, em cargos de consultor jurídico, de cargos ou empregos de assistente jurídico, assessor jurídico, procurador jurídico e assistente judiciário-chefe, bem como de outros servidores estáveis já admitidos a representar o Estado em juízo (§ 2º e 4º do art. 310 da Constituição do Estado do Pará). Inconstitucionalidade declarada por preterição da exigência de concurso público (art. 37, II, da Constituição Federal)” (STF – TP – ADI nº 159 – Rel. Min. Octavio Gallotti – j. 16/10/92 – DJ 2/4/93).
O art. 22, ADCT, assegura aos defensores públicos investidos na função até a data da instalação da Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, observando-se as garantias e as vedações previstas o art. 134, parágrafo único, da CF.
“É inconstitucional o preceito que permite aos assistentes jurídicos do quadro do extinto Território do Amapá, sob subordinação da Procuradoria-Geral e da Defensoria Pública do Estado, a opção de ingresso na carreira de Procurador ou de Defensor Público do Estado de 1ª Categoria, bem como nos cargos de Defensor Público-Geral, Chefe de Defensoria, Núcleos Regionais e da Corregedoria; violação aos princípios da isonomia e da impessoalidade previstos no art. 37, caput, da Constituição do Brasil. São ressalvados, no entanto, os direitos previstos no art. 22 do ADCT da Constituição do Brasil, que assegurou aos defensores públicos investidos na função até a data da Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira” (STF – TP – ADI nº 1.267 – Rel. Min. Eros Grau – j. 30/9/2004 – DJ 10/8/2006).
O ingresso no serviço público, por aprovação em concurso, é uma imposição que procura dar transparência à gestão da administração pública, visando evitar favorecimentos e prejuízo dos serviços públicos.
A imposição do concurso público deve ser observada como forma de acesso ao serviço público, tanto para a administração pública direta como a indireta, inclusive em todas as esferas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios).
A exigência de concurso público para as contratações feitas pela administração indireta só se tornou pacífica na jurisprudência após decisão do STF sobre a matéria (STF – TP – MS nº 21.322 – DF – Rel. Min. Paulo Brossard – j. 3/12/92 – DJ 23/4/93 – p. 6921).[11]
O STF, por considerar que a OAB não faz parte da administração indireta, entendeu que incabível a exigência de concurso público para a contratação de seus empregados celetistas (STF – TP – ADIn 3026-DF – Rel. Min. Eros Grau – j. 8/6/2006 – DJ 29/9/2006 – p. 478).[12]
O concurso público tem validade de até 2 anos, prorrogáveis uma vez por igual período. Assim, se no edital constar que o concurso terá validade por 1 ano, a prorrogação será de 1 ano também.[13]
O Constituinte delegou à norma infraconstitucional a reserva de percentuais de cargos e empregos reservados às pessoas portadoras de deficiência (art. 37, VII, CF).
No âmbito da União, é assegurado o direito da pessoa portadora de deficiência inscrever-se em concurso público para provimento de cargos, cujas atribuições lhe sejam compatíveis, e são reservados até 20% das vagas oferecidas no concurso (art. 5º, § 2º, Lei nº 8.112/90).
Em seus estudos, Cretella Júnior[14] aponta que “sob o regime das Constituições anteriores à de 1988, a jurisprudência firmou princípios como se pode observar, lendo os julgados que seguem: ‘Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem direito à nomeação, quando o cargo foi preenchido sem observância da classificação’ (Súmula 15). ‘O concurso não vincula o Poder Executivo à nomeação compulsória do candidato; assiste-lhe, apenas, uma expectativa de direito’ (STF, em RDA 98/114). ‘A Administração pública pode adiar por motivos de conveniência a realização de concurso para provimento de cargo público. Contra esse adiamento mandado de segurança’ (STF, em RDA 90/91). ‘Somente a lei, com exclusão do regulamento, pode estabelecer limite de idade para inscrição em concurso destinado ao provimento de cargo público’ (STF, em RDA 72/70). ‘A realização do concurso, por si só, não obriga a Administração a nomear os candidatos classificados’ (TASP, em RDA 66/108). ‘A aprovação em concurso não obriga a Administração a nomear, desde logo, os candidatos aprovados e a preencher todas as vagas existentes’ (TJSP, em RDA 62/105). ‘É lícita a exclusão de concurso de candidato do sexo feminino’(TASP, em RDA 67/94). ‘A lei pode deferir, ao regulamento, a discriminação de sexos, com exclusão das mulheres, para efeito de provimento de cargos públicos’ (STF, em RDA 77/116). ‘Nomeado por concurso, o funcionário tem direito à posse (STF, em RDA 85/107). ‘A revisão de classificação de candidatos a concurso para provimento de cargo público, promovida por ato administrativo, não alcança aos já classificados, nem altera os resultados homologados’ (STF, em RDA 104/139).”
O STF considera legitima a limitação de idade para inscrição em concurso público quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido (Súm. nº 683), não admitindo a restrição, por ato administrativo, em razão da idade, inscrição em concurso para cargo público (Súm. nº 14). Constitucionalmente, aos 70 anos de idade, se tem a aposentadoria compulsória no setor público (art. 40, § 1º, I).
“Pode a lei, desde que o faça de modo razoável, estabelecer limites mínimo e máximo de idade para ingresso em funções, emprego e cargos públicos. Interpretação harmônica dos artigos 7º, XXX, 37, I, 39, § 2º. O limite de idade, no caso, para inscrição em concurso público e ingresso na carreira do Ministério Público do Estado de Mato Grosso – vinte e cinco anos e quarenta e cinco anos – é razoável, portanto não ofensivo à Constituição, art. 7º XXX, ex vi do art. 39, § 2º. Precedentes do STF: RMS 21.033/DF, RTJ 135/958; RMS 21.046; RE 156.404/BA; RE 157.863/DF; RE 136.237/AC; RE 146.934/PR; RE 156.972/PA” (STF – RE nº 184.635 – Rel. Min. Carlos Velloso – j. 26/11/1996 – DJ 4/5/2001).
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) não tem admitido limitação de idade máxima em 45 anos para ingresso na Magistratura.
“Procedimento de Controle Administrativo. Concurso público para a magistratura. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Exigência de idade máxima menor que 45 anos. Impossibilidade. – “I) A limitação de idade para ingresso na magistratura afronta os princípios da isonomia, razoabilidade e legalidade, pois não há previsão constitucional desta natureza e a maturidade elemento importante para o exercício da judicatura. II) O argumento referente ao tempo de aposentadoria é inconsistente, não podendo ser vedado o acesso do candidato ao concurso com base na suposta data em que ele se aposentaria” (CNJ – Plenário – PCA 347 – Rel. Cons. Ruth Carvalho – j. 14/3/2007 – DJU 23/3/2007).
Características físicas do candidato, como altura mínima, também podem ser exigidas como requisitos para inscrição no concurso público, desde que necessária à atribuição da função e sempre deverão ser analisadas com observância do princípio da razoabilidade.
“Razoabilidade da exigência de altura mínima para ingresso na carreira de delegado de polícia, dada a natureza do cargo a ser exercido. Violação ao princípio da isonomia. Inexistência” (STF – RE nº 140.889 – Rel. Desig. Min. Maurício Corrêa – j. 30/5/2000 – DJ 15/12/2000).
“Concurso público. Fator altura. Caso a caso, há de perquirir-se a sintonia da exigência, no que implica fator de tratamento diferenciado com a função a ser exercida. No âmbito da polícia, ao contrário do que ocorre com o agente em si, não se tem como constitucional a exigência de altura mínima, considerados homens e mulheres, de um metro e sessenta para a habilitação ao cargo de escrivão, cuja natureza é estritamente escriturária, muito embora de nível elevado” (STF – RE nº 150.455 – Rel. Min. Marco Aurélio – j. 15/12/1998 – DJ 7/5/1999).[15]
Contudo, é de se ressaltar há divergência jurisprudencial sobre o tema, por considerarem alguns que restrições dependem de lei.
“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLICIAL MILITAR. ALTURA MÍNIMA. PREVISÃO LEGAL. INEXISTÊNCIA. 1. Somente Lei Formal pode impor condições para o preenchimento de cargos, empregos ou funções públicas. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF – 2ª T. – AI-AgR nº 627586-BA – Rel. Min. Eros Grau – j. 27/11/2007 – p. 19).[16]
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 2. Concurso público. Altura mínima. Ausência de previsão legal. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF – 2ª T. – RE-AgR nº 509296-SE – Rel. Min. Gilmar Mendes – j. 18/9/2007).
“AGRAVO REGIMENTAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE POLICIAL MILITAR DO ESTADO DA BAHIA. ALTURA MÍNIMA EXIGIDA. NECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL PARA DEFINIÇÃO DOS REQUISITOS PARA INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE OFENSA DIRETA À CONSTITUIÇÃO. Agravo regimental a que se nega provimento” (STF – 2ª T. – AI-AgR nº 588768-BA – Rel. Min. Joaquim Barbosa – DJ 3/8/2007 – p. 94).
Por considerar violação ao princípio da igualdade, o STF declarou inconstitucional a previsão legal que dispensa da prova de capacitação física e da investigação social candidatos integrantes do quadro permanente da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro em concurso público (STF – TP – SDI 1072-RJ – Rel. Min. Sydney Sanches – j. 6/2/2003 – DJ 16/5/2003 – p. 89).
Em maio de 2008, o STF entendeu que viola ao princípio constitucional da presunção da inocência (art. 5º, LVII), a exclusão de candidato de concurso público para ingresso na Polícia Militar que responde por inquérito ou ação penal sem trânsito em julgado da sentença condenatória (STF – 1ª T. – RE-AgR nº 559135-DF – Rel. Min. Ricardo Lewandowski – j. 20/5/2008). Parece-nos que tais questões merecem uma maior reflexão, à medida que também devem ser observados os princípios da moralidade e da eficiência administrativa (art. 37, caput, CF), ainda mais quando se tratar de atividades relacionadas à segurança pública, informações privilegiadas e cargos que exerçam funções de Estado.
No aspecto doutrinário e jurisprudencial, é pacífico o entendimento de que o candidato aprovado em concurso público tem mera expectativa ao direito de nomeação.[17]. O STF reconhece o direito do candidato aprovado à nomeação, dentro do prazo de validade do concurso, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação (Súm. nº 15), sendo que o funcionário nomeado por concurso tem direito à posse (Súm. nº 16) e a nomeação sem concurso poderá ser desfeita antes da posse (Súm. nº 17).
Contudo, é de se ressaltar que em recente decisão, o STJ, por maioria de votos, entendeu que o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previstas em edital possui direito líquido e certo à nomeação (6ª T. – RMS nº 20718-SP – Rel. Min. Paulo Medina – j. 4/12/2007 – DJ 3/3/2008 – p. 1).[18]
Considera-se inconstitucional o veto não motivado à participação de candidato a concurso público (Súm. nº 684) e toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido (Súm. nº 685).
No que se refere à exigência de exame psicotécnico, além da necessidade de lei formal prevendo-o como requisito para o ingresso no serviço público (Súm. nº 686), “o exame psicotécnico depende de um grau mínimo de objetividade e de publicidade dos atos em que se desdobra” (STF – 1ª T. – RE-AgR nº 417019-SE – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – j. 14/8/2007 – DJ 14/9/2007 – p. 41). Assim, para o STF a “avaliação em exame psicotécnico, com base em critérios subjetivos, sem um grau mínimo de objetividade, ou em critérios não revelados, não é legítima por não permitir o acesso ao Poder Judiciário para a verificação de eventual lesão de direito individual pelo uso desses critérios” (STF – 2ª T. – AI-AgR nº 611443-BA – Rel. Min. Eros Grau – j. 26/6/2007 – DJ 17/8/2007 – p. 80).
Segundo o STF, “mostra-se conflitante com o princípio da razoabilidade eleger como critério de desempate tempo anterior na titularidade do serviço para o qual se realiza o concurso público” (STF – TP – ADI nº 3.522 – Rel. Min. Marco Aurélio – j. 24/11/2005 – DJ 12/5/2006).
Não viola a Constituição a limitação do número de candidatos aprovados em uma etapa para ter acesso à sucessiva (STF – RE nº 478.136-AgR – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – j. 14/11/2006 – DJ 7/12/2006).
O TRT da 2ª Região concedeu a segurança, em sede de writ, para ordenar a contratação de candidato aprovado em concurso público, quando havia terceirizado exercendo suas funções.[19]
Com a EC 45/2004, para ingresso nas carreiras da Magistratura e do Ministério Público passou a ser exigido 3 anos de atividade jurídica (art. 93, I, e art. 129, § 3º, CF).
A Resolução nº 11, de 31/1/2006, do CNJ regulamenta o critério da atividade jurídica para inscrição em concurso público para ingresso na carreira da magistratura nacional.
As Resoluções nº 4, de 20/2/2006, e nº 11, de 7/8/2006, do Conselho Nacional do Ministério Público, cuidam da inscrição em concursos públicos.
Segundo decisão do STF, anulação do concurso anterior à posse dos candidatos nomeados, exige prévio processo administrativo com a garantia do contraditório e a ampla defesa (STF – RE nº 351.489 – Rel. Min. Gilmar Mendes – j. 7/2/2006 – DJ 17/3/2006).
3. Concurso Interno
Conhecido como concurso interno, tem-se um processo seletivo restrito no âmbito de órgãos da administração ou com a participação de candidatos de forma limitada.
Segundo a doutrina, a questão surge com o art. 19, § 1º, do ADCT, que após conceder a estabilidade no serviço público, previu que o tempo de serviço desses servidores seria contado como título quando se submeterem à concurso para fins de efetivação, na forma da lei.
Para melhor interpretar o sistema constitucional, defende José dos Santos Carvalho Filho,[20] “deve considerar-se admissível o concurso interno apenas para provimento de cargos de classes intermediárias e finais de carreira, ou ainda para a ascensão funcional, pelo qual o servidor pretende sair de cargo de classe final de uma carreira para outro da classe inicial de carreira superior ou complementar, isso em circunstâncias especiais, como aquela em que a carreira superior é complementar à inferior.”
Para ascensão ou promoção na carreira, parece-nos que o STF admite o concurso interno, pois somente considerou, de forma expressa, inconstitucional a modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido (Súm. nº 685).
A progressão na carreira é, no nosso modo de ver, a única hipótese de se admitir o concurso interno, sendo que as demais acabam por violar a exigência constitucional de aprovação em concurso público.
Em muitos casos, o cargo de professor adjunto não está atrelado à ascensão na carreira. Por isso, o acesso de professor adjunto ao cargo de professor titular só pode ser efetivado por meio de concurso público, conforme dispõem os art. 37, II, e art. 206, V, da CF/88 (OJ nº 65, SDI-I). Decisões judiciais em sentido contrário ensejam ação rescisória (OJ nº 38, SDI-II).
Para a carreira da Magistratura, a própria Constituição prevê como critérios para promoção de entrância para entrância e acesso para o tribunal, antiguidade e merecimento (art. 93, II e II).
4. Processo Seletivo para Servidores Temporários
Por previsão constitucional, “a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público” (art. 37, IX).
O STF pacificou o entendimento que no caso de contratação temporária, nos termos do art. 37, IX, CF, não existe a obrigatoriedade de concurso público.
Até porque a exigência de aprovação em concurso público seria um contra-senso à contratação emergencial.
Visando à eficiência dos serviços públicos e à observância do princípio da impessoalidade e da moralidade administrativa (art. 37, caput), a legislação federal prevê que nos casos de contratação temporária haverá um processo seletivo simplificado sujeito à ampla divulgação, inclusive pelo Diário Oficial da União, prescindindo de concurso público (art. 3º, Lei nº 8.745/93, com as alterações posteriores).
No caso de calamidade pública, a contratação prescindirá do processo seletivo.
A contratação de professor e técnicos especializados, nas situações mencionadas na lei, poderá ser efetivada à vista de notória capacidade técnica ou científica do profissional, mediante análise do curriculum vitae.
A contratação simplificada prevista na legislação federal se justifica pela excepcionalidade e temporariedade dos serviços de interesse público.
5. A Legislação Eleitoral e o Concurso Público
5.1. Da Abrangência da Legislação Eleitoral
A abrangência da legislação eleitoral que possui implicação nas relações de trabalho pode envolver dois aspectos: a) circunscrição ou territorialidade – extensão territorial de aplicação da norma eleitoral; b) destinatário da norma – servidores públicos (funcionários, empregados públicos e temporários) e empregados da iniciativa privada.
O segundo aspecto (destinatário da norma) ainda pode ser desdobrar, considerando se o empregado, público ou não, que é candidato a um cargo eletivo ou não.
Na ocorrência de eleições presidenciais, a circunscrição será o País e nas eleições federais e estaduais, o Estado; e nas municipais, o respectivo Município (art. 86, Código Eleitoral),[21] de maneira que onde não houver eleições, não há se falar em vedações de ordem administrativa.
Aplicáveis apenas aos servidores públicos, as restrições impostas pela Lei nº 9.504, de nomeação, contratação, demissão sem justa causa, supressão ou readaptação vantagens ou outras alterações das relações de trabalho existentes, previstas na legislação eleitoral para o período de 3 meses que antecedem o pleito até a data de posse dos eleitos, estão adstritas à circunscrição do pleito (art. 73, V).
Assim, as restrições impostas ficam limitadas à circunscrição do pleito, seguindo os critérios estabelecidos pelo Código Eleitoral.
Importante destacar que restrições semelhantes existiam nas leis que disciplinaram outras eleições e que, atualmente, é predominante o entendimento de que também são aplicáveis aos empregados das empresas públicas e de sociedade de economia mista as restrições de contratação, dispensa e transferência (OJ nº 51, SDI-I).
Tal entendimento diz respeito à aplicação da Lei Eleitoral nº 7.773/89, o qual, certamente, se estende à legislação eleitoral posterior.
Porém, nem sempre foi esse o entendimento do TST.
“O disposto no artigo 15, da Lei nº 7.773/89, não é aplicável aos empregados de Sociedade de Economia Mista, em face do disposto no artigo 173, § 1º, da Constituição Federal que a equipara às empresas privadas” (TST – 3ª T – RR nº 83.236 – Rel. Min. José Luiz Vasconcellos – j. 25/8/1994 – DJ 24/3/1995 – p. 6.984).
“Garantia de emprego. Servidor público. Lei nº 8.713/93. Empresa Pública ou de economia mista. A Lei Eleitoral nº 8.713/93 não se aplica às empresas públicas ou de economia mista. Servidores públicos só compõem os quadros das Autarquias e fundações públicas” (TRT – 3ª R – 5ª T – RO nº 2.526/95 – Rel. Antônio Fernando Guimarães – DJMG 20/1/1996).
Quanto ao destinatário da norma, existem regras que se aplicam aos empregados públicos e privados indistintamente, como, por exemplo, aquelas que dizem respeito ao alistamento e transferência do título eleitoral e implicações legais para aqueles que deixam de votar, e algumas outras direcionadas apenas aos servidores públicos, v.g., concessão de reajustes, contratação e dispensa no período eleitoral.
Dentro desse prisma, necessário se faz analisar também a condição do empregado quanto à disputa eleitoral, ou seja, se ele detém a qualidade de candidato a cargo eletivo ou não. Os empregados candidatos a cargo eletivo possuem alguns regramentos específicos, como a possibilidade de interrupção ou suspensão do contrato de trabalho para se dedicar à campanha eleitoral e a necessidade de desincompatibilização no prazo previsto pela legislação eleitoral.
5.2. As Limitações da Legislação Eleitoral para a realização de Concurso Público
Inúmeras normas que disciplinaram o processo eleitoral no País trouxeram restrições quanto à contratação, alteração e mesmo a dispensa de empregados e de funcionários públicos no período eleitoral.
Nos últimos 30 anos, o tema foi tratado por várias leis, primeiramente, pelo art. 13, da Lei nº 6.094, de 15/8/1974. Em seguida, a matéria foi disciplinada pelos art. 9º, da Lei nº 6.978, de 19/1/1982 (estabeleceu normas para a realização de eleições em 1982); art. 16, da Lei nº 7.332, de 1º/7/1985 (eleição de 1985); art. 19, da Lei nº 7.493, de 17/6/1986 (eleição de 1986); art. 27, da Lei nº 7.664, de 29/6/1988 (eleição de 1988); art. 15, da Lei nº 7.773, de 8/6/1989 (eleição de 1989); art. 29, da Lei nº 8.214, de 24/7/1991 (eleição 1992) e art. 81, da Lei nº 8.713, de 30/9/1993 (eleição de 1994). A Lei nº 9.100, de 29/9/1995 (eleição de 1996), não dispôs sobre a matéria.
Nos dias atuais, a questão está disciplinada pelo art. 73, da Lei nº 9.504. De modo que, no período de 3 meses que antecede o pleito, até a data da posse dos eleitos, é vedado nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, sob pena de nulidade de pleno direito (art. 73, V).
No próprio art. 73, V, encontram-se as exceções à regra de vedação de contratar: a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança; b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos tribunais ou conselhos de contas e dos órgãos da Presidência da República; c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início do período eleitoral; d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo; e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários.
Como o próprio art. 73, d, menciona, o legislador autorizou a nomeação e contratação de pessoal necessário à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços essenciais.
“CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO EM CAMPANHA ELEITORAL. ART. 73, INCISO V, ALÍNEA ‘D’, DA LEI Nº 9.504/97. 1. Contratação temporária, pela Administração Pública, de professores e demais profissionais da área da educação, motoristas, faxineiros e merendeiras, no período vedado pela lei eleitoral. 2. No caso da alínea d do inciso V da Lei nº 9.504/97, só escapa da ilicitude a contratação de pessoal necessária ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais. 3. Em sentido amplo, todo serviço público é essencial ao interesse da coletividade. Já em sentido estrito, essencial é o serviço público emergencial, assim entendido aquele umbilicalmente vinculado à ‘sobrevivência, saúde ou segurança da população’. 4. A ressalva da alínea d do inciso V do art. 73 da Lei nº 9.504/97 só pode ser coerentemente entendida a partir de uma visão estrita da essencialidade do serviço público. Do contrário, restaria inócua a finalidade da lei eleitoral ao vedar certas condutas aos agentes públicos, tendentes a afetar a igualdade de competição no pleito. Daqui resulta não ser a educação um serviço público essencial. Sua eventual descontinuidade, em dado momento, embora acarrete evidentes prejuízos à sociedade, é de ser oportunamente recomposta. Isso por inexistência de dano irreparável à ‘sobrevivência, saúde ou segurança da população’. 5. Modo de ver as coisas que não faz tábula rasa dos deveres constitucionalmente impostos ao Estado quanto ao desempenho da atividade educacional como um direito de todos. Não cabe, a pretexto do cumprimento da obrigação constitucional de prestação ‘do serviço’, autorizar contratação exatamente no período crítico do processo eleitoral. A impossibilidade de efetuar contratação de pessoa em quadra eleitoral não obsta o poder público de ofertar, como constitucionalmente fixado, o serviço da educação” (TSE – RESPE nº 27563 – Rel. Min. Carlos Augusto Ayres de Freitas Brito – j. 12/12/2006 – DJ 12/2/2007 – p. 135).
Admite-se a realização de concurso público,[22] inclusive com homologação de resultado, porém, sem que ocorram nomeações no período eleitoral.
“Concurso público. Abertura por prefeito durante o período eleitoral. Possibilidade. O Prefeito Municipal, mesmo durante o período eleitoral, pode abrir o concurso público, realizá-lo e homologar o resultado; mas não pode fazer as nomeações dos concursados, por motivo de vedação legal, conforme o que dispõe o art. 13 da Lei nº 6.091/74” (TJ – ES – 2ª Cam. Cível – AP nº 03598900201 – Rel. Júlio César Costa de Oliveira – j. 18/4/2000 – in ADCOAS 8180686).
No TST, é predominante o entendimento de que também se aplicam aos empregados das empresas públicas e de sociedade de economia mista as restrições da contratação, da dispensa e da transferência prevista na legislação eleitoral (OJ nº 51, SDI-I).
Em questão semelhante, o TST adotou posição diversa. A Corte Trabalhista entende que ao servidor público celetista (administração direta, autárquica e fundacional) é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF, antes da EC nº 19 (Súm. nº 390, I), porém, não a estende aos empregados das empresas públicas e as sociedades de economia mista, pois o art. 173, § 1º, II, determina a sujeição dessas entidades ao regime jurídico próprio das empresas privadas (Súm. nº 390, II).
No caso de descumprimento do art. 73, a conduta vedada será suspensa imediatamente, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis ao pagamento de multa (art. 73, § 4º), sendo que no caso de violação dos incisos I, II, III, IV e VI, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma (art. 73, § 5º).
Importante destacar que constitui ilícito eleitoral o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública (art. 41-A, Lei nº 9.504, acrescido pela Lei nº 9.840/99).[23] [24] Segundo posição firmada no TSE, não se exige de que o ato tenha sido praticado diretamente pelo candidato, sendo suficiente que haja participado ou com ele consentido.[25]
Além disso, dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que não seja aceita configura ilícito penal eleitoral (art. 299, Código Eleitoral), com pena de reclusão de até 4 anos e pagamento de 5 a 15 dias-multa.
Segundo o entendimento do TSE, a reclamação por descumprimento do previsto nos art. 73[26] e art. 41-A[27], devem ser apresentadas até a data do pleito, sob pena de perda do interesse de agir.
Apesar das restrições da legislação eleitoral, não é incomum a ocorrência de contratações no período eleitoral. Diante da contratação irregular, têm-se 4 posições.
A primeira posição entende que os atos de admissão realizados pelo ente público, durante o período eleitoral, são nulos, pois são imperfeitos, inválidos e ineficazes, eivados de abuso de poder e em afronta aos princípios da legalidade e moralidade administrativa. Trata-se de vínculo impossível.
“Município. Admissão. Eleição. Nulidade. Abuso de poder. Princípio da legalidade. Princípio da moralidade. Os atos de admissão realizados pelo ente público, durante o período eleitoral, são nulos, eis que são imperfeitos, inválidos e ineficazes, eivados, portanto, de abuso de poder e em afronta aos princípios da legalidade e moralidade administrativa” (TRT – 1ª R – 3ª T – RO nº 02924/95 – Rel. Nídia de Assunção Aguiar – j. 9/4/1997 – DORJ 16/5/1997).
“Município. Relação de emprego. Eleição. Nulidade. Contrato de trabalho. Rescisão. O fato gerador das verbas rescisórias é a existência do vínculo empregatício, tácito ou não entre empregados e empregador. Se a existência deste vínculo era impossível, face proibição legal, não há que se falar em verbas rescisórias. Recurso voluntário e ex officio que se dá provimento” (TRT – 1ª R – 1ª T – RO nº 14.193/90 – Rel. Edilson Gonçalves – j. 3/11/1992 – DORJ 30/11/1992).
Outro entendimento, posição vitoriosa no TST, reconhece a nulidade absoluta da contratação, mas entende devido o salário do período trabalhado, tendo em vista a impossibilidade do retorno ao status quo ante, uma vez que a força de trabalho já fora despendida e implicaria enriquecimento sem causa para a administração pública se não houvesse qualquer remuneração.
“Contratação em período pré-eleitoral. Nulidade do contrato de trabalho. Nos termos da jurisprudência desta Corte, de acordo com o artigo 19 da Lei nº 7.493/86, é nula a contratação de empregado por pessoa jurídica de Direito Público em período pré-eleitoral, gerando tão-somente direito ao pagamento do equivalente aos salários em sentido estrito” (TST – 1ª T – RR nº 559.276/1999-8 – Rel. Min. Aloysio Silva C. da Veiga – DJ 14/2/2003 – p. 474).
“RECURSO DE REVISTA. RELAÇÃO DE EMPREGO. ADMISSÃO EM PERÍODO PRÉ-ELEITORAL. EFEITOS. 1. Conforme dispõe a literalidade do art. 19, da Lei nº 7493/86, é nula de pleno direito à contratação de empregados e servidores, pela administração pública, no período eleito pela norma em referência. 2. Produzindo o vício efeitos da modalidade ex tunc, nenhuma parcela, à exceção das horas efetivamente trabalhadas, respeitado o salário mínimo fixado em Lei, é devida. Precedentes. 3. Recurso conhecido e parcialmente provido” (TST – 1ª T – RR nº 737922 – Rel. Min. Conv. João Amílcar Pavan – DJU 14/11/2002).
“Contratação durante o período eleitoral. Contrato nulo. Não há qualquer incompatibilidade entre as normas constitucionais de proteção ao trabalho e o art. 19 da Lei nº 7.439/96. O escopo da vedação de contratação de servidor pelo regime celetista durante o período eleitoral consiste em preservar a moralidade administrativa, garantindo que também o acesso ao trabalho na administração pública seja pautado pelos princípios de probidade, legalidade e impessoalidade, impedindo que a atuação estatal se desvie do objetivo de alcançar o bem comum durante as campanhas eleitorais. Recurso de revista provido” (TST – 4ª T – RR nº 677.878 – Rel. Min. Milton de Moura França – j. 7/3/2001 – DJ 30/3/2001 – p. 696).
É uma posição que vinha sendo construída pela jurisprudência mesmo antes da Lei Eleitoral nº 9.504.
Essa posição tem a mesma lógica jurídica desenvolvida para declarar a nulidade dos contratos de trabalho celebrados pela administração pública sem aprovação em concurso público (art. 37, II, § 2º, CF, Súm. nº 363, TST, OJ nº 10, SDI-II), ante a ausência de elemento essencial à validade do ato jurídico.
Para alguns, no entanto, a irregularidade administrativa de contratar no período eleitoral não tem o condão de anular o contrato de trabalho existente, de maneira que se garante ao empregado todos os direitos trabalhistas, com justificativa no princípio da primazia da realidade.
Por fim, já se defendeu que findo o prazo previsto na legislação eleitoral, com a continuidade da prestação de serviços, o contrato de trabalho se convalida, até porque a contratação somente se operou após aprovação em concurso público. A vedação para a contratação seria temporária, o que não impediria a validação do ato de contratação após o termo final do período eleitoral.
“Servidor Público. Período Eleitoral. Nulidade. Inobstante a proibição de contratação de pessoal prevista no artigo 16 da Lei Federal nº 7.332/85, considera-se válido o contrato de trabalho no período posterior à vedação nela prevista” (TRT – 13ª R – RO nº 590/97 – Rel. Ana Maria Ferreira Madruga – j. 30/7/1997 – DJ 25/10/1997 – p. 13).
“Remessa ex officio. Investidura irregular. Vedação legal de contratação pelo ente público. O contrato celebrado pelo ente público, em período que havia proibição de contratação, em virtude de lei eleitoral, só produz efeitos após o término da vedação” (TRT – 20ª R – REO nº 974/98 – Rel. Stênio Gonçalves Andrade – j. 7/7/1998 – DJ 27/7/1998).
“RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE TRABALHO. PERÍODO PRÉ-ELEITORAL. NULIDADE. EFEITOS. CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. Nos termos do art. 16 da Lei nº 7.332/85, é proibida a contratação de servidor público, regido por estatuto ou pela Consolidação das Leis do Trabalho, no período compreendido entre 15 de julho de 1985 e 1º de janeiro de 1986, revestindo-se de nulidade contrato de trabalho celebrado nesse período. Contudo, a continuidade na prestação de serviços à administração pública pelo empregado, após o decurso do período eleitoral, acarreta a formação de um novo e tácito contrato de trabalho, pois efetuado sob a égide da Constituição de 1967, em que se autorizava a contratação de empregado público sem prévia aprovação em concurso público. Recurso de revista não conhecido” (TST – 8ª T. – RR nº 745169 – Rel. Min. Dora Maria da Costa – j. 5/12/2007 – DJ 14/12/2007).
A anulação do concurso público após a nomeação e posse dos servidores estatutários somente é possível mediante a instauração de processo administrativo regular, de modo a observar os princípios constitucionais (devido processo legal, contraditório e ampla defesa) (art. 41, § 1º, II, CF, Súm. nº 20 e nº 21, STF).[28]
Admitindo a estabilidade do art. 41, CF, antes da EC nº 19, aos empregados públicos concursados[29] (Súm. nº 390, I, TST), também seria de se aplicar as Súm. nº 20 e nº 21, do STF, às relações celetistas.
Já para o candidato que deu causa a nulidade do pleito por violação do art. 41-A e 73, o TSE não admite que o mesmo participe da renovação do pleito.
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2004. PROVIMENTO. CASSAÇÃO. REGISTRO. CANDIDATO. CONDENAÇÃO. ART. 41-A E 73 DA LEI Nº 9.504/97. CAUSA. NULIDADE. PLEITO. PARTICIPAÇÃO. RENOVAÇÃO. ELEIÇÕES. IMPOSSIBLIDADE. Nos termos da jurisprudência desta Corte, havendo renovação da eleição, em obediência ao artigo 224 do CE, o candidato que tiver dado causa à nulidade da eleição não poderá participar da renovação do pleito, em respeito ao princípio da razoabilidade. Agravo regimental desprovido” (TSE – RESPE nº 26140 – Rel. Min. Ari Pargendler – j. 12/6/2007 – DJ 1/8/2007 – p. 235).
6. Controle do Concurso Público pelo Poder Judiciário
O STF já entendeu que cabe ao Poder Judiciário, em concurso público, exercer o controle jurisdicional “quando não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca examinadora, na formulação das questões ou na avaliação das respostas, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se continham no programa do certame, dado que o edital – nele incluído o programa – é a lei do concurso” (STF – RE nº 434.708 – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – j. 21/6/2005 – DJ 9/9/2005).
Na análise do concurso para magistratura do Estado do Espírito Santo, o STJ considerou que houve violação ao princípio da igualdade quando o candidato teve seu pedido de arredondamento de nota final indeferido, por haver vedação expressa no edital, e outros candidatos tiveram êxito no pedido de revisão da correção de suas provas (STJ – 5ª T. – RMS nº 15836-ES – Rel. Min. Laurita Vaz – j. 10/2/2004 – DJ 12/4/2004 – p. 221).[30] Contudo, não se pode exigir o arredondamento de nota sem previsão expressa no edital e não há violação ao princípio da igualdade, quando o arredondamento de nota se dá ou não por motivos distintos entres os candidatos (STJ – 5ª T. – RMS nº 22705-ES – Rel. Min. Feliz Fischer – j. 18/10/2007 – DJ 10/12/2007 – p. 400).
A análise do edital, das etapas do concurso público e da legalidade das contratações realizadas por parte do Poder Judiciário será de competência da Justiça do Trabalho, se o mesmo envolver a contratação de empregados públicos ou servidores temporários regidos pela CLT, vez que sua realização diz respeito à etapa prévia de celebração do contrato de trabalho.[31] O edital do concurso não será mero ato de natureza administrativa, mas também cláusulas do contrato de trabalho, equiparando-se ao regulamento de empresa.
Por sua vez, se o concurso público disciplinar a contratação de servidores estatutários, a competência da Justiça Comum, sendo da Justiça Federal quando se tratar de servidores públicos federais e será da Justiça Estadual quando cuidar de servidores estaduais e municipais.
Contudo, não foi esse o entendimento do STJ, ao julgar conflito de competência envolvendo o concurso público de servidores regidos pela CLT, entendeu que a competência para analisar a legalidade do edital e do concurso público, por serem atos administrativos, é da Justiça Comum (STJ – 3ª S. – CC nº 89080-RN – Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima – j. 27/2/2008).
Informações Sobre os Autores
Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante
Advogado. Professor da Faculdade de Direito Mackenzie. Ex-coordenador do Curso de Direito da Faculdade Integrada Zona Oeste (FIZO). Ex-procurador chefe do Município de Mauá. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP/PROLAM). Autor de várias obras jurídicas em co-autoria com Francisco Ferreira Jorge Neto, com destaques para: Direito do Trabalho (4ª ed., no prelo) e Direito Processual do Trabalho (3ª ed., 2007), todos pela Lumen Juris.
Francisco Ferreira Jorge Neto
Desembargador Federal do Trabalho (TRT 2ª Região). Coordenador e Professor da Pós-Graduação Lato Sensu do Pró-Ordem em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho em Santo André (SP). Professor Convidado: Curso de Pós-Graduação Lato Sensu da Escola Paulista de Direito. Mestre em Direito das Relações Sociais – Direito do Trabalho pela PUC/SP. Autor de livros, com destaques para: Direito do Trabalho (5ª edição) e Direito Processual do Trabalho (4ª edição), publicados pela Lumen Juris, em co-autoria com Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante