A saída do
jurista Miguel Reale Júnior do comando do Ministério da Justiça tem
conseqüências para o Brasil muito mais sérias do que a simples troca de um
colaborador do governo Fernando Henrique. Representa, em última análise, uma
vitória do crime organizado, justamente no momento em que a sociedade se
mobiliza no combate à criminalidade e à violência urbana que assola este País.
Não há como não concordar com a declarações do ilustre jurista, ao deixar o
Ministério, quando diz que “o crime organizado deve estar festejando a esta
hora, soltando fogos”.
Miguel
Reale Júnior estava desenvolvendo, no Ministério da Justiça, um trabalho sério
e profundo, na tentativa de passar a limpo a
segurança da sociedade e articulando, com o apoio da Polícia Federal, um
confronto direto contra o crime organizado nos principais centro urbanos do
País, cujos resultados não tardariam em aparecer. Mas, nessa
batalha entre a lei e o crime, entrou a presunção política, colocando a perder
todo um trabalho já elaborado. A desautorização que o ex-Ministro sofreu por
parte do Presidente da República é inadmissível e inconseqüente, atendendo
apenas aos escusos interesses eleitoreiros de grupos que não demonstram a menor
preocupação com a efetiva segurança do cidadão.
Ganha,
mais uma vez, a odiosa impunidade, pois tanto o Presidente da República, alguns
dias atrás, quanto o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, haviam
autorizado Miguel Reale a dar continuidade ao processo de intervenção no Estado
do Espírito Santo, mergulhado em acusações de corrupção e ligação com o
narcotráfico e o crime organizado. Um Estado onde o presidente da Assembléia
Legislativa responde a nada menos do que 14 processos criminais.
Perde a
Justiça, instância certa e correta para analisar e julgar a procedência do pedido de intervenção. E isso
é importante que se frise: compete única e exclusivamente ao Supremo Tribunal
Federal julgar e decidir pela intervenção, cujo encaminhamento foi precocemente
ceifado pelo Procurador-Geral da República, Geraldo Brindeiro, com aprovação do
Presidente República, que voltou atrás de sua decisão anterior e desautorizou
publicamente o trabalho de seu fiel e honrado colaborador, em nome de uma
frágil e questionável prudência política.
Se a
intervenção federal em um
Estado pode ser considerada uma violência administrativa,
principalmente nesse período eleitoral em que as Unidades da Federação se
preparam para eleger seus novos governantes, o recuo do Presidente e as ações
de seu procurador-geral foram atos vergonhosos, pois o que está em jogo são
vidas humanas, além da demonstração pública e transparente da vontade política
de um governo em enfrentar o crime e a
corrupção.
Perde,
enfim, toda a Nação e a sociedade brasileira, pois impediu-se a
possibilidade do Supremo Tribunal
Federal analisar a questão e discutir o problema do Espírito Santo. Perde o
Brasil uma rara oportunidade de combater a conivência com o crime organizado,
a corrupção e a impunidade. Perde o
Brasil a possibilidade de se combater as violações aos direitos humanos.
Na luta
insana de toda uma Nação contra o crime, perde o cidadão e vence o bandido.
Tudo por uma mera questão de conveniência política.
Informações Sobre o Autor
Ademar Gomes
presidente da Acrimesp – Associação dos Advogados Criminalistas do Estado de São Paulo.