Resumo: O presente trabalho consistirá na análise da obrigatoriedade do depósito recursal frente ao exercício do princípio constitucional do amplo acesso à justiça no âmbito trabalhista, quando no pólo passivo da ação figurar um empregador no porte de Micro ou Pequeno Empresa. Será feito uma abordagem sobre a aplicação do princípio da proteção na lide trabalhista, bem como uma das formas de sua exteriorização que é o depósito recursal. Será analisado a posição jurisprudencial, que por vezes tem indeferido o benefício da assistência judiciária gratuita ao empregador, e quando concedido, não tem ampliado este benefício ao depósito recursal, e o mandamento constitucional que impõe ao Estado garantir a todos, pessoas físicas ou jurídicas, o amplo acesso à justiça. E por fim será analisado se a concessão da assistência judiciária gratuita abarcando o depósito recursal é permitido pela legislação processual do trabalho e se não fere o Princípio da Proteção.[1]
Palavras-chave: Acesso à Justiça. Depósito Recursal. Micro e Pequena Empresa. Princípio da Proteção.
Sumário: Introdução. 1. O Princípio da Proteção no Processo Trabalhista. 1.2. Depósito Recursal. 2. As Micro e Pequenas Empresas. 2.1. Do Surgimento ao Tratamento Jurídico Diferenciado e Simplificado. 2.2. Do Conceito Atual. 3. O Amplo Acesso à Justiça na Lide Trabalhista. 3.1. O Obstáculo denominado Depósito Recursal e a possibilidade de sua isenção. 3.2. Perspectivas Legislativas Futuras. Conclusão. Referências Bibliográficas. Anexos.
INTRODUÇÃO
Na Justiça do Trabalho, assim como na Justiça Comum, para se interpor um recurso é necessário o pagamento de custas e emolumentos, e na hipótese de recurso do empregador contra condenação em valores é necessário ainda a efetivação do depósito recursal.
O depósito recursal se por um lado tem a função de evitar a interposição de recursos protelatórios por parte do empregador, por outro pode se tornar um obstáculo para que os Micro e Pequenos Empresários em dificuldades econômicas exerçam efetivamente o direito de acesso à justiça previsto na Carta Constitucional de 1988.
Ocorre que os micros e pequenos empresários possuem grande importância no cenário econômico e social do país, sendo os mantenedores de mais da metade dos empregos formais do Brasil, tamanha é essa importância que lhes foram conferido proteção especial no texto Constitucional, que concede um tratamento diferenciado e simplificado para que esses empreendimentos possam sobreviver aos grandes conglomerados de empresas.
Por outro lado, a assistência judiciária gratuita, mandamento constitucional, é conferida à toda pessoa que comprove insuficiência econômica para arcar com as custas do processo independente de ser natural ou jurídica, entretanto, a jurisprudência em sua grande maioria vem entendendo que só faz jus a este benefício o empregado, sendo raramente concedido ao empregador e quando concedido, não abarcando o depósito recursal, uma vez que o mesmo não figura como taxa ou emolumento judicial , mas sim como garantia do juízo da execução, inibindo desta forma exercício do amplo acesso à Justiça, principalmente dos micro e pequenos empresários que muitas vezes não possuem disponibilidades para efetivar o recolhimento do referido depósito.
Para garantir a efetividade deste princípio processual constitucional aos empregadores deste porte, surge a possibilidade de se conceder a isenção do depósito recursal.
Todavia a concessão dessa isenção deve ser medida para que não venha favorecer os empregadores que queiram simplesmente protelar a discussão judicial em prejuízo do trabalhador.
Objetivando-se uma lide trabalhista equilibrada, a concessão da isenção do depósito recursal deve estar condicionada as micro e pequenas empresas quando estas forem beneficiárias da justiça gratuita, pois desta forma não se traria nenhum risco à proteção estatal conferida aos trabalhadores tendo em vista nestes casos não existir um desnível tão grande entre as partes.
Diante disto o presente trabalho irá avaliar se é possível ou não a concessão da isenção do depósito recursal, e se essa isenção não irá ferir o princípio da proteção trabalhista.
1. O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO NO PROCESSO TRABALHISTA
Na lide Trabalhista, parte-se da idéia de que as partes são desiguais, sendo o trabalhador a parte hipossuficiente da relação processual. Com o objetivo de colocar as partes num mesmo patamar, a legislação processual do trabalho criou mecanismos de proteção ao trabalhador. Todos estes mecanismos são formas de exteriorização do Princípio da Proteção. Neste sentido, Wagner D. Giglio[2] menciona que:
“Embora muitas outras fossem necessárias, algumas normas processuais de proteção ao trabalhador já existem, a comprovar o princípio protecionista. Assim, a gratuidade do processo, com isenção de pagamento de custas e despesas, aproveita aos trabalhadores, mas não aos patrões; a assistência judiciária gratuita é fornecida ao empregado, mas não ao empregador; a inversão do ônus da prova através da presunções beneficia o trabalhador, nunca ou raramente o empregador; o impulso processual ex officio favorece o trabalhador, já que o beneficiário dos serviços, salvo raras exceções, é o réu, demandado, e não aufere proveito da decisão: na melhor das hipóteses, deixa de perder.”
Além de todos estes mecanismos que beneficiam o trabalhador na lide trabalhista, existe a previsão da efetivação do depósito recursal, para o empregador condenado a obrigação de pagamento em pecúnia, que deseja ver sua matéria reapreciada em outra Instância.
1.2. Depósito Recursal
O legislador criou o depósito recursal, através do Decreto-Lei nº 75, de 21 de novembro de 1966, com o objetivo de frear a interposição sistemática de recursos protelatórios por parte dos empregadores, postergando indefinidamente o cumprimento das sentenças, em detrimento da necessidade de impor efetividade ao processo, face o caráter alimentar das verbas discutidas.
O depósito recursal, previsto no §1º do art. 899 da CLT, é exigência legal para a interposição de determinados recursos, e não possui a natureza jurídica de taxa judicial ou emolumento, mas sim de “garantia de execução futura” conforme interpretação dada pelo TST, através da Instrução Normativa 03 de 12/03/1993[3].
O Depósito Recursal é feito na conta vinculada do FGTS do empregado ou conta para depósito judicial na CEF, os valores atualmente vigentes foram fixados pelo ATO SEJUD.GP do TST nº 493/2008 e são de R$5.357,25 para Recurso Ordinário e R$10.714,51 para Recurso de Revista, Embargos, Recurso Extraordinário e Ação Rescisória. Na hipótese de o valor da condenação ficar abaixo dos valores mencionados, o depósito estará limitado ao valor da condenação.
O Depósito não será exigido quando interpuser recurso as Pessoas Jurídicas de Direito Público[4], o Ministério Público do Trabalho por falta de determinação legal e a massa falida, entretanto este benefício não foi estendido às empresas em liquidação extrajudicial[5].
2. AS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS
2.1. Do Surgimento ao Tratamento Jurídico Diferenciado e Simplificado
A economia nacional passou por diversas crises durante a década de 80, devido as grandes mudanças políticas ocorridas naquele período. A instabilidade econômica acarretou numa série de consequências, como o desequilíbrio fiscal, monetário, cambial, aumento vertiginoso da inflação e um dos maiores índices de desemprego visto na história. Muitos profissionais, até mesmo qualificados, se viram enfrentando a situação de serem dispensados de seus postos de trabalho, quando não viam o encerramento das atividades de seu empregador sem sequer receber os seus direitos trabalhistas.
Devido a todos estes acontecimentos, muitos desses ex-empregados procuraram a atividade empresarial como alternativa à própria subsistência, surgindo então as micro empresas.
Por sua vez, o Legislador Constituinte visualizando a importância das Micro Empresas no novo cenário econômico e social do país, fez constar em seu texto normas programáticas através do inciso IX art. 170[6] e art. 179[7] , que asseguram o tratamento jurídico diferenciado e simplificado as micro e pequenas empresas, para fortalecer este tipo de empreendimento.
2.2. Conceito Atual:
Por tratar-se de uma norma programática, coube ao Legislador Infraconstitucional elaborar a regulamentação das Micro e Pequenas Empresas. Hodiernamente os conceitos de Micro Empresa e Empresa de Pequeno Porte estão previstos no artigo 3º da Lei Complementar número 123, de 14 de dezembro de 2006:
“Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002, devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:
I – no caso das microempresas, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais);
II – no caso das empresas de pequeno porte, o empresário, a pessoa jurídica, ou a ela equiparada, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 240.000,00 (duzentos e quarenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 2.400.000,00 (dois milhões e quatrocentos mil reais).
§1º Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.”
Observa-se que o legislador estabeleceu como critério para se classificar a empresa como Micro ou Pequena, a receita bruta anual que nada mais é do que o total do seu faturamento.
Atualmente, segundo o Anuário do Trabalho SEBRAE/DIESSE 2008[8], as Micros e Pequenas Empresas são as que mais geram emprego e renda no Brasil, representando 51% dos empregos formais no país.
3 – O AMPLO ACESSO A JUSTIÇA NA LIDE TRABALHISTA
O Estado assumiu o monopólio da jurisdição. Em razão deste monopólio, ao Estado incumbe garantir a todos aqueles que necessitam deduzir pretensão em juízo, independentemente de serem pessoas físicas ou jurídicas, a mais ampla, efetiva, adequada e tempestiva prestação jurisdicional. Assim, a Constituição da República disciplina essa garantia no seu art. 5º, XXXV, dizendo que: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Não basta, contudo, que se garanta o simples acesso à justiça. É indispensável que desse acesso advenha uma prestação jurisdicional eficaz e efetiva, com presteza e pacificação social com justiça. O Estado tem que garantir que as partes tenham acesso à ordem jurídica justa, ou seja, obtenção da justiça substancial, nesse sentido se posiciona Cândido Rangel Dinamarco[9]:
“Não obtém justiça substancial quem não consegue sequer o exame de suas pretensões pelo Poder Judiciário e também quem recebe soluções atrasadas ou mal formuladas para suas pretensões, ou soluções que não lhe melhorem efetivamente a vida em relação ao bem pretendido. Todas as garantias integrantes da tutela constitucional do processo convergem a essa promessa-síntese que é a garantia do acesso à justiça assim compreendido.”
Assim, para que se atinjam esses objetivos é essencial que a Jurisdição esteja resguardada de inúmeras garantias, para que ninguém dela se distancie, como é o caso da Justiça Gratuita, prevista no art 5º, inciso LXXIV[10] da Carta Constitucional de 1.988.
A Justiça Gratuita além de fazer valer importante garantia constitucional, disponibiliza ao requerente, a certeza de que, caso comprove sua impossibilidade de arcar com as despesas, estará dispensado das mesmas.
O benefício da Justiça Gratuita, é uma espécie do instituto da assistência judiciária gratuita, enquanto no primeiro há somente a isenção das custas, emolumentos, taxas e honorários periciais o segundo abarca também o patrocínio da causa.
No processo do trabalho, a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, que foi recepcionada pela nova ordem constitucional, que disciplina a concessão da assistência judiciária é interpretada conjuntamente com a Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970. O artigo 14[11] da lei 5.584/70 restringe a concessão deste benefício aos trabalhadores que estejam assistidos pelo sindicato da categoria e não percebam salário superior ao dobro do mínimo legal.
Assim, em princípio, somente a pessoa física pode se beneficiar da assistência judiciária gratuita. Infelizmente a posição majoritária dos Tribunais é de se não conceder o benefício da Justiça Gratuita ao empregador. O julgado abaixo nos mostra um posicionamento da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, tendo como relatora a Juíza Helena Rosa Mônaco da Silva Lins Coelho:
“JUSTIÇA GRATUITA – EMPRESA RECLAMADA – IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO – Não se afigura, da leitura do artigo 14 da lei 5.584/70, a possibilidade de deferimento da gratuidade da justiça à empresa reclamada. Trata-se de benefício exclusivo do trabalhador que pleiteia em juízo verbas oriundas de relação de emprego. Há expressa referência a “trabalhador” – Leia-se empregado -, assim como a “salário”, no caput e parágrafo 1º do mencionado dispositivo. Não obstante, quando do exercício da atividade empresarial, presume-se a capacidade econômica do empregador, sendo que os riscos inerentes àquela são de sua exclusiva responsabilidade, na forma do artigo 2º da consolidação das leis do trabalho”.[12]
Essa interpretação literal do art. 14 é o argumento sustentado por esta corrente para não se conceder a Justiça Gratuita ao empregador.
Entretanto, a vigente ordem constitucional não distingue a pessoa física da pessoa jurídica para fins de concessão da assistência judiciária gratuita e integral. Esse também é o entendimento do Professor Sérgio Pinto Martins[13]:
“O inciso LXXIV do art 5º da Constituição não faz distinção entre pessoas físicas ou jurídicas, mas faz referência à pessoa que comprove insuficiência de recursos. Assim, a assistência poderá ser concedida à pessoa jurídica, desde que comprove insuficiência de recursos.”
Analisando-se o instituto sob a ótica Constitucional, verifica-se a total compatibilidade de suas disposições albergarem também as pessoas jurídicas, tendo em vista que existem situações em que uma pessoa jurídica esteja numa situação econômica que não seja possível pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio.
Felizmente, alguns magistrados já compartilham deste entendimento, concedendo a Justiça Gratuita ao pequeno empregador, quando este não tem condições de suportar o ônus imposto pela legislação, atendendo os preceitos constitucionais processuais. Esse foi o posicionamento do Ministro do TST José Luciano de Castilho Pereira, relator do Recurso de Revista nº TST-RR-728010/2001.0, que concedeu à uma Micro Empresa os benefícios da Justiça Gratuita:
“INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA DO EMPREGADOR. JUSTIÇA GRATUITA. O Reclamado, dono de uma firma individual, enquadrado como microempresário, ao interpor o Recurso Ordinário, declarou, de próprio punho, sob as penas da lei, ser pobre na acepção jurídica do termo, não tendo condições de residir em Juízo pagando as custas do processo sem prejuízo do próprio sustento e dos respectivos familiares. Assim, não se apresenta razoável, diante da peculiaridade evidenciada nos autos, a deserção declarada pelo Tribunal Regional, na medida em que o entendimento adotado acabou por retirar do Reclamado o direito à ampla defesa, impedindo-o de discutir a condenação que lhe foi imposta em 1º Grau. A tese lançada na Decisão revisanda vai de encontro aos termos do art. 5º da Constituição Federal, pois tal dispositivo, em seu inciso LXXIV, estabelece textualmente que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos, sem fazer qualquer distinção entre pessoas física e jurídica. Recurso conhecido e provido”.[14]
Como observado através deste julgado, foi concedido ao Empregador Micro Empresário, que passava por dificuldades financeiras o Benefício da Justiça Gratuita, entretanto, o Tribunal de Origem manteve a deserção pelo motivo do não recolhimento do depósito recursal.
3.1. O Obstáculo denominado Depósito Recursal e a possibilidade de sua isenção.
O depósito recursal, como já abordado no presente trabalho, não possui a natureza jurídica de taxa judicial ou emolumento, mas sim de “garantia de execução futura”. Este entendimento é motivo pelo qual os recursos são julgados desertos quando não há a efetivação do seu recolhimento, mesmo sendo pequenas empresas e beneficiárias da Justiça Gratuita.
Esse foi o posicionamento da 5ª Turma do TST ao julgar o Recurso de Revista 338/2002, figurando como relator o Ministro João Batista Brito Pereira:
“Ementa: RECURSO DE REVISTA. JUSTIÇA GRATUITA RECLAMADO. ALCANCE. DEPÓSITO RECURSAL. DESERÇÃO. As isenções asseguradas pela Lei 1.060/50 não abrangem o depósito recursal, uma vez que este não detém a natureza de taxa ou emolumento judicial, mas de garantia de juízo, com vistas à execução, nos termos do art. 899, § 1º, da CLT e da Instrução Normativa 3/93, item I, do TST. Assim, embora concedida a assistência judiciária ao empregador, esse benefício não alcança o depósito recursal. Recurso de Revista de que não se conhece”.[15]
Essa posição se mostra antagônica, pois como poderá uma empresa ser considerada pobre, nos termos da lei, fazer o recolhimento do depósito recursal sendo que não consegue sequer suportar as despesas do processo.
Ocorre ainda que a maioria dos empregadores do Brasil são micros e pequenos empresários, que muitas vezes padecem por falta de capital de giro, sendo este fator responsável por até 39% das causas de mortalidade destes empreendimentos, conforme estudos técnicos efetuados pelo SEBRAE[16]. A falta de capital de giro acrescido aos altos impostos e encargos sociais, e que frente a exigência do depósito previsto no §1º art. 899 CLT podem invibializar ou até mesmo impossibilitar que as empresas deste porte em dificuldades financeiras possam ver apreciado o seu recurso em grau superior.
Como o depósito recursal previsto no art. 899 da CLT, é anterior à CFRB/1988, segue-se que deve ser interpretado à luz da nova ordem constitucional, que garante à todos que não possuem condições, assistência jurídica integral e gratuita. Nesse rumo, alguns pronunciamentos judiciais vêm entendendo pela possibilidade de dispensa do depósito recursal às micro e pequenas empresas, como é o caso do julgado do Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região, sendo o Juiz relator Carlos Alberto Pedreira Cardoso:
“JUSTIÇA GRATUITA – POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO AO EMPREGADOR. A realidade sócio-econômica do País deve ser levada em consideração na análise dos fatos, pelo que o microempresário em dificuldades financeiras não deve ser privado da defesa de seus direitos em razão de não ter condições de efetivar o depósito recursal”.[17]
O Tribunal Regional da 13ª Região, em Acórdão redigido pelo Desembargador Afrânio Neves de Melo, também compartilhou deste entendimento ao julgar o Agravo de Instrumento 099/2001:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEPÓSITO RECURSAL. EMPREGADOR QUE NÃO POSSUI CONDIÇÕES DE EFETIVÁ-LO. POSSIBILIDADE DE DISPENSA EM CASOS EXTRAORDINÁRIOS. A assistência judiciária gratuita é assegurada constitucionalmente a todo aquele que comprove sua hipossuficiência (CF/88, art. 5º, LXXIV). Ao intérprete é vedado restringir ou distinguir onde a norma não faz. Agravo de Instrumento provido para desobstruir o Recurso Ordinário interposto.”[18]
Todavia, esse entendimento jurisprudencial ainda é minoritário, prevalecendo-se o espírito protecionista em detrimento do exercício do direito de amplo acesso à Justiça afirmado pela Constituição.
A proteção que é dada ao obreiro, no processo trabalhista, que tem como objetivo colocá-lo no mesmo patamar do empregador, acaba se tornando um mecanismo de desigualdade quando no pólo passivo figura um pequeno empregador, pois este nem sempre terá disponibilidades em caixa para efetuar o recolhimento do depósito recursal sem prejuízo da saúde financeira da empresa.
E como já abordado no presente trabalho, as micro e pequenas empresas foram criadas na década de 80 por ex-empregados que viram o empreendimento como única alternativa para a sobrevivência, sendo que na atualidade o panorama não é diferente, pois mais de 50% dos empregadores anteriormente figuravam como funcionários de empresas privadas[19]. De notar que a maioria desses ex-empregados e novos “empregadores” se equivaliam aos empregados, não sendo portanto razoável essa diferenciação exacerbada dos pólos da relação trabalhista, que não permite a isenção do depósito recursal para as micro e pequenas empresas em dificuldades financeiras.
3.2. Perspectivas Legislativas Futuras
Com o objetivo viabilizar o amplo acesso ao judiciário no âmbito trabalhista, o Ilustre Deputado Almir Moura apresentou o projeto de lei 506/03 (Anexo A) que pretendia dispensar as Micro e Pequenas Empresas do cumprimento do disposto no §1º art. 899 da CLT. Em sua justificativa o Deputado ressaltava a importância das Pequenas e Micro empresas no cenário nacional bem como o prejuízo que a exigência do depósito recursal traz para o exercício do amplo acesso ao judiciário, entretanto o projeto não prosperou devido à revogação do Estatuto da Micro Empresa previsto anteriormente pela Lei nº 9.841, de 5 de outubro de 1999.
Em contra mão aos objetivos do projeto de lei 506/03, o Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos, apresentou em 10 de dezembro de 2004 o Projeto de lei nº 4.734 (Anexo B), que poderá prejudicar ainda mais as pequenas e médias empresas do País. Já aprovado pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público, o documento estabelece que o valor do depósito recursal deverá variar entre 60 salários mínimos, para o caso de recurso ordinário, e o máximo de 100 salários mínimos.
Durante a sessão que debatia tal projeto, o pleno da OAB se manifestou contra a aprovação do Projeto, entendendo ser este inconstitucional pois viola o art 5º, inciso LV da CRFB/88. Nessa oportunidade, o Conselheiro da OAB Edísio Souto se manifestou totalmente contra ao projeto:
“Se este processo passar, não conseguiremos chegar aos pretórios porque os nossos clientes não terão recursos financeiros para suportar o astronômico valor do depósito recursal.O acesso pleno ao Judiciário, em todas as suas instâncias, ser-lhes-á negado”.[20]
Este Projeto em tramitação, caso aprovado, irá impedir de vez o acesso pleno à justiça dos pequenos empreendedores.
CONCLUSÃO
Em face da matéria abordada no presente estudo, observa-se que os Tribunais ainda utilizam uma interpretação literal e protecionista da legislação que estabelece a Justiça Gratuita no Processo do Trabalho, criando assim obstáculos para a sua concessão e a isenção Depósito Recursal para as Micro e Pequenas Empresas.
O indeferimento ao pedido de isenção do depósito recursal, prejudica a saúde financeira destes empreendimentos que têm grande importância no cenário econômico e social do país, sendo os que mais geram emprego e renda na atualidade. Foi demonstrado que em se tratando de relações trabalhistas entre empregado e empregador deste porte, não existe um desnível tão grande que justifique essa extremada Proteção que é conferida ao empregado a tal ponto de impedir a concessão da isenção do Depósito Recursal para a micro e pequenas empresas que não tenham condição de efetivá-lo.
Ao se fazer uma interpretação à Luz da Constituição, percebe-se que o depósito recursal, pode e deve ser inexigido das pequenas e microempresas, devido a tais entes, por vezes não disporem de recursos para promoverem sua efetivação, ou seja, o Estado deve propiciar meios para que essas empresas não fiquem adstritas à sentenças monocráticas que podem conter erros de procedimento ou mesmo judicial, de maneira que o pronunciamento por um órgão colegiado permite maior tranqüilidade, mesmo para o vencido. Compartilhando deste entendimento, alguns magistrados já vêm adotando esse posicionamento afastando a exigibilidade do depósito recursal em casos excepcionais estando no pólo passivo estes entes.
Concluí-se que a legislação trabalhista processual ainda impede a concessão da isenção do depósito recursal, devido ao seu espírito protecionista. Entretanto, o magistrado no caso concreto, pode dar um enfoque constitucional à interpretação da questão, concedendo a isenção do depósito recursal para as micro e pequenas empresas que comprovem a sua impossibilidade de fazê-lo, somente assim esses empreendimentos terão o Acesso Amplo à Justiça e a soluções justas e efetivas no âmbito trabalhista.
Notas:
Informações Sobre o Autor
Leonardo Fernandes Teixeira
Acadêmico do Curso de Direito da UNIPAC-Ubá