Resumo: O que falta a nossa cultura é vontade de se unir, de ser um só corpo e mente ao beneficio de todos, independentemente de etnia, morfologia, sexualidade. É possível?
Palavras-chaves: direitos humanos; Estado Social; darwinismo social; eugenia; desigualdades sociais.
Sumário: I. Introdução; II. O Poder; III. Revolução Industrial e segunda dimensão dos direitos humanos; IV. Deuses, Mortais e discriminações; V. Ações Afirmativas e Estado Social; VI. Economia e dominação; VII. Conclusão.
I. Introdução
Fome e pobreza têm suas gêneses por motivos diversos, desde que o homem se apropriou do solo (agricultura), pessoas ficaram ricas, e outras na miséria. Com o feudalismo, mais e mais pessoas passaram a ter escassez de recursos naturais. Depois, com a Revolução Industrial, milhões de seres humanos passaram a não só ficarem famintas, mas na condição deplorável de miseráveis. Farrapos humanos mendigavam, outros furtavam, ou roubavam, para mitigarem, por breves momentos, as dores cruciantes que percorriam seus sistemas digestivos e suas mentes.
Fome e miséria sempre existiram, dependendo das condições topográficas e climáticas. Até aqui, são condições geradas pela natureza, e não pela ação do ser humano. Não é de se refutar a necessidade das tribos nômades, e dos exploradores no século XV, de percorrer quilômetros para suprir suas necessidades. As guerras humanas, por sua vez, se deflagraram para suprir necessidades básicas, ou para acúmulo [ganância] de recursos naturais. A escravidão surgiu, então, como oportunidade de manter certos grupos humanos na bonança (faraós, reis, religiosos), enquanto outros seres humanos eram subtraídos em suas vitalidades para manter essas regalias.
II. O Poder
O poder, então, passou a ser cobiçado por muitos; pois o poder garante a subsistência, ou até mesmo regalias, confortos, dominações sobre outros seres humanos. Novas teorias de superioridade surgiram, ao longo da jornada humana, para manterem as regalias de grupos humanos através da exploração cruel da mão de obra de outros seres humanos. As diferenças sociais são os resultados de dominações, de um povo ao outro, pela apropriação do solo, da escravidão da mão de obra. Já ouvi dizer que se faz necessário manter as desigualdades sociais, como fonte de perpetuar o desenvolvimento à humanidade. Ou seja, ninguém desejaria trabalhar em pleno verão, com sol a pico, temperatura de 40° C, e sensação térmica de 55° C. Por condição normal [biológica] da espécie humana, à procura de condições climáticas favoráveis [amena] se torna um dos objetivos na busca de melhoria à qualidade de vida. Sim, o meio ambiente influenciando as escolhas dos seres humanos. Entretanto, quem quer se submeter ao sol escaldante? Assim, a desigualdade social se tornou um meio de manter o desenvolvimento humano. Ora, tal concepção de pensamento é nada mais que a busca de conforto por dominação de outro ser humano, mesmo que este venha a morrer – afinal, é um ser humano a menos. Aos adeptos de Thomas Robert Malthus, Francis Galthon, e outros, à “comprovação” das loucuras humanas.
III. Revolução Industrial e segunda dimensão dos direitos humanos
Mas foi com a Revolução Industrial que houve aperfeiçoamento à forma de escravidão mundial. No desejo de conforto, de proteção, milhões de seres humanos, nos quatro cantos do planeta, passaram a lutar, ferrenhamente, por um lugar nas estratificações sociais altas. O ato de estudar e, consequentemente, o alcançar das tarefas intelectuais, passou a ser o grande direcionador da vida humana. Mas nesse contexto, por teorias segregacionistas, e pela compostura de exploração da mão de obra alheia, o ato de estudar não se tornou objeto de fraternidade a humanidade, porém de conseguir fazer parte de uma parcela humana que detém boa parcela, ou maioria, das riquezas geradas pelos proletariados. Somado ao desejo, de qualquer ser humano, de ter qualidade de vida – que tem a ver, por exemplo, com a adaptação favorável ao clima hostil; entre outras condições, como a topográfica etc. –,o ato de estudar passou a ser contemplado [diploma, medalhas, condecorações; ou seja, status social] como diferenciador entre “capacitados” e “incapacitados”. Aliás, é possível ver essa concepção seletiva ainda no século XXI. Quando grupos de pessoas exercem certas funções – independentemente de etnia, morfologia e sexualidade -, seja como balconista, gari, taxista, motorista de ônibus, mototaxista, motofretista, atendente de telemarketing etc., estas profissões são consideradas como subempregos, ou seja, funções de pessoas “incapacitadas” intelectualmente, e até emocionalmente, para trabalharem em funções que exigem mais capacidades. Essa “capacidade” é associada à condição de pessoas “superiores”, genética e/ou espiritualmente.
IV. Deuses, mortais e discriminações
Não muito diferente, há endeusamento entre profissionais da mesma área. Assim, técnicos [enfermagem, edificação, eletrotécnica etc.] são associados, também, à ideia de pessoas limitadas [incapacitadas] para exercerem funções mais técnicas – estas conseguidas com a graduação universitária. E o que dizer, absurdamente, dos acontecimentos entre agentes públicos? A hierarquia, dos cargos, passa a ser um antro de complexados e traumatizados – possivelmente em suas infâncias. A frase esdrúxula “Sabe com quem está falando?” não desmente o complexo de endeusamento. Os cargos públicos também passam a ser o divisor supremo da rale [administrados]. Eis as consequências do complexo de inferioridade.
A ascensão socioeconômica se torna uma expectativa de prazer aos sentidos físicos, e torpor às emoções. A segregação, por sua vez, propicia qualidade de vida através da exploração da mão de obra. Veja que segregação, aqui, não é genocídio, ou expulsar do território o “indesejável” ser humano. A segregação pode acontecer, sem a expulsão do “incapacitado” do território, ou do convívio como os “capacitados”. No Brasil, por exemplo, na Constituição de 1824, os cidadãos plenos eram os nobres, às mulheres, uma expectativa limitada de direitos, e aos negros, às chicotadas. Os Direitos Civis e Políticos dos cidadãos brasileiros, em 1824, são muitos diferentes quando se analisa a Constituição de 1988, onde homens e mulheres têm direitos iguais. Não se admite, ainda, qualquer diferença, ou privilégio, pela condição étnica, ou hereditária, aos direitos político e civil; não importa, por exemplo, respeitando os preceitos constitucionais, se é estrangeiro ou nacional à ocupar cargo político.
E o que dizer da ascensão feminina? Muitos homens se incomodam com a ascensão do sexo “frágil”. O medo interior desses homens é o medo que as mulheres do passado sentiam dos homens: dominação. Os homens estão projetando seus medos, pois sabem o que causaram, ao longo da história humana, às mulheres. É o poder, dos homens, se fragmentando. Sempre o poder.
V. Ações afirmativas e o Estado social
As ações afirmativas, por exemplo, às cotas raciais, nas universidades federais, estas consideradas berços esplendorosos [Olimpo] das estratificações sociais alta e [antiga] classe média alta – atualmente existe a nova classe média – demonstraram o quanto de darwinismo social ainda existe em nosso país. Na extinta comunidade social Orkut, por exemplo, existiam comunidades exaltando à intelectualidade, à capacidade superior dos ingressos nessas comunidades, por terem sidos aprovados em alguma Universidade Federal – se Alfred Adler estivesse entre nós, mortais complexados, tais comunidades serviriam como amplo material de estudo para a teoria do complexo de inferioridade. Aliás, posso afirmar que as estratificações sociais – quando existe as diferenças sociais abissais, por políticas [absolutistas] dos administradores públicos – seus supersalários versus o piso salarial nacional, ou regional, dos proletariados -, ou ações de grupos oligárquicos, aristocrático, ou até eugenistas – é o combustível para inflamar o complexo de inferioridade em cada ser humano. Ou será o complexo de inferioridade o combustível?
O Estado social [segunda dimensão dos direitos humanos] é uma necessidade para criar harmonia entre os seres humanos: aos iguais, o tratamento igual, aos desiguais, o tratamento desigual, conforme suas igualdades e desigualdades. Todavia, não basta somente as ações do Estado para criar harmonia social, isto é, tornar a sociedade fraterna. As leis forçam mudanças nos comportamentos – ou obedece, ou vai preso -, mas não nas ideologias que estão impregnadas nos âmagos dos seres humanos. No caso do Brasil, se verificarmos a Constituição de 1937, a educação eugênica fora institucionalizada e se tornara diretriz para o Estado construir uma sociedade “justa”, “equilibrada”, “saudável”. A própria educação física serviu, na época, como materializadora dos ideais eugenistas – em alguns artigos meus, já publicados, é possível constatar as ações dos eugenistas no Brasil, mas que, infelizmente, ainda se perpetua nas gerações deste século XXI.
O Brasil, para mudar, de forma consciente, isto é, de dentro para fora, necessita aglutinar a atuação do Estado e da sociedade organizada universalista na divulgação dos direitos humanos. Não o simples divulgar dos artigos dos direitos humanos, mas divulgá-los e explicá-los o porquê de suas existências. Ou seja, elucidarem as causas que deram existências aos direitos humanos. Não são as leis frias, as imputações de deveres, que mudarão os comportamentos, entretanto, é através da educação fraternal – há, infelizmente, educação que imputa discriminações, sectarismo, preconceitos – que o Brasil concretizará os seus objetivos, estes expressos no artigo 3º, da Carta Política de 1988.
Absurdamente, as ações afirmativas [Estado Social] estão sendo atacadas por ódios ideológicos. Há grupos sociais, por convicções políticas, se opondo ao Estado Social por ser “ação pérfida de comunista”. Sim, o Estado Social vem trazendo benefícios ao Brasil, desde a gestão do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso até a atual presidenta, Dilma Rousseff.
O que não se pode confundir é o Estado Social com a corrupção: aquele é uma necessidade para concretizar o artigo 3º, da CF; esse é um mal, um vírus mortal, que se encontra nos âmagos de pessoas egocêntricas, sádicas. E o povo, sem a educação necessária para distinguir os dois, os associam como males às suas vidas. Na esteira da ignorância do povo, astutos e velhacos, dentro e fora da Administração Pública, se aproveitam da ignorância, e exaltam passeatas, ações físicas truculentas, condenações [especificamente direcionadas] contra à corrupção, porém com a maquiavelice de arruinar o Estado Social que tem proporcionado um pouco de dignidade aos “desiguais”. Em síntese, o Estado social está sendo associado à corrupção, como se aquele fosse o meio favorável à ações ímprobas.
O Estado social teve sua gênese na Revolução Industrial. Nas mãos dos que detinham riquezas – essas, em muitos casos, conquistadas com a exploração da mão de obra escrava, de conquistas de terras indigências, ou por ações de oligárquicos, aristocráticos, mafiosos e seus capangas, que se perpetuam de gerações a gerações –, o poder proporcionava dominação, aquisições de riquezas e conforto material à custa da escravidão; modernamente se faz sem chicotadas, sem algemas, mas pela dominação econômica ao miserável – tudo possível "dentro das leis" e por leis científicas segregacionistas. Há, claro, acontecimentos inesperados, como o encontrar algum bem de valor comercial [petróleo, jazida etc.], que proporcionou acúmulo de riqueza, ou criação de alguma parafernália tecnológica, que também proporcionou acumulação de riqueza. Mas a mão de obra necessária para gerar e transformar riquezas sempre fora escrava.
VI. Economia e dominação
O poder econômico proporcionou, ainda mais, controle sobre os demais seres humanos desafortunados. Na luta pelo conforto material, pelo aparente poder, pois sempre se tem alguém para tomar à força este poder, políticas públicas criadas pelos gestores públicos, por intervenções de empresários, sempre criaram favorecimentos para ambos. O topo do poder, então, é o topo do privilégio, e este é conquistado pela escravização moderna. As diferenças sociais abissais servem para manter uma sociedade injusta, uma sociedade que criará pessoas com o intuito de sobreviver, seja qual for o modo de aquisição da qualidade de vida, mesmo que gere danos aos semelhantes.
A corrupção, então, não é mais vista como anormal, mas uma necessidade de sobrevivência. As instituições públicas passam a ser centros de excelência das mais inimagináveis ações bestiais em favorecimento dos “afortunados” e “privilegiados”. O princípio da moralidade administrativa (artigo 37, da CF/1988) não passa de letras impressas em papel. O ímprobo agente público, assim age, pela força motriz perversa criada, alhures, no inconsciente coletivo. Um cargo comissionado passa a ser uma oportunidade de emprego e sobrevivência material, mesmo que o cidadão não seja servidor de carreira, o que é proibido por lei.
As emergências, como inundações e proliferações de vetores transmissores de doenças, exigem atuações rápidas dos administradores públicos para a necessidade da coletividade; sem necessidade de licitação, ou licitação dispensável, se perpetuam os “contratados para sempre”, numa demonstração de que o comportamento cultural é embasado na trapaça, ou “jeitinho brasileiro”. Mas repito, tais atitudes se devem aos conceitos perpetuados no Brasil: absolutismo, aristocracia, oligarquia, escravidão, darwinismo social e eugenia. Nessa postura trapaceira, não há qualquer sentimento de solidariedade ao concidadão trabalhador, que acordas às 4h para tentar ser transportado pelos transportes públicos perigosos, que trabalha quarenta horas semanais para, no final de cada mês, receber míseros trocados para tentar sobreviver. Esses “contratados para sempre” se encontram na área de saúde, em caso de calamidade pública, licença-maternidade etc., e nos cargos comissionados [cargos de direção, chefia, assessoramento], que não se exige concurso público. Há uma verdadeira troca de favores entre partidos políticos. Mesmo que algum agente político não reocupe, pela reeleição, cargo público, o servidor público comissionado poderá continuar a prestar serviço de direção, assessoramento ou chefia, por indicação do ex-gestor público ao novo gestor público, quando aliados políticos. É a troca de favores criando os “contratados para sempre”. Em muitos casos, o servidor público comissionado serve como “caixa dois”, pois o que percebe de remuneração não condiz com a folha de pagamento. Isto é, o agente político abocanha uma parte da remuneração do comissionado. Em outros casos, os comissionados não aparecem em suas respectivas repartições públicas, porém o dinheiro de suas remunerações é garantido. Em outros casos, mais esdrúxulos, mesmo sendo servidor de carreira, que sempre será através de concurso público, também não comparece diariamente para exercer sua função. A “presença” laboral de comparecimento é feita, ou quando há biometria digital, pelo simples e rápido entrar e sair. Nenhum trabalho é executado, mas a remuneração é garantida. Eis uma perversidade.
VII. Conclusão
Este texto tem o propósito de elucidar o óbvio: o problema da corrupção, da discriminação e do preconceito é cultural. O Brasil foi colonizado para ser explorado economicamente, e não habitado. Por ironia do destino, o Brasil passou a servir como moradia, depois que D. João VI, sob ação de Napoleão, teve que se refugiar no Brasil. Mas dizer que a corrupção no Brasil se deve aos portugueses é absurdo. O Brasil fora habitado por vários povos, e até houve povos que fixaram moradias, como em Pernambuco. Então, de quem é a culpa pela corrupção, pelo racismo no Brasil? Se invocarmos precedente genético caímos na mesmice do erro dos eugenistas, que causaram horrores à humanidade, como, por exemplo, a Segunda Guerra Mundial.
Os direitos humanos atuais é um compêndio de pensamentos de vários célebres homens e mulheres do passado na busca pela paz, harmonia, fraternidade e igualdade. Em alguns vislumbres, parecem que os direitos humanos foram concebidos por comunistas e socialistas, que há uma Nova Ordem Mundial a querer escravizar a humanidade. Há, ainda, absurdamente, quem diga que o demônio está agindo disfarçado nos direitos humanos – direitos humanos não faz discriminações à opção sexual. O Muro de Berlin foi destruído, a mentalidade da Guerra fria persiste. Os comunistas e socialistas radicais, remanescentes, querem tomar o poder do capitalismo, o mal do mundo. Os capitalistas, radicais, querem radicar do planeta os comunistas e socialistas remanescentes, pois são comedores de crianças e ateus. As religiões se digladiam para apresentarem e imputarem o “verdadeiro” deus aos “iludidos”, de outras religiões. A fé, diante do caos criado por ímprobos gestores públicos, se transformou no maior mercado capitalista, desde os primeiros passos do mercantilismo. As Cruzadas deixaram rastros de ódios, que ainda se perpetuam nas guerras religiosas. A Terceira Guerra Mundial, que quase aconteceu em 1962, com a Crise dos Mísseis Cubanos, parece mais presente do que nunca. Não se pode esquecer que guerra é o resultado de guerras íntimas. O expurgo [ação] é consequência de conflitos íntimos. Mas o íntimo humano não é sempre assombrado por questões ideológicas, o puro sadismo também contribui para deflagrar guerras.
Na confusão de ideologias pretéritas, as gerações futuras são ensinadas a odiar o “desigual”. O ser humano “desigual”, então, se revolta contra as pessoas nas quais se dizem “superiores”. As belicosidades se perpetuam entre religiões, nas lutas de classes, entre países, nos lares, nas vias públicas, pelo status social.
O que falta na cultura brasileira é a vontade de se unir, de ser um só corpo e mente ao beneficio de todos, independentemente de etnia, morfologia, sexualidade. É possível? Sim. Temos exemplos, e um deles se chama Suécia. O bem-estar deve ser proporcionado a todos os suecos. A vergonha não é o trabalho, seja qual for a atividade laboral, não é ser diferente [morfologia, etnia, sexualidade], e sim ser corrupto, violar o Estado de Direito. Como mudar? Hoje, agora, dizer “Não!” a qualquer ato que viole o Estado de Direito. Esperar que Deus, ou que algum líder, mude o Brasil é ter a certeza de que não há força de vontade em querer mudar. E a mudança começa de dentro para fora, a partir de cada brasileiro.
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Sérgio Henrique da Silva Pereira
articulista colunista escritor jornalista professor produtor palestrante