Resumo: O presente trabalho a partir de uma perspectiva sociojurídica está estruturado de forma que articula a apresentação das principais noções relacionadas à noção de cidade sustentável contida no Estatuto das cidades, traçando uma discussão acerca da idéia de poder de polícia ambiental no âmbito municipal e a questão da responsabilidade civil ambiental no tocante a característica intrínseca da objetividade na responsabilização. Problematizando-se a questão da efetividade do estatuto das cidades no sentido da construção de uma cidade sustentável e de como o poder de polícia ambiental pode servir como um dispositivo para realização de uma responsabilidade civil ambiental, devido ao seu aspecto objetivo, sendo capaz de condicionar a instituição de um Estado de Direito Ambiental a partir do empoderamento local.
Palavras-chave: Direito Ambiental; Estatuto das Cidades; Empoderamento.
Abstract: This study from a socio-legal perspective is structured so that articulates the presentation of key concepts related to the concept of sustainable city contained in the Statute of cities, drawing a discussion about the idea of police power at the municipal and environmental issue of environmental liability with regard to intrinsic characteristic of objectivity in accountability. Discussing the question of the effectiveness of the status of cities towards building a sustainable city and how the environmental police power can serve as a device for performing an environmental liability due to its objective aspect, being able to condition the establishment of a State Environmental Law from the local empowerment.
Keywords: Environmental Law; Status of Cities; Empowe
Sumário: 1. Introdução. 2. A concepção de cidade sustentável presente no estatuto das cidades como reflexo e potencial para construção de uma sociedade sustentável. 3. Sobre o poder de polícia ambiental e a responsabilidade civil: aspectos e interfaces na construção de um empoderamento local. 3.1. A idéia do poder de polícia na esfera de empoderamento local. 3.2. Sobre a responsabilidade civil ambiental e o aspecto da responsabilização objetiva. 4. O estatuto das cidades como mecanismo concreto potencializador da construção da cidade sustentável e o papel da responsabilidade civil ambiental e do poder de polícia. 5. Considerações finais. 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo é resultado de revisão bibliográfica, onde numa perspectiva sociojurídica, se propõe uma discussão acerca de questões relacionadas ao Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001), enquanto mecanismo de efetividade do Direito Ambiental de maneira mais ampla e de como o poder de polícia ambiental e a responsabilização civil ambiental no âmbito local podem servir como mecanismos de empoderamento local e conseqüente instituição de um Estado de Direito Ambiental.
A partir da sistematização de leituras, com realização de fichamentos, o trabalho está estruturado de forma que num primeiro momento apresentamos as principais noções relacionadas à noção de cidade sustentável contida no Estatuto das cidades. Num segundo momento, discute-se a idéia de poder de polícia ambiental no âmbito municipal e a questão da responsabilidade civil ambiental no tocante a característica intrínseca da objetividade na responsabilização. No terceiro momento trazemos a problematização relativa à efetividade do estatuto das cidades no sentido da construção de uma cidade sustentável e de como o poder de polícia ambiental pode servir como um dispositivo para realização de uma responsabilidade civil ambiental, devido ao seu aspecto objetivo, sendo capaz de condicionar a instituição de um Estado de Direito Ambiental a partir do empoderamento local. Num quarto e último momento do texto, tecemos as considerações finais do trabalho.
2. A CONCEPÇÃO DE CIDADE SUSTENTÁVEL PRESENTE NO ESTATUTO DAS CIDADES COMO REFLEXO E POTENCIAL PARA CONSTRUÇÃO DE UMA SOCIEDADE SUSTENTÁVEL
Partindo-se do pressuposto de que não basta a prescrição legal para que uma determinada sociedade passe de um estágio a outro em relação às práticas empreendidas em suas vivências cotidianas, e sim, que as leis, representam ao mesmo tempo o reflexo desta sociedade e o ponto de partida para efetividade dos Direitos, analisamos o Estatuto das Cidades enquanto dispositivo legal que condiciona ou não a ação pró-ativa em relação à questão ambiental.
Fazendo-se um recorte em relação à dimensão sócio-ambiental, partindo-se da consideração da cidade enquanto meio ambiente artificial, entendido como expressão da ação transformadora do ser humano, analisa-se os aspectos sócio-jurídicos que conformam a idéia de cidade proposta pelo Estatuto das Cidades, analisando-se como e em que medida pode se dar a garantira do Direito Ambiental em sua plenitude, valendo-se do dispositivo legal do Estatuto das Cidades, tendo-se como base a concepção de cidade ali vislumbrada.
A realização da cidade enquanto empreendimento humano figura-se como um campo que nos permite pensar a humanidade em suas diversas dimensões, seja técnica, tecnológica, sócio-política, cultural, estética, jurídica e logicamente ambiental – que pela sua natureza, abarca todas outras – sendo um dos espaços mais representativos da ação antrópica do homem.
A partir da ocupação de um determinado espaço geográfico a cidade compõe-se conforme definiu Lefebvre (1969) como a “projeção da sociedade sobre um dado território”, ou seja, a conformação da cidade enquanto fenômeno humano representa aquilo que os homens em sociedade vislumbram, objetiva e subjetivamente, sendo sua realização, o resultado de processos de ocupação e significação de determinados territórios, realizados por sujeitos em suas relações sociais, constituindo-se na modernidade, num lócus de realização de um projeto social, baseado no antropocentrismo, no individualismo e na razão, vivenciados em suas dimensões política, social, cultural e econômica.
A preocupação ambiental figura-se como um reflexo de tempos em que se coloca em “cheque” todo o “caldo cultural” formador dos modos de vida moderno em sua amplitude, fazendo valer idéias como a de que se faz necessária a preservação do meio ambiente para as futuras gerações e que esta não pode ser delegada a um ente (concreto, abstrato ou divino), mas, que se constitui em algo que pertence a cada um em nome de todos, a partir do seu local, pensando e vivenciando as questões globais.
No nosso ordenamento constitucional temos no artigo 225 a expressão social daquilo que se espera em termos da questão do direito ao meio ambiente, onde vamos encontrar que:
“Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para os presentes e futuras gerações” (ART. 225 C.F. 1988).
Tendo-se neste artigo algo que está para além de uma suposta pretensão política de dar uma conformação “verde” a lei maior, no sentido de um rótulo político-ambientalista, mas ao contrário, convertendo o texto constitucional num pilar-mestre na ação econômica, social, política e jurídica em prol da busca de um meio ambiente equilibrado, como algo que é bem de todos e a todos, sociedade e Estado, é imposto o dever de protegê-lo em nome das presentes e futuras gerações.
Desta maneira as nossas cidades, enquanto meio ambiente artificial, vão ser tratadas de forma imediata no artigo 182, onde se lê que:
“A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em Lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes” (ART. 182 C.F. 1988).
Tendo-se na previsão legal a perspectiva de que a cidade, enquanto lócus de desenvolvimento de uma sociedade concreta, deve se converter, a partir das suas políticas de desenvolvimento urbano, em um espaço garantidor de Direitos Fundamentais como o bem estar e a função social da propriedade. Tendo a sociedade local, expressa dentro do Estado na figura da municipalidade, a possibilidade de introduzir a variável ambiental no seio dos seus processos e dinâmicas sócio-políticas, segundo Edis Milaré este é um aspecto já constatado na realidade brasileira, onde discorre que:
“Ressalte-se que a variável ambiental vem sendo, cada vez mais, introduzida na realidade municipal, para assegurar a sadia qualidade de vida para o homem e o desenvolvimento de suas atividades produtivas . Isto é sentido sobretudo na legislação, com a inserção de princípios ambientais em Planos diretores e leis de uso do solo e, principalmente, com a instituição de sistemas Municipais de meio ambiente, e a edição de Códigos Ambientais Municipais. Deve o município implementar o conselho de Meio ambiente” (MILARÉ, 2001, p. 223).
Onde se visualiza caminhos a construir no sentido da responsabilização do Estado e da sociedade na construção de um meio ambiente equilibrado.
Desta maneira a Lei nº 10.257/2001 (Estatuto das Cidades) assume um protagonismo, uma vez que representa um marco no sentido da garantia do Direito a cidade sustentável, uma vez que em seu artigo 1º, parágrafo único, encontramos:
“Art. 1o Na execução da política urbana, de que tratam os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, será aplicado o previsto nesta Lei.
Parágrafo único. Para todos os efeitos, esta Lei, denominada Estatuto da Cidade, estabelece normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (LEI Nº 10.257/2001).
Constatando-se que a referida lei encontra-se de acordo com uma visão ampla e social da questão ambiental, uma vez que se tem nitidamente a consonância com a intenção de tornar esta lei um dispositivo capaz de efetivar o que prevê a Constituição num sentido que parte de uma premissa geral, oferecida pelos artigos 182, 183 e 225, operando-se no estabelecimento de regras que dizem respeito às dimensões sociais e ambientais ao nível individual e coletivo naquilo que concerne à construção da cidade enquanto meio ambiente artificial que esteja a serviço da garantia do Direito ao meio ambiente equilibrado.
Em suas diretrizes gerais encontra-se a perspectiva de uma sustentabilidade que perpassa os campos socioculturais, políticos e ambientais relativos à intervenção humana na construção das cidades.
Encontrando-se o entendimento do direito a cidades sustentáveis como algo que diz respeito aos direitos fundamentais como propriedade, moradia, saneamento ambiental, infraestrutura e mobilidade urbana, trabalho e lazer, bem como, serviços públicos, garantidos as presentes e futuras gerações, conforme se encontra no capítulo I, artigo 2º, inciso I:
“I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações” (LEI Nº10.257/2001).
Já em relação à perspectiva política, enunciada na referida lei, encontra-se a concepção participacionista da democracia, onde no artigo 2º, inciso II, tem-se:
“II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano” (Lei nº10.257/2001).
Em relação aos preceitos ambientais, encontramos ainda no artigo 2º, incisos VI, alínea “f” e “g”, além dos incisos VII, VIII, XII, XIII e XIV, conforme podemos verificar:
“VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;
XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;
XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;” (Lei nº10.257/2001).
Tendo-se neste diploma legal, uma visão bastante ampla de sustentabilidade, enquanto princípio que necessita para efetivar-se ser pensado em sua complexidade e dentro de uma perspectiva interdisciplinar.
3. SOBRE O PODER DE POLÍCIA AMBIENTAL E A RESPONSABILIDADE CIVIL: ASPECTOS E INTERFACES NA CONSTRUÇÃO DE UM EMPODERAMENTO LOCAL
3.1. A idéia do poder de polícia na esfera de empoderamento local
Quando referimo-nos ao poder de polícia, trata-se exatamente do poder decisório emanado do ente estatal, com o objetivo regulatório, limitador e/ou disciplinador das ações dos indivíduos em sociedade, buscando no corpo social a regulação de práticas relacionadas à questão ambiental, entendida de maneira mais ampla. Essa amplitude pode ser mais bem visualizada, na definição trazida por Paulo Affonso Leme Machado, onde para o autor o exercício do poder de polícia ambiental no caso brasileiro corresponde:
“À atividade da administração pública que limita ou disciplina direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas ou de outras atividades dependentes de concessão, autorização, permissão ou licença do Poder Público de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza” (MACHADO, 2000, p. 303).
Desta maneira no caso brasileiro, o poder de polícia, que segundo o que prevê o Código Tributário Nacional em seu artigo 78, constitui-se como atividade da administração pública, dizendo respeito a práticas de atos e abstenções de fato, relacionadas ao interesse público, concernentes aos direitos individuais e coletivos. Tendo-se na constituição Federal de 1988, em seu artigo 23, nos incisos III, VI e VII, a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e sítios arqueológicos; o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas, bem como de preservar as florestas, fauna e flora.
Sobre essa competência conferida ao ente estatal no âmbito municipal, Paulo Leme elucida que:
“ A Constituição foi clara ao atribuir indistintamente à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a competência para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas e de preservar as florestas, a fauna e a flora (art.23, incisos VI e VII)” (MACHADO,2000, p.303).
O que permite um empoderamento local nas questões relacionadas à questão ambiental, enquanto algo amplo, dizendo respeito à busca de uma sustentabilidade econômica, sociocultural, política e ambiental, permitindo uma ação mais eficaz na busca da garantia do Direito ao meio ambiente equilibrado, o que sem dúvida demanda ações que sejam capazes de articular aquilo que diz respeito ao local e o global e que dêem conta da emergência que quase sempre acompanha as questões de ofensa aos bens ambientais.
Neste sentido uma ação a nível local tende a ser mais eficaz em relação à capacidade do estado de responsabilizar o agente danoso, onde a figura do poder de polícia ambiental exercido pelo ente municipal, conforme permite nossa legislação, vai de encontro aos preceitos ditados pela constituição, o que em última instância permite o cumprimento da máxima que acompanha nossos dias, qual seja, a de que é necessário pensar o global, a partir do local.
O que se pode perceber nas leituras realizadas é que há certo consenso na doutrina acerca da questão da competência do município em relação ao poder de polícia ambiental, se convertendo passo a passo, na jurisprudência.
3.2. Sobre a responsabilidade civil ambiental e o aspecto da responsabilização objetiva
A origem etimológica do termo responsabilidade, ainda nos diz muito do que ele ressoa em termos da relação jurídica contemporânea, entendida como aquela em que se tem em jogo a garantia ou negação de um Direito qualquer. Estando ligada em sua raiz (latim) ao verbo respondere, o que remete a idéia de responder por algo prometido, afiançado. Seguindo-se o que encontramos hoje na nossa cultura jurídica, ou seja, a responsabilidade diz respeito à relação de obrigação em responder por algo em uma situação de um fato ou ato.
Tratando-se de Responsabilidade Civil, esta diz respeito à busca da reparação civil, onde numa relação marcada pelo ato ilícito, busca-se uma sanção imposta ao agente ou responsável. A Lei 10.406/02, que inseriu o Novo Código Civil Brasileiro, impõe em seu artigo 927 a explícita obrigação de reparação do dano, imputada a quem por ato ilícito causar dano a outrem. Sendo que esta obrigação segue a característica peculiar de ser objetiva, ou seja, não sendo exigido à idéia da vinculação da culpa, o que vai ser encontrado no Código Civil vigente, em seu artigo 927, parágrafo único, onde:
“Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem (Lei 10.406/02, parágrafo único).”
O que em termos ambientais, sua efetividade enquanto dispositivo que permita a garantia do Direito ao meio ambiente equilibrado – como preceituado pela Constituição Federal de 1988 – se dá pelo fato de que não havendo a necessidade de vinculação subjetiva, a ação reparatória cumpre a missão de atuar na dimensão reparatória – que é um dos pilares da questão ambiental, juntamente como a prevenção e a punição – do status do bem ambiental que sofreu o dano.
Essa questão da responsabilidade objetiva, vai se materializar na legislação brasileira através da Constituição Federal de 1988, no parágrafo 3º do seu artigo 225, onde não há menção a relação de culpa para caracterizar a responsabilização e a Lei nº 6.938/81, que em seu artigo 14, parágrafo 1º, onde se encontra:
“Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente (LEI Nº 6.938/81, ARTIGO 14, § 1º).”
Segundo alguns autores como Herman (1998. p. 36.), “O Direito Ambiental Nacional, a partir da Lei nº 6.938/81, passa a proteger o individual a partir do coletivo”. Daí, sua natureza essencialmente pública, remetendo a uma ruptura em termos paradigmáticos, uma vez se a proteção dos bens ambientais, da ordem dos Direitos difusos, tem em última instância a função de resguardar as condições da manutenção de Direitos relacionados ao indivíduo. O que em termos relacionados à dinâmica da responsabilização dentro da relação jurídica desloca a obrigação de reparação do nexo de causalidade da necessidade de culpa, para a caracterização do dano ao bem ambiental, pois conforme afirma Paulo Affonso Leme Machado:
“A responsabilidade objetiva ambiental significa que quem danificar o meio ambiente tem o dever jurídico de repará-lo. Presente, pois, o binômio dano-reparação. Não se pergunta a razão da degradação para que haja o dever de reparar (MACHADO, 2001, p. 324).”
Esse amadurecimento, que pelo menos em termos doutrinários encontra-se mais desenvolvido numa perspectiva “progressista”, em face à jurisprudência, que naturalmente seguirá segue sua tradição que tende a um maior “conservacionismo”, na nossa visão permite uma ação por parte do Estado, que devido à caraterística da objetividade implícita a responsabilidade civil objetiva, permite uma ação pró-ativa em nome da preservação ambiental, conforme nos demonstra Milaré, onde afirma que:
“a responsabilidade civil objetiva funda-se num princípio de eqüidade, existente desde o Direito Romano: aquele que lucra com uma atividade deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes. Assumem o agente, destarte, todos os riscos de sua atividade, pondo-se fim, à prática inadmissível da socialização do prejuízo e privatização do lucro (MILARÉ,2001 p. 338-39).”
Permitindo pensarmos em termos da perspectiva da efetividade do poder de polícia ambiental a um nível municipal, conforme foi desenvolvido anteriormente, que somado a questão da objetividade advinda da responsabilização civil em matéria ambiental, cumpre o papel de servir como um dispositivo para efetividade do ideário ambientalista aplicado a dinâmica da vida social na cidade.
4. O ESTATUTO DAS CIDADES COMO MECANISMO CONCRETO POTENCIALIZADOR DA CONSTRUÇÃO DA CIDADE SUSTENTÁVEL E O PAPEL DA RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL E DO PODER DE POLÍCIA
Seguindo-se o curso da tendência contemporânea no tocante a considerar a centralidade que a questão ambiental tende a assumir na organização da sociedade como um todo, abarcando tanto as dinâmicas privadas, como aquelas que dizem respeito à ação estatal, a responsabilidade civil ambiental, devido a sua natureza reparatória cumpre o papel de mecanismo concreto, que se coloca na dimensão “do que fazer”, uma vez que necessitamos de princípios, posturas, aliados a caminhos, mecanismos e ferramentas, que resultarão em práticas sobre determinadas questões situadas histórica e socialmente, ou seja, a cidade sustentável, não pode ser uma utopia, no sentido idealista, mas, algo passível de realização a partir do conjunto social em sua totalidade.
Neste sentido o Estatuto das Cidades, enquanto dispositivo normativo constitui-se como um marco no que tange a possibilidade da instituição de um ambiente urbano que cumpra os preceitos condicionantes de um modo de vida que se opere buscando não somente a exploração dos bens naturais, o que leva a expropriação dos mesmos, mas, que seja capaz de se inserir no “movimento” da vida social de maneira positiva, trilhando caminhos que visam o desenvolvimento de um meio ambiente artificial a serviço da manutenção da vida de maneira mais ampla. Constituindo-se como um ponto de partida construtivo de novas relações sociais na dinâmica das cidades.
A referida lei (10.257/2001), em seu texto traz um conjunto de dispositivos práticos, relacionados à dinamização do planejamento urbano que cumprem o que anteriormente desenvolvemos, sendo os casos dos capítulos II, dos instrumentos da política urbana, seção I, dos instrumentos gerais, bem como, o capítulo III, do plano diretor, ambos referentes à composição de mecanismos que propiciam à instituição de práticas que visem uma ocupação do espaço urbano com vias a racionalização positiva em favor das questões ambientais.
Aliadas a essa dimensão ambientalista encontra-se aquilo que diz respeito a elementos relacionados à instituição de uma cultura política fundada na participação efetiva dos cidadãos, o que se encontra no artigo 40, em seu parágrafo 4º, dispondo sobre a garantia da participação, transparência e fiscalização.
Neste sentido o poder de polícia ambiental e a responsabilização civil em matéria ambiental, figuram-se como centrais para realização daquilo que está consolidado no Estatuto das Cidades, enquanto reflexo de um paradigma, que no tocante ao meio ambiente artificial, reflete o desejo de uma totalidade social que necessita ocupar os territórios sob uma nova ótica, pautada pelo respeito à vida.
Dentro deste contexto, o poder de polícia ambiental somada à responsabilização civil em matéria ambiental, devido a suas características implícitas relacionadas à objetividade e a reparação, constituem-se em ferramentas que possibilitam a um âmbito local o desenvolvimento de práticas individuais e sociais que caminhem no sentido da instituição de valores positivos no que se refere à relação do homem com o meio ambiente.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A centralidade investigativa do trabalho se moveu em torno da questão da efetividade do Estatuto das cidades, enquanto mecanismo de efetividade do Direito Ambiental de maneira mais ampla e de como o poder de polícia ambiental e a responsabilização civil ambiental no âmbito local podem servir como mecanismos que possibilitem a garantia daquilo que está consolidado em nossa constituição, qual seja, o Direito ao meio ambiente equilibrado, inerente a todos e que é dever de todos preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Partindo da premissa de que as leis devem ser vistas como dispositivos para realização de Direitos inerentes a condição humana, encontrando dentre estes os direitos ambientais, e que a consolidação destas, são resultados que fazem parte daquilo que uma determinada sociedade, em determinado tempo foi capaz de imaginar e produzir em termos da sua regulação. O que em termos das sociedades contemporâneas, necessariamente, remete-nos a uma idéia do poder estatal, enquanto ente que congrega uma vontade geral em torno daquilo que busca a normatização.
Neste sentido, que vimos à questão do poder de polícia ambiental municipal, como mecanismo concreto de realização regulatória, de imposição do poder autorizado do Estado em nome do meio ambiente, o que numa relação de responsabilização civil ambiental, devido a sua dimensão reparatória e sua operatividade baseada na objetividade, permite a efetividade de práticas que vão ao sentido da garantia do Direito ambiental em sua amplitude, convertendo a questão valorativa, refletida no texto normativo, em práticas sociais, imbuídas de sentido, dinamismo e historicidade.
Sociólogo. Especializando em Direito Ambiental (interdisciplinar) na Universidade Federal de Pelotas. Atua desde 2005 em consultoria e assessoria social, tendo atuado em projetos relacionados às áreas de Extensão Rural, Educação Ambiental, Habitação de Interesse Social e Monitoramento Social de Políticas Públicas. Colaborador do Instituto Pluris – Pesquisas, Consultoria e Assessoria – Ltda. em Assessoria Social em geral. Membro (discente) do Grupo de Pesquisa “A Efetividade dos Direitos Humanos”,
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