Artigo por Aron Vitor Fraiz Costa
A tecnologia blockchain vem ganhando importante destaque globalmente, possibilitando que as transações ocorram sem a necessidade de um terceiro de confiança (instituições bancárias, por exemplo), e assim, proporcionam atividades negociais mais rápidas e eficazes.
Conceitualmente, a blockchain é a forma em que se armazenam os dados da transação dentro de blocos que se juntam para formarem cadeia de blocos. Desse modo, o tamanho dessa cadeia vai aumentando proporcionalmente ao número das transações realizadas, gerando um hash único, englobando os blocos das transações antecedentes alocadas nas recentes.
Com isso, a blockchain, por intermédio dos smart contracts, possibilita uma gestão mais ativa dos contratantes, reduzindo custos inerentes à relação contratual e expandindo os efeitos econômicos do contrato, facilitando as microtransações e permitindo o acesso de mercados em que antes apenas grandes empresas atuavam[1].
Assim, o smart contract é entendido como um “protocolo de transação informatizado, que executa os termos de um contrato” pautado no sistema IFTP (If-This-Then-That), não existindo possibilidade de interpretação daquilo que foi pactuado, já que o programa irá se basear na causalidade de algoritmos (“se x, então y”). Basta pensar em uma máquina eletrônica de venda de produtos em que, ao se inserir o valor estabelecido, o pedido será automaticamente executado, entregando o produto. É assim que o smart contract funciona.
Se por um lado os “contratos tradicionais” podem apresentar termos contraditórios, inaplicáveis ou de difícil interpretação, os smart contracts, regidos pelo princípio “the code is law”, acabam por reduzir a possibilidade de falhas ou subjetividade de terceiros, já que prescindem de instituições jurídicas, agências de fiscalização ou estruturas normativas[2].
Sob o prisma do direito contratual brasileiro, optou-se por adotar um modelo solidarista[3], já que se pauta na boa-fé entre os particulares, seja na fase pré-contratual, seja durante sua execução (art. 422, Código Civil), inclusive, exigindo que sua interpretação seja realizada conforme os usos do lugar de sua celebração (art. 113, Código Civil).
Assim, em um cenário de confiança mútua, a negociação acaba sendo facilitada e, consequentemente, os custos são reduzidos. Por outro lado, quando inexistente a confiança, os agentes tendem a um aumento do autointeresse, como revisão excessiva e inclusão de cláusulas que forcem o cumprimento do contrato.
Neste ponto, a teoria econômica concebe o contrato como uma transação de mercado, cuja base é a promessa, de modo que os contratantes pretendem a satisfação de suas necessidades por meio das trocas e pela redução de riscos[4].
No entanto, as obrigações podem vir a serem inadimplidas, acarretando importantes efeitos, tais como o desfazimento da relação contratual e o aumento de custos de transação (a exemplo de custos de advogados com trocas de notificações e revisões contratuais ou busca de novos contratantes).
Existe, contudo, uma via alternativa, oferecida pela tecnologia da blockchain e dos smarts contracts, que se pauta na “confiança sem confiança”, justamente pela auto-verificação e auto-execução (com maior certeza daquela conferida pelas instituições tradicionais e centralizadas). Assim, os smarts contracts permitem maximizar a relação contratual, atenuando a probabilidade de inadimplemento.
Contudo, é preciso reconhecer que blockchain e smart contracts, apesar da expectativa de erro nulo, se tratam de sistema projetados, implementados e usados por humanos que, por sua vez, estão suscetíveis ao erro, são tendenciosos e possuem a racionalidade limitada.
Por tal motivo, a recomendação reside na formulação de instrumentos jurídicos paralelos aos smart contracts que possibilitem também a regulação da relação contratual fora do mundo virtual e codificado, a exemplo de Contratos de Parceria para o desenvolvimento de tecnologias (NFTs, criptomoedas) ou Memorando de Entendimentos, estabelecendo os parâmetros e expectativas da relação contratual a se firmar.
Desse modo é possível conferir uma maior segurança aos contratantes, sabendo que, em caso de litígio, aquilo que restou entabulado quando do início da relação contratual será respeitado e corretamente interpretado, sem descartar a inovação e eficiência econômica trazida pelos smarts contracts.
[1] MARCHSIN, Karina Bastos K. Blockchain e smart contracts: As inovações no âmbito do Direito. São Paulo: Editora Saraiva, 2022, p. 18.
[2] SAVELYEV, Alexander. Contract Law 2.0: «Smart» Contracts as the Beginning of the End of Classic Contract Law, Higher School of Economics, 2016, p.6.
[3] TIMM, Luciano Benetti. Direito Contratual Brasileiro: críticas e alternativas ao solidarismo jurídico. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 40.
[4] ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Rachel (Org.). Direito & Economia: Análise Econômica do Direito e das Organizações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 123.
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