Resumo:A expansão urbana vivenciada ao longo das últimas décadas obrigou a busca de mecanismos que resultassem no uso racional da propriedade, estabelecendoa Constituição Federal, o Código Civil e o Estatuto da Cidade o fim social da propriedade como determinação para que se dê uso adequado aos imóveis. Um dos mecanismos para se alcançar tal fim é através da tributação, atribuindo-se aos Municípios o poder de estabelecer e cobrar o Imposto Predial Territorial Urbano com função extrafiscal, podendo ele assumir a forma progressiva, com a aplicação de alíquotas diferenciadas para os imóveis localizados em sua área urbana, de forma a gerar desenvolvimento local e justiça tributária.No fim de 2010, Mogi Guaçu, SP, uma cidade de médio porte, adotou a forma progressiva do IPTU, o que causou grande impacto na sociedade, culminando na Construção do Shopping Buriti em uma área subutilizada e na não reeleição do Prefeito da época, o que levou a conclusão de que esse tipo de medida pode gerar desenvolvimento, mas com consequências políticas para o administrador que a adotou.
Palavras-chave: IPTU. Princípios tributários.Progressividade. Mogi Guaçu. Função Social da Propriedade.
Abstract: The urban expansion experienced over the past decades has forced the search for mechanisms that would result in the rational use of the property, establishing the Constitution, the Civil Code and the City Statute the social purpose of the property as determined manner to give proper use to real estate. One of the mechanisms to achieve this end is through taxation, attributing to the municipalities the power to establish and collect the Territorial Property Tax Urban with extrafiscal function, can he take the progressive way, by applying different rates for properties located in its urban area in order to generate local development and tax justice. In late 2010, Mogi Guaçu, SP, a medium-sized city, adopted a progressive form of property tax, which caused great impact on society, culminating in the construction of Shopping Buriti in an underutilized area and no re-election of the then Mayor, which led to the conclusion that such a measure could generate development, but with political consequences for the administrator who adopted her.
Keywords: property tax. Tax principles. Progressiveness. Mogi Guaçu. Social Function of Property.
Sumário: 1. Introdução; 2.Referencial Teórico; 2.1 O Sistema Tributário Nacional; 2.1.1Princípios Constitucionais Tributários; 2.1.2 Imunidades Tributárias; 2.1.3 Isenções Tributárias; 2.2O Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU); 2.3O IPTU Progressivo; 3. Metodologia; 3.1 Objeto de estudo – Mogi Guaçu/SP; 4. Análise e discussão de resultados; 5. Considerações finais.
1.Introdução:
Um dos grandes problemas enfrentados pelas cidades relaciona-se com a ocupação do espaço urbano, sendo comum em todas elas a existência de vazios, de áreas subutilizadas em regiões centrais, onde se concentram a maior parte dos serviços, sendo tais espaços utilizados na maioria das vezes como mecanismo de especulação imobiliária.
Diante de tal quadro, o presente estudo pretende analisar esse tipo de situação em Mogi Guaçu, SP, uma cidade de médio porte, com forte presença da população na área urbana, com áreas subutilizadasna região central da cidade.
Uma das formas utilizadas para enfrentar a situação e buscar uma melhor ordenação do espaço urbano no município foi a adoção da progressividade do IPTU, com a utilização de alíquotas diferenciadas para algumas áreas e correção do valor venal dos imóveis.Diante de tal quadro, no final de 2010, foram aprovadas duas leis municipais, visando atualizar a planta genérica de valores e alterar as alíquotas do IPTU.
Com isso surge o questionamento: quais os benefícios que a adoção da progressividade pode trazer para o Município de Mogi Guaçu-SP?
A partir desse questionamento, o presente estudo tem como objetivo geral: descrever o processo de implantação do Imposto Predial Territorial Urbano, na sua forma progressiva, no Município de Mogi Guaçu-SP.
2. Referencial teorico:
A partir do momento que um indivíduo nasce eleestá sujeito a alguma forma de tributação por parte do Estado, que faz uso de tal poder para custear suas despesas e para regular a sociedade. Os tributos são classificados em taxas, contribuições, contribuições de melhoria e impostos, sendo o último objeto deste estudo.
Diante da ordem constitucional vigente, o poder de tributar tem que obedecer determinadas regras, sendo que para a análise do IPTU se faz necessário entender o funcionamento do Sistema Tributário Nacional e seus princípios norteadores.
2.1 O sistema tributário nacional:
Segundo Paulo de Barros Carvalho (2003, p.21)“tributo é a prestação pecuniária que o Estado, ou um ente por ele autorizado, no exercício de sua soberania exige dos sujeitos econômicos que lhe estão submetidos”, ou seja, todo aquele que pratique qualquer atividade econômica e esteja, de alguma forma, submetido à soberania brasileira, paga tributo ao Brasil, aí sendo entendido os três entes federativos e as demais pessoas jurídicas de direito público.
Vale destacar que só pessoa jurídica de direito público cobra tributo, não sendo qualificado como tal, prestações pecuniárias feitas para entes privados.
O sistema tributário nacional tem sua estrutura determinada pela Constituição de 1988, sendo que toda a legislação sobre a questão deve ser vista a partir do texto constitucional.
A Constituição de 1988 estabeleceu que o Estado Brasileiro adotaria a forma federativa,com três esferas de poder: União, Estados e Municípios, não tendo um ente o poder de usurpar a competência do outro.Para a garantia de tal ordem, a própria Constituição criou um guardião de seu texto: O Supremo Tribunal Federal (STF).
Diante do princípio federativo, ao tratar da ordem tributária e do orçamento, no título VI, a Constituição estabeleceu competências distintas para os três entes federativos, referente à cobrança de tributos.
Vale destacar que tributo é gênero, do qual impostos, taxas e contribuições são espécies. Dentre os Impostos, coube aos Municípios a cobrança do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), Imposto sobre Transmissão Intervivos e o imposto que interessa ao presente estudo: o IMPOSTO PREDIAL TERRITORIAL URBANO (IPTU)
No entanto, antes de adentrar ao IPTU, tendo em vista que ele está totalmente integrado ao sistema tributário nacional, é necessário que se entendam alguns temas relacionados aos tributos: os princípios constitucionais tributários, as imunidades e as isenções:
2.1.1.Princípios constitucionais tributários:
Segundo Paulo de Barros Carvalho princípios devem ser entendidos:
“Sendo objeto do mundo da cultura, o direito e, mais particularmente, as normas jurídicas estão sempre impregnadas de valor. Esse componente axiológico, invariavelmente presente na comunicação normativa, experimenta variações de intensidade de norma para norma, de tal sorte que existem preceitos fortemente carregados de valor e que, em função do seu papel sintático no conjunto, acabam exercendo significativa influência sobre grandes porções do ordenamento, informando o vetor de compreensão de múltiplos segmentos. Em direito utiliza-se o termo “princípio para denotar as regras de que falamos” (in CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. Saraiva. São Paulo: p. 144)
Já Carraza (1999, p. 33), citando JesúsGonzales Peres acrescenta:
“Os princípios jurídicos constituem a base do Ordenamento jurídico, a parte permanente e eterna do Direito e, também, o fator cambiante e mutável que determina a evolução jurídica; são as idéias fundamentais e informadoras da organização jurídica da Nação.(…)”
Melhor esclarecendo: princípios são orientações, determinações superiores à lei, que norteiam a sua interpretação e aplicação. A Constituição Federal consagrou uma série de princípios, abaixo comentados, que devem ser obedecidos quando da aplicação da legislação tributária.
A)Princípio da legalidade: segundo esse princípio nenhum tributo pode ser exigido ou aumentado sem lei que o estabeleça (art. 150, I da CF);
B)Princípio da anterioridade: segundo ele nenhum tributo pode ser cobrado no mesmo exercício financeiro em que foi publicada a lei que o criou (art. 150, III da CF). Há exceções: a anterioridade nonagesimal das contribuições, que não é objeto do presente estudo;
C)Princípio da irretroatividade da lei tributária:não podem ser cobrados tributos de fatos ocorridos antes da lei que o criou, ou seja, a lei tributária não retroage para prejudicar o contribuinte. É corolário deste princípio, o dispositivo constitucional (art. 5º.) que determinam o respeito ao ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
D)Princípio da tipologia tributária: só será cobrado tributo daquilo que está exatamente descrito na norma que o criou, não comportando interpretações extensivas.
E)Princípio da proibição de tributo com efeito de confisco: (art. 150, IV da CF): o tributo cobrado não pode ter valor que torne inviável a atividade econômica. Vale destacar que o tributo não se confunde com as penalidades advindas do seu não pagamento, mas essa questão não é objeto do presente estudo.
F)Princípio da vinculabilidade da tributação: o agente público só pode fazer o que a lei determina, não se aplicando à questão tributária os critérios de conveniência e oportunidade.
G)Princípio da uniformidade: é vedado a União estabelecer tributos não uniformes em todo território nacional. Vale destacar que tal princípio não conflita com as imunidades e isenções que serão vistas abaixo.
H)Princípio da capacidade contributiva: Segundo
Sabag (2007, p.36) “Traduz-se no brocardo “quanto mais se ganha, mais se paga”Tal postulado remete o leitor à intelecção do conceito de progressividade de alíquotas”. Esse princípio será de extrema relevância para o entendimento do IPTU progressivo.
Assim, independente do ente federativo que estabeleça o tributo, na sua aplicação os princípios acima deverão ser obedecidos, sob pena de sua cobrança ser considerada inexigível.
2.1.2 Imunidades tributárias:
Imunidades Tributárias são vedações que a Constituição impõe ao ente público de cobrar impostos de determinadas pessoas, fatos e situações. Melhor esclarecendo: O Estado não pode cobrar imposto nas situações previstas no art. 150, VI da Constituição, sendo elas:
a)Cobrar impostos sobre a renda, serviços ou patrimônio uns dos outros;
b)Templos de qualquer culto;
c)Patrimônios, rendas ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos de lei;
d)Livros, jornais e periódicos e o papel destinado a sua impressão.
Além das imunidades acima citadas, há outras espalhadas pela Constituição, mas que não guardam relevância com o tema do presente estudo e, portanto, não serão analisadas.
2.1.3 Isenção tributária:
Ao contrário da imunidade que veda a incidência da norma sobre determinado fato gerador, a isenção nasce dentro da norma, isentando o fato gerador de determinado tributo sob determinadas circunstâncias;
Melhor esclarecendo: na imunidade a situação não gera tributo, na isenção a lei prevê que aquela situação gera tributo, mas que se ocorrer em determinadas hipóteses o tributo não será cobrado.
As imunidades encontram-se previstas constitucionalmente, não cabendo ampliação ou redução. Já na isenção, o ente que estabeleceu o tributo pode estabelecer condições em que não será ele cobrado.
2.2.O imposto predial territorial urbano (IPTU)
O IPTU é um imposto previsto constitucionalmente no art.156, I , de competência municipal, incidente sobre a propriedade predial e territorial urbana, incidindo ele sobre a posse, a propriedade ou o domínio útil de imóveis localizados em áreas urbanizadas.
Para o Código Tributário Nacional não basta que a Lei Municipal estabeleça como área urbana determinado local, havendo a necessidade de que ela tenha pelo menos dois dos seguintes itens:
1 – Meio fio ou calçamento com a canalização de águas pluviais;
2 – Abastecimento de água;
3 – Sistemas de esgotos sanitários;
4 – Sistema de iluminação pública, bastando neste caso que haja distribuição domiciliar, visto que a lei fala expressamente “com ou sem posteamento);
5 – Posto de Saúde ou Escola Primária a menos de 03 km do imóvel.
Apesar de haver certo debate sobre a possibilidade dos Municípios cobrarem IPTU de áreas urbanizáveis, ou seja, de loteamentos que não preencham os requisitos acima, a Lei n. 6766/79 que trata do parcelamento do solo urbano, exige que o empreendedor implante no local pelo menos os 04 primeiros itens supra mencionados, ou seja, todo loteamento é considerado área urbana e, portanto, passível de incidência de IPTU.
As alíquotas do IPTU incidirão sobre o valor venal do imóvel, sendo ela determinada por Lei Municipal, com base na Planta Genérica de Valores.
Valor Venal deve ser entendido comoo valor atribuído a cada imóvel urbano de um Município por sua Planta Genérica de Valores, assim dizendo Fabretti (2005, p.64):
“A base de cálculo do IPTU é o valor venal do imóvel.
O valor venal é determinado pelo Município, com base numa planta genérica de valores. Essa planta deve levar em conta a localização do imóvel no território do Município que, dependendo do zoneamento urbano, terá maior ou menor valor.”
Segundo Moreira (2005, p.02) “Planta de valores é a denominação genérica de uma fórmula de cálculo que possibilita a obtenção dos valores venais de todos os imóveis urbanos de um município a partir da avaliação individual de cada uma dessas propriedades.”
Ao estabelecer o valor do IPTU de um imóvel, o Município também deverá se atentar sobre o cumprimento ou não dafunção social da propriedade, previsto na Constituição Federal, no Código Civil e no Estatuto da Cidade.
Segundo Santos (2010)a função social da propriedade deve ser vista como “o princípio da predominância do interesse público sobre o interesse particular, que deve utilizar a propriedade de maneira racional em prol do bem-estar da sociedade.”
Sobre a progressividade do IPTU afirma Carraza (1999, p. 78):
“Portanto, a capacidade contributiva revela-se, no caso do IPTU, com o próprio imóvel urbano. Do contrário, não se teria mais mãos a medir. Apenas à guisa de exemplo, dois proprietários de imóveis urbanos idênticos pagariam IPTUs diferentes só porque um deles é rico industrial e outro, modesto aposentado. Não é isto, obviamente, que a Constituição quer.
Em suma, o IPTU deve obedecer ao princípio da capacidade contributiva, nos termos do já estudado art. 145, §1º., 1ª parte, da CF. E, para isso, deve ser progressivo. Esta é uma progressividade fiscal, de existência obrigatória.
Mas há uma outra progressividade do IPTU, que poderíamos chamar de extrafiscal, que tem dado margem a inúmeras controvérsias. Vejamos.
O §1º do art. 156 da CF prescreve que o IPTU “poderá ser progressivo, nos termos de lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Aliás, este poderá, como aguisadamente observou Souto Maior Borges, em parecer, equivale a deverá.
É que, como averbava Rui Barbosa, todo poder encerra um dever. Quando a Constituição confere a uma pessoa política um poder, ela, ipso facto, lhe impõe um dever. É por isso que se costuma falar que as pessoas políticas têm poderes-deveres. Assim, o §1º do art. 156 da CF, juridicamente interpretado, estabelece que o IPTU deverá ser progressivo, nos termos da lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade.”
Segundo o art. 32 do Código Tributário Nacional, o fato gerador do IPTU é “a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física, como definido na lei civil”
Para Sabag (2007, p. 312) bem imóvel deve ser considerado:
“O conceito de bem imóvel ou acessão física é o decorrente do art. 79, 1ª parte, do Código Civil (Lei n. 10.406/2002), ou seja, por natureza, sendo o solo e seus agregados da própria natureza (vegetação, árvores etc) e por acessão física, tudo que se une ou adere ao imóvel por acessão, como o caso de formação de ilhas, de aluvião, de avulsão, de abandono de álveo, de construções e edificação.”
Como já dito acima o fato gerador do IPTU é a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel urbano, incidindo ele anualmente, ou seja, a incidência tributária ocorre no dia 1º. de janeiro de cada ano.
O sujeito passivo do IPTU é o proprietário, o possuidor ou o titular do domínio útil (usufrutuário ou enfiteuta), não sendo considerado como tal o locador. Sua base de cálculo é o valor venal do imóvel, estabelecido pela Planta Genérica de Valores.
Vale destacar que este imposto, apesar de suas características peculiares, visto que ligado diretamente ao desenvolvimento dos municípios, tem que respeitar os princípios constitucionais, entre eles o da capacidade contributiva.Para Carraza (1999, p. 77) “a capacidade contributiva, para fins de tributação por via de IPTU, é aferida em função do próprio imóvel (sua localização, dimensões, luxo, características etc), e não da fortuna em dinheiro de seu proprietário”
O princípio da capacidade contributiva do IPTU, junto com a autorização legal dos Municípios de intervir na economia local para assegurar o cumprimento da função social da propriedade, confere ao IPTU natureza extrafiscal,conforme afirmado por Carraza (1999, p. 77) sendo tal dispositivo conhecido como PROGRESSIVIDADE.
No entanto, antes de adentrar a questão da progressividade é preciso esclarecer que a simples atualização monetária do valor venal do imóvel, que é a base de cálculo do IPTU, não lhe confere progressividade, tanto que tal ato pode ser feito por simples Decreto do Poder Executivo.Para se aplicar a progressividadeé necessário que seja feita Lei Municipal, aprovada pelo Poder Legislativo local.
2.3 O IPTU progressivo
A progressividade do IPTU é admitida pela Constituição Federal, em seu art. 156, §1o. I e II e art. 182, § 4o., II, que a estabelece em razão do valor do imóvel, do seu uso e localização.
No caso do § 1º, I do art. 156 da Constituição Federal, que autoriza a progressividade em razão do valor do imóvel, aplicou–se o princípio da capacidade contributiva, ou seja, imóvel que vale mais, paga mais, não comportando tal dispositivo grandes discussões, visto que contempla ele o princípio da Justiça Tributária.
O dispositivo que será analisado pelo presente estudo é o previsto no § 1º. , II do art. 156, que juntamente com o art. 182, § 4º., II da Constituição irão buscar o cumprimento da função social da propriedade, assim dizendo eles:
Art. 156, § 1º., II da Constituição Federal:
“ter alíquotas diferentes de acordo com a localização e o uso do imóvel”
Art. 182, §4º.II da Constituição Federal:
“É facultado ao Poder Público Municipal, mediante lei específica para a área incluída no Plano Diretor, exigir nos termos da Lei Federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I – parcelamento ou edificação compulsória
II – imposto predial territorial urbano progressivo no tempo
III – desapropriação…
Sobre a função extrafiscal do IPTU com o fim de assegurar a o cumprimento da função social da propriedade, como já citado a acima, Carraza (1999, p 79) esclarece:
“O §1º do art. 156 da CF prescreve que o IPTU “poderá ser progressivo, nos termos da Lei municipal, de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade”. Aliás, este poderá, como aguisadamente observou Souto Maior Borges, em parecer, equivale a deverá”
Assim, os Municípios tem o dever de usar o IPTU para atender a função social da propriedade, entendida como o seu uso de forma a beneficiar a todos, onde está ela inserida.
Em que pese o art. 182, § 4º. II da Constituição apresentar a expressão “sucessivamente” para estabelecer as medidas que serão tomadas caso a função social da propriedade não seja cumprida, a questão não foi tratada pelo Supremo Tribunal Federal que se ateve apenas a afirmar em vários julgados que a progressividade do IPTU só pode ser aplicada, para garantir o seu fim social, após a edição da Emenda Constitucional 29/2000, o que leva a concluir que pode ser ela aplicada pura e simplesmente.
Também não há impedimento que as alíquotas sejam aumentadas ano a ano, no caso do proprietário que se recusa a dar aproveitamento ao seu imóvel, como dito por Carraza (1999)
Enfim, compete aos Municípios garantir o fim social da propriedade, sendo que um dos instrumentos que dispõe é a aplicação da progressividade do IPTU, ou seja, as alíquotas sobre o tributo poderão ser aumentadas ou reduzidas para garantir o uso racional da propriedade urbana.
3. Metodologia
No presente estudo será feito uma análise qualitativa do IPTU progressivo, a partir de estudo de caso, consistente na situação encontrada na cidade de Mogi Guaçu, SP.
Para isso foram levantados dados junto ao Município, consistente nas Leis que implantaram a progressividade do IPTU, valores de IPTU cobrados em locais de baixa densidade populacional próximos ao centro da cidade e em bairros distantes e mais populosos e a evolução da ocupação urbana a partir da implantação da progressividade do IPTU a partir de 2011.
Também foram obtidas informações sobre a inauguração de empreendimentos comerciais na cidade após a implantação do IPTU progressivo e do impacto de seu aumento, na rede mundial de computadores, com notícias publicadas nos dias 10/03/2011, 11/03/2011, 22/03/2011 20/04/2011.
3.1 Objeto de estudo – Mogi Guaçu/SP.
Mogi Guaçu é uma cidade do interior paulista, situada há 166 km da capital, com população de 144.963 habitantes, segundo o censo demográfico de 2010, sendo que a maior parte da população reside na área urbana – 130.366.
Como Mogi Guaçu apresenta uma forte concentração populacional (163,8 hab/km2) a ocupação do solo urbano passou a ser uma questão de grande importância dentro do planejamento municipal, havendo no Município inúmeras áreas próximas ao centro da cidade subutilizadas,além da pequena variação de valores de imóveis situados entre a região central e em bairros populares.
Na região central da cidade há grandes áreas com baixo índice de ocupação, apesar da sua localização privilegiada, sendo observadas grandes áreas vazias, o que pode ser um problema, visto a forte presença da população urbana, o que se torna relevantepara o seu planejamento.
Vazios urbanos em regiões com alto índice populacional é um problema para municípios de médio e grande porte, pois aumenta o custo dos serviços públicos, com a necessidade de maior oferta de transporte para as regiões centrais, além da instalação de equipamentos urbanos
4. Análise e discussão dos resultados:
Para oPlano Diretor do Município de Mogi Guaçu, expresso pela Lei Complementar 968/2008 uma propriedade atende a sua função social se atende as exigências desta lei e também respeita os índices de desenvolvimento urbanístico ali previsto com o usoda propriedade com atividades de interesse urbano, a ocupação do solocompatível com a preservação e manutenção ou melhoria da qualidade do meio ambiente, respeito ao direito de vizinhança, redução de viagens por transporte individual motorizado, oferta atividades adequadas para o desenvolvimento socioeconômico
Diante de tal situação e considerando os vazios urbanos existentes em áreas centrais do município, no final de 2010 foram aprovadas as Leis Municipais Complementares 1085 e 1086 que mudaram o totalmente a estrutura de cobrança do IPTU.
A mudança na legislação municipal se deu em virtude daconstatação que o valor do IPTU em Mogi Guaçu apresentava valor muito aquém das necessidades do Município, sendo que muitas propriedades não atendiam a sua função social, observando-seque bairros que concentravam população com baixa renda como Santa Terezinha e Chaparral pagavam valores próximos daqueles situados em bairros nobres ou com baixa densidade populacional, apesar de situados em áreas urbanas centrais, como é o caso do Loteamento Parque Real e do Imóvel Pedregulhal.
Assim, como já dito acima, no fim de 2010,o então prefeito da época decidiu atualizar a planta genérica de valores do município e realizar alterações no Código Tributário Municipal, estabelecendo alíquotas diferenciadas para o pagamento do IPTU.
A Lei Complementar Municipal 1085/2010 atualizou a planta genérica de valores e a Lei 1086/2010 alterou inúmeros dispositivos do Código Tributário Municipal, ambas alterações tinham objetivos comuns:inibir a especulação imobiliária o que se dá quando se mantém imóveis subutilizados em regiões valorizadas do Município, reduzindo a oferta no local e estabelecer justiça tributária
A Lei Complementar Municipal n. 1085/2010, ao atualizar a Planta Genérica, apresentou novos valores de construção e de localização e, também, novos valores referente à localização e valorização do imóvel, o que foi chamado de fator K, fato que pode ser constatado pela Lei em anexo, constando tal fator dos carnês de IPTU do Município.
Pelo Fator K são estabelecidos valores diferentes de acordo com os números que receberam os imóveis, podendo tal diferenciação ser considerada como a progressividade do IPTU
Já a Lei Complementar Municipal 1086/2010 alterou diversos dispositivos do Código Tributário Municipal, sendo que o dispositivo alterado mais relevante para o presente estudo é aquele que está diretamente ligado ao IPTU Progressivo, constanteda alteração sofrida no art. 147, I e II que estabelece uma alíquota de 6% sobre o valor venal de imóveis não edificados que estejam abertos, abandonados ou baldios ou onde houver edificação inadequada na zona, nas dimensões e no uso.
No entanto, tais leis, apesar de aumentarem sobremaneira o valor do IPTU em algumas áreas, não se detiveram apenas nessa questão, apresentando a Lei Complementar 1086/2010 em seu art. 6º., faixa de isenção de referido tributo para imóveis cujos valores venais não ultrapassassem 14.000 UFIM (unidade fiscal do Município de Mogi Guaçu), o que hoje perfaz o valor de R$ 36.820 de valor venal, ou seja, imóveis situados em bairros com baixo poder aquisitivo (valor da UFIM em 2014 – 2,63), onde se situam pequenas construções.
Também gozaram de valores diferenciados imóveis com áreas inferiores a 10.000m2, visando beneficiar os cidadãos com menor poder aquisitivo.
Assim, no fim de 2010, mais especificamente no dia 16 de dezembro, foram aprovadas duas leis municipais que previram a progressividade do IPTU em Mogi Guaçu, sendo ela objeto de projeto de Lei do então Chefe do Poder Executivo, Paulo Eduardo de Barros, mas tais leis só foram “percebidas” pela população no início de 2011, com a chegadados carnês para pagamento de IPTU.
A edição das Leis supracitadas causou inúmeras conseqüências entre as quais podem ser citadas: o inicio da Construção do Shopping Buriti na cidade, cujo anúncio de inicio das obras se deu em 02 de junho de 2011, vindo ele a ser inaugurado em 22 de novembro de 2012 . Coincidentemente ou não, fato é que referido empreendimento situa-se defronte a Av. Brasil, situada na região central da cidade, foi construído em uma área subutilizada que sofreu as conseqüências da mudança na forma de cobrança do IPTU.
Vale destacar que defronte ao local já está sendo realizado a terraplenagem dá área para construção de um grande hipermercado, vindo da Capital
No entanto, referido aumento, apesar dos benefícios advindos para a população, como aumento de faixas de isenção de tributo e a inauguração de empreendimentos em áreas antes não utilizadas no Município, não foi bem recebida pela maior parte da população que, ao constatar o aumento sensível do IPTU para o ano de 2011, que não afetou toda a população, tomou inúmeras medidas tanto do ponto de vista político como do ponto de vista jurídico.
Politicamente foram feitas passeatas, com diversas manifestações junto à Câmara dos Vereadores, manifestações na Imprensa Local e regional.
A comoção popular se mostrou real através da não reeleição do então Prefeito, vindo ele a perder o pleito para seu maior adversário político, o atual prefeito Valter Caveanha, não restando a menor dúvida que o aumento dos valores de IPTU foi um fator de extrema relevância no processo eleitoral do anode 2012, tanto que os 03 vereadores mais ativos na questão, que faziam parte da oposição foram eleitos, fato que pode ser constatado por simples consulta ao site do T.R.E.
Juridicamente foram interpostas inúmeras ações judiciais, entre as quais pode ser citada a Ação Popular n. 0004425-71.2011.8.26.0362 (362.01.2011.004425), atualmente em fase de recurso no Tribunal de Justiça paulista, interposta pelos então vereadores Salvador Francelli Neto, Thomaz Caveanha e Ivens Chiarelli, todos reeleitos em 2012. Referida Ação Popular obteve a concessão de liminar para suspender a cobrança do IPTU durante o ano de 2011, liminar essa posteriormente cassada pelo Tribunal de Justiça Paulista, vindo posteriormente, em 1ª Instância, a ser julgada procedente, visto que foi constatado um vício formal na publicação da Lei, ou seja, a ausência de publicação de um de seus anexos.
Atualmente a Ação Popular já conta com julgamento do Tribunal de Justiça favorável ao Município, estando aguardando o decurso do prazo para interposição de recurso para os Tribunais Superiores.
Outras ações idênticas à Ação Popular também foram interpostas, com o mesmo objetivo: isentar os guaçuanos do pagamento do IPTU com base na nova legislação, todas elas ainda em tramitação perante o Poder Judiciário.
As falhas na publicação das Leis foram sanadas e a administração mudou, estando atualmente em pleno vigor as leis que implantaram o IPTU progressivo.
4.1 Considerações finais:
Considerando as mudanças ocorridas na região central de Mogi Guaçu, fica claro que a adoção do IPTU progressivo atendeu sua função extrafiscal, intervindo na sociedade para gerar desenvolvimento, apesar do impacto político que teve, culminando na não reeleição do prefeito que alterou a legislação municipal.
Como se disse acima, a questão não é apenas legal ou jurídica, pois já foi incluída na Constituição e pacificada pelo Supremo Tribunal Federal, mas se reveste de um caráter político. Dessa forma, como garantir o cumprimento do que determina a Constituição Federal quanto à progressividade do IPTU? Como garantir o cumprimento de algo que beneficia a população?
Enfim,essas são questões que merecem um estudo posterior, pois aqui se concluiu que o IPTU progressivo pode ser usado, de forma eficaz, como instrumento para fomentar o desenvolvimento em municípios de médio porte, como Mogi Guaçu, SP.
Bacharel em Direito e Especialista em Gestão Pública Municipal
Administrador Mestre e Doutor em Administração
Docente da Universidade Federal de Alfenas UNIFAL-MG Campus Avançado de Varginha
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