O interesse de agir e o prévio requerimento administrativo nas ações previdenciárias

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Resumo: São inúmeras as ações previdenciárias, e muitas não preenchem todas as condições da ação. Analisou-se essa situação através do método indutivo, conjuntamente com o exegético-jurídico. A ausência do requerimento administrativo previdenciário anterior a propositura da ação judicial acarreta a inexistência da lide. Contudo muitos magistrados têm dado provimento a estas demandas. A falta do conflito de interesses resulta na ausência do interesse de agir, condição da ação, que deveria resultar de plano na extinção do processo sem julgamento de mérito. Urge analisar essa correspondência e discutir sobre a caracterização, ou não, do requerimento administrativo como requisito de validade do processo. Apesar dos diversos posicionamentos jurisprudenciais é a doutrina que abaliza a solução desses conflitos de natureza processual responsáveis pela validade da ação, e consequentemente pela solução dos conflitos segundo o Código Processual Civil.  


Palavras-chave: Ação Previdenciária. Processo Civil. Interesse de Agir.


Sumário: 1.Introdução. 2. Da ação previdenciária. 3. Da ação. 4. Da lide. 5. Das condições da ação. 5.1. Da possibilidade jurídica do pedido 5.2 Da legitimidade para a causa 5.3 Do interesse de agir 5.3.1 Do interesse de agir na ação previdenciária 5.3.2 Da substituição ao órgão previdenciário 5.3.3 Do prejuízo à ampla defesa e ao contraditório 5.4. A ausência ao requerimento administrativo e a solução judicial. 6. Conclusão.


1 Introdução


A demanda previdenciária é volumosa, permeia as esferas administrativas e judiciárias, mas existem divergências quanto a necessidade prévia de requerer-se o beneficio administrativamente antes do ingresso em juízo. Parte da jurisprudência entende que inexiste esta necessidade, contudo, esta ausência gera prejuízo a própria ação e suas condições de validade. Inexistindo o requerimento administrativo, seu reflexo é a ausência de litígio (lide), o que conduz diretamente a ausência do interesse de agir, uma das condições da ação.


Discute a jurisprudência acerca da necessidade ou não de encarar o requerimento administrativo prévio como requisito para a validade da ação. Contudo, não trata-se apenas do requerimento, e sim do seu reflexo na esfera processual.


Objetiva-se com este trabalho elucidar o tema e discutir sobre o interesse de agir nas ações previdenciárias e sua conexão intima com o prévio requerimento citado. Para tanto, tratou-se em linhas gerais sobre a ação previdenciária; a ação inserida no Estado moderno; da lide e dos conflitos de interesses, das condições de validade da ação; do interesse de agir nas ações previdenciárias e da solução adequada para esse problema.


Reflete a importância do trabalho na vasta jurisprudência divergente e na análise de uma condição primária de validade e sua influência na sobrevivência do processo, demonstrando a necessidade de avaliar-se e discutir-se sobre as condições de validade da ação, para evitar-se prejuízos processuais.


2 Da Ação Previdenciária


A ação previdenciária, seja aquela que busca alcançar quaisquer dos benefícios a que faça jus (salário-maternidade, auxílio-doença, aposentadoria por invalidez, dentre outros) subtende que antes de sua propositura houve a busca pela via administrativa.


O Instituto Nacional do Seguro Social é uma autarquia do Governo Federal criada para manter o regime geral da previdência social e conceder os benefícios pleiteados pelos segurados uma vez que estejam presentes os requisitos próprios, como carência e tempo de contribuição em casos determinados.


Contudo, caso entenda a referida autarquia que inexiste o preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do benéfico, será o pedido indeferido, possibilitando ao requerente o contraditório e a ampla defesa a ser exercido na esfera administrativa através de recurso.


O artigo 5º da Constituição Federal, em seu inciso XXXV, consagra que ao Poder Judiciário incubirá a análise de lesão ou ameaça ao direito, o que não é passível de modificação legislativa por intermédio de lei. Partindo desta premissa, é assegurado ao requerente que pela via administrativa não logrou êxito, requerer judicialmente seu pedido sem extinguir a esfera administrativa.


Ocorre, entretanto, uma situação constante na esfera judiciária que tem tomado grandes proporções e de discussão doutrinaria calorosa, a possibilidade, ou não, de ingressar no juízo sem o requerimento administrativo. Antes de mais nada urge observar conceitos do processo civil e sua correspondência com a situação fática analisada.


3 Da Ação


O Estado Moderno, organizado sistematicamente, amadurecido através dos séculos, desenvolveu tentáculos de controle e organização em sociedade. A tríade que teve início ainda com Aristóteles, aprimorada por Montesquieu, desenvolveu-se bastante, sendo estudada a fundo. O Poder Judiciário, um desses vértices, é de suma importância para a convivência em sociedade, desde os pactos sociais clássicos. Contudo, para a aplicação correta desse Poder, é imprescindível compreendê-lo através de uma ciência própria, mormente quando o que se pretende vislumbrar é a forma de atuação e aplicação da Justiça corporificada e Estatal.


O Estado, como tutelar do Poder Judiciário tem a capacidade e o dever de aplicar a tutela jurisdicional, forma de soluções de conflitos através da aplicação do Direito pelo ente Estatal.


Uma vez o Estado ser munido desse poder de tutela, outras formas de defesa do direito são afastadas (contudo em alguns momentos podem ser exercidas, como a autotutela). Partindo desta premissa, por ser o Estado titular desse poder-dever, ao indivíduo surge um direito subjetivo, público, de acionar a jurisdição. Público porque busca-se a tutela através do Estado. Subjetivo por ser uma faculdade de requerer a manifestação Estatal para a solução do litígio (DONIZETE, 2007).


O ato através do qual se busca a solução desse litígio, a manifestação do Poder Judiciário, é a propositura da Ação. É a busca da resolução da incerteza ou insegurança ocasionada pela lide, independentemente da solução.


O Código de Processo Civil ao tratar de ação adotou a teoria eclética da qual Liebman fora precursor. Segundo esta teoria, o direito de ação não está adstrito a uma sentença que consagre o resultado favorável daquele que pleiteia, mas também, ao contrário do que defende a teoria abstrata, não está o direito de ação completamente independente do direito material. Existe, todavia, um liame entre a ação e uma sentença de mérito, seja qual for o provimento final (DONIZETE, 2007).


A manifestação deste direito a uma sentença de mérito está adstrito a certos requisitos que devem estar presentes para a resolução do mérito, denominados de condições da ação, a ausência destes encargos configura um fenômeno conhecido como carência da ação.


Contudo, antes de se levar em conta os requisitos básicos para se constituir a ação, é necessário observar a fagulha que desperta esse direito, a lide.


4 Da Lide


Por ser a vida em sociedade dinâmica, situações hão de surgir constantemente. Esses movimentos sociais e individuais seguem em sentidos distintos, em algum momento esses sentidos (interesses) irão se chocar, em maior ou menor proporção. Esses choques de interesses produzem conflitos que podem ser de ordem religiosa, moral, ética, política, jurídica, entre outros.


Estes conflitos ou insatisfações denotam um descontentamento causado por situações fáticas diversas onde se observam os choques de interesses. Quando estes choques levam a notável insatisfação, ou resistência, surge uma pretensão de lutar pela defesa desses interesses em conflito.


Se duas ou mais pessoas pleiteiam o mesmo bem, se apresentam interesses pelo mesmo item, que a uma só possa satisfazer, estar-se-á presente um conflito de interesses.


Contudo, uma vez que esses interesses se encontram em rota de colisão, e uma das direções busca submeter à outra ao seu crivo, observa-se, assim, a pretensão. Significa dizer em linhas gerais que se trata de um ato e não um poder. Algo que o indivíduo pratica, e não que possui. Consiste em uma manifestação e não na superioridade volitiva. Consiste ainda na submissão do interesse alheio ao próprio (CARNELUTTI, 1999).


Essa pretensão, para que de origem a lide (conflito de interesses, qualificado por uma pretensão resistida) deve encontrar resistência por parte daquele a quem se busca a submissão. É intrínseca ao próprio conceito de lide, condição necessária a sua existência. Resistir é opor-se, é reagir contra a pretensão imposta.


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

O binômio pretensão/resistência é responsável pela a configuração da lide, este conflito intersubjetivo de interesses. A resistência oposta à pretensão torna a situação litigiosa, apenas a existência da pretensão não configura a lide (CARNELUTTI, 1999).


A lide tem origem anterior ao processo (em regra), mas é no processo que ela busca sua solução, onde o autor, através da petição inicial leva ao crivo do Judiciário sua pretensão de solucionar o conflito.


Na ação previdenciária a busca da solução administrativamente e sua posterior recusa geram os requisitos básicos para a composição da lide, a pretensão de obter o direito pleiteado pelo autor e a resistência da Autarquia ao negar o interesse requerido.


A ausência deste requerimento não constitui a lide, o ingresso diretamente no judiciário carece da composição necessária para o conflito de interesses, a resistência da outra parte.


Parte da jurisprudência tem entendido que o requerimento administrativo não é requisito para a propositura da ação, ignorando assim a composição do litígio, a falta do requerimento significa a falta da resistência, logo, repita-se, a inexistência do conflito, da lide. Além da inexistência da oposição outros aspectos podem ser observados como estritamente necessários para que seja válida a ação e preencha todas as suas condições.


5 Das Condições da Ação


A solução da lide pressupõe o nascimento correto da ação, que requer o preenchimento de requisitos próprios. A ausência destes resulta na ausência de resolução, através de uma sentença de mérito, do conflito. Resolvendo-se o processo sem julgamento do mérito.


Os requisitos para existência da ação na verdade correspondem aos requisitos para o provimento final de mérito, uma vez que a ação já estará constituída, ainda que precariamente, é o que se extrai da teoria abstrata.


As condições da ação (teoria eclética) ou as condições para o provimento final (teoria abstrata), são três: a possibilidade jurídica do pedido, o interesse de agir, e a legitimidade para causa (DONIZETE, 2007).


5.1 Da possibilidade jurídica do pedido


Entende-se por possibilidade jurídica do pedido quando o ordenamento jurídico não se abstém de consagrar o exame determinada pretensão pelo Poder Judiciário. Diferentemente da improcedência do pedido, aquele requisito corresponde ao requerimento de matéria não vedada pelo ordenamento jurídico. Enquanto o direito não amparar a pretensão, vislumbra-se o caso de improcedência. Contudo, se o ordenamento jurídico proíbe a discussão do pedido, vislumbra-se a impossibilidade jurídica do pedido (MARINONI; ARENHART, 2006).


Convém ressaltar que o tema é bastante polêmico, tendo em vista que Liebman posteriormente conduziu a possibilidade jurídica do pedido para a seara do interesse de agir, deslocando-a e suprimindo-a, resultando assim em apenas duas condições, legitimidade para a causa e interesse de agir, mormente porque quando a pretensão requerida não pudesse ser atendida, faltaria o próprio interesse de agir. Contudo, o Código de Processo Civil ainda mantém a possibilidade jurídica do pedido como condição da ação.


5.2 Da Legitimidade para a Causa


A discussão quanto ao tema da legitimidade para a causa, requer uma observação quanto a duas teorias norteadoras desse elemento, a teoria da exposição e a teoria da asserção.


Segundo a teoria da exposição cumpre observar que as partes serão legitimas quando existir liame subjetivo com o direito material questionado, que seja demonstrado pelas partes. Seria uma similitude com o próprio juízo de mérito.


Por seu turno, a teoria da asserção consiste em afirmar que não se necessita que o direito material tutelado seja real, mas apenas sua afirmação. Destarte, a alegação da parte quanto a determinado direito, ainda que inexistente, já configura a parte como legítima, uma vez que a sentença é que irá determinar o mérito do conflito.


Dessa premissa se configura a legitimidade, não importa a o direito controvertido e a sentença, interessa observar se existe um liame entre a narrativa do autor e o direito alegado, criando um nexo plausível capaz de levar a conclusão lógica dos fatos expostos na inicial.


5.3 Do Interesse de Agir


O interesse de agir “relaciona-se com a necessidade ou utilidade da providência jurisdicional solicitada e com a adequação do meio utilizado para obtenção da tutela” (DONIZETE, 2007).


A provocação do Estado e a posterior concretização do processo não pode ser instrumento de mera consulta, e sim meio de aplicação da justiça, de soluções de conflitos.


Não basta apenas a importância da atuação jurisdicional para a solução do conflito, é necessário também que o meio utilizado seja condizente com a pretensão requerida.


Denota-se o interesse de agir quando, levando-se em consideração as afirmações autorais, encontre-se presente o binômio necessidade/adequação, para o autor da tutela requerida. Para verificar a presença do interesse de agir, ao analisar as alegações da parte requerente, algumas perguntas devem ser formuladas, partindo-se do princípio de que as afirmações alegadas na inicial são verídicas: “(a) somente através da providência solicitada ele poderia satisfazer sua pretensão (necessidade da providência)? (b) Essa providência é adequada a proporcionar tal satisfação (adequação da providência)?” (LIMA, 2005).


O interesse de agir, que é instrumental e secundário, provem da necessidade presente na busca da proteção ao interesse substancial. “Entende-se, que há interesse processual se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais” (THEODORO JÚNIOR, 1990).


O interesse processual não está presente apenas na utilidade do provimento, mas justamente na necessidade da tutela judicial como solucionador da lide, disposto à aplicação do direito objetivo ao caso concreto (THEODORO JÚNIOR, 1990). O processo não consiste em um meio de indagação ou consulta acadêmica. Só o dano ou o perigo de dano jurídico, representado pela efetiva existência de uma lide, é que autoriza o exercício do direito de ação.


5.3.1 Do interesse de agir na ação previdenciária


A falta do requerimento administrativo nas ações previdenciárias e o seu ingresso diretamente no judiciário correspondem a falta de uma das condições da ação, a ausência do interesse de agir, já que a lide não está constituída.


Na análise em tela, inexiste interesse processual da parte autora, uma vez que é desnecessário o provimento jurisdicional, haja vista a ausência de conflito de interesses (lide). A ausência do requerimento administrativo pressupõe a ausência de resistência, logo a ação não preenche todos os seus requisitos de validade, uma vez que o litígio é conditio sine qua non do processo (LIMA, 2005).   


Não se trata da necessidade do exaurimento da via administrativa, mas sim de encontrar uma resistência a pretensão, caso contrário não haverá lesão ou ameaça a ser apreciada pelo Poder Judiciário (artigo 5º, XXXV, CF/88).


A ausência do requerimento deve levar a carência da ação, antagonicamente ao que compreende parte do judiciário. É farta as decisões neste sentido, mormente em primeira instância, urge mencionar a título de exemplo a seguinte jurisprudência, que corresponde ao reflexo de muitas outras.


“PREVIDENCIÁRIO – PENSÃO POR MORTE – LEI VIGENTE – DATA DO ÓBITO – DECRETO 83.080/79 – AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO À PREVIDÊNCIA SOCIAL – DOENÇA ESPECIFICADA EM LEI – ART. 26, C/C ART. 151 DA LEI 8.213/91 – ACOMETIMENTO DURANTE O PERÍODO DE GRAÇA – MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DO CUJUS — UNIÃO ESTÁVEL – COMPROVAÇÃO – PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO DA PENSAO POR MORTE – RECURSO PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA – PEDIDO PROCEDENTE – BENEFÍCIO DEVIDO DESDE CITAÇÃO – AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO FORMAL – CORREÇÃO MONETÁRIA – JUROS DE MORA – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111 DO STJ.” (AC 2001.38.00.015454-6/MG, Rel. Juiz Federal Itelmar Raydan Evangelista, Primeira Turma,e-DJF1 p.1498 de 03/06/2008).


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Nota-se que o judiciário não compreende a falta da pretensão resistida como fundamental para a condição válida da ação. Todavia, os Tribunais Superiores vem compreendendo de modo diferente, é o que se denota da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça em análise:


“PROCESSUAL CIVIL. CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. FALTA DE PEDIDO ADMINISTRATIVO. 1 – A ausência total de pedido na via administrativa, ingressando a segurada, diretamente, na esfera judiciária, visando obter benefício previdenciário (aposentadoria por idade), enseja a falta de uma das condições da ação – interesse de agir – pois, à mingua de qualquer obstáculo imposto pela autarquia (INSS), não se aperfeiçoa a lide, doutrinariamente conceituada como um conflito de interesses caracterizado por uma pretensão resistida. 2 – Recurso Especial conhecido e provido para extinguir o feito sem julgamento de mérito (art. 267, VI, do CPC). Decisão: por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento.” (RESP 151818/SP (1997/0073680-6); DJ: 30/03/1998, PG: 00166; Relator Min. FERNANDO GONÇALVES; Data da Decisão 10/03/1998 Órgão Julgador SEXTA TURMA).


O interesse de agir está configurado na necessidade preeminente do requerimento administrativo, sua ausência configura a carência da ação, o que deve gerar a extinção do processo sem julgamento de mérito.


O Poder Judiciário não pode substituir-se a Autarquia Previdenciária, que deve inicialmente conhecer o pedido de concessão de benefícios. Apenas a negativa da administração enseja ao pretenso segurado o interesse de agir, pressuposto do direito de ação.


A propositura diretamente no Poder Judiciário deve ser interpretada como ausente de interesse de agir, e destarte, extinta. Caso contrário, uma interpretação diversa, privilegiando a ausência do requerimento acarreta duas situações a ser examinadas: A substituição ao órgão previdenciário e o prejuízo a ampla defesa e ao contraditório, o que convém refletir em linhas gerais.


5.3.2 Da substituição ao órgão previdenciário


Ao julgar como válida a ação que não dispõe de todas as condições de validade, o julgador presume existir a resistência à pretensão do autor, apesar de sequer o réu ter conhecimento do que se pleiteia. Fato este que acarreta uma situação desfavorável a ser observada, o aumento da proposição diretamente no órgão jurisdicional.


Os juizados especiais federais por serem mais céleres e contemplar o contraditório e a ampla defesa de forma mais eficaz, poderão, caso seja acolhida a tese de desnecessidade do prévio requerimento administrativo, ser alvo de diversos pedidos previdenciários, sem o dito requerimento. Destarte, aumenta-se a demanda e pode-se levar até mesmo a mudanças estruturais significativas na Autarquia Previdenciária, como o fim do atendimento aos requerentes dos benefícios. Suprimindo, assim, a função precípua do referido órgão, e substituindo sua função pela jurisdicional sem que haja antes a constituição da lide.


5.3.3 Do prejuízo a ampla defesa e ao contraditório


A ausência do interesse de agir, uma vez inexistente o requerimento administrativo, deveria levar a uma providência, a extinção sem o julgamento de mérito. Todavia, esse não é um caminho pacífico; muitos juizes entendem que deve a Autarquia Previdenciária afirmar se resiste ou não à pretensão do autor em sede de contestação.


Opondo resistência o INSS no mérito à pretensão, parte da jurisprudência entende que fica demonstrada a pretensão resistida e, em decorrência, evidencia-se o interesse de agir do autor, independentemente de existir requerimento administrativo prévio (LIMA, 2005).


Apresentando, a administração, contestação ao pedido do autor, abrangendo o mérito, ainda que em consagração ao princípio da eventualidade, a situação litigiosa resta caracterizada, ensejando o exercício da jurisdição, independentemente da prévia instauração na instância administrativa.


Destarte, a inexistência de pedido administrativo de benefício previdenciário, segundo a jurisprudência, não autoriza a extinção do processo, sem a apreciação do mérito, por falta de interesse de agir, caso a Autarquia, citada para os termos da pretensão, contesta o mérito, evidenciando o conflito de interesses que caracteriza a lide e impõe a autuação dos órgãos jurisdicionais para dirimi-lo (LIMA, 2005).


O magistrado, uma vez evidenciada a inexistência do requerimento administrativo, e consequentemente a falta de interesse de agir, deve de plano indeferir a inicial. Evidenciada a carência da ação por falta do preenchimento de seus requisitos, não deveria sequer citar a Autarquia Previdenciária, já que não há pretensão resistida e não há condições válidas da ação, este posicionamento é criticado por parte dos magistrados (LIMA, 2005). Entendem que é o INSS quem deve dizer se resistirá ou não a pretensão. Contudo, em face do princípio da eventualidade, o réu deve apresentar todos os argumentos de fato e de direito contrapostos àqueles apresentados na inicial, sob pena de preclusão.


Destarte, caso não ataque ao mérito, estar-se-á configurada a preclusão, caso o magistrado afasta a falta de interesse de agir, o contraditório e a ampla defesa estarão prejudicados. Assim, fica clara a necessidade do indeferimento inicial uma vez observada a inexistência de uma das condições da ação, para que não haja prejuízo a outra parte, nem que se presumam condições inexistentes.


5.4 A ausência do requerimento administrativo e a solução judicial


A formação da lide requer a resistência a pretensão proposta, o que resulta na falta do interesse de agir, caso não reste configurada. A ausência do requerimento administrativo resulta em alguns posicionamentos judiciais, todavia, o mais acertado, é o indeferimento de plano da inicial.


O interesse de agir constitui condição da ação, sua ausência resulta na carência da ação, o que vem expressamente delineado como causa de julgamento sem apreciação do mérito pelo Código de Processo Civil em seu artigo 267.


A lide deve estar previamente formada, o conflito de interesses deve ser anterior a propositura da inicial, caso contrário não deve existir provimento judicial. A ausência da lide, consoante anteriormente exposto, constitui falta de interesse de agir, e dessa forma, por tratar-se de evento anterior a citação, esta não deve ser efetuada, já que a ação sequer está regulamente constituída.


Não se trata de uma nova condição de procedibilidade, o prévio requerimento administrativo, mas justamente de uma condição da ação consagrada há tanto tempo. O requerimento é necessário para que torne a coisa litigiosa, e que preencha assim os requisitos da ação, evitando prejuízos maiores a parte requerida e ao próprio judiciário.


Não pode ser outra a providência adotada pelos magistrados que não o indeferimento da ação. Ausente os requisitos básicos de validade, a ação não pode iniciar qualquer ato do processo, por estar evidenciada a sua carência, e ter reconhecida sua solução positivada no Código Processual Civil, sua extinção sem julgamento de mérito.


6 Conclusão


Observou-se que o requerimento administrativo constitui como pressuposto de formação do litígio, o que resulta no interesse de agir. Assim, sua ausência acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, ao contrário do que parte da jurisprudência compreende.


Apesar de inúmeras situações existentes, de diversas soluções tomadas pelos juizes, observa-se que ao encarar o requerimento administrativo prévio como vital para a validade da ação, corporificado no interesse de agir, evita-se afrontar princípios como o contraditório e a ampla defesa, bem como premuni do aumento da demanda previdenciária diretamente ao Poder Judicial sem o prévio conhecimento do Instituto Nacional do Seguro Social.


Através da ilustração de duas jurisprudências que refletem outras tantas foi possível observar a divergência sobre a interpretação do requerimento administrativo como causa necessária a validade da ação, representada pelo interesse de agir.


Ademais, vislumbra-se no presente trabalho como uma condição da ação pode acarretar a extinção do processo, visto sua importância, o que deve ser discutido e observado pelos magistrados com o intuito de julgar da forma mais escorreita possível, dando o provimento adequado à solução jurisdicional.


 


Referências

BRASIL. Código de Processo Civil. Lei nº 5869, 11 de janeiro 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 12 set. 2009.

______. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em: 12 set. 2009.

______. Superior Tribunal de Justiça (STJ). 6ª Turma. Recurso Especial nº. 151818/SP. Publicado no Diário da Justiça no dia 30.03.1998. Disponível em: <http://www.stj.gov.br>. Acesso em: 12 set. 2009.

______. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. 1ª Turma. Apelação Cível nº. 2001.38.00.015454-6. Publicado no Diário da Justiça no dia 03.06.2008. Disponível em: <http://www.trf3.gov.br/>. Acesso em: 12 set. 2009.

CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. Vol. I. Tradução de Adrián Sotero de Witt Batista. Campinas: Servanda, 1999.

DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 8. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007.

LIMA, George Marmelstein Lima. O prévio requerimento administrativo como condição para a propositura da ação previdenciária. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=172>. Acesso em: 14 set. 2009.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 5. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 725.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Processo Civil, vol. I.. Rio de Janeiro: Forense, 1990, p. 59. 


Informações Sobre o Autor

Enderson Danilo Santos de Vasconcelos

Advogado, Pós-graduando em Direito Processual Civil


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
logo Âmbito Jurídico