O lado oculto da comunicação publicitária: as mensagens ocultas e subliminares e a ilicitude de seus efeitos sobre o consumidor

Resumo: O objetivo do presente artigo é analisar o tema da publicidade e suas técnicas de atuação. No estudo haverá o exame de métodos e espécies de publicidade bem como seus efeitos para os consumidores. Na evolução e desenvolvimento do tema central foram abordadas questões como a publicidade oculta e a subliminar bem como a forma como elas atuam e seu caráter ilícito perante o ordenamento jurídico.

Palavras chave: Código de Defesa do Consumidor. Publicidade oculta. Ilicitude. Consumidor.

Sumário: Introdução. 1.Modalidades de Publicidade Oculta. 1.1.A Publicidade Redacional. 1.2.O Merchandising. 2.A Publicidade Subliminar.3.A Enganosidade da Mensagem Subliminar. Considerações finais. Referências.

Introdução

Toda mensagem publicitária veiculada nos mais diversos meios de comunicação tem por finalidade persuadir o consumidor que é ao mesmo tempo receptor da mensagem a consumir determinado produto ou serviço.

O método da persuasão faz parte do nosso cotidiano, pois a todo o momento somos seduzidos para adquirir bens e serviços, de modo que o nosso cérebro muitas vezes nos sugere o consumo sem uma razão aparente, ou seja, sem que haja uma real necessidade de consumo.

É certo que todos nós temos vontades, no entanto, quase sempre estas vontades estão direcionadas ao consumo de alguma coisa, sob a influência e, na grande maioria das vezes, manipuladas por fatores externos e imperceptíveis, ou seja, temos vontades inconscientes de consumir certos bens.

A proposta do presente estudo é analisar a influência que a publicidade exerce sobre a vontade humana voltada ao consumo e, para isso, importantes questões começam a surgir, tais como, a publicidade tem relação com a vontade que sentimos? Podemos controlar as nossas vontades? Nossas vontades são conscientes?

No decurso dos estudos, veremos que a vontade consciente e a inconsciente tornam-se distantes quando ficamos expostos aos estímulos externos que manipulam a vontade e induz ao consumo.

Importante, mencionar, que a percepção humana varia em cada um dos consumidores receptores de uma mesma mensagem publicitária, sendo certo que cada estímulo para o consumo embutido no anúncio terá reflexos distintos e conseqüências variáveis em cada consumidor, seja ela legal, consciente ou camuflada e ilegal.

Nesse passo, em ambas as hipóteses a finalidade é o consumo levado a efeito pelo público alvo da mensagem publicitária. Se o consumo é feito de forma consciente pelo consumidor por influência da mensagem veiculada, também este poderá ocorrer de forma inconsciente por meio de estímulos subliminares.

É nesse ponto que reside a periculosidade e gravidade da utilização de mecanismos ocultos, externos e subliminares de estímulos do inconsciente humano com vistas a induzir o consumidor a adquirir bens ou serviços à partir de uma comunicação manipuladora da vontade.

Trataremos, nos itens seguintes, com mais profundidade sobre esse tema à luz do nosso ordenamento jurídico.

1. Modalidades de Publicidade Oculta

Enquanto mecanismo destinado a promover a aquisição de mercadorias e serviços no mercado, a publicidade deve ser clara e facilmente identificável como tal pelos seus destinatários, nos termos da norma do Artigo 36, do Código de Defesa do Consumidor que ao consagrar o princípio da identificação busca assegurar que o consumidor tenha sempre consciência de que determinada mensagem tem por objetivo a oferta de bens ou serviços, bem como visa proteger os consumidores dos reflexos da publicidade veiculada com conteúdo oculto.

Como regra a publicidade aparece por meio de mensagens naturalmente percebidas pelos consumidores, por vários motivos, por exemplo, pela marca anunciada, pelo conteúdo claro que estimula a aquisição de bens e serviços, dentre outros. Referida publicidade geralmente ocorre nos meios de comunicação em massa através de contratação de espaços e remuneração, tais como jornais, revistas, internet, televisão, rádio etc.

No entanto, há casos em que as mensagens publicitárias não são claramente identificadas, dando a impressão de mensagem que não emana de determinado fornecedor do produto ou serviço objeto do anúncio. Para esse tipo de mensagem dá-se o nome de publicidade oculta ou também chamada de camuflada, clandestina.

Em outras palavras, podemos conceituar a publicidade oculta como a informação que se apresenta sob a aparência de uma mensagem neutra e sem interesse não revelando o seu caráter publicitário, tanto pela forma ou pelo conteúdo. Esse tipo de publicidade viola o princípio da identificação da mensagem publicitária pelo consumidor, sendo, portanto, uma modalidade de publicidade rejeitada pelo nosso ordenamento jurídico, eis que enganosa, ferindo, sobretudo, importante viés internacional consagrado pela OMC, qual seja, a informação do consumidor acerca dos produtos e serviços disponibilizados no mercado.

Entendo que a publicidade oculta ou clandestina é aquela que aparece aos olhos dos consumidores como uma informação objetiva camuflando a visão e finalidade subjetivas dos fornecedores que estão na verdade promovendo seus bens ou serviços. Desse modo, por camuflar ou encobrir a finalidade promocional da mensagem, a publicidade oculta tem por efeito induzir os consumidores a erro quanto à real origem das informações anunciadas, não podendo escapar da modalidade enganosa de publicidade repudiada pelo CDC.

Existe um critério para que se possa identificar o objetivo promocional de uma mensagem publicitária, qual seja, a existência de uma remuneração estabelecida entre o fornecedor que anuncia e o veiculo de comunicação. Carballo-Calero explica que “toda vez que seja feita menção a uma marca como conseqüência de uma contraprestação econômica estaremos diante de uma publicidade”[1], o que certamente afasta a possibilidade de determinada mensagem ser meramente informativa e neutra.

Nesse sentido é a orientação da Diretiva Européia 2007/65/CE, de 11.12.2007, que no seu Artigo 1º, letra “j”, estabelece que a apresentação do produto ou serviço em certa comunicação oral ou visual é feita de modo intencional na hipótese de haver pagamento ou outra contribuição equivalente.

Ocorre, que nem sempre é possível a identificação de uma remuneração direta como contraprestação pela veiculação da mensagem, portanto, este critério não pode ser o único indicativo de que estamos diante de uma publicidade oculta. Muitas vezes a contraprestação é indireta e o intérprete deverá buscar indícios acerca do caráter promocional da mensagem publicitária.

O ocultamento é o pressuposto elementar da hipótese legal, de modo que a modalidade de publicidade oculta é ilícita e consiste na total ausência de identificação por parte do consumidor de que determinada mensagem representa uma comunicação publicitária.

Nesse sentido, estaremos diante de uma publicidade oculta sempre que o consumidor médio não for capaz de identificar o caráter promocional da mensagem por acreditar que está diante de uma informação neutra e desinteressada.

Em síntese, a publicidade oculta pode ser compreendida como qualquer informação de natureza publicitária não identificável pelos destinatários e, na lição de Carballo-Calero pode ser definida como:

 “toda publicidade que veda de forma eficaz a sua natureza aos olhos do consumidor médio, de modo que este seja incapaz de distinguir a finalidade promocional da mensagem, porque essa se camufla atrás de uma aparência de uma comunicação informativa ou de qualquer outra índole”.[2]

Alguns anos atrás, houve no Brasil uma discussão no Conar por meio da Representação 09/2007 que envolveu o princípio da identificação da publicidade na música do cantor Seu Jorge envolvendo a cachaça Sagatiba.

Neste caso, a música intitulada “Sagatiba – Eterna Busca do Valor Mais Puro” explorava o significado do nome do produto (cachaça) sendo veiculada nas emissoras de rádio. Houve manifestação do anunciante afirmando que a música consistia em expressão espontânea do cantor veiculada prontamente nas rádios.

A veiculação de mensagens publicitárias ocultas é feita principalmente por meio da publicidade redacional ou por meio do merchandising. Importante, esclarecer que as técnicas acima mencionadas não são proibidas pela nossa legislação consumerista, mas serão ilícitas e proibidas sempre que ocultarem eficientemente a finalidade promocional da mensagem e tornarem impossível a sua identificação como publicidade de produtos ou serviços.

Nos próximos itens desse trabalho vamos apresentar as peculiaridades da publicidade redacional e do product placement, ressaltando em quais circunstâncias essas técnicas podem configurar publicidade oculta, isto é, ilícita eis que vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.

1.1. A Publicidade Redacional

A publicidade redacional é uma técnica publicitária lícita num primeiro momento, mas passará a ser considerada ilícita quando a sua utilização ocultar o caráter publicitário da mensagem veiculada, de modo a confundir o consumidor a respeito do produto ou serviço objeto da mensagem.

É fato que muitas vezes podemos encontrar em jornais e revistas publicidades que se utilizam de uma linguagem aparentemente análoga àquela usada nos artigos e matérias jornalísticas para anunciarem bens ou serviços. Se o recurso da publicidade redacional for bem utilizado pelo anunciante a ponto de permitir a identificação do conteúdo promocional não significará afronta às normas do CDC, desde que também seja possível distinguir a mensagem constante da publicidade redacional das demais notícias que integram o veículo de comunicação para que os destinatários da mensagem possam perceber que se trata de um informativo publicitário pago pelo fornecedor do produto ou serviço.

Na hipótese de veiculação de conteúdo publicitário por meio da publicidade redacional oculta, estaremos diante de uma ilegalidade repudiada pela nossa legislação consumerista, pois a menção aos produtos ou serviços é feita com finalidade publicitária, mas sob a aparência de escolha pessoal do redator, visto que inserida no meio de comunicação com as mesmas feições dos demais escritos informativos.

Diante de uma publicidade redacional oculta o consumidor não consegue diferenciar a publicidade oculta das demais matérias informativas e seus reflexos sobre os consumidores são muito maiores e nocivos, eis que recaem sobre a confiança e credibilidade que o público confere às informações veiculadas pela impressa, daí porque sua utilização é vedada por diversas legislações, sobretudo a brasileira.

É certo que para constatarmos a hipótese de publicidade redacional oculta e, portanto, ilícita, deve-se observar dois elementos: a finalidade promocional constante do conteúdo da mensagem e a possibilidade de identificação pelos consumidores-destinatários. Sendo impossível a identificação, estaremos diante de uma mensagem ilícita em virtude do ocultamento.[3]

Em relação ao controle da publicidade é elementar que exista o fim promocional na mensagem veiculada, para que então seja possível falar em ilicitude da publicidade redacional. Lembrando, que, se não for possível constatar de forma inequívoca o caráter publicitário da mensagem, no caso concreto será necessário observar se a matéria contém interesse jornalístico de informar, ainda que da menção ao produto ou serviço possa resultar alguma vantagem ao fornecedor.

O que se deve observar, na hipótese acima, é se a mensagem veiculada está isenta ou não de interesse, de modo que deve haver apenas o interesse autônomo de transmitir a informação jornalística, lembrando que a tutela do consumidor assegurada pela Constituição da República a ter acesso somente a publicidades identificáveis não pode fulminar o direito garantido constitucionalmente de manifestação do livre pensamento no âmbito de uma atividade jornalística e informativa.

É certo que os consumidores podem ficar atentos a alguns indicativos que permitem ao menos uma presunção relativa acerca da finalidade publicitária ou não de determinada mensagem, não deixando de lado o caso concreto em cada hipótese particularmente suscitada, vejamos:

Nesse passo, podemos ficar vigilantes para alguns sinais: 1. O tom da mensagem; 2. O conteúdo da mensagem; 3. A alusão a produtos análogos; 4. O caráter inovador de um produto ou serviço, dentre outros indícios. Com relação ao tom e conteúdo da mensagem veiculada, cabe observar se estão sendo feitos muitos elogios ao produto ou serviços e suas características, assim como com relação ao preço ou, ainda, se há o convite ao consumo.

Por outro lado, deve-se prestar atenção se no texto da mensagem anunciada existe referência a produtos semelhantes de fornecedores concorrentes, isso porque a menção a apenas um produto pode caracterizar a finalidade publicitária da mensagem e, conseqüentemente, configurar o desinteresse jornalístico da matéria anunciada. Não se pode deixar de observar se o produto ou serviço constante da mensagem é inovador e, portanto, justificável o direito de informar o público à esse respeito na forma de opinião ou serviço informativo.

Cumpre, por oportuno, ressaltar que a análise desses rudimentos de presunção acerca do fim publicitário de certa mensagem redacional deve ser feita com cuidadosa prudência para evitar-se atitudes violadoras do direito de informar por meio das escolhas editoriais.

Por outro lado, uma vez verificado o fim publicitário de determinada mensagem redacional, sobre ela incidirá o Código de Defesa do Consumidor sendo necessária, por conseguinte, a análise de um segundo elemento, a investigação da possibilidade da identificação da finalidade publicitária pelos destinatários médios, ou seja, os consumidores típicos dos serviços ou produtos objetos do conteúdo da mensagem sob análise.

Sendo negativa a possibilidade de identificação do conteúdo publicitário, estaremos diante da mensagem redacional ilícita e oculta em afronta aos dispositivos constantes dos Artigos 36 e 37 do Código de Defesa do Consumidor por violação do princípio da identificação.

Um elemento que certamente deve ser avaliado para se constatar se uma publicidade é ou não oculta, é o conteúdo da mensagem, uma vez que na hipótese do leitor conseguir identificar que determinada mensagem ou artigo veiculados não se referem apenas a uma informação neutra e desinteressada, mas sim ao anúncio de determinado produto ou serviço, não estaremos diante de uma mensagem publicitária oculta, eis que possível a sua identificação pelo consumidor.

Segundo entendimento de Lucia Ancona:

“ … o tom abertamente elogioso do texto; a presença de imagens fotográficas do produto, de sua embalagem ou de marca conhecida; o fato de não constar qualquer assinatura ou firma de jornalista são exemplos de elementos importantes no exame da identificação do caráter publicitário da publicidade redacional pelos consumidores. Igualmente de grande valia para esta identificação é a utilização dos sufixos “informe publicitário”, “publicidade”, “mensagem promocional” em local visível da publicidade.”[4]

É certo que o caráter ilícito de uma mensagem publicitária deve ser analisado e apurado conforme o caso concreto e suas peculiaridades, de modo que se o fornecedor fizer uso de um veículo informativo para divulgar aos consumidores como funcionam seus produtos ou serviços, não configura por si só um anúncio redacional publicitário oculto ou ilícito. Assim, tão somente aqueles informes publicitários dotados de mensagem oculta e não compreensíveis ao consumidor, configurarão a mensagem enganosa, nos termos da legislação vigente que disciplina a matéria.

Deste modo, mais uma vez, nos socorremos das lições de Lucia Ancona que assim afirma:

“Em outras palavras, se ao leitor não for possível fazer a distinção entre a publicidade redacional e os demais artigos constantes do veículo, conferindo credibilidade às alegações publicitárias como se fossem provenientes da redação (e não do fornecedor que promove o produto ou serviço), então estar-se-á diante de uma publicidade oculta ou clandestina, que seguramente tem o potencial de induzir os consumidores a erro sobre a sua real natureza”.[5]

Assim, imprescindível que se compreenda que a mensagem redacional será considerada ilícita sempre que se apresentar na forma de informativo ao leitor, bem como com aparência de matéria jornalística sem menção ao fim publicitário do conteúdo, visto que desta forma afronta o princípio da identificação da mensagem publicitária, comprometendo, inclusive, a boa fé nas relações entre fornecedores e consumidores, assim como configura violação aos Artigos 36 e 37 do Código de Defesa do Consumidor e dos princípios da identificação e transparência.

1.2. O Merchandising

Entender o que seja merchandising não é algo fácil. Há quem diga que é o termo mais confuso em termos de marketing. No entanto, a compreensão do conceito de merchandising é essencial para enfrentar o tema objeto do presente estudo.

É comum entender-se por merchandising aquela mensagem publicitária que aparece em uma cena de filme, novela, programas de TV, etc., de diversas maneiras: diálogo entre artistas, exibição, ainda que rápida, do produto, dentre outras. Nessas modalidades, o merchandising aparece como algo que está presente nas situações do dia a dia do consumidor.

Sobre o tema, ensina Rizzatto Nunes “Merchandising é a técnica utilizada para veicular produtos e serviços de forma indireta por meio de inserções em programas e filmes”[6].

Claudia Lima Marques, ao falar sobre o merchandising faz sob a seguinte assertiva:

“Pela técnica do merchandising, hoje comum em novelas de televisão, nos filmes e mesmo em peças teatrais, um produto aparece na tela e é utilizado ou consumido pelos atores em meio a ação teatral, de forma a sugerir ao consumidor uma identificação do produto com aquele personagem, história, classe social ou determinada conduta social. O aparecimento do produto não é gratuito, nem fortuito, ao contrário existe um vínculo contratual entre o fornecedor e o responsável pelo evento cultural, sendo que o fornecedor oferece uma contraprestação pelo espaço de divulgação para o seu produto.”[7]

Por meio do merchandising ocorrem as práticas comerciais sem que os consumidores se conscientizem de que estão assistindo à uma mensagem publicitária.

É certo que no Brasil a exibição comercial de um produto ou serviço durante o conteúdo de um programa audiovisual, assim entendidos: novelas, seriados, filmes, entre outros passou a ser chamada rotineiramente de Merchandising, no entanto, a Diretiva Européia 1989/522/CEE sobre radiodifusão adota a terminologia inglesa product placement que significa em português “colocação do produto” para definir a técnica publicitária do merchandising.

Desse modo, o merchandising pode ser entendido como uma técnica publicitária que se desenvolve em ambiente de mídia não considerado originariamente como publicitário, visto que a exibição do produto ou do serviço ocorre no bojo de um programa audiovisual, isto é, no decorrer de um filme, de um seriado, de uma novela, ou de qualquer outro meio de entretenimento, portanto, não pode ser confundido com a publicidade na sua forma tradicional.

Um exemplo de merchandising ocorre quando o fornecedor insere em uma determinada cena de novela, um personagem guiando um veículo modelo novo de uma determinada montadora de veículos, com o objetivo de induzir o consumidor ao consumo.

Assim, ao inserirem situações que fazem parte, de certa forma, do cotidiano do consumidor, os fornecedores de produtos ou serviços ao se utilizarem do merchandising atingem os consumidores sem que eles percebam que se trata de publicidade.

É certo que não existe um conceito consensual do que seja o merchandising, no entanto, é pacífico o entendimento de que se trata um anúncio publicitário.

Enquanto anúncio publicitário o merchandising não estaria em regra proibido pelo Código de Defesa do Consumidor, desde que o anunciante e o veículo de informação previamente informem ao consumidor que será alvo de uma mensagem publicitária.[8]

Nesse passo, podemos entender como prática perfeitamente legal, eis que não vedada pelo ordenamento jurídico, sendo necessário se avaliar a eventual ilegalidade da prática no caso concreto específico.

Rizzatto Nunes suscita a questão do merchandising decorrente da clandestinidade, já que uma característica peculiar dessa prática é não aparecer como publicidade e, afirma: “[…] o CDC acaba sendo contrariado como um todo em sua filosofia, que pressupõe a avaliação crítica do consumidor”[9].

Nessa linha de raciocínio, o consumidor estaria sendo enganado, uma vez que dele é retirada a escolha autônoma e livre do produto ou do serviço, o que não pode ser admitido, sob pena de ferir-se as regras consumeristas protetivas da relação de consumo.

O estudo do merchandising ganha relevância jurídica no campo das relações de consumo, sobretudo sob a ótica do dever de transparência e identificação das mensagens publicitárias decorrentes de princípios norteadores estampados na norma do Artigo 36 do Código de Defesa do Consumidor. Frise-se que não se trata de técnica proibida ou ilícita em si, entretanto em determinadas situações poderá caracterizar uma modalidade oculta de publicidade, induzindo em erro os consumidores no que tange aos reais interesses do fornecedor ao inserir um produto ou serviço na cena de um filme ou outro programa congênere, isto é, o interesse publicitário.

Deste modo, para que o merchandising seja considerado legal e não abusivo deve preservar ou ao menos permitir o senso crítico e a capacidade de escolha do consumidor.

Para elucidar, podemos apontar alguns filmes como exemplos de merchandising audiovisual, tais como: Náufrago, protagonizado pelo ator Tom Hanks em que se promove a empresa FedEx e a marca de produtos esportivos Wilson; Man in Black, que promoveu a marca da empresa Ray-Ban e triplicou as vendas do modelo do óculos aparente no filme. Temos, ainda, um exemplo marcante na história do merchandising ocorrido também no cinema no filme E.T. de 1982 de Steven Spielberg, em que o menino protagonista oferece um caramelo de chocolate da marca Reese’s Pieces ao extraterrestre, com o fim de facilitar a comunicação entre ambos. Esse merchandising rendeu à Hershey’s um aumento considerável nas vendas do referido produto.

É fato que os veículos de comunicação são quase em sua totalidade sustentados pela publicidade e buscam ocupar todo o espaço da grade de programação permitido com a veiculação de propagandas ocultas, ou seja, com o merchandising.

Um traço marcante do merchandising reside no fato de por meio dessa técnica o fornecedor não mais explicitar as características dos seus bens ou serviços, mas procurar impor situações que proporcionem prazer a partir da aquisição do produto, representando na verdade uma publicidade de estilos de vida em que induz o consumidor a associar os produtos com certos padrões sociais almejados.

A técnica do merchandising inserida nos programas audiovisuais poderá ocorrer de forma verbal ou visual. Em uma opção verbal poderá ser feita por um dos personagens do filme, novela ou seriado a menção à marca ou outras características do produto objeto da publicidade na intenção de destacar as qualidades e diferenciá-lo de outro já existente no mercado ou não. Ao passo que na exibição tipicamente visual, haverá apenas a exposição sem citação ou qualquer referência verbal do produto ou serviço, sendo certo que em muitas cenas a colocação visual do produto pode até ganhar um certo protagonismo no contexto da trama.[10]

A ilicitude da técnica do merchandising deve ser analisada sob a finalidade promocional da exposição do produto ou serviço em contextos audiovisuais de filmes, novelas ou programas semelhantes. Nesse aspecto, salutar ressaltar que não são todas as exposições de produtos com finalidade promocional e publicitária veiculadas devem ser consideradas ilícitas, mas somente aquelas que ocultem o seu propósito das percepções dos consumidores.

Destarte, é possível afirmar que o ocultamento do propósito publicitário constante intrinsecamente é o indício e o pressuposto para que o merchandising seja considerado ilícito em determinado caso concreto.

Em outros termos, para que estejamos diante de merchandising ilícito necessário se faz que a apresentação da marca, do serviço ou de produto em algum programa seja dotada de intenção promocional, bem como que este desígnio promocional e publicitário não seja possível de ser percebida pelo consumidor em virtude da eficiência do ocultamento, conforme definição da Diretiva Europeia 1989/552/CE.[11]

Nesse sentido, interessante a observação de Pasqualotto ao questionar se,

“a inserção de matéria publicitária no contexto do programa configura clandestinidade ou se a prática é hoje tão disseminada que se tornou claramente perceptível. Em princípio a segunda afirmação parece verdadeira, mas sempre pode surgir uma técnica mais refinada que burle a sagacidade do consumidor.”[12]

É por isso que quando falamos de publicidade o intérprete, no caso concreto, deverá examinar se o público a partir da veiculação da mensagem está apto a identificar uma situação de finalidade publicitária ou não. Como conseqüência, importante defendermos que antes da exibição da mensagem promocional de um produto ou serviço, seja feita uma advertência ao consumidor alertando-o sobre a finalidade da informação e, com isso afastar a característica oculta do merchandising.

A doutrina brasileira que procurou abordar o tema da necessidade de realização das mensagens de advertência para informar aos consumidores a finalidade promocional decorrente da exibição de um determinado produto ou serviço durante a apresentação de um filme ou programa de televisão entende que se trata de uma medida informacional que evitaria uma eventual configuração do merchandising como uma espécie de publicidade oculta.[13]

Como conseqüência desse posicionamento em devesa do cumprimento do dever de transparência, surge um questionamento acerca do momento em que a mensagem de advertência deve ser veiculada, isto é, se no início, no final ou durante a apresentação do programa.

Segundo, ainda, a doutrina nacional a mensagem de advertência veiculada antes e ao final do filme ou programa semelhante parece ser a medida que melhor atende às preocupações que envolvem o dever de transparência na veiculação de mensagens publicitárias. Entende Antônio Herman Benjamin que a advertência feita no início do filme ou programa de televisão visa evitar que a identificação seja feita posteriormente pelo consumidor e, assim afirma:

“Ora, o crédito simplesmente fornece os elementos necessários para que o consumidor no início da veiculação do merchandising, possa identificá-lo, de imediato, como publicidade (…) por cautela, o crédito, nos programas que são fragmentados, deve ser reapresentado tantas vezes quanto sejam os fragmentos. E para proteger os consumidores que não tenham oportunidade de assistir ao início do programa (ligaram a televisão após a abertura da novela, por exemplo), também se deve exigir que os créditos sejam repetidos ao final de cada fragmento”.[14]

Assim, a mensagem prévia de advertência deverá ser inserida de forma visível e em letras legíveis, antes que tenha início o filme ou programa televisivo, bem como necessita permanecer expressa por algum tempo suficiente à leitura dos telespectadores. Além disso, seu conteúdo deve informar que haverá a exibição de produtos ou serviços com finalidade publicitária.

Um merchandising nesses moldes atende ao princípio da transparência e, conseqüentemente evita-se excessos no uso da técnica que podem lesar direitos do consumidor.

Em que pese todas as considerações acima, fato é que o consumidor tem o direito de assistir uma programação saudável, de modo que não pode ser constrangido à incessante publicidade oculta que lhe retira a liberdade de escolha, sendo essa prática comercial vedada pelo Código de Defesa do Consumidor sempre que afrontar seus princípios basilares.

2. A Publicidade Subliminar

As mensagens subliminares “são técnicas comunicativas ilícitas que tendem a ser mais utilizadas no presente milênio, de forma a possibilitar a expansão do poder político e/ou econômico”[15].

O ato de transmissão de mensagens publicitárias depende de esforços dos emissores e dos receptores, pois para que o receptor identifique e compreenda o significado da mensagem é necessário que o comunicador-emissor utilize de palavras cujos significados sejam de conhecimento do receptor.

Em matéria de consumo, é necessário que o fornecedor anunciante utilize-se de palavras ou signos que permitam ao consumidor a compreensão acerca do caráter publicitário da mensagem que está recebendo.

A mensagem subliminar é muito utilizada no meio publicitário, tanto na televisão, quanto no cinema, desenhos animados, jornais, propaganda de políticos, etc. A publicidade subliminar é aquela que trabalha o inconsciente do consumidor que é levado a consumir através de exposição de mensagem que não é percebida de forma consciente. Funciona como uma mensagem invisível.

A técnica das mensagens subliminares foi descoberta e passou a ser utilizada pela publicidade e propaganda após o final da Segunda Guerra Mundial e foi conseqüência da pressão pela concorrência que havia no mercado àquela época, sendo, então, realizados os primeiras práticas comerciais apoiadas em mensagens ocultas.

O primeiro registro que se tem sobre a propaganda invisível ou subliminar de produtos refere-se ao experimento de Jim Vicary, proprietário da empresa Subliminal Projection Company realizado em junho de 1956 em uma sessão de cinema em Nova Jersey, EUA e por meio da utilização de um equipamento chamado Taquicoscópio projetava a cada cinco segundos sobre o filme Picnic a frase “Beba Coca-Cola”, numa velocidade de 1/3.000 de segundo. Segundo alegado na época, as vendas de Coca-Cola aumentaram em 57,7% no intervalo do filme. Referida experiência foi realizada pelo período de seis semanas, com aproximadamente 45 mil pessoas que passaram pelo cinema.

Segundo Walter Ceneviva, em pesquisas realizadas na época constatou-se que as vendas desses dois produtos subiram significativamente.[16]

A partir de então, a técnica não parou de ser utilizada por revistas, jornais, anúncios publicitários, propaganda eleitoral, dentre outros.

Nosso Código de Defesa do Consumidor proíbe a publicidade subliminar, pois a entende como publicidade não perceptível.

No entanto, a utilização da técnica gera polêmica quanto aos seus efeitos danosos sobre o subconsciente consumidor, ou seja, uma vez que podem provocar danos estamos diante de algo lícito ou ilícito?

De fato, em meio às discussões acerca dos danos que a técnica subliminar pode provocar, ao longo dos anos a técnica sobreviveu e ainda é utilizada pelos mecanismos publicitários.

É certo, outrossim, que a maior parte das mensagens subliminares é visual ou auditiva. As informações de maneira geral podem ser escolhidas, filtradas ou ignoradas pelo consciente humano, no entanto, o inconsciente ou subconsciente não tem essa defesa.

Reynaldo Andrade da Silveira, afirma a respeito da publicidade subliminar:

“O apelo da mensagem é sutil, discreto, e alcança o inconsciente do consumidor, que não percebe a finalidade da informação. A mensagem não convida, diretamente, o consumidor a adquirir um produto ou serviço. Mas, a repetição das inserções fica registrada no inconsciente do consumidor, e, na ocasião em que necessita do produto/serviço, esse ‘registro’ gravado de forma espontânea no inconsciente do consumidor aflora, como se fora ‘uma opção espontânea’”.[17]

No que se refere à veiculação, a mensagem subliminar pode ser veiculada por meio de qualquer veículo, quais sejam, TV, jornais, revistas, rádio, filmes, celular, cinema, internet, etc. Houve casos em que a mensagem subliminar foi encontrada em produtos como cigarro, perfume, refrigerante em lata, pacotes de lanches, dentre outros.

No entanto, diversos doutrinadores se posicionam pela ilicitude da publicidade subliminar, dentre os quais podemos destacar Nelson Nery Júnior, Carlos Alberto Bittar, Reynaldo Andrade da Silveira, Claudia Lima Marques, Melina Penteado Trentin.

Carlos Alberto Bittar afirma que os consumidores, grande parte das vezes se encontram,

“sem possibilidade de conhecer as condições do negócio e sob os efeitos diretos e subliminares de sugestivas e excitantes publicidades que, por todos os meios e estímulos para todos os sentidos, lhes remetem constantes mensagens comerciais, a gerar-lhes impulsos de compra, seja no lar, no transporte, no ambiente de trabalho ou lazer, enfim, em todos os momentos de sua vida normal”.[18]

Claudia Lima Marques ao se referir ao princípio da identificação da mensagem publicitária aduz que este princípio tem por finalidade “coibir a chamada publicidade subliminar, a qual atingiria somente o inconsciente do indivíduo e que, por seu grande perigoso potencial de sugestão, está proibida no mundo desde os anos setenta”[19].

É certo que o estímulo subliminar, pode ser feito de diversas formas, dentre as quais podemos citar as mais comuns: 1. Estímulo visual muito rápido; 2. Discurso rápido em mensagens auditivas; 3. Utilização de imagens ou símbolos de forma camuflada; 4. Estímulos olfativos em revistas; dentre outras.

Por meio de algumas dessas formas de anúncio subliminar o fornecedor utiliza-se de estímulos com índices ou níveis muito abaixo do limiar de consciência e que não são percebidos pelos sentidos conscientes dos consumidores, no entanto, o subconsciente capta a mensagem e induz o receptor ao consumo.

Desse modo, na análise de Flávio Calazans,

“subliminar pode ser entendido como maior quantidade de informação em menor tempo de exposição, sendo que o excedente de informações é passivamente assimilado pelo inconsciente pessoal ou subconsciente. A saturação subliminar é resultante da falta de tempo para pensar nas imagens”.[20]

As mensagens subliminares uma vez veiculadas não são percebidas pelo consciente humano, pois atuam de forma muito rápida e não permitem a compreensão imediata do consumidor, no entanto, ficam arquivadas no seu subconsciente e, posteriormente atuam na motivação direcionada ao consumo.

Nesse passo, temos que as mensagens subliminares, a partir do subconsciente, têm por objetivo, através da publicidade, introduzir de maneira clandestina e simulada, informações, vontades, desejos, estímulos e necessidades que se manifestarão em algum momento, impulsionando o consumidor a adquirir determinado bem ou serviço anunciado.

Começa a ficar claro, a partir de então, que o objetivo precípuo das mensagens publicitárias subliminares, é a criação de estímulos que conduzem o consumidor ao consumo, de modo que podemos entender que as mensagens subliminares são todo e qualquer estímulo captado pelo inconsciente humano por intermédio da publicidade, com a finalidade de criar necessidades que influenciam o consumidor na decisão de consumir.

 Segundo ensina Daniela Bacellar Fernandes:

“por definição, subliminares são as mensagens que nos são enviadas dissimuladamente, ocultas, abaixo dos limites da nossa percepção consciente e que vão influenciar nossas escolhas, atitudes ou motivar a tomada de decisões”.[21]

Conforme informa Flávio Calazans “Subliminar é abaixo dos limites; onde houver fronteiras e limites haverá sublimites subliminares”[22]. Citando Jung (A dinâmica do inconsciente), Flávio Calazans ensina que “o inconsciente contem todas as impressões subliminares sem energia psíquica para alcançarem a superfície da consciência”[23].

A eficácia persuasiva das mensagens subliminares reside justamente no fato de serem veiculadas com pouca exposição de tempo, mas com conteúdo extenso que não é processado ou assimilado pelo inconsciente, no entanto, produz o efeito esperando pelo autor da mensagem.

Novamente nos socorremos de Flavio Calazans que nos fornece uma fórmula para entender o que é subliminar:

Pode-se, então, propor uma fórmula esquemática para explicar o subliminar:

“SUBLIMINAR = maior quantidade de informação

 ___________________________

 menor tempo de exposição.”[24]

Para o autor da fórmula,

“o excedente de informações é passivamente assimilado pelo inconsciente ou subconsciente. A saturação subliminar é resultante da falta de tempo para pensar nas imagens. Esse é o ritmo do telejornalismo, cuja força manipuladora reside na rapidez com que é transmitida muita informação diversificada…”[25]

Assim, me arrisco a dizer que a técnica subliminar de publicidade de produtos e serviços, ou também a publicidade oculta poderia se enquadrar na disciplina legal da publicidade enganosa, pois de alguma forma leva o consumidor a erro. Essa publicidade oculta ou simulada é ilícita, assim como são as enganosas e as abusivas, de modo que, qualquer que seja a modalidade de publicidade oculta, tão logo seja identificada deverão ser retiradas de circulação, pois ferem o princípio da identidade da mensagem publicitária, assim como o princípio da boa fé e transparência nas relações de consumo.

3. A Enganosidade da Mensagem Subliminar

Toda comunicação publicitária deve ser pautada na lealdade da comunicação por parte, especialmente do emissor, isso porque o ato de transmitir mensagens demanda certo esforço para que o consumidor e ao mesmo tempo receptor da mensagem possa identificar que está diante de uma publicidade, bem como tenha condições de compreender o conteúdo da mensagem.

Nas mensagens publicitárias, sobretudo, nas ocultas o fornecedor buscará induzir o consumidor a ter determinada conduta antevista o que é feito através da utilização de linguagens e signos que seduzem o receptor da mensagem com mecanismos que inibem a racionalidade do consumidor.

As técnicas de sedução utilizadas nas mensagens publicitárias cada vez mais são utilizadas com o objetivo de manipulação dos desejos e necessidades dos consumidores que acabam consumindo determinado produto ou serviço sem o exercício de vontade consciente. Desse modo, para que a mensagem publicitária produza o efeito esperado e domine o consumidor é interessante que este não compreenda de forma transparente todo o conteúdo constante do anúncio.

O correto seria que todas as mensagens publicitárias fossem leais com o seu público alvo de modo que a ocultação de significados ou as mensagens camufladas é procedimento ilícito, vez que visam esconder a verdadeira intenção do fornecedor, bem como aproveitam da fragilidade do consumidor para manipulá-lo de forma eficaz no mais das vezes.

Cumpre, por oportuno, esclarecer que a técnica de sedução não é ilegal e somente será quando a intenção do anunciante for manipular o consumidor destinatário da mensagem a proceder de forma mais benéfica ao fornecedor.

Desse modo, a conduta de todo anunciante deve ser da forma mais transparente o possível, de modo que qualquer indício de ocultação de informação ou significado deverá ser coibido, eis que enganoso, pois é capaz de provocar um comportamento inconsciente do consumidor direcionado ao ato de consumir.

Nesse passo, todos os destinatários dos anúncios publicitários dependem dos seus sentidos para conseguirem compreender as diversas mensagens que nos bombardeiam todos os dias. É certo que os sentidos têm mais poder de captação das mensagens do que a consciência humana. A consciência é o que facilitará a compreensão das mensagens que recebemos nos seus mais diversos símbolos e imagens.

No entanto, as mensagens subliminares atuam de forma inconsciente sobre o consumidor, pois atuam abaixo do limiar da consciência.

Joan Ferrés, traz um conceito interessante acerca da mensagem subliminar:

“Num sentido amplo, considera-se subliminar qualquer estímulo que não é percebido de maneira consciente, pelo motivo que seja: porque foi mascarado ou camuflado pelo emissor, porque é captado desde uma atitude de grande excitação emotiva por parte do receptor, por desconhecimento dos códigos expressos por parte do próprio receptor, porque se produz uma saturação de informações ou porque as comunicações são indiretas e aceitas de maneira inadvertida.”[26]

Esse conceito acima demonstra bem as formas de comunicação que o presente trabalho busca analisar, ou seja, aquelas mensagens que não são perceptíveis conscientemente pela mente, mas absolutamente passíveis de captação pelos sentidos.

É certo que o fornecedor de produtos ou serviços pode se valer de artifícios para esconder do consumidor destinatário da mensagem quais as suas verdadeiras intenções com o anúncio veiculado, especialmente, o reconhecimento de que se trata de uma publicidade.

Assim, a linguagem utilizada pelos publicitários pode se utilizar de mecanismos subliminares de maior ou menor intensidade que podem variar desde a camuflagem de um signo publicitário constante do anúncio até a total dissimulação do conteúdo da mensagem, o que resulta nas transmissões subliminares de informações.

O cerne da questão deve ser a verificação da influência que a ocultação se signos pode provocar no desejo de compra do consumidor, pois referida influência existe em função do respeito que o público tem pela mensagem veiculada. É assim com a publicidade oculta veiculada em programas de televisão que contem enorme poder de incitação do consumidor, sobretudo, pela grande exposição do brasileiro à televisão através da representação de valores que o telespectador acredita serem verdadeiros e que são capazes de criar desejos pelos bens anunciados de forma camuflada.

O consumidor encantado pela manipulação que sofre acaba por adquirir bens e serviços acreditando que estará dentro da realidade a que foi induzido a acreditar no momento em que foi atingido pela publicidade oculta ou subliminar.

Nesse ponto, podemos dizer, a publicidade subliminar é ilícita, visto que atinge o consumidor de tal forma que este não é capaz de interpretar o significado da mensagem publicitária, pois seu senso crítico é comprometido diante do conteúdo subliminar a que está exposto, sendo convencido pelo anúncio.

Na mensagem subliminar o anunciante adota uma conduta omissiva que não revela ao consumidor informações importantes em sua mensagem ou camufla determinada informação ludibriando a compreensão do consumidor. Segundo Guy Durandin as mensagens camufladas decorrem de omissões, pois:

“1. É a maneira mais fácil de mentir; de fato, ao não se falar uma coisa, não se fica exposto à contradição, ao contrário do que acontece quando se faz uma afirmação falsa ou uma negação. 2. A omissão é particularmente fácil de praticar quando se trata de esconder intenções, pois estas são mais difíceis de detectar que os fatos. Se um é omitido, e se o interlocutor conhecer esse fato, ele poderá ficar surpreso e fazer questionamentos. Quanto às intenções, ele poderá fazer hipóteses, mas não terá constatações para usar como argumento”.[27]

Desse modo, pela forma como a publicidade subliminar é veiculada, acreditamos na possibilidade de enquadrá-la como uma espécie de publicidade enganosa, de forma que as disposições legais que se aplicam na repressão da publicidade enganosa podem ser aplicadas no combate à publicidade subliminar.

É certo que até hoje os efeitos exatos das mensagens subliminares sobre os consumidores não são completamente conhecidos, as obras sobre o tema são raras e até mesmo os estudiosos das técnicas subliminares atestam dificuldades encontradas na identificação dos efeitos provocados pela técnica.

Todavia, para fins legais, o efeito da publicidade subliminar é enganoso, uma vez que o conteúdo da mensagem veiculada é dotado de clandestinidade e dissimulação, devendo ser repudiado pelo ordenamento jurídico e punida como tal.

Considerações finais

A publicidade é mecanismo lícito dentro do nosso ordenamento jurídico, portanto, não se pode proibi-la, mas é possível impedir a publicidade nociva, abusiva, enganosa, desleal para evitar-se a lesão aos direitos dos consumidores.

Devemos buscar que a publicidade promova bens e serviços e impulsione o consumo por meio de anúncios verídicos e de fácil identificação para os consumidores, respeitando, assim, seus direitos assegurados pela legislação específica.

Com o fim de obter mais e mais lucro os empresários se utilizam de todos os mecanismos à disposição, inclusive das mensagens subliminares e não se preocupam com seus efeitos e conseqüências sobre o consumidor.

No entanto, não é possível admitir como legal aquela publicidade que contenha mensagem oculta, que deixa transparecer apenas o que é conveniente, ou seja, a publicidade que não se mostra como tal. O sistema normativo e principiológico do Código de Defesa do Consumidor não ampara as técnicas ocultas-subliminares. Pelo princípio da identificação da mensagem publicitária estampado no Artigo 36, do CDC resta proibida a mensagem publicitária subliminar. De outra sorte, tendo-se em vista que a publicidade subliminar é também enganosa, podemos dizer que está vedada expressamente pelo CDC.

Desse modo, as técnicas ocultas-subliminares não podem ser utilizadas como meios de indução do consumidor à aquisição de bens e serviços.

É certo que a ciência avançou demais e com isso os mecanismos subliminares que controlam o inconsciente do consumidor necessitam de rigor legislativo para que não sejam causados danos aos direitos do consumidor.

Assim, a publicidade deverá sempre veicular informações verídicas, claras e honestas sem a utilização de técnicas escusas acerca dos elementos e características dos produtos ou serviços sem lesar o consumidor.

 

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Notas:
[1] Pubblicitá occulta e product placement. p. 10.

[2] Ibid., p. 13.

[3] A jurisprudência do TJSC no julgamento de Ag. De Instrumento nº 2009.014633-4 a 4ª Camara Dir. Com, j. 06.04.2010, Des. José Inacio Schaefer, repudiou a publicidade redacional oculta: O caso se referia à publicidade comparativa denigritória, veiculada em portal de construção (Forum da Construção), cujas matérias supostamente jornalísticas, foram identificadas como de caráter publicitário. Para além do problema de comparação denigritória, ressaltou-se que os artigos de autoria de arquitetos publicados em referido site apresentavam conteúdo publicitário, porquanto patrocinados pela empresa anunciante, não havendo a necessária isenção. Segundo a decisão ‘o reconhecimento de que os textos ultrapassam o caráter técnico ou científico, afasta o argumento de afronta à propriedade intelectual do seu autor. Tal procedimento (…) viola preceito do Código de Defesa do Consumidor: a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal’.

[4] Publicidade e Direito, p. 228.

[5] Ibid., p. 229.

[6] Curso de Direito do Consumidor, p. 486.

[7] Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais, p. 659.

[8] Valéria Falcão Chaise, A Publicidade em face do Código de Defesa do Consumidor, p. 16.

[9] Curso de Direito do Consumidor, p. 488.

[10] Pablo Fernandez Carballo-Calero, Pubblicitá occulta e product placement, p. 156-157.

[11] A Diretiva Européia 1989/552/CE define especificamente a comunicação comercial audiovisual oculta como “a apresentação oral ou visual de produtos, de serviços, do nome, da marca ou das atividades de um fabricante de produtos ou de um fornecedor de serviços em programas, quando essa apresentação seja feita de forma intencional pelo fornecedor dos serviços de comunicação social com fins publicitários e possa induzir o público em erro quanto à natureza dessa apresentação. Tal apresentação é, em particular, considerada intencional caso seja feita a troco de pagamento ou retribuição similar”.

[12] Oferta e Publicidade no Código de Defesa do Consumidor. In: Teresa Ancona Lopez, Ruy Rosado Aguiar (coord.), Contratos empresariais: Contratos de consumo e atividade econômica, p. 64.

[13] Nelson Nery Junior, Os princípios gerais do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. vol. 3. São Paulo: RT, set-dez./1992, p. 67. Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin, CBDC Comentado pelos autores do anteprojeto, p. 322.

[14] CBDC Comentado pelos autores do anteprojeto, p. 322.

[15] Guilherme Fernandes Neto, Direito da comunicação social, p. 266.

[16] Publicidade e Direito do Consumidor, p. 124.

[17] Práticas mercantis no direito do consumidor, p. 127.

[18] Direitos do Consumidor: Código de Defesa do Consumidor, p. 26.

[19] Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais, p. 659.

[20] Propaganda Subliminar Multimídia, p. 49.

[21] Responsabilidade civil e direito do consumidor em face das mensagens subliminares, p. 30.

[22] Propaganda Subliminar Multimídia, p. 41.

[23] Ibid., mesma página.

[24] Ibid., p. 49.

[25] Ibid., mesma página.

[26] Televisão Subliminar: socializando através de comunicações despercebidas, p. 14.

[27] As mentiras na propaganda e na publicidade, p. 85.


Informações Sobre o Autor

Juliana Pullino

Advogada e Professora Universitária Mestre em Direitos Difusos e Coletivos Especialista em Direito Civil e Processo Civil


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