Direito Administrativo

O Programa de Leniência no Combate aos Cartéis em Licitações

Autor: Ana Keelina Brandão Lopes – Acadêmica de Direito no Centro Universitário – UNINOVAFAPI.

Orientador: Mestre José Antônio Lira Bezerra.

Resumo: O Programa de Leniência é a principal ferramenta no combate aos cartéis em licitações, visto que, quando empresas ou indivíduos burlam as licitações públicas, acaba sendo uma grande ameaça para toda a sociedade, pois ela é a mais afetada, ele, serve para reportar a existência de cartéis, da qual se participa ou já participou, a fim de obter os benefícios concedidos pelo Acordo de Leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Esta pesquisa tem como objetivo analisar a eficácia do Programa de Leniência no combate aos cartéis em licitações. Esta é uma pesquisa bibliográfica baseada em estudos de artigos científicos, revistas, doutrinas e leis. A eficácia do Programa de Leniência pode ser evidenciada pelo aumento de cartéis denunciados a partir de Acordos de Leniência celebrados, além da maior probabilidade e agilidade, de que os cartelistas sejam julgados e punidos com base nas evidencias obtidas, com isso alterando o tempo de sua atuação. Cabe enfatizar, que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica tem grande destaque no contexto concorrencial brasileiro, atuando com eficácia e celeridade, além de julgar e punir os cartéis, com isso destacando o Programa de Leniência, que se tornou essencial para o combate aos cartéis.

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Palavras-chave: Programa de Leniência. Cartéis. Licitação.

 

Abstract: The Leniency Program is the main tool in the fight against bidding cartels, since, when companies or individuals circumvent public tenders, it ends up being a great threat to the whole society, as it is the most affected, it serves to report the existence of cartels, in which one participates or has already participated, in order to obtain the benefits granted by the Leniency Agreement with the Administrative Council for Economic Defense. This research aims to analyze the effectiveness of the Leniency Program in combating bidding cartels. This is a bibliographic search based on studies of scientific articles, magazines, doctrines and laws. The effectiveness of the Leniency Program can be evidenced by the increase in cartels denounced on the basis of Leniency Agreements, in addition to the greater probability and agility, that cartelists are judged and punished based on the evidence obtained, thereby changing the time of their performance. It should be emphasized that the Administrative Council for Economic Defense has great prominence in the Brazilian competitive context, acting with efficiency and speed, in addition to judging and punishing cartels, thereby highlighting the Leniency Program, which has become essential for combating cartels.
Keywords: Leniency Program. Cartels. Bidding.

 

Sumário: Introdução; 1. A eficácia da concorrência nas licitações e o empecilho dos cartéis; 1.1. A importância da concorrência efetiva nas licitações; 1.2. Os cartéis como a mais grave lesão à concorrência; 2. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica e o Programa de Leniência Brasileiro; 2.1. Conselho Administrativo de Defesa Econômica; 2.2. O Programa de Leniência Brasileiro; 3. Pontos de Programa de Leniências que auxiliam o combate dos cartéis em licitações e Acordos de Leniência celebrados no Brasil; 3.1. Sistema de senha; 3.2. Termo de Compromisso de Cessação; 3.3. Leniência Plus; 3.4. Acordos de Leniência celebrados no Brasil; 3.4.1. O Cartel dos Vigilantes; 3.4.2. Setal Engenharia e Construções e a SOG Óleo e Gás; Considerações finais. Referências.

 

INTRODUÇÃO

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), tem como propósito a proteção da livre concorrência, ele foi criado pela lei nº 4.137/62, que somente em 1994 foi revogada e passou a ser a lei nº 8.884, que transformou o CADE em autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça. Em 2011 a lei nº 12.529 foi aprovada modificando inúmeras autarquias, especialmente sob o entendimento organizacional e processual (BRASIL, 1962; BRASIL, 1994; BRASIL, 2011).

Para auxiliar o CADE foi criado o Programa de Leniência que é o principal instrumento de combate a cartéis e foi firmado na nossa legislação em 2000, sendo o primeiro Acordo de Leniência do país assinado em 2003. O Programa é uma forma de empresas ou indivíduos que participam ou participaram de um cartel que possa reportar a atividade criminal à autoridade competente, assumindo a culpa pelo crime e auxiliando na acusação dos demais envolvidos. Ao cumprirem determinados pré-requisitos podem ser beneficiados com anistia de multas e/ou processos criminais (BRAGA; OLIVEIRA; PINHA, 2016).

Os cartéis prejudicam a todos pactuando com atos ilícitos, regularmente os entes federados disponibilizam grandes valores para licitações de bens e serviços, sendo necessário observar que as regras das licitações sejam transparentes e amplamente conhecidas para que todos as entendam, e o maior número de licitantes possam participar, pois consequentemente, maior será a concorrência, e com a efetividade delas as contratações serão mais econômicas, beneficiando os cidadãos.

Diante dessas considerações o objeto de estudo é o Programa de Leniência no combate aos cartéis em licitações. A partir do objeto de estudo elaborou-se o seguinte questionamento: o Programa de Leniência é eficaz no combate aos cartéis em licitações?

A pesquisa tem como objetivo geral analisar a eficácia do Programa de Leniência no combate aos cartéis em licitações, e como objetivos específicos: discutir a eficácia da concorrência nas licitações e o empecilho dos cartéis; esclarecer o que é o CADE e o Programa de Leniência e explicar alguns pontos do Programa de Leniência que ajudam no combate aos cartéis em licitações e Acordos de Leniência celebrados no Brasil.

É de suma importância a produção científica sobre o tema, destacando que, o Programa de Leniência deve ser ainda mais discutido no contexto concorrencial brasileiro, considerando a dificuldade de produção de provas e da condenação dos participantes de cartéis. As práticas dos cartéis proporcionam aparência de competitividade e legalidade aos certames, assim dificultando a produção de provas para a punição dos integrantes. Diante desses obstáculos, cabe aos órgãos públicos e toda a sociedade, que acaba sendo prejudicada com tais práticas, buscar meios para diminuir as chances de sucesso de um cartel.

Sendo assim, o Programa de Leniência é uma ferramenta apta para facilitar o alcance de provas, de ampliar as condenações e também de impossibilitar a formação dos cartéis, afetando a sua duração, tendo em vista uma maior discussão no país sobre o combate aos cartéis e as vantagens criadas para facilitar a sua denúncia, ao mesmo tempo em que este é um tema de suma importância na literatura.

O presente artigo trata-se de uma pesquisa bibliográfica sobre a temática discutida, os dados foram extraídos dos seguintes documentos: artigos científicos, revistas, doutrinas e Leis.

Os resultados foram apresentados em três capítulos a saber: A eficácia da concorrência nas licitações e o empecilho dos cartéis; o Conselho Administrativo de Defesa Econômica e o Programa de Leniência Brasileiro; pontos do Programa de Leniência que auxiliam o combate dos cartéis em licitações e Acordos de Leniência celebrados no Brasil.

 

1 A EFICÁCIA DA CONCORRÊNCIA NAS LICITAÇÕES E O EMPECILHO DOS CARTÉIS

Uma boa licitação tem ampla concorrência para que se tenha eficácia na contratação de bens e serviços, a presença de cartéis pode eliminar ou limitar essa concorrência tão desejada pela administração pública, tornando prejudicial a toda a sociedade.

 

1.1 A importância da concorrência efetiva nas licitações

Licitação pode ser entendida como um método democrático para a contratação com o poder público, sendo que este procedimento tem como objetivo garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, selecionando a proposta mais vantajosa para a Administração Pública (BRASIL, 1993).

A realização de licitação pública para a contratação de obras, serviços, compras e alienações pela Administração Pública é exigência constitucional, prevista no art. 37, inciso XXI, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), que somente pode ser afastada nos casos expressamente previstos em lei – especificamente, nos casos de dispensa e inexigibilidade, conforme estabelecido nos arts. 24 e 25 da Lei nº. 8.666, de 21 de junho de 1993 (BRASIL, 1988; BRASIL, 1993).

Convém distinguir o que seriam as situações de dispensa e de inexigibilidade de licitação. No primeiro caso, a licitação é possível, mas foi dispensada pelo legislador em decorrência das situações que constam rol do art. 24 da Lei de Licitações, que é taxativo. A inexigibilidade de licitação, por sua vez, se verifica sempre que há inviabilidade de competição, sendo apenas exemplificativo o rol previsto no art. 25 da mesma lei (BRASIL, 1993).

A Administração Pública seguindo os princípios administrativos aos quais deve seguir, irá selecionar a proposta que lhe seja mais vantajosa para cada contratação, cuja não é, necessariamente, aquela de melhor preço e/ou de melhor técnica, e sim aquela que também atenda às demais condições estabelecidas no correspondente instrumento convocatório. O art. 37, caput, da CRFB, impõe à Administração Pública a observância aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência (BRASIL, 1988).

Por sua vez, o art. 3º da Lei de Licitações preconiza que esta deve transcorrer segundo os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos demais princípios que lhes são correlatos – dentre os quais a doutrina inclui o princípio da competitividade ou da concorrência.

O Poder Judiciário adota a visão segundo a qual a competição é inerente à licitação, como bem se vê no acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.070/RN, em 29/11/2007: “A licitação é um procedimento que visa à satisfação do interesse público, pautando-se pelo princípio da isonomia. Está voltada a um duplo objetivo: o de proporcionar à Administração a possibilidade de realizar o negócio mais vantajoso – o melhor negócio – e o de assegurar aos administrados a oportunidade de concorrerem, em igualdade de condições, à contratação pretendida pela Administração. Imposição do interesse público, seu pressuposto é a competição” (Supremo Tribunal Federal, 2007, p. 1).

Desse modo, ao buscar uma maior competição, possibilita uma ampliação da oferta dos bens ou serviços que a Administração Pública deseja obter, assim incentivando os potenciais competidores a aperfeiçoarem seus processos produtivos e, consequentemente, a formularem melhores propostas.

Contudo, a regra geral é que as obras, serviços, compras e alienações da Administração Pública sejam contratadas em licitações nas quais se busque a máxima ampliação possível da concorrência, sempre na medida em que contribua para a seleção da proposta mais vantajosa em cada caso.

 

1.2 Os cartéis como a mais grave lesão à concorrência

De acordo com a Cartilha do CADE (BRASIL, 2016a, p. 14) os cartéis são definidos como “qualquer acordo ou prática concertada entre concorrentes para fixar preços, dividir mercados, estabelecer quotas ou restringir produção, adotar posturas pré-combinadas, ou que tenha por objeto qualquer variável concorrencial”.

Nunes (2016) preceitua que o propósito dos participantes do cartel é, por meio da ação coordenada entre concorrentes, eliminar a concorrência, com o consequente aumento de preços e redução de bem-estar para o consumidor. Braga (2015) complementa citando que o revezamento nas licitações, que é uma prática típica da atuação em cartel, se dá quando um grupo de empresas se organiza criminosamente com a finalidade de dividir as licitações entre si, elevando o preço de contratação com a Administração Pública, trazendo, consequentemente, danos.

Sobre acordo nos preços, não é essencial em um cartel, os que ainda estão ativos já perceberam que isso é arriscado e, portanto, preferem recorrer a outros meios. O art. 36, §3º, inciso I, da Lei 12.529/11, deixa claro que o ajuste entre rivais pode se dar não apenas por preços, mas também por quantidades, clientes, fornecedores, regiões, entre outras características Públicas (BRASIL, 2011).

Após demonstrada a existência de um cartel em licitações, é possível classificá-lo em cartel fraco ou em cartel forte segundo Braga (2015, p. 119) “os cartéis fracos são aqueles em que, por qualquer razão, os ganhos do cartel não são distribuídos entre os membros da conspiração. Os cartéis fortes, de outra sorte, têm duas características primordiais: (I) potencialidade de exclusão de licitantes oportunistas – apenas atraídos pelos lucros do cartel; e (II) potencialidade de transferência de ganhos entre os membros do conluio, inclusive por pagamentos compensatórios da não participação de determinada empresa”.

A comunicação entre as partes envolvidas nos cartéis é essencial, é a forma pela qual se resolve o problema da falta de informações para implementação do acordo quanto à seleção da empresa vencedora e, consequentemente, da proposta vencedora.

Um cartel em licitações não precisa necessariamente de todos os participantes para ser posto em prática, basta que mais de um esteja disposto a ir contra o princípio competitivo da licitação para que ele ocorra, já que não se faz cartel sozinho. Por isso, a força de um cartel não tem relação com o número de infratores ou de licitações prejudicadas, mas sim, com o nível de sofisticação dos instrumentos de implementação do ajuste entre concorrentes e com a potencialidade de dano.

 

2 O CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA E O PROGRAMA DE LENIÊNCIA BRASILEIRO

O Programa de Leniência foi implantado para que empresas ou indivíduos possam obter isenção de sua pena caso, denunciem ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica sua participação e auxilie para que os demais envolvidos sejam punidos, sendo que somente o primeiro a denunciar poderá ter o Acordo de Leniência com todos os seus benefícios.

 

2.1. Conselho Administrativo de Defesa Econômica

Com o advento da Lei nº 4.137/62 criou-se o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). A Lei 8.884, promulgada em 11 de junho de 1994 transformou o CADE em autarquia vinculada ao Ministério da Justiça, e posteriormente foi revogada pela Lei 12.529 de 30 de novembro de 2011, que ficou conhecida como Lei Antitruste por dispor sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica (BRASIL, 1962; BRASIL, 1994; BRASIL, 2011).

A lei 12.529/11 organizou o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), que passou a ser formado pelo CADE e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda – SEAE. O CADE é composto pelo Tribunal Administrativo de Defesa Econômica; Superintendência-Geral – SG/CADE; e o Departamento de Estudos Econômicos (BRASIL, 2011). Com essa nova estrutura que a lei implantou, o CADE começou a apurar processos de infrações à ordem econômica, e os de análise de atos de concentração.

O CADE possui, três funções segundo Teixeira (2017): Função Preventiva, que versa sobre o controle dos atos de concentração que possam colocar em risco a livre concorrência; Função Repressiva, cujo controle preventivo, como nem sempre consegue combater as práticas lesivas a concorrência, o repressivo entra para combater a cartéis e outras condutas nocivas ao ambiente concorrencial e a Função Educativa, objetiva a disseminação do hábito da concorrência, instruindo o público das ações que prejudicam a livre concorrência, fomentar estudos e pesquisas acadêmicas sobre o tema e editar a Revista de Defesa da Concorrência e cartilhas.

 

2.2. O Programa de Leniência Brasileiro

A detecção de cartéis é difícil, ainda mais sem ajuda de um participante, levando em conta que ele é sigiloso e fraudulento, por essa razão, foi adotado o Programa de Leniência de modo a descobrir tais práticas, que atualmente está previsto na Lei 12.529/2011 (BRASIL, 2011; BRASIL, 2018b).

A Leniência passa a ser entendida como uma maneira de benefício a empresa/pessoa física que denunciar um cartel ou outra prática anticoncorrencial a qual esteja envolvida. O cartel se mantém na base da confiança, o que pode impedir que a infração seja descoberta, para disseminar essa confiança, é preciso que um integrante se sinta beneficiado caso informe ao CADE sobre a violação (ABDOU, 2013).

Os benefícios e requisitos do Programa de Leniência são tratados pelo art. 86 e pelo art. 87 da Lei 12.529/2011, com o estabelecimento do Acordo, os benefícios são, tanto administrativos quanto criminais, porém tem que seguir todos os requisitos que se encontram no art. 86, § 1º.

Caso haja o descumprimento do Acordo e for averiguado que não houve um real prejuízo e nem a intenção de burlar a investigação, somente será reduzido os benefícios, porém, caso essa tenha sido a real intenção, o beneficiário sofrerá as devidas sanções previstas no art. 11 da Portaria Interministerial do CGU/AGU nº 2.278/16.

Conforme salientado no Guia do Programa de Leniência Antitruste do CADE (2018b) não ocorrendo Acordo com as empresas/pessoas físicas que participaram da ação anticoncorrencial elas são passíveis de condenação administrativa (art. 37 da Lei nº 12.529), e criminal (art. 4º da Lei nº 8.137). Havendo também a possibilidade da reparação civil por danos causados, o que é importante salientar, pois o CADE costuma aplicar penas mais severas às partes que exerceram função de liderança ou destaque no cartel.

 

3 PONTOS DO PROGRAMA DE LENIÊNCIA QUE AUXILIAM O COMBATE DOS CARTÉIS EM LICITAÇÕES E ACORDOS DE LENIÊNCIA CELEBRADOS NO BRASIL

O Programa de Leniência é um instrumento importante e eficaz na detecção e no combate às infrações a livre concorrência. Cabe destacar três pontos do Programa de Leniência que auxiliam no combate aos cartéis, que são: Sistema de Senha; Termo de Compromisso de Cessação (TCC); e a Leniência Plus. Além desses pontos, existem dois Acordos de Leniência que merecem ser citados: o Cartel dos Vigilantes; e o Acordo feito pela Setal Engenharia e Construções e a SOG Óleo e Gás.

 

3.1 Sistema de Senha

O pedido de senha é para quem quer fazer um Acordo de Leniência, para isso ele deve entrar em contado com a SG/CADE para comunicar seu interesse no Acordo, assim garantindo ser o primeiro proponente. Deve-se procurar o chefe de gabinete da SG/CADE, ou na sua ausência, o Superintendente Adjunto da SG/CADE, mencionando expressamente que é para realizar o pedido de senha para propor Acordo de Leniência. O contato pode ser pelo telefone +55 61 3221-8404/8405, de forma presencial no endereço SEPN 515, Conjunto D, Lote 4, Ed. Carlos Taurisano, CEP: 70770-504, Brasília/DF, ou através do e-mail: gab.presidencia@cade.gov.br (OLIVEIRA; SOUZA, 2015).

Para aderir ao Acordo tem que comprovar a existência do ilícito, não havendo essa possibilidade imediata quando for solicitado, o delator poderá valer-se do chamado Sistema de Senha para habilitar-se como primeiro delator, podendo fazê-lo, nos termos do artigo 198, do Regimento Interno do CADE – RICADE.

Após cumprida todas as formalidades do §1º do referido artigo a SG/CADE irá emitir a declaração no prazo máximo de 5 dias uteis, porém ela costuma declarar no mesmo dia ou no dia seguinte, com isso mesmo que o proponente não tenha todas as provas necessárias, é importante que ele contate a SG/CADE o mais rápido possível para ser o primeiro a obter a senha, pois até mesmo os segundos nesse caso conta.

 

3.2 Termo de Compromisso de Cessação

Como preceitua o art. 86, §1° da Lei 12.529/2011, somente poderá ter extinta a ação punitiva,  a primeira empresa a se qualificar, para quem não consegue o Acordo de Leniência tem outra forma de ter sua pena atenuada, que é com o Termo de Compromisso de Cessação – TCC (BRASIL, 2011). Ele pode ser possível a todos os demais investigados, gerando privilégio na seara administrativa, mas sem garantia na seara criminal, no RICADE, foi criado faixas de redução da multa a ser paga pelos infratores que firmarem um TCC conforme consta no artigo 186

Em relação ao TCC, quem tiver vontade de aderi-lo poderá apresentar proposta oral à Superintendência-Geral, a qual fará termo único a ser preservado a quem interessa. A negociação é confidencial e tem período de seis meses prorrogáveis por igual período. Caso a SG/CADE não faça o TCC, a parte interessada fica com os documentos referentes à negociação (OLIVEIRA; SOUZA, 2015).

Consoante art. 48, inciso I, da Lei 12.529/2011, quando houver: procedimento preparatório de inquérito administrativo; inquérito administrativo ou processo administrativo para imposição de sanções administrativas, sendo ambos de infrações à ordem econômica, o CADE poderá tomar do representado assinatura do TCC, nos termos do art. 85 da Lei 12.529/2011.

Apesar do TCC ser um instrumento jurídico eficaz, ele por si só não consegue ser decisivo para acabar com um cartel, com isso a legislação incentiva a adesão do Acordo de Leniência com benéficos superiores aos do TCC para quem aderir, dessa forma tornando a assinatura do TCC menos benéfica em relação ao Acordo de Leniência.

 

3.3 Leniência Plus

O Acordo de Leniência só pode ser celebrado conforme requisitos previstos na Lei 12.529/11, a qual no art. 86, § 1º, I, diz que “a empresa seja a primeira a se qualificar com respeito à infração noticiada ou sob investigação”, com isso, caso não consiga se qualificar poderá fornecer outras informações, a qual pode ser concedido outros benefícios, a exemplo da Leniência Plus que está disposta no art. 86, §7º e §8º, da Lei 12.529/11 (BRASIL, 2011).

A Leniência Plus consiste para empresa/pessoa física que já está sendo investigada por um 1° cartel e não se habilita para negociar um Acordo de leniência, nem queira recorrer a um TCC, possa reportar a SG/CADE um 2° cartel da qual ela ainda não saiba. Com isso a empresa/pessoa física no 1° cartel, terá redução de 1/3 da pena, e no 2° cartel, terá todos os benefícios do Acordo de Leniência.

Abaixo tem-se um gráfico com o número de Acordos de Leniência assinado a partir de 2003:

Gráfico 1 – Números de Acordos de Leniência Assinados, Aditivos e Pedidos de Leniência Plus de empresas firmados pelo CADE. Brasil, 2019a.

Os casos no Brasil de Acordo de Leniência Plus vêm sendo crescente ao longo dos anos, sendo o primeiro em 2015, e até dezembro de 2019 foram feitos 24 pedidos, conforme demonstrado no gráfico 1.

 

3.4 Acordos de Leniência celebrados no Brasil

Com o Programa de Leniência atuando a partir do ano 2000, vários Acordos foram celebrados com a SG/CADE durante esse tempo, o primeiro Acordo foi em 2003, que foi feito pela extinta Secretaria de Direito Econômico – SDE, desde então foram julgados mais de 100 Acordos de Leniência, deduzindo assim que o Programa vem avançando para a dissolução de cartéis.

A título exemplificativo, pode-se citar pelo menos dois Acordos de Leniência celebrados no Brasil: o Cartel dos Vigilantes, pois foi o primeiro Acordo de Leniência celebrado no Brasil; e o Acordo feito pela Setal Engenharia e Construções e a SOG Óleo e Gás, que em decorrência desse Acordo desmembrou-se inúmeros outros no âmbito da Operação Lava Jato.

 

3.4.1 O Cartel dos Vigilantes – Primeiro Acordo de Leniência

O Ministério Público do Rio Grande do Sul junto com funcionários e o proprietário de uma das empresas envolvidas denunciaram o ilícito, sendo o Acordo de Leniência celebrado no dia 09 de outubro de 2003, Processo Administrativo nº 08012.001826/2003-10, com o processo julgado em 21 de setembro de 2007 (BRASIL, 2018a).

O objetivo do cartel era no tocante a licitações para contratar serviços de vigilância privada no Estado do Rio Grande do Sul, tendo sido aberta as investigações que indicaram ilícitos em licitações realizadas pela Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, e pela Superintendência da Receita Federal do Rio Grande do Sul (OLIVEIRA; SOUZA, 2015).

Foram quatro empresas e duas associações envolvidas no cartel, que passaram por busca e apreensão, e dentre as provas apreendidas ficou demonstrado que era realizado reuniões semanais para combinar as propostas e os pregões que seriam realizados pela administração pública (BRASIL, 2013).

Com todas as provas obtidas, o CADE condenou 16 empresas, 3 associações comerciais e 18 pessoas físicas por formarem cartel, sendo aplicada multas de 15% a 20% do faturamento bruto em 2002 das empresas, e aos demais também foi aplicado multa.

Foram mais de R$ 40 milhões em multas, além das empresas não poderem participar de concorrências públicas por cinco anos. O CADE isentou totalmente das penas a Vigilância Antares e seu Diretor Rubem Oreli, pois assinaram o Acordo (BRASIL, 2009).

 

3.4.2 Setal Engenharia e Construções e a SOG Óleo e Gás – Operação Lava Jato

A SG/CADE celebrou o Acordo no dia 19 de março de 2015, com a Setal Engenharia e Construções, e a SOG Óleo e Gás, assim como, com pessoas físicas que estavam envolvidas. Eles confessaram e forneceram informações que havia formação de cartel entre os concorrentes em licitações de obras de montagem industrial “onshore” (realizados em indústrias localizadas em terra), em licitações da Petrobras – Petróleo Brasileiro S/A. Tudo teve início no final dos anos 90, ficando mais constantes a partir de 2003, com duração até início de 2012 (BRASIL, 2018a).

Com o Acordo assinado, foi fornecido documentos colaborando com as investigações no âmbito da intitulada Operação Lava Jato. Eles informaram a participação de 23 empresas, e como a Petrobras contratava por meio de convites ficava mais fácil tudo ser combinado.

As partes concordaram em não ter sigilo das informações, assim foi publicado o denominado “Histórico da Conduta” com 71 páginas. A qual o Histórico se configura como documento “no qual a Superintendência-Geral do Cade descreve de maneira detalhada a prática anticompetitiva conforme relatada pelos signatários e subsidiada pelos documentos probatórios apresentados” (BRASIL, 2018a).

As 23 empresas envolvidas eram divididas em três grupos: os primeiros a montar o esquema, clube dos nove; depois passou a ser clube dos dezesseis, com a chegada de sete construtora; e por fim mais sete companhias que eventualmente participavam (OLIVEIRA; SOUZA, 2015).

Com o referido histórico da conduta publicado foi constatado que as condutas anticompetitivas consistiam em: “acordos de (i) fixação de preços, condições, vantagens e abstenção de participação, e (ii) divisão de mercado entre concorrentes, em licitações públicas de obras de montagem industrial “onshore” da Petrobras no Brasil. Estas condutas foram viabilizadas, principalmente, por meio de reuniões presenciais, contatos telefônicos e SMSs entre os representantes das empresas, voltados à supressão/redução de competitividade nas licitações/contratações realizadas pela Petrobras nas obras de montagem industrial “onshore”, com prévio acerto do vencedor, preços apresentados, condições, divisões de lotes, abstenções, propostas de cobertura, dentre outros. Os serviços afetados pela conduta consistem, portanto, naqueles “onshore”, consistentes na montagem e construção de plantas industriais em qualquer segmento – refinarias, petroquímicas, indústrias em geral” (BRASIL, 2015, p. 1).

Com o advento desse Acordo de Leniência com o grupo Setal, em 2017 foi homologado TCC com a Andrade Gutierrez, que dentre outras obrigações teve que pagar contribuição de R$ 49.854.412,72. Em 2018 foi assinado TCC com as empresas OAS, Carioca Engenharia e Odebrecht, que pagaram respectivamente os valores de R$ 124.710.743,26, R$ 54.168.407,61, R$ 338.984.697,80 (BRASIL, 2018a).

O Programa de Leniência foi crucial para detecção e punição de cartéis em licitações no âmbito da operação Lava Jato, pois a partir dele, várias empresas/pessoas físicas tiveram coragem para fazer a denúncia.

Abaixo tem-se um gráfico com o número de Acordos de Leniência no âmbito da Operação Lava Jato assinado a partir de 2015:

Gráfico 2 – Números de Acordos de Leniência no âmbito da Operação Lava Jato e outros firmados pelo CADE. Brasil, 2019a.

De 2015 até dezembro de 2019 foram assinados 31 Acordos de Leniência só no âmbito da Operação Lava Jato, tendo seu ponto alto em 2017 com 12 Acordos fixados, como demonstrado no gráfico 2.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto, faz-se notar que a concorrência nas licitações é algo extremamente essencial para o bom funcionamento da Administração Pública, cujo maior intuito é justamente uma concorrência leal, e que ao final se torne a melhor para a Administração, já que é a partir delas que se encontram as propostas mais vantajosas. Existindo cartéis dispostos a irem contra esse princípio competitivo tudo se torna em vão, pois eles geram prejuízos imensuráveis, principalmente na sociedade, que se torna a mais prejudicada.

É necessário compreender a relevância que o CADE trouxe à concorrência brasileira, visto que o combate aos cartéis é prioridade para o SBDC e consequentemente para o CADE, pois ele é a autoridade na defesa da concorrência. A eficácia das licitações quando existem cartéis envolvidos, necessita da utilização de mecanismos que ajudam nas investigações, nisso o Programa de Leniência tem sido muito relevante para detectar cartéis.

Muitos cartéis foram extintos através de denúncias feitas ao CADE que sem a colaboração do delator não seria possível, por falta de provas ou até mesmo por não se saber da existência. As denúncias são feitas principalmente para obter os benefícios do Programa de Leniência, porém existem outros benefícios como foram citados o TCC e a Leniência Plus, todavia o Acordo de Leniência ainda é a principal ferramenta no combate aos cartéis.

Os cartéis citados neste artigo foram importantes para o sucesso do Programa de Leniência, o Cartel dos Vigilantes foi significativo pois foi o primeiro a ser celebrado, assim dando início aos Acordos no Brasil, já o Acordo com o grupo Setal é importante visto que a partir dele foram descobertos vários outros cartéis, principalmente no âmbito da Operação Lava Jato.

Desde o ano que foi implantado o Programa de Leniência foram mais de 100 Acordos julgados, alguns tendo impacto inclusive no âmbito internacional. A sua eficácia, é comprovada pelo aumento crescente na identificação de cartéis; da ampliação das informações que as autoridades tem, ou das que ainda, não se tem conhecimento desse modo, trazendo provas decisivas para o fim da prática e consequentemente reduzindo o tempo nas investigações tornando o processo mais rápido; além de alterar o tempo dos cartéis, assim impedindo que mais práticas ilícitas nas licitações aconteçam, entre outros fatores que ajudam a contribuir para o seu desempenho no Brasil.

 

REFERÊNCIAS

ABDOU, Tamara Ghassan. A coexistência do termo de compromisso de cessação de prática e o programa de leniência: possibilidade ou mera ilusão? Florianópolis: CONPEDI/UFPB, 2014. Disponível em: <http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=c66b42fcd7e375b4>. Acesso em: 21 de março de 2020.

 

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BRAGA, Tereza Cristine Almeida. CADE, Cartéis e Licitações: um Novo Nicho da Política Antitruste Brasileira. Revista de Defesa da Concorrência, Vol. 3, nº 1, p. 108-132, maio de 2015. Disponível em: <http://revista.cade.gov.br/index.php/revistadedefesadaconcorrencia/article/view/143>. Acesso em: 21 de março de 2020.

 

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NUNES, Daniele de Oliveira. Cartéis em licitações: fronteiras entre a infração à ordem econômica e o ato de improbidade administrativa. Revista de Defesa da Concorrência, Brasília, Vol. 4, nº 1, p. 185-210, maio de 2016. Disponível em: <http://revista.cade.gov.br/index.php/revistadedefesadaconcorrencia/article/view/254>. Acesso em: 21 de março de 2020.

 

OLIVEIRA, Natália Carolina Melo de; SOUZA, Gustavo Lopes. O programa de leniência e o início da operação lava-jato. Revista Direito em Ação, Brasília, V.14, n° 1, p. 46-73, junho de 2015. Disponível em: <https://portalrevistas.ucb.br/index.php/RDA/article/view/6711>. Acesso em: 21 de março de 2020.

 

TEIXEIRA, Samuel Araújo. As funções do conselho administrativo de defesa econômica. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/60089/as-funcoes-do-conselho-administrativo-de-defesa-economica>. Acesso em: 13 de abril de 2020.

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