O voto secreto no congresso nacional brasileiro: O recall como instrumento de fiscalização popular

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Resumo: O presente estudo procura mostrar como se desenvolve um Estado Democrático de Direito, apontando os elementos que o compõe, traçando definições e conceitos, apontando seus momentos históricos em cada experiência constitucional brasileira. Mostra ainda como o sistema de representação política produz reflexos no livre exercício da Cidadania, apontando a importância do estudo do voto, a disposição deste no Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro, disseminando o uso do Recall como instituto de controle e fiscalização popular dos atos dos Representantes eleitos.[1]


Palavras-chaves: 1. Estado Democrático de Direito, 2. Representação, 3. Cidadania, 4. Regimento Comum Interno, 5. Recall


Abstract: This study attempts to demonstrate how to verify a Democratic State of Law, pointing out the elements that compose it, mapping definitions and concepts, pointing out their historical moments in ach one Brazilian constitutional experience. It also shows how the system of political representation produces effects on the free exercise of citizenship, noticing the importance of studying the vote, its provision on the Internal Common Regiment of Brazilian National Congress, spreading the use of the Recall as institute of control and popular supervision of the acts of elected Representatives.
Keywords: 1. Democratic State of Law, 2. Representation, 3. Citizenship, 4. Internal Common Regiment, 5. Recall.


INTRODUÇÃO


O presente estudo trata da necessidade de controle popular dos atos públicos realizados por representantes políticos, eleitos, defendendo a idéia da obrigatoriedade do voto aberto em Sessões do Congresso Nacional Brasileiro.


É sabido que o silente voto dado nas urnas do Congresso Nacional Brasileiro fere a princípios comezinhos de direito, uma vez que, à luz de um Estado Democrático, legalmente constituído, o controle social e a soberania popular, são pilares fundamentais para a concretização do referido estado.


Para chegar a este entendimento este estudo traz a significação de um Estado, os elementos que o compõe, a sua significação enquanto estado de direito e a sua composição enquanto estado democrático de direito.


Não obstante tais definições são abordadas ainda as experiências constitucionais vividas no Brasil, as suas repercussões, a previsão do voto em cada texto constitucional, bem como o Sistema de Representação e sua contribuição à concretização da Cidadania.


Importante mencionar que estes institutos que serão a seguir apresentados, somados ao estudo do sufrágio e ao estudo do Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro, especificamente a previsão constante do seu artigo 47, findarão na necessidade de previsão de um instituto que facilite o maior controle e fiscalização popular dos atos praticados pelos representantes políticos eleitos.


Para tanto o estudo do Recall e a defesa do seu uso como mecanismo capaz e eficaz do controle e da fiscalização dos atos daqueles que atuam em nome de uma coletividade, será o ponto último e crucial de todo esses esforço aqui trabalhado. 


Neste sentido, o estudo em questão, traz à tona, a importância da fiscalização popular dos atos praticados pelos outorgados dos poderes políticos.


2. NOÇÕES DE ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO


Como noção introdutória, convém significar, para maior clareza das informações ora trazidas, o que é um Estado, que elementos o compõem e, por conseguinte, qual a designação do Estado Democrático de Direito.


O Estado, enquanto ente sócio-político, organizado e determinado por normas jurídicas, promovedor do bem estar social, age, dentro de certos limites territoriais, sob a tutela de certo governo, de forma independente, para regular as interações sociais, buscando a sua pacificação, garantindo direitos e impondo deveres ou limitações ao exercício individual de algumas garantias.


A organização que integra o contexto de um Estado, sob certa ordem, traduz a necessidade que os seres humanos têm em alcançar objetivos comuns, o que, certamente, faz estabilizar um dos elementos essenciais para a existência do próprio Estado, qual seja o Povo.


O Povo compõe-se de todos aqueles habitantes que estão sujeitos a certa ordem estatal. Trata-se do conjunto de pessoas que são submetidas a certo ordenamento jurídico e dele são obedecedoras de suas ordens e comandos, ainda que este seja o ideal primordial.


Em segunda análise, há de se falar no Território ou, como preferem alguns autores, Base Territorial. A delimitação física é elemento essencial na composição de um Estado, pois é nela que este atuará, fazendo valer seus princípios e regras.


A delimitação territorial é fator pujante na construção de conceitos sociais, jurídicos e políticos, pois, considerando que as diferentes regiões que compõe um determinado território crescem e se desenvolvem de formas dispares, caberá ao legislador apreciar os diferentes costumes e forma de convívio social, para que as normas edificadas por este compreendam tais diferenças.


Seguindo com o raciocínio apresentado, falar-se-á em Governo. O Governo compreende o conjunto de órgãos e funções pelas quais as autoridades investidas de poderes públicos (outorgados pelos cidadãos), regulam e dirigem as interações sociais.


Por fim, e não menos importante, destaca-se a Soberania. A Soberania como sendo um poder superior, ou autoridade suprema de que se investe um Estado (que sem tal atributo não o é considerado), de certo está intrinsecamente ligado à idéia de que um Estado, dentro de seus limites territoriais, enquanto ente sócio-político, organizado e determinado por normas jurídicas, promovedor do bem estar social, composto por um conjunto de órgãos e funções pelas quais as autoridades investidas de poderes públicos regulam e dirigem as interações sociais, não poderá sofrer limitações ou infringência de qualquer outro Estado.


Percebe-se que, para a coexistência pacífica dos Estados no cenário mundial, deve-se haver o respeito à medida de poder que cada Estado tem, devendo estes regularem a sua forma de atuação dentro de seu território, tudo em respeito ao instituto, ou elemento essencial ao Estado, da soberania.


Com base nessas premissas, pode-se trazer à tona como se desenvolve a idéia do Estado de Direito, para que assim se analise sob uma perspectiva Democrática.


O Estado de Direito é uma instituição que se desenvolve a partir da observância dos ditames legais, onde as leis são criadas pelo ente, por intermédio de seus representantes (aqui sendo os politicamente constituídos), e delas devem ser obedecedores.


José Afonso da Silva (1999, p. 116 e 117) afirma que o Estado de Direito é possuidor das seguintes características: a submissão do Estado ao império da lei, a divisão dos poderes e o enunciado e a garantia dos direitos individuais.


Neste sentido, conforme comentário anterior, com este sistema, o Estado se submete às leis que ele cria, respeitando os poderes conferidos aos seus órgãos e instituições, não se afastando da proteção aos direitos garantidos ao conjunto de sujeitos submetidos àquela ordem estatal.


Quanto ao Estado Democrático de Direito, de início, devemos conceituar Democracia. A Democracia se traduz pela acessibilidade que o povo e os governantes têm de participar do processo de formação da vontade estatal, direta ou indiretamente; trata-se da forma de governo na qual o poder de decisão é exercido pelos cidadãos e pelos representantes por eles escolhidos, caso em que estes últimos são de responsabilidades destes primeiros.


É neste sentido que José Afonso da Silva (apud SAMPAIO, 2009, p. 45), em conceito trazido por Abraham Lincoln, sabiamente leciona:


“Governo do povo significa que este é fonte e titular do poder […] Governo pelo povo quer dizer governo que se fundamenta na vontade popular, que se apóia no consentimento popular; […] Governo para o povo há de ser aquele que se procure liberar o homem de toda imposição autoritária e garantir o máximo de segurança.”


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Importante mencionar as formas nas quais o Povo, em uma Democracia, poderá exercer seus poderes.


Na Democracia, o Povo age de forma: – Direta: quando estes agem por si só, exercendo as funções de Estado (governando, administrando, editando leis…); – Indireta: também denominada de Democracia Representativa, onde a outorga dos poderes governamentais é para representantes eleitos, ante a impossibilidade do Povo em dirigir um Estado (observa-se nesta forma que não há a presença de nenhum instituto de participação popular); – Semidireta: que conjuga os conceitos de Direta e Indireta, o Povo outorga poderes a representantes eleitos periodicamente, mas goza de alguns institutos de participação direta (esta é a forma de Democracia adotada pelo Brasil).


Subsumindo estes conceitos ora expendidos, pode-se tranquilamente significar um Estado Democrático de Direito.


Este se significa como o modelo de Estado que, em respeito ao império da lei, consolida-se pela divisão harmônica dos poderes, garantindo aos populares direitos e impondo-lhes deveres. Os freios e limitações, bem como o respeito às garantias individuais, característicos deste modelo de Estado, são formados em atenção à participação popular, que com poder decisório, exercido de forma direta, ou indireta, através de representantes políticos eleitos pelos anseios da maioria, faz formar a vontade estatal.


A clarividência do conceito de Estado Democrático de Direito, trazido por Vinício C. Martinez, em obra extraída por meio eletrônico, intitulada “Estado Democrático de Direito Social”, é salutar neste momento, pois abarca os conceitos até aqui trazidos. Desta forma, a publicação leciona:


“Estado Democrático de Direito Social é a organização do complexo do poder em torno das instituições públicas, administrativas (burocracia) e políticas (tendo por a priorio Poder Constituinte), no exercício legal e legítimo do monopólio do uso da força física (violência), a fim de que o povo (conjunto dos cidadãos ativos), sob a égide da cidadania democrática, do princípio da supremacia constitucional e na vigência plena das garantias, das liberdades e dos direitos individuais e sociais, estabeleça o bem comum, o ethospúblico, em determinado território, e de acordo com os preceitos da justiça social (a igualdade real), da soberania popular e consoante com a integralidade do conjunto orgânico dos direitos humanos, no tocante ao reconhecimento, defesa e promoção destes mesmos valores humanos. De forma resumida, pode-se dizer que são elementos que denotam uma participação soberana em busca da verdade política” (JUSNAVIGANDI, 2003, não paginado).


Passadas essas noções introdutórias, bases conceituais de todo este trabalho, tratar-se-á, a seguir, das disposições constitucionais, estabelecidas na Carta Magna de 1988, observando o histórico constitucional brasileiro.


2.1 Estado Democrático de brasileiro e o Constitucionalismo brasileiro pós 1988


É vasta a experiência constitucional do Estado Brasileiro, uma vez que este, ao longo de sua história, já possuiu sete Constituições, diferentes entre si, fundadas em momentos sociais diversos.


Urge entender a Constituição mais recente, a de 1988, conhecida como “Constituição Cidadã”, por ser a que apresenta o maior rol de direitos e garantias asseguradas num único diploma legal, ainda mais com a magnitude de uma Constituição.


No entanto convém, sucintamente, abordar em qual contexto as Constituições anteriores surgiram, para que se possa entender como se deu a formação do atual diploma legal vigente, observando o que cada Constituição dispunha acerca do voto, uma vez que este figura como instituto de participação popular, que, conforme se verá em alguns casos, não era exercido em consonância com a sua real destinação, qual seja, a de expressar a opinião ou manifestar a vontade do Povo.


De início, para que se entenda do voto como instituto de participação popular, imperioso falar sobre outros institutos de participação popular num regime Democrático, vez que se abordará o voto nessa perspectiva histórica das Constituições.


Urge ainda mencionar, que os institutos a seguir destacados, bem como o voto, em momento oportuno, serão melhores estudados.


A despeito do próximo ponto a ser tratado, Sistema de Representação, que abarcará uma forma de participação popular (quando ocorre a outorga de poderes), faz-se necessário traçar uma definição, como dito, de outros institutos de participação popular direta.


O plebiscito, como importante mecanismo de consulta popular, viabiliza a manifestação da vontade soberana do Povo sobre questões de interesse nacional, político e social, a exemplo do que ocorreu em 1993 no Brasil, quando se buscou, junto ao Povo, sua opinião sobre a forma e sistema de governo. Naquela ocasião, o Povo decidiu como é até hoje, a Forma Republicana, com o Sistema de Governo Presidencialista.


Em passagem salutar, Maurício Sampaio (2009, p.114) demonstrou que:


“O Plebiscito é o primeiro dos instrumentos de democracia participativa colocados à disposição do Povo (art. 14, inc. I da CF/88 e Lei n. 9709/98) e consiste numa consulta prévia à opinião popular, para adotar providências legislativas ou outras quaisquer, dependendo do resultado da consulta, ou seja, consiste na possibilidade de o eleitorado decidir uma determinada questão de grande relevo para os destinos da sociedade, com efeito vinculante para as autoridades públicas atingidas.”


Quanto ao referendo, pormenorizando as discussões nele existentes, vez que se busca apenas apontar mais uma forma de participação popular, ressalta-se que esse também é uma forma de consulta popular. Destaque-se aqui uma diferenciação, com entendimento pacificado no Direito brasileiro, deste em face ao plebiscito, vez que o referendo é manejado ocorre como ato posterior à elaboração de uma lei, enquanto o plebiscito é manejado antes.  


Segundo Maurício Sampaio (2009, p.115), quanto ao referendo, “significa submeter certas decisões à aprovação de outrem, para que possam ser tidas como definitivamente tomadas e, assim, surjam ou extingam os efeitos jurídicos, que lhes são próprios”.


Note-se que o Brasil também já experimentou de tal instituto quando, em 2005, o Povo teve que responder acerca da comercialização, ou não, de armas e munições no país.


Mais adiante, José Horácio Meirelles Teixeira (apud SAMPAIO, 2009, p. 119), define que a Iniciativa Popular “consiste em atribuir-se a uma certa parte ou porcentagem do eleitorado o direito de iniciar ou propor a legislação, que deverá ser elaborada pelo legislativo”.


Recentemente, no dia 29 de Setembro de 2009, contando com 1,3 milhões de assinaturas de eleitores, fora encaminhada à Câmara de Deputados, uma proposta de Iniciativa Popular que versa sobre a exigibilidade de “ficha limpa” para candidatos à cargos eletivos. A proposta é uma prova da utilização deste instituto de participação direta.


Paulo Bonavides (apud SAMPAIO, 2009, p. 118) destaca que “de todos os institutos da democracia semidireta, o que mais atende às exigências populares de participação positiva nos atos legislativos é talvez a iniciativa”.


Não obstante tal glorioso entendimento, pondera Maurício Sampaio (2009, p. 119):


“É aceitável a idéia de ser esse instituto o que mais freqüentemente ocorre, mas somente em relação aos outros dois referidos [plebiscito e referendo]. A iniciativa está longe de ser utilizada no Brasil com a freqüência desejada pelo princípio democrático.”


Assim, passados estes pontos e entendimentos, tratar-se-á das experiências constitucionais, abordando como se manifestava o voto em cada um desses diplomas legais.  


Em 1824, a Constituição do Império, primeira no cenário constitucional do Brasil, nas palavras de Robério Nunes e Geisa de Assis (INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS CONSTITUCIONAIS, 2009, não paginado), em obra extraída por meio eletrônico, intitulada Estado Democrático de Direito, “inaugura apenas aparentemente o Estado de Direito brasileiro”.


Isso porque, surge através de uma Carta Outorgada, imposta pelo Imperador D. Pedro I (contradizendo os avanços constitucionais, ferindo as premissas basilares do Estado de Direito), onde o Estado era centralizado. Este diploma trazia a divisão do Estado em quatro poderes: o Executivo, o Legislativo, o Judiciário e o Moderador (exercido pelo Imperador) que serviu como última voz, ditando as ordens, impossibilitando o controle do poder pelo poder, ferindo a independência entre estes.


Neste modelo constitucional, que até o presente momento foi o que perdurou por mais tempo (mais de 65 anos), o sistema eleitoral destinava-se aos homens, maiores de 25 anos, como certo desenvolvimento intelectual (estando definido como voto capacitário), e mais adiante, destinava-se àqueles detentores de certo poderio econômico (voto censitário – destinado aos mais ricos), que de forma indireta elegiam um corpo eleitoral incumbido de votar nos candidatos ao Senado e à Câmara.


Mais à frente, em 1891, a Constituição deste período fora feita, a despeito da anterior, por Carta Promulgada, legalmente estabelecida, com peculiar e interessante observação, já que naquele período os interesses dos cafeicultores predominavam.


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Surge neste contexto o “voto de cabresto”. De certo, o voto era universal, bem verdade que com muitas exceções a exemplo dos analfabetos, mas os desejos dos detentores do poder, os já mencionados cafeicultores, sempre se impunham ao exercício livre (sem maculas) do voto, era o chamado poder do Coronelismo, que fatalmente findava na distorção da finalidade do voto.


Verifica-se neste modelo constitucional a presença do Estado Federativo e da República (res pública = coisa pública, coisa do povo) Presidencialista, dividida em três poderes, uma vez que fora extinto o Poder Moderador, presente na constituição anterior.


Nas palavras dos já citados Robério Nunes e Geisa de Assis, “a Constituição de 1891 apresentou uma verdadeira alegoria da República. O ideal republicano era negado amiúde pelas práticas políticas de ocupação e exercício do poder na época de sua vigência”.


Seguindo, a Constituição de 1934, da Era Vargas, presidente eleito indiretamente para o exercício do cargo, só vigeu por pouco mais de 01 ano, já que em 1935, com a decretação do Estado de Sítio, o então Presidente Getúlio Vargas, suspendeu a eficácia de suas normas.


Este novo diploma introduziu em suas disposições a previsão do voto secreto e do voto feminino, bem como para todos aqueles maiores de 21 anos, excluídos os analfabetos, padres, mendigos (resquícios da distinção feita sobre o poderio econômico) e soldados. Neste mesmo passo, esta Constituição criou a Justiça do Trabalho e implementou as Leis Trabalhistas.


Ressalte-se que o Governo Vargas, no início, por ser um governo provisório, atuou sem estar sob a égide de qualquer Constituição. Só em 1933, a Assembléia Constituinte, naquela ocasião eleita, começou a redigir a Constituição.


Como seu governo só duraria até 1938, Vargas logo tratou de criar um meio para manter-se no poder, foi quando deu um golpe de estado, tornando-se um ditador, sob o falho argumento de que o Estado Brasileiro precisava defender-se da “ameaça vermelha” (comunismo).


Fora nesta ocasião que, através de uma Carta Outorgada (imposta), que surgiu a Constituição de 1937.


Neste novo diploma Constitucional, o de 1937, partidos políticos, liberdade de imprensa, garantia de direitos civis, liberdade política, quando não abolidos, foram reduzidos a uma esfera mínima de gozo, devido a intensa intervenção estatal.


No tocante ao sistema eleitoral, apesar desta Constituição prevê um instituto característico da Democracia Direta, o plebiscito, com a finalidade de referenda-lá (o que nunca ocorreu), esta seguia as mesmas disposições da Constituição anterior.


Muitos consideram este o período mais obscuro da história brasileira. Não foram poucos os números de perseguições, assassinatos, caça a opositores.


Após ser deposto pelos militares, Getúlio Vargas deixou o poder, e deixou também um vazio constitucional sem precedentes. Diante desta necessidade de busca a uma nova ordem constitucional, surge a constituição de 1946, implementada por uma Carta Promulgada legalmente, dispondo sobre a autonomia dos entes federativos (político-administrativa), prevendo um mandato presidencial com duração de 05 anos.


A despeito do que tratava a Constituição anterior, esta nova Constituição, garantia a liberdade de opinião e de expressão, assegurava o direito de greve e de associação sindical, ao passo em que permitia a defesa da propriedade privada. Ainda dispunha sobre o pluripartidarismo, que voltava a vigorar, assegurando também, as eleições diretas.


Posteriormente, depois de um novo golpe de estado em 1964, nasce a Constituição de 1967, consideravelmente modificada com a Emenda Constitucional de nº 01 de 1969. Adveio de um documento promulgado, legalmente aprovado por um Congresso um tanto quanto dissipado em virtude de cassações, já que esta Constituição absorveu bases ditatoriais como o Ato Institucional nº 05 que suspendia direitos políticos.


Notório saber que, as disposições do Capítulo II – Dos Direitos Políticos, precisamente no art. 142, a Constituição de 1967, dispõem acerca do sistema eleitoral, elencando quais os eleitores brasileiros (maiores de dezoito anos), quais os requisitos para este exercício (alistamento eleitoral para ambos os sexos) e quais os impedidos de votar (analfabetos ou que tenham seus direitos políticos, ainda que temporariamente, suspensos).


Esta Carta Magna, ainda dispõe sobre o voto, declarando-o secreto e pela primeira vez, ao longo dessas experiências constitucionais, trouxe a previsão do voto secreto no Congresso Nacional, consoante publicação da Agência Senado:


“O sigilo na votação de matérias pelo Congresso Nacional foi inserido no texto constitucional, pela primeira vez, na Carta de 1967, quando se impôs caráter reservado ao julgamento de cassação de mandato decorrente de quebra de decoro parlamentar. A norma vigorou apenas por dois anos, sendo revogada pela emenda nº 1, editada pela junta militar em 1969 e que excluiu da Constituição qualquer menção a quórum ou modalidade de voto. Essa possibilidade só foi resgatada, quase vinte anos mais tarde, pela Assembléia Nacional Constituinte de 1988” (DIREITO2, 2000, não paginado).


Curioso expor que esta Constituição foi a única que trouxe o nome que é utilizado hoje pelo nosso país, qual seja, República Federativa do Brasil. 


Valendo-se ainda das lições de Robério Nunes e Geisa de Assis, oportunamente citados, destaca-se ainda que:


“Não é de estranhar, portanto, que o constituinte de 1988 quisesse bradar a todos os ventos que o Estado de Direito que estava sendo fundado deveria ser qualificado como democrático […] Logo no preâmbulo encontramos a proclamação de que os representantes do povo brasileiro se reuniram em Assembléia Nacional Constituinte “para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”.”


 A Constituição Cidadã de 1988, vigente atualmente, tem trazido um momento de redemocratização de suma importância no nosso ordenamento. Isso porque, dispõe de um rol extenso de garantias individuais e respeito às liberdades políticas e sociais.


Não é raro encontrarmos defensores fiéis a este modelo constitucional, uma vez que esta Carta Magna fora promulgada legalmente, trazendo uma série de reformas inovadoras, garantindo direitos essenciais, buscando, como nunca visto, minimizar as diferenças sociais, os abusos de poder, impondo freios à atividade estatal.


Logo no seu preâmbulo destacamos o sentimento de renovação que movia os ideais daqueles constituintes. A pressão popular, que exigia mudanças, requeria maior atenção ao livre exercício dos direitos, quer sejam individuais, sociais, políticos, ademais, o movimento de exaltação dos direitos humanos, certamente, compuseram, dentre outros, os fatores pujantes na elaboração da Constituição Cidadã.


Em definição cristalina, o artigo primeiro da Carta de 1988, traduz a composição do Estado Democrático de Direito brasileiro, este formado pela união indissolúvel de seus entes: Estados, Distrito Federal e Municípios.


Outrossim, valendo-se das disposições do artigo primeiro, são traçados os ideais fundamentais que servem de bases para instituição da República Federativa do Brasil, tais como, a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho, o pluralismo político, com destaque à inteligência do parágrafo único deste artigo que dispõe: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.


Os princípios fundamentais dispostos no Título I da CF de 1988 traduzem bem a necessidade que sentiu o Constituinte de fincar as diretrizes orientadoras da promoção do Estado Brasileiro. Como pode-se perceber os objetivos fundamentais (dispostos no art. 3°/CF 88), os direitos e deveres individuais e coletivos (dispostos no art. 5°/CF 88), com especial atenção a previsão da inviolabilidade do direito à vida, à liberdade e segurança, e os direitos sociais (dispostos no art. 6°/CF 88), com igual atenção às previsões dos direitos à educação, saúde, trabalho, segurança, reafirmam o sentimento de proteção e disseminação do bem estar social.


Neste passo, é reservado o direito de, em momento posterior, tendo em vista a didática do presente estudo, analisar com maior destaque as previsões constantes no Capítulo IV – Dos Direitos Políticos, dando especial atenção, às lições do artigo 14, desta Constituição.   


3. SISTEMA DE REPRESENTAÇÃO


Partindo das premissas apresentadas, tomando como base os conceitos trazidos, passaremos ao estudo da Representação no Brasil, fixando inicialmente de que forma se busca justificar e conceituar a Representação e qual a repercussão deste instituto numa determinada espécie de governo.


Inicialmente, não se pode falar de Representação sem antes significar com afinco o elemento chave para a manifestação deste instituto; o Povo.


O Povo, conforme disposto no capítulo primeiro do presente estudo, compõe-se de todos aqueles habitantes que estão sujeitos a certa ordem estatal. São os destinatários das ações estatais, sendo este o elemento que institui o próprio Estado.


Têm-se como principal os interesses acerca deste elemento, talvez por ser o que é dotado de maior instabilidade, ou melhor, talvez por ser aquele elemento que mais sofre mutações, afinal, o ser humano é adaptável (nos costumes, ações, ideais…) a diversas situações.


Não é outro o motivo pelo qual “o conceito de povo pode ser estabelecido de pontos de vistas distintos: do político, do sociológico ou do jurídico”, com bem preceitua Maurício Sampaio (2009, p. 40).


Quanto ao ponto de vista político, podemos destacar que, conforme lições de Bonavides (SAMPAIO, 2009, p. 75), o “Povo é então o quadro humano sufragante, que se politizou (quer dizer, que assumiu a capacidade decisória), ou seja, o corpo eleitoral”.


No que se refere ao ponto de vista sociológico, carregados de impressões culturais, este traz um conceito pautado na observância comportamental da sociedade. O mesmo Paulo Bonavides (2002, p. 78) aduz que “o povo é compreendido como toda continuidade do elemento humano, projetado historicamente no decurso de várias gerações e dotado de valores e aspirações comuns” (grifo nosso). Ainda, nas definições de Maurício Sampaio (2009, p. 41):


“O povo é compreendido como todos os componentes da sociedade, de todas as gerações e de todas as épocas, ou seja, os vivos e os mortos, e os que irão viver. É o povo que é colocado numa dimensão histórica que liga todos os tempos e que transcende a contemporaneidade de sua existência.”


Quanto ao ponto de vista jurídico, que neste momento mais importa, mais uma vez aproveitando as lições de Maurício Sampaio (2009, p. 41 e 42), destaca-se que:


“Atualmente, o conceito jurídico de povo está ligado à idéia de um conjunto de indivíduos vinculados a um determinado ordenamento jurídico. Não basta afirmar que o povo é o elemento humano possuidor de direitos e deveres. Tem-se que enfatizar o laço de cidadania, o vínculo que une o indivíduo a um certo sistema de leis.”  


Dentro desta ótica, Friedrich Muller, citado por Sérgio Baalbaki, em publicação intitulada O Estado, o Povo e a Soberania, sabiamente aduz que:


“Povo como instância global de atribuição de legitimidade são os cidadãos do país, os titulares da nacionalidade, os destinatários dos textos normativos oriundos da atuação do povo ativo [eleitores e elegíveis] ao eleger os seus representantes (JUSNAVIGANDI, 2005, não paginado).”


E é neste passo que, ante a impossibilidade da totalidade do Povo (como já demonstrado, elemento constitutivo de um Estado) em dirigir um Estado, haja vista a sua numerosa presença e a suas distintas vontades, surge o instituto da Representação.


Nos cursos de Direito, em matérias propedêuticas, se ensina o porquê da necessidade de utilização deste instituto. Justifica-se que este se faz necessário por ser inviável que, numa sociedade complexa e numerosa, todos queiram se manifestar e requerer o atendimento a suas vontades.


Se assim o fosse, perder-se-ia muito tempo para que todos pudessem ser atendidos e de fato não teriam a necessária atenção às suas pretensões. Imaginemos o caso do Brasil, um país com dimensões continentais, tendo que atender a vontade de seus milhões de habitantes. Impossível.


É com base nessa fundamentação que se faz mister o estudo do Sistema de Representação Política, enfatizando as suas características e/ou seu desenvolvimento no Brasil.


Em primeira análise, a necessidade da existência de um Sistema de Representação se dá pela impossibilidade de, num Estado numeroso, todos se vêem efetivamente atendidos pela prestação estatal, no tocante aos seus anseios, vendo valer suas garantias individuais e, por conseguinte coletivas.


Mas esta análise se mostra um tanto quanto minimalista e simplória. Isso porque a representação, como chave da democracia representativa, nos transporta a tempos remotos.


A saber, nos tempos medievais, que já manifestavam a representação, os Representantes apenas falavam em nome de uma determinada coletividade ou grupo sobre assuntos anteriormente delimitados. Não agiam por vontade própria.


Em comparação com institutos atuais, os artigos 653 e 654, do Capítulo X, Seção I, do novo Código Civil Brasileiro, trazem as disposição inerentes ao mandato. Figura na qual uma pessoa recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses, através do instrumento procuratório (artigo 653/ CC 02). Essa outorga de poderes deverá se destinar a atender um objetivo específico (artigo 654, §1º/ CC 02), tal qual como era nos tempos medievais, onde os representantes recebiam poderes específicos para tratar sobre um assunto predeterminado.


Como todo e qualquer instituto, este não fugiria a regra. À medida que o tempo vai passando, as sociedades evoluindo, os estudos se aprofundando e se adequando às novas realidades sociais, toda e qualquer produção intelectual (jurídica, artística, jornalística, etc.) avança um patamar em entendimento e adequação.


Foi assim que, nas palavras de Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2005, p. 84), a representação, agora denominada representação moderna, “era, como ainda é, um modo de compor o governo, dando aos escolhidos a decisão sobre os meios e modos de realizar o bem geral”.


Se outrora a representação destinava-se a tratar de assuntos predeterminados, neste novo contexto, a representação confere aos Representantes poderes, também, para decidir sobre qual a melhor forma (e assim o deve ser) para o desenvolvimento da sociedade a qual está representando.


Isto certamente traz uma problemática, talvez essencial à presente discussão. Afinal, de que forma poderiam ou podem os Representados, outorgantes do poder, fiscalizar as ações dos Representantes, aqui outorgados?


Observe-se ainda que este não é o único problema que se mostra no particular, vez que, a exemplo, a anulação do Mandato Tradicional (aqui entendido como Mandato de Direito Privado) difere-se do Mandato Político.


No Mandato de Direito Privado um simples ato de vontade do outorgante fará com que os poderes outorgados não possam ser mais praticados por aquele a que foi destinado/conferido. No Mandato Político, além da necessidade de previsão de instrumentos capazes de exercer o controle dos atos dos outorgados, faz-se necessário o uso de remédios jurídicos, legalmente previstos, para se insurgir contra aqueles que não praticam os atos em conformidade com à sua destinação. Nesta ocasião haverá o uso do maquinário estatal-judicial, com o fito de sanar (entendendo como anular) a arbitrariedade ou desvirtuamento cometidos.


Neste deslinde, o mencionado Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2005, p. 84) expõe:


“Na verdade, a representação – esse vínculo entre governados e os governantes pelo qual estes agem em nome daqueles e devem trabalhar pelo bem dos representados e não pelo próprio – constitui um dos mais difíceis problemas do Direito Público e da Ciência Política”. (grifo nosso)


Notório perceber que a falta de mecanismo ou a precariedade destes, ainda que inicialmente, para o controle popular sobre os atos dos Representantes, ressalte-se, outorgados, causa instabilidade e insegurança nas relações político-sociais. Não é outro o motivo pelo qual se vê, com tanta freqüência, a leva de atos irresponsáveis dos eleitos para com os eleitores.


Em peculiar e sapiente passagem, Maurício Sampaio (2009, p. 19), mostra que:


“Acontece que o desvirtuamento do real propósito da representação política, causado por inúmeras práticas moralmente e juridicamente irregulares, junto à falta de utilização efetiva e satisfatória dos instrumentos de participação direta terminam gerando dúvidas acerca da inclusão do Estado brasileiro como uma verdadeira democracia.”


É pautada nesta incerteza e insegurança que, de algum modo, busca-se a natureza jurídica da Representação, numa tentativa de estreitar a deliberação, sem qualquer controle, dos Outorgados dos poderes públicos.


Conforme salientado anteriormente, destacada a idéia de Representação, tal como é no Direito Privado, urge analisá-la à luz das Representações Políticas, com a finalidade de saber se a presente definição/comparação aponta saídas ou mecanismos para estreitar a deliberação desenfreada dos Governantes.


 De certo esta não é a melhor definição ou comparação a ser adotada como meio de justificação do vínculo existente entre eleitor (outorgante) e eleito (outorgado).


Em análise, alguns problemas ou, para melhor compreensão, algumas inconsistências, demonstram-se, clarificando quão frágil é tal comparação.


Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2005, p. 85) destaca:


“Entretanto não se pode assimilar o mandato representativo ao mandato do Direito Privado. O mandatário-representante não está, como o procurador, adstrito a seguir instruções do mandante. Nem pode ser a qualquer tempo destituído ou substituído, nem tem contas a prestar, salvo moralmente, a quem o constituiu, ao conjunto de cidadãos. Nem age em nome apenas dos que nele votaram mas em nome de todos e do todo, o povo ou nação.”


Assim, o entendimento que se abstrai é que existem definições do Mandato no Direito Privado que não guardam conformidade com os parâmetros definidores do Mandato Político, não havendo, portanto, campo para sua aplicabilidade na solução de inconformismos existentes entre outorgantes e outorgados, aqui entendidos como eleitores e eleitos.


Este entendimento é o mesmo de Friedrich Glum (apud SILVA, 1999, p. 201) ao afirmar que “quanto à qualificação política da representação, faz-se mister lembrar a esse propósito que a representação deixa de ser de direito privado e se politiza, desde que seus fins transcendam os fins e interesses individuais”.


A despeito da classificação da Representação trazida pela Teoria do Mandato (talvez a mais expressiva Teoria), acima explicada, outras teorias tentaram de forma ineficaz conceituar ou classificar a natureza jurídica da Representação, sendo esta uma das maiores discussões no campo da ciência política.


Na verdade entende-se que a Representação, apontando aqui a sua repercussão e finalidade, é o meio pelo qual aquele escolhido agirá, ou pelo menos deverá agir, em nome de quem o escolheu, harmonizando interesses e minimizando opiniões e aspirações díspares.


A doutrina da identidade, bem lembrada por Paulo Bonavides (2002, p. 215), buscou significar tais premissas adequando-as à realidade política, face à Representação, demonstrou que:


“Todas as variações que se prendem ao sistema representativo e aos novos moldes que ele ostenta ao presente podem, sem grave fratura de unidade e congruência, resumir-se num feixe de doutrinas, cuja aspiração básica consiste essencialmente em estabelecer a identidade e suprema harmonia da vontade dos governantes com a vontade dos governados.” (destaque-se)


E vai além ao abordar preceitos fundamentais à Democracia como forma de governo de todos e para todos:


“Consiste também em fazer, com máximo acatamento dos princípios democráticos, que aquelas vontades coincidentes venham a rigor apagar traços distintivos entre o sujeito e o objeto do poder político, entre povo e governo. De modo que a soberania popular, tanto na titularidade como no exercício, seja peça única e monolítica, sem a contradição e contraste dos que na sociedade mandam e dos que nessa mesma sociedade são mandados.” (destaque-se)


Ainda assim, passada essa tentativa de busca pela natureza jurídica do instituto em foco, o que de certo se pode afirmar, em consonância com os ensinamentos de Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2005, p. 85 e 86), é que:


“Da eleição resulta que o “representante” recebe um poder de querer, é investido do poder de querer pelo todo, torna-se a vontade do todo. […]


Nada o vincula, juridicamente, à vontade dos eleitores. No máximo, reconhece-se que a moral e o seu próprio interesse o impelem a atender os desejos do eleitorado. A moral porque a eleição não se obtém sem promessas… O próprio interesse porque o tempo trará nova eleição”


No Brasil, não foram diferentes os momentos histórico-sociais em que houveram divergências quanto à representação e participação popular no exercício da democracia.


A história demonstra que combates sociais, que lutas ideológicas, marcaram a construção de conceitos e aprimoramento de institutos que, usualmente, servem como meios de controle político.


3.1 Concretização da Cidadania


De certo, toda e qualquer forma que vise a maior participação popular, que busque a similitude entre os propósitos dos poderes outorgados e anseios sociais, findam num Estado, ao menos, harmônico, que caminha paralelo às aspirações sociais, dando-lhes respostas rápidas e eficazes, solidificando o ideal do “ser cidadão”. Trata-se da concretização da cidadania.


A cidadania está atrelada ao gozo dos direitos, quer sejam individuais, quer sejam coletivos, ou ainda políticos e/ou sociais, que permitem aos indivíduos intervir no rumo das políticas públicas do Estado, seja no tocante à escolha do governo, seja na forma de administração, seja nas regras de estruturas públicas de promoção ao desenvolvimento humano, social e econômico, enfim, é a configuração do binômio direitos-deveres garantidos e impostos a toda coletividade.


À luz das palavras de Maurício Sampaio (2009, p. 61), reafirma-se este posicionamento, quando este expõe que:


“Ser cidadão é possuir direitos civis garantidos pela lei, como também direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade, etc.; é também ter direitos políticos, participando do destino da sociedade, votando e sendo votado. Mas esses direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os direitos sociais, ou seja, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva, como o direito à educação, à saúde, ao trabalho etc”. (destaque-se)


A cidadania, como princípio da participação da nação na política nacional, nas mais diversas vertentes apontadas (e outras porventura esquecidas), desenvolve-se ao longo das experiências constitucionais de um País, em particular o Brasil. As mudanças de diretrizes no ordenamento jurídico apontam uma nova perspectiva e uma nova forma de exercício à cidadania.


Ainda Maurício Sampaio (2009, p. 62):


“Tomando por base a idéia de que a cidadania diz respeito à qualidade daquele que possa participar da vida do país na sua integralidade, sendo cidadão, diferentes modos de se observar essa qualidade podem ser descritos no decorrer da evolução histórica do homem, já que cidadania não é uma definição estanque, variando no espaço e no tempo. É um conceito histórico.”


O próprio termo “cidadania” é uma prova das variantes constitucionais e conceituais. Nos primeiros modelos constitucionais brasileiro, este se confundia com as idéias de nacionalidade e naturalidade. Hoje são conceitos bem distintos.


A nacionalidade, proclamada na Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu artigo XV 1 e 2, quando define que “toda pessoa tem direito a uma nacionalidade”, e que “ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade”, traduz-se no vínculo existente entre as pessoas submetidas a certa ordem estatal, que lhes confere direitos e dita deveres, dando proteção, inclusive, fora de sua base territorial.


Já a naturalidade, como qualidade de quem é natural, define-se no vínculo que se estabelece do nascimento da pessoa em determinada localidade. Trata-se do local de onde se nasce.


Assim, como bem demonstrado, o Brasil passou por regimes governamentais que minimizaram à esfera quase que inexistente, o gozo dos direitos civis e políticos. Por óbvio, a luta pela cidadania subsume-se à luta pela afirmação dos direitos humanos. Estes conceitos, em certo ponto, se confundem.


O presente estudo, em curta passagem, expôs os massacres, as perseguições, as lutas, as mortes, acontecidas em momento histórico distinto, sob uma égide constitucional, que corroboram para construção de modelos jurídicos necessários de aperfeiçoamento, não descartadas aqui as influências mundiais.


Mas hoje, com um novo modelo constitucional que, conforme exposto, tem trazido um momento de redemocratização, fixando um rol extenso de garantias individuais e respeito às liberdades políticas e sociais, o instituto da cidadania é mais facilmente verificado.


Aliás, não é outro o entendimento ao se deparar com a previsão constitucional do artigo 14, do Capítulo IV – Dos Direitos Políticos, ao trazer institutos que glorificam a concretização da cidadania.


CAPÍTULO IV – DOS DIREITOS POLÍTICOS


Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:


I – plebiscito;


II – referendo;


III – iniciativa popular.” (destaque-se)


O voto, meio ou forma de exercício do plebiscito e do referendo (excetuada a iniciativa popular, uma vez que essa se concretiza com a manifestação de vontade do povo), enaltece a utilidade destes instrumentos, no tocante ao exercício da cidadania. É a própria cidadania se manifestando quando do uso de qualquer destes instrumentos.


E é com o uso destes instrumentos que escolhemos o rumo de nossa nação, seja viabilizando a manifestação da vontade soberana do povo sobre questões de interesse nacional, político e social, seja submetendo decisões à aprovação do povo para que se tornem definitivas, ou mesmo dando a possibilidade de iniciativa ao povo para que este proponha normas delineadoras do rumo nacional, ou seja ainda dando ao povo à possibilidade de escolher os seus representantes.


A despeito da utilidade dos instrumentos aqui apresentados, conforme já traçado, é latente a limitação, ou dificuldade de viabilização destes, face aos inviáveis requisitos e/ou pressupostos para as suas corretas utilizações.


Já dizia Maurício Sampaio (2009, p. 152):


“Os três institutos, no entanto, dentro do que é estabelecido na Constituição Federal de 1988, nas Constituições Estaduais e em lei infraconstitucional, possuem inúmeras limitações que os tornam ineficazes. O que faz com que a sua utilização efetiva no Brasil se restrinja a quase nada, quando comparada ao que se fez e ao que se faz, em relação à participação na formação da vontade nacional marcada pela atuação do poder público, principalmente na esfera do Poder Executivo.”


A necessidade de um percentual mínimo do eleitorado nacional, estando estes eleitores distribuídos por número certo de Estados, em que a repercussão dentro de cada Estado atinja outro percentual mínimo, bem como a falta de regras formais para o controle, fiscalização, coleta e autenticidade das assinaturas que irão compor tal iniciativa, reforça, ainda mais, a idéia de que estes não são utilizados da forma que se almeja, restando assim, prejudicada a democracia.


A democracia, por certo, resta prejudicada, pois a frágil instituição destes instrumentos (Plebiscito, Referendo e Iniciativa Popular), pelos motivos ora apontados, prejudicam, entre outros fatores, o controle dos atos dos representantes, dando margem à discricionariedade, o que, fatalmente irá afastar os anseios sociais dos interesses individuais dos nossos representantes.


Em suma, conforme expendido, a fragilidade do uso destes institutos, bem como o afastamento existente entre as suas funções e a necessidade de fiscalização, maculam o ideal democrático.


4. O SUFRÁGIO


Muitas vezes associado à definição restrita de “voto”, se entendido genericamente, ou, ao passo em que se confunde com o próprio vocábulo voto, chegar-se-á, comumente, à tradução para forma de participação popular, ou forma de manifestação da vontade do povo, nos assuntos atinentes à vida pública.


Entende-se que com este (sufrágio ou voto – acepção costumeira) o povo tem o poder de ingerir nos rumos da sociedade à qual está submetido.


Entretanto, leciona Paulo Bonavides (2002, p. 228):


“Quando o povo se serve do sufrágio para decidir, como nos institutos da democracia semidireta, diz-se que houve votação; quando o povo porém emprega o sufrágio para designar representantes, como na democracia indireta, diz-se que houve eleição. No primeiro caso, o povo pode votar sem eleger, no segundo caso o povo vota para eleger.” (destaque-se)


Ou seja, o sufrágio se revela em duas funções distintas. A primeira, quando destinada a decisões, a exemplo de casos abarcados pelo uso dos mecanismos de Iniciativa Popular, Referendo ou Plebiscito, traduz-se em votação (participação direta de todos os integrantes do povo), entendido como escolha/decisão, de rumos e/ou caminhos sociais.


Em segunda análise, quando é empregado para designar representantes, como destacado acima na lição de Paulo Bonavides, traduz-se em eleição, entendida como a escolha daqueles que irão representar a totalidade do povo, escolhendo por este, os rumos e/ou caminhos sociais.


Note-se que em ambas as situações, o que se depreende é que urge a necessidade de participação popular, tornando concreto o exercício da cidadania, vez que, a sociedade é do povo e para o povo.


Em passagem singular, mostra Paulo Bonavides (2002, p. 228) que “é o poder que se reconhece a certo número de pessoas (o corpo de cidadãos) de participar direta ou indiretamente na soberania, isto é, na gerência da vida pública”.


Na mesma esteira ensina Monica Herman S. Caggiano (2002, p. 539) que:


“Partindo do princípio de que o sufrágio configura o momento de participação política de maior relevância para os integrantes de uma comunidade politicamente organizada, traduzindo, por isso, mais que um direito – um dever em relação ao cidadão, que somente vem a integralizar o “status civitatis” com a efetiva possibilidade de interveniência no pólo do exercício do poder político.” (destaque-se)


Seja “dever”, quando manifestada a obrigação/função útil ao desenvolvimento de uma sociedade, ou “direito” quando do poder de ingerência do povo nos assuntos da vida pública, o certo é que o sufrágio tem sido uma importante arma na luta da consolidação dos direitos sociais.


Na busca pela natureza jurídica do sufrágio, Paulo Bonavides (2002, p. 230), à luz da doutrina constitucional italiana, indica que o sufrágio “[…] se trata de um “direito de função”. Conjuga assim no conceito de sufrágio igualmente a “função eleitoral” (direito) e o “correto exercício” dessa mesma função (dever ou obrigação)”.


Vai adiante Paulo Bonavides (2002, p. 230, 231) quando define:


“Como “função eleitoral”, o sufrágio é direito público subjetivo, contendo certos poderes reconhecidos ao seu titular […] Como “correto exercício da função eleitoral”, entende-se por aí a face do sufrágio que se apresenta em forma de dever, de obrigação do eleitor cidadão. Este não poderá ser molestado no livre e independente exercício daquele direito. Descumprindo porém o caráter público da função, abstendo-se de votar ou valendo-se do voto para auferir vantagens pessoais e indevidas, ficará então o eleitor sujeito às sanções da ordem jurídica. O exercício do voto, pelo lado pois de sua obrigatoriedade, apresenta-se como “dever cívico” […]”


Com efeito, não obstante às discussões existentes acerca do sufrágio, seja no tocante à sua natureza jurídica, seja no tocante à sua classificação doutrinária como direito ou função (dever/obrigação), o que nos toma mais atenção, é o desvio da finalidade deste instrumento essencial ao desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária, que busque a pacificação e a similitude nos interesses sociais.


Não raras são as notícias de violação a preceitos fundamentais de uma sociedade democrática. O sufrágio, como dito, é o instrumento capaz de fazer com que o povo, elemento de composição de um Estado, no exercício da cidadania, onde cada indivíduo é titular de parte ou fração da soberania (outro elemento de composição de um Estado), dite os rumos e destinos que sua Nação deva seguir, ao passo em que, sob outra ótica, escolha representantes capazes de, em seu nome, tomar decisões salutares a mantença do Estado social, capaz de atender os anseios sociais.


Ainda assim, diante de tão importante instrumento, este, por vezes, é maculado face à oferta e necessidade de facilidades que, aos olhos dos necessitados, não implicarão em prejuízos maiores à determinada nação.


Cestas básicas, materiais de construção, médicos, dinheiro, cargos, concessões, são algumas das mais variadas e “criativas” facilidades que, a todo tempo, nos são ofertadas por aqueles que buscam ser representantes.


Mas porque esta necessidade, esta desenfreada e desmedida busca ao poder de ser outorgado/representante de determinada Nação?


Será que é pela falta da necessidade de justificação ao eleitor / outorgante / representado, sobre os atos praticados? Sobre o uso correto das atribuições conferidas à quem torna-se representante? Sobre a disposição das riquezas da Nação?


Essas perguntas serão respondidas no capítulo último do presente estudo, apontando, por conseguinte, qual forma será a eficaz na correta cobrança de justificativas acerca dos atos dos representantes.


4.1 Previsão Legal


Conforme já fora relatado, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 14, no capítulo atinente aos direitos políticos, informa que “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante Plebiscito, Referendo e Iniciativa Popular”.


Destaque-se que o caput do próprio artigo já informa que o povo terá garantido, ao tempo em que obrigado, a possibilidade do exercício da soberania popular, na medida em que cada um, sem distinção de cor, raça e ou sexo, em grau de igualdade, são detentores da medida de poder garantida.


Por óbvio, como se depreende das lições de Paulo Bonavides (2002, p.233), “é natural que os estrangeiros sejam excluídos de participação na vida política do Estado onde porventura se achem”; por isso destina-se ao povo, vez que estes são detentores da medida de poder, qual seja, a soberania.


Com efeito, toda e qualquer previsão que confira direitos e ou imponha obrigações, deverá vir seguida de requisitos para o seu exercício (quando for direito) e para o seu cumprimento (quando for dever).


Os onze parágrafos e seus conseqüentes incisos que seguem à disposição disposta no caput do citado artigo, trazem as condições para o exercício desta soberania e, por conseguinte, a concretização da Cidadania.


De início urge esclarecer que, ao contrário da impressão causada pela previsão do caput do artigo 14, ao mencionar que o voto será universal, sem qualquer restrição, o já citado Paulo Bonavides (2002, p. 233) ensina que:


“A rigor todo sufrágio é restrito. Não há sufrágio completamente universal. Relativa, pois é a distinção que se estabelece entre o sufrágio universal e o sufrágio restrito. Ambos comportam restrições: o sufrágio restrito em grau maior; o sufrágio universal em grau menor.


Define-se o sufrágio universal como aquele em que a faculdade de participação não fica adstrita às condições de riqueza, instrução, nascimento, raça e sexo”.


Destaque-se a idéia de faculdade, vez que, conforme Paulo Bonavides (2002, p. 233) “essas limitações feitas à capacidade de eleitor, em regime de sufrágio universal, se prendem mais às condições de nacionalidade, residência, sexo, idade, capacidade física e mental, grau de instrução, indignidade e serviço militar”.


O presente estudo já retratou que, em outras experiências constitucionais, o Brasil previa o sufrágio restrito, vez que exigia requisitos específicos para a condição de eleitor, como eram as hipóteses do voto capacitário e censitário, oportunamente explicados.


Atualmente a própria previsão do artigo 14 mostra que, o que há são limitações à capacidade de eleitor. Não há qualquer restrição. Apenas à faculdade para o seu exercício quando observadas as limitações à capacidade de eleitor.


4.1.1 Art. 14, § 1° – Disposição Legal


Nas disposições do parágrafo primeiro, observa-se a obrigatoriedade e a faculdade do exercício do voto.


“§ 1º – O alistamento eleitoral e o voto são:


I – obrigatórios para os maiores de dezoito anos;


II – facultativos para:


a) os analfabetos;


b) os maiores de setenta anos;


c) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.”


A obrigatoriedade constante do inciso I mostra o dever exigível quando manifestada a obrigação/função útil ao desenvolvimento de uma sociedade, conforme demonstrado.


Imperioso destacar que Paulo Bonavides (2002, p. 234) explica tal previsão quando, “a lei eleitoral adota geralmente uma idade mínima para o exercício do direito de voto, idade que faça presumir no eleitor a capacidade de discernimento, maturidade e tirocínio indispensáveis a uma intervenção esclarecida nos negócios públicos”. Note-se que estes são os casos descritos no inciso I e nas alíneas “b” e “c” do inciso II.


Quanto à faculdade do voto, para aqueles que não possuam um mínimo de grau de instrução, previsão da alínea “a” do inciso II, podemos destacar outra passagem de Paulo Bonavides (2002, p. 235), onde verifica-se que:


“Raros são os sistemas constitucionais que em sua legislação eleitoral admitem o voto às pessoas que não sejam possuidoras de um grau mínimo de instrução. A exclusão dos que não sabem ler e escrever tem por fundamento a presunção de que não se acham em condições de emitir voto, formular juízo ou tomar decisões.”


Note-se que no casos acima retratado, a Constituição brasileira, não excluiu aqueles brasileiros que não gozem de um desejável grau de instrução. Para estes que não o possuem, a Constituição tornou-o facultativo, vez que se busca a plena capacidade eleitoral do povo, com o afinco de que não hajam maculas quando do exercício da soberania popular, aqui representada através do voto.


 4.1.2 Art. 14, § 2° – Disposição Legal


Conforme já demonstrado e cristalinamente disposto no parágrafo segundo deste artigo 14, “não podem alistar-se como eleitores os estrangeiros”. Por óbvio, não se pode admitir que outra pessoa, que não a natural do País ao qual se submete, dite ou opine em rumos que devam tomar o Estado. Não há de se admitir que outrem interfira na vida político-social da Nação.


O parágrafo segundo ainda dispõe que aqueles recrutados para o serviço militar, a exemplo dos estrangeiros, não podem se alistar como eleitores.


Paulo Bonavides (2002, p. 236 e 237) mostra que:


“A limitação em apreço decorre, segundo os publicistas, da conveniência de preservar a solidez dos laços de disciplina nas fileiras militares, uma vez que evita: a) a pressão dos oficiais sobre os soldados; b) o ingresso da política nos quartéis, com abalo ou quebra do princípio de autoridade e disciplina.”


Segundo Laveleye (apud BONAVIDES, 2002, p. 237) “as discussões políticas destroem a disciplina, que é a alma dos quartéis”.


Em verdade se tenta afastar qualquer desvio de foco possível, caso se possibilite o voto daqueles militares. Ademais, não é absurdo pensar que os Comandantes possuem meios suficientes para macular o voto de seus subordinados.  


4.1.3 Art. 14, § 3° – Disposição Legal


As disposições constantes no parágrafo terceiro do artigo 14 intensificam as condições necessárias para que um “comum”, entendido como aquele que não tenha pretensão em assumir as responsabilidades de se tornar um representante, torne-se representante, ou como tem-se falado neste estudo, outorgados, dos poderes de todo o povo.


Essas disposições abarcam determinadas restrições, ou mesmo requisitos específicos para a condição de outorgado. Trata-se dos já citados requisitos da: nacionalidade, grau de instrução, capacidade, bem como a idade e o alistamento, a seguir traçados.


O parágrafo terceiro assim anuncia:


“§ 3º – São condições de elegibilidade, na forma da lei:


I – a nacionalidade brasileira;


II – o pleno exercício dos direitos políticos;


III – o alistamento eleitoral;


IV – o domicílio eleitoral na circunscrição;


V – a filiação partidária;


VI – a idade mínima de:


a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador;


b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;


c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;


e) dezoito anos para Vereador.”


No tocante à idade Bonavides (2002, p. 234) indicava que:


“A lei eleitoral adota geralmente uma idade mínima para o exercício do direito de voto [direito de votar e de ser votado], idade que faça presumir o eleitor a capacidade de discernimento, maturidade e tirocínio indispensáveis a uma intervenção esclarecida nos negócio públicos.”


Já em relação ao alistamento, o mesmo Bonavides (2002, p. 237) destaca que:


“Não basta ao eleitor reunir todos os requisitos de capacidade exigidos por lei para exercer o direito de sufrágio. Faz-se mister também o alistamento, de modo que lhe seja conferido o título de eleitor e seu nome possa assim constar previamente nas listas oficiais de participação, por ensejo dos pleitos eleitorais”.


Atendidas essas condições, estarão, aqueles interessados, capacitados a receber poderes, claro que atingido o quorum mínimo de votos capazes de torná-lo eleito, respondendo, por fim, em nome de todo o povo.


4.1.4 Art. 14, § 4° – Disposição Legal


A previsão constante no parágrafo quarto, glorifica as condições de que, para ser representante do povo, qualquer interessado, antes, deverá estar devidamente alistado, ou seja, deverá manter o seu nome registrado nas listas oficiais de participação como eleitor, bem como deverá gozar de desejável grau de instrução, uma vez que se espera de um representante uma capacidade intelectual mínima que possa auxiliá-lo na busca por melhores condições no atendimento dos anseios sociais.


4.1.5 Art. 14, § 5° A 11º – Disposição Legal


Os demais incisos, não menos importante que os anteriores, tratam de disposições acerca de mandatos, suas restrições e forma composição e destituição.


Logo no parágrafo quinto destaca-se que aquelas figuras das alíneas “a”, “b” e “c” segunda parte, do inciso IV do parágrafo terceiro, um vez substituídos no curso de seus mandatos (lapso temporal em que um representante exerce as prerrogativas e poderes a ele outorgados, enquanto representante do povo), só poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.


Em tempo, é importante salientar que existem discussões doutrinárias acerca da caracterização dos membros do Poder Executivo como representantes. Aqueles que sustentam a idéia de que não podem ser considerados como tal, pautam-se na premissa de que estes têm a função de governar e administrar um Estado.


Em entendimento oposto, os que sustentam a idéia de que os membros do Poder Executivo são sim representantes do povo, defendem que os poderes constituídos e a autoridade pública atribuída os membros do Poder Executivo, ainda que estes tenham atribuições administrativas, são baseados no princípio da soberania popular e da representação.


As inteligências destes princípios informam que o poder político (outorgado aos membros do Poder Executivos), tem como titular o povo, sendo exercido por este quando do uso do sufrágio.


Assim, ao que parece, a idéia de que os membros do Poder Executivo são representantes, é a que mais se adequa ao conteúdo deste estudo. Seguindo, no parágrafo sexto visualiza-se a previsão de que, caso algum representante já escolhido (eleito) deseje concorrer a cargo diferente daquele atualmente exerce, deverá renunciar a este atual num prazo não inferior a seis meses antecedentes a pleito que concorrerá.


 O parágrafo sétimo veda o favoritismo que possa ocorrer em casos nos quais um representante eleito favoreça a parentes em detrimento de outros potenciais Candidatos à representação. Busca-se fixar um termo legal (seis meses) para que parentes próximos do titular de determinado cargo público, ou de quem os haja substituído, tornem-se inelegíveis. Vide neste particular a preocupação no tocante ao nepotismo.


Em relação ao parágrafo oitavo, pode-se destacar uma exceção em relação à condição daqueles recrutados para o serviço militar. Nesta hipótese, o militar alistado (na Justiça Eleitoral) que contar menos de 10 (dez) anos de desenvolvimento de atividades militares, deverá afastar-se dessas atividades para tornar-se elegível, ou seja, para poder ser votado.


Para aqueles que contem com mais de dez anos de exercício de funções militares, se eleito, ao tomar posse do cargo para o qual fora eleito, passará para inatividade.


As disposições do parágrafo nono mostram que lei complementar, cuja aprovação se dá por maioria absoluta, cuja destinação é para complementar, explicar, adicionar algo, indicará novos casos de inelegibilidade com os conseqüentes prazos para sua cessação.


A justificação trazida pelo Constituinte é bem clara quanto à preocupação do bom exercício da soberania popular. Este assim descreve:


“A fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”


Os parágrafos décimo e décimo primeiro, são mais procedimentais pois informam que qualquer impugnação feita a qualquer mandato, contados 15 (quinze) dias da diplomação do representante eleito, versando esta sobre abuso do poderio econômico (compra direta de votos, troca de voto por benefícios particulares…), corrupção ou fraude, tramitará em segredo de justiça, junto à Justiça Eleitoral.


5. O ESTUDO DA PREVISÃO DO ARTIGO 47 DO REGIMENTO COMUM INTERNO DO CONGRESSO NACIONAL BRASILEIRO


Comungando com discussão similar à anterior, prossegue-se o estudo do sufrágio, neste instante sob a ótica do artigo 47 do Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro.


Após as discussões aqui lançadas, após o estudo dos conceitos trazidos, traçadas as experiências constitucionais, indicados os problemas existentes na relação outorgante-outorgado, com a análise passada a seguir, apontar-se-á como e o porquê da afirmação de que o artigo 47 de Regimento Comum Interno do Congresso Nacional Brasileiro, viola o princípio democrático, contraria o livre exercício da cidadania e mitiga o exercício da soberania popular.


De início cumpre fazer algumas considerações.


O Congresso Nacional Brasileiro, cuja sede é em Brasília, no Distrito Federal, é órgão constitucional, cuja disposição é encontrada no Título IV – Da Organização dos Poderes, em seu Capítulo I – Do Poder Legislativo, na Seção I – Do Congresso Nacional.


O Congresso Nacional exerce a função típica do Poder Legislativo, sendo bicameral, vez que se divide no Senado Federal e na Câmara dos Deputados. Destaque-se que estas Casas, são compostas por representantes eleitos pelo povo.


Paulo Bonavides (2002, p. 310) ensina que:


“A primeira dessas casas [Câmara de Deputados] representa a totalidade de cidadãos, dos contribuintes, do povo como fonte primária do poder político, composta de representantes populares em número proporcional aos habitantes (critério demográfico) ou de eleitores (critério político). É a assembléia democrática por excelência.” (destaque-se)


Neste passo, a Câmara de Deputados, composta por representantes eleitos através do sistema de voto proporcional (típico do Poder Legislativo, cujo o coeficiente de cada partido elegerá um representante), é considerada a Casa que, essencialmente, representa o povo.


No que se refere ao Senado Federal, Paulo Bonavides (2002, p. 310) destaca:


“Já o Senado tem no sistema presidencial feição menos popular, sendo nas organizações federativas e presidenciais, a assembléia dos Estados, que se fazem nela representar em termos de paridade política, cabendo a cada Estado igual número de Senadores [qual seja, três Senadores]”


E, em se tratando de Senado Federal, à luz dessa brilhante definição de Paulo Bonavides, tem-se que esta Casa, cuja representatividade é igualitária para todos os entes federativos (Estados e Distrito Federal), é composta de representantes direito dos Estados, por isso que não há uma proporcionalidade diretamente ligada ao número de habitantes de cada Estado.


Para o exercício das funções de representantes do Povo, e dos Estados, cada Deputado e/ou Senador, goza de algumas prerrogativas, quando do exercício da função de representante, para que se busque o entendimento entre a necessidade da realização de atos que atendam às necessidades e anseios populares, bem como para que se mantenha a independência natural de cada Poder, na esfera de sua atuação.


Destaca-se aqui a imunidade material, ou inviolabilidade civil e penal, quando da prolação de opiniões e posicionamentos no exercício da função de parlamentar; e a imunidade formal que é atribuída aos casos do cometimento de crimes, excetuados aqueles inafiançáveis, e suspensão do andamento de ação penal, após a diplomação e, por fim e não menos importante, o foro por prerrogativa de função, cuja fácil definição (WIKIPÉDIA, 2009, não paginado) se entende quando explica que “visa proteger o bom funcionamento do Congresso Nacional, impedindo que os seus membros sejam perseguidos politicamente por meio de ações judiciais. Assim, após a diplomação, os congressistas só poderão ser julgados pelo STF”.


Observa-se a importância das imunidades conferidas aos nossos representantes, o que ressalta, ainda mais, a importância da fiscalização de seus atos enquanto agem em nome do interesse nacional. Essa premissa será discutida mais a frente.


Assim, conforme visto, é a união dessas Casas que dá origem ao Congresso Nacional, órgão que tipicamente trata das matérias legislativa, votando, seja para a aprovação ou não sobre matérias das leis que irão compor o ordenamento jurídico pátrio.


Urge mencionar que, pelo fato de o Congresso Nacional ser bicameral, o processo de criação de leis, no Brasil, dependerá da manifestação (do voto) das duas casas, em atenção ao princípio da participação popular.


É sobre esta ótica que, sendo o órgão responsável por dispor sobre matérias de competência da União, o Congresso Nacional é de fundamental importância no desenvolvimento social, político, educacional, econômico, dentre outros, de determinado povo e, por conseguinte, Estado.


E é nesse sentido, no que se refere às decisões que irão apontar o rumo da Sociedade, no que se refere também às disposições atinentes às prerrogativas dos nossos representantes, bem como àquelas disposições que tratam do voto secreto no Congresso Nacional, que, por hora, se lança o presente debate.


Diante de tais premissas, traz-se à baila à discussão atinente à previsão do artigo 47 do Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro. É bem verdade que qualquer das Casas, Câmara de Deputados e Senado Federal, terá regimento próprio, porém este não é o foco aqui escolhido, uma vez que as disposições do Regimento Comum Interno do Congresso terão aplicabilidade sobre todos aqueles Deputados e Senadores, quando estes estiverem reunidos.


Originariamente aprovado pela Resolução n° 01 de 1970-CN, o Regimento Comum Interno do Congresso trazia disposições acerca do funcionamento, da composição, da forma em que seriam praticados os atos atinentes ao exercício da função de representantes do povo, visando padronizá-las e adequá-las à realidade nacional. 


Entretanto, algumas alterações foram percebidas ao longo de 39 anos de instituição do Regimento Comum Interno.


Destaque-se, a tempo, que algumas das referidas alterações foram, inclusive, feitas pela Constituição Federal de 1988, que é posterior à instituição do Regimento. Algumas de suas disposições não foram recepcionadas pelo novo modelo constitucional que, à época, se iniciava.


A nota à edição, da mais recente publicação compilada do Regimento Comum Interno do Congresso Nacional, mostra tal alegação, ao expor que:


“O Regimento Comum do Congresso Nacional foi originalmente aprovado pela Resolução no 1, de 1970-CN. Parte de seus dispositivos foi revogada ou alterada pela Constituição Federal de 1988 e por Resoluções subseqüentes, razão pela qual, em dezembro de 1994, a Secretaria Geral da Mesa do Senado Federal preparou uma edição adaptando o Regimento Comum àquelas modificações (BRASIL, 2007, não paginado).”


Assim, certo de que Regimento Comum é um compêndio de regras e normas de funcionamento e auxílio ao exercício da função de representante do povo, urge destacar que nenhuma de suas previsões poderá ser contrária à aspiração social, sob pena de ferir o direito de exercício da soberania popular.


Não foi outra a razão pela o qual o presente estudo elegeu o artigo 47 do Regimento Comum Interno como aquele que notadamente viola preceitos fundamentais de uma democracia representativa, e não só, abala, também, alicerces estatais de suma importância, vez que, impossibilita o controle popular sobre os atos dos representantes eleitos.


O artigo 47, inscrito na Seção IV – Das Modalidades de Votação, trata, especificamente, da votação secreta no Congresso Nacional. Votação esta que versará sobre qualquer matéria de interesse nacional.


O artigo 47 diz:


“Art. 47. Na votação secreta, o Congressista chamado receberá uma sobrecarta opaca, de cor e tamanho uniformes, e se dirigirá a uma cabina indevassável, colocada no recinto, na qual devem encontrar-se cédulas para a votação. Após colocar na sobrecarta a cédula escolhida, lançá-la-á na urna, que se encontrará no recinto, sob a guarda de funcionários previamente designados.” (grifo nosso)


Ou seja, na votação, os Congressistas serão chamados, um a um, a se dirigir a uma urna que não pode ser invadida, inviolável, para que, sem que se saiba qual decisão (qual voto proferido) decida acerca dos rumos da nossa nação.


Vem à tona o seguinte questionamento: Se nós (eleitores) ao elegermos nossos representantes (eleitos), outorgamos poderes para que estes ajam em nosso nome, como pode esse outorgado (representante) tomar qualquer decisão sem que seja de nosso conhecimento? Isso é possível?


Por obvio é possível uma vez que não houve qualquer vedação legal ao presente dispositivo.


A despeito de não haverem vedações legais, conforme salientado, questionar-se-ia acerca de outras possibilidades de retirar do ordenamento jurídico tal previsão.


 Num olhar menos criterioso poderíamos afirmar que há uma inconstitucionalidade nesta previsão. De início não há que se falar em inconstitucionalidade uma vez que o Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro é anterior à Constituição de 1988. Caso houvesse alguma incongruência teríamos que focar na não recepção deste dispositivo. Entretanto isso não ocorre no particular uma vez que a própria Constituição Federal de 1988, em seu artigo 14, conforme disposição já estudada prevê a figura do voto secreto.


Outro questionamento se demonstra compreensível no particular. Mas essa previsão do voto secreto não é apenas aplicada ao voto quando vise designar representantes, como bem definiu Paulo Bonavides em ilustre passagem já disparada?


Não há, em resposta, qualquer vedação legal ou disposição em contrário que informe que o voto quando destinado a decidir rumos, na figura dos representantes, seja aberto, público e notório.


É nesse sentido que apontamos que a falta de mecanismo direto de fiscalização dos atos/votos dos representantes, quando do exercício da função, implica na violação ao princípio democrático, contraria o livre exercício da cidadania e mitiga o exercício da soberania popular. Senão vejamos.


Restou demonstrado ao longo deste estudo que o princípio informador da Democracia, ou princípio democrático, define a necessidade/acessibilidade que o povo, elemento de composição do Estado, tem de participar do processo de formação da vontade estatal, traçando rumos e apontando diretrizes que visem o aperfeiçoamento e amadurecimento social.


Ora, se o povo e os governantes têm o poder de participar na formação da vontade estatal, como pode este mesmo povo ser privado do controle dos atos daqueles que agem em nome do Estado? Participar da formação da vontade estatal significa dizer que o povo tem não só o poder de ditar, eleger, apontar, indicar, rumos e diretrizes, mas também o poder de fiscalizar os atos daqueles que agem em seu nome e que foram constituídos (outorgados no poder) para este fim.


Em igual sentido, a Cidadania, caracterizada pelo gozo dos direitos individuais, coletivos, políticos e/ou sociais, que permite aos indivíduos intervirem no rumo das políticas públicas do Estado, ou o seu exercício, intrinsecamente ligado a idéia de intervenção (fiscalização) nas decisões do governo, na forma de administração, nas regras de estruturas públicas de promoção ao desenvolvimento humano, social e econômico, buscando a similitude entre os propósitos dos poderes outorgados e anseios sociais, não pode sofrer restrições e/ou mitigações.


É o exercício da Cidadania que possibilita o crescimento e o amadurecimento social, é o exercício da Cidadania que permite que o povo se torne mais consciente de seus direitos e deveres, podendo gozá-los ou cumpri-los, da forma mais satisfatória e plena possível, tal como se almeja no princípio democrático.


Na mesma esteira de entendimento, a soberania popular, como medida de poder conferida ao povo para ingerir nos rumos do Estado, utiliza-se de instrumentos que viabilizam a manifestação da vontade soberana do povo sobre questões de interesse nacional, político e social.


A despeito do uso de determinados instrumentos de controle (Referendo, Plebiscito e Iniciativa Popular) verificamos, caso a caso, que estes instrumentos estão longe de serem utilizados e aplicados de forma conveniente para a própria sociedade.


A própria destinação de cada um (submeter decisões à aprovação do povo para que se tornem definitivas, dar a possibilidade de iniciativa ao povo para que este proponha normas delineadoras do rumo nacional e ainda dar ao povo à possibilidade de escolher os seus representantes) estão afastadas das idéias de fiscalização uma vez que estes instrumentos dirigem-se a fatos imponentes na sociedade e não a atos específicos dos Representantes.


O que se observa é que, numa tentativa de promover o controle de atos públicos (interesse nacional) dos representantes, o povo se vale das medidas judiciais cabíveis, quando cabíveis.


A necessidade de se ter um mecanismo próprio, político (uma vez que é através dos meios políticos que outorgamos poderes aos representantes) capaz de atender a necessidade de controle, fiscalização e, porque não, sanção, dos representantes e seus possíveis atos destoantes das escolhas do povo, evitando, assim a discricionariedade, é latente.


5.1 O uso do Recall como forma de Fiscalização Popular


É nesse sentido que esse estudo aponta o Recall como saída, ou quem sabe, medida, ao que parece, mais eficaz na realização do controle e fiscalização dos atos dos representantes.


Alguns países como Estados Unidos, Suíça, Venezuela e Canadá, em seu ordenamento jurídico, prevêem o instituto do Recall, como sendo aquele capaz de avaliar o mandato político conferido ao representante do povo.


O Recall se traduz no instituto capaz de avaliar o mandato político conferido, passado dois anos do exercício deste mandato (tempo este que se demonstra razoável para que um representante demonstre que vem trabalhando para atender os anseios sociais), daqueles representantes que se mostram descuidados com os poderes recebidos.


A finalidade do Recall é a de cassar, revogar, o mandato daqueles políticos considerados inoperantes, incompetentes, corruptos, que destoam, fundamentadamente, dos objetivos do seu mandato (qual seja, representar a sociedade dando-lhes respostas eficazes e rápidas aos problemas por ela apresentados), sem que seja necessário movimentar o aparato judicial.


Por certo, como demonstrado, atualmente, somente o Poder Judiciário tem condão de julgar qualquer representante, quando do cometimento de faltas graves no exercício de sua função, sendo estas faltas graves entendidas como qualquer daquelas hipóteses em que o representante deixar de dar o devido atendimento à sociedade outorgante.


Neste passo, faz-se imperioso, a existência de um instrumento político capaz de sancionar, corrigir, os desvirtuamentos dos Representantes. Por certo, o Poder Judiciário, como guardião da Constituição, deverá cumprir o seu papel social, dando efetividade e aplicabilidade dos comandos constitucionais, dizendo o direito no caso concreto. Entretanto, a soberania popular, a vontade de povo, como vontade suprema, deve ser atendida e sempre verificada num determinado contexto. Assim, sendo os Representantes escolhidos por meio político de demonstração de vontade do povo, é também por este meio, o político, que eles devem ser responsabilizados.


O Recall, no particular, mostra-se uma resposta rápida e eficaz à sociedade que, fundamentadamente, insatisfeita como determinado representante, seja pela sua inoperância, seja pela sua incompetência, seja pela comprovação do envolvimento em corrupção, poderá revogar o seu mandato, dando a oportunidade para que outro (Suplente) possa desempenhar a referida função.


O Instituto Recall Brasil, em artigo intitulado “O que é Recall?”, explica como tal instrumento é verificado a aplicado num caso concreto.


Como o Brasil é um país grande, é fundamental também que seja incluído na reforma eleitoral, a divisão do país em DISTRITOS, para facilitar a FISCALIZAÇÃO e o povo ter mais velocidade para usar o RECALL para cassar os corruptos. […]


8) Essa divisão por DISTRITOS será simples, pois já existe, é na verdade um processo normal de organização governamental, já utilizado pelos Batalhões da Polícia Militar em todo o país. Será necessário que prefeituras, Governos Federal e dos Estados padronizem esta organização. […]


9) Cada país tem uma maneira própria de acionar a ação do RECALL. Em alguns países, a sociedade se utiliza do referendo ou de plebiscito para remover o governante indesejável. Em outros países que possui legislação DISTRITAL, e neste caso, os DISTRITOS se reúnem uma vez por ano e, se nessa reunião, houver mais de 50% do número de eleitores do DISTRITO, eles poderão cassar, os seus parlamentares que traíram compromissos com a comunidade. No Brasil, além de outras opções que poderão ser escolhidas pela sociedade, podemos determinar que o eleitor de posse de um fato delituoso, munido de provas, possa encaminhar ao Tribunal Eleitoral, o pedido de cassação do referido político.” (RECALL BRASIL, não paginado)


O que se busca aqui não é um novo pleito eleitoral. Busca-se a maior responsabilização dos representantes quando do exercício da função de responder por toda a sociedade. Com o uso do Recall, o processo do poder se inverte, na medida em que os representantes (que por hora acham que são controladores da sociedade) passam a ser controlados (como assim deve ser) pelo povo, outorgante do poder.


Ora, se é o povo que confere os poderes atinentes ao exercício do mandato representativo, somente o povo será o legitimado a revogá-los, vez que é em nome deste que os representantes agem.


Destaque-se que o Recall político está tratado na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 73, apresentada em 2005 ao Senado. Inspirada em outros modelos mundialmente testados, a exemplo de como ocorreu nos Estados Unidos, no Estado da Califórnia onde o então Governador Gray Davis foi removido do cargo pelo sistema do Recall, obtendo 55,4% (cinqüenta e cinco vírgula quatro por cento) dos eleitores votando em “SIM” a favor de sua remoção. Arnold Schwarzenegger fora eleito com 48,6% (quarenta e oito vírgula seis por cento) dos votos, substituindo Gray Davis.


Destaque-se ainda que até o presente momento a PEC n° 73 não fora votada pelos nossos Representantes.


É de fundamental importância entender que não se pode comprometer o funcionamento da Administração Pública com aqueles representantes que apenas visam se locupletar de riquezas às custas do suor do povo que, arduamente, cotidianamente, tem que arcar com altas cargas tributárias, com o baixo índice de desenvolvimento humano, com o péssimo acesso à saúde, com o despreparo dos educadores, com o risível saneamento básico, dentre outros problemas que a todo tempo somos submetidos.


O Recall é oportunidade que terá o povo de dizer um “basta”, mais rápido, aos maus representantes.


“Através do recall podemos fortalecer o controle social dos mandatos e cassar o político que não vêm cumprindo com suas obrigações antes que estes cheguem ao final do mandato. Com a inclusão do recall na legislação eleitoral os políticos são forçados a pensar “duas vezes” – exigir que pense “mil vezes” seria querer de mais – antes de cometer improbidade administrativa. Duvido que a maioria destes chegue ao final do mandato caso o recall passe a vigorar no Brasil! (A VOZ DO CIDADÃO, 2008, não paginado)” (grifo nosso)


Finalmente, faz-se imperioso, por fim ao corporativismo, ao abuso do poderio econômico, aos atos secretos, ao desvio de verbas públicas, aos favorecimentos.


Evitar que votações sigilosas ocorram, que violem preceitos fundamentais, que mitiguem o exercício da soberania popular, que contrariem o livre exercício da cidadania, instituindo o Recall como meio de fiscalização popular, são medidas capazes de favorecer o amadurecimento democrático da República Federativa do Brasil.


CONCLUSÃO


Por fim, apreendeu-se do presente estudo que o Estado de Direito é uma instituição que se desenvolve a partir da observância dos ditames legais, onde as leis são criadas pelo ente, por intermédio de seus representantes e delas devem ser obedecedoras.


Entendeu-se também que a Democracia traduz-se pela acessibilidade que o povo e os governantes têm de participar do processo de formação da vontade estatal, direta ou indiretamente, dando origem a uma forma de governo onde o poder de decisão dos rumos estatais é exercido pelo povo e por seus representantes.


Em igual sentido, restou-se apresentado que a formação da vontade estatal desenvolve-se paralelamente à instituição de freios e limitações ao exercício de garantias sociais, não se afastando, entretanto, do respeito às garantias individuais, tudo em atenção à soberania popular.


Restou demonstrado, ainda, que toda e qualquer forma que vise a maior participação popular, que busque a similitude entre os propósitos dos poderes outorgados e anseios sociais, findam num Estado, ao menos, harmônico, que caminha paralelo às aspirações sociais, dando-lhes respostas rápidas e eficazes, solidificando o ideal do “ser cidadão”.


É nesse sentido que o Regimento Comum do Congresso Nacional Brasileiro, instituído pela Resolução nº 1 de 1970 do Congresso Nacional, anterior à Constituição Federal de 1988, que traz em seus dispositivos as regras que regulamentarão as ações do Congresso Nacional Brasileiro, especificamente o seu artigo 47, mitiga e viola preceitos fundamentais de um Estado Democrático de Direito, maculando o exercício da cidadania e da soberania popular.


Ora, não é outro o entendimento que se pode abstrair desta previsão, uma vez que, levando em consideração os preceitos do Estado Democrático de Direito, onde os representantes devem agir em conformidade com os poderes outorgados por seus eleitores, tem o dever de dar justificativas, explicações e esclarecimentos, quanto às medidas e posicionamentos adotados.


É cristalino o entendimento de que essa premissa democrática de controle popular dos atos dos representantes, constitucionalmente abalizada, não só pelo preâmbulo da Carta Constitucional, como também em seus vários dispositivos, destacando aqui a importância dada ao princípio da publicidade dos atos públicos, deverá ser, a todo instante, protegida de qualquer controvérsia ou violação.


A previsão da votação secreta dos representantes, insculpida no artigo 47 do Regimento Comum Interno do Congresso Nacional brasileiro, difere-se da previsão inscrita no artigo 14 da Constituição Federal, isso porque, este primeiro refere-se a pessoa ocupante de cargo público, sujeito, por conseqüência lógica, ao princípio da publicidade de seus atos, bem como sujeito à fiscalização e ao controle popular, uma vez que este recebe, quando eleito, poderes para agir em nome de uma coletividade, devendo, por conseguinte, justificar-se sobre seus atos, decisões e medida adotados.


No tocante ao artigo 14 da Constituição Federal tem-se que este trata da preservação à soberania popular, que, certamente, seria mitigada, se não fosse abarcada pela exigência de ser praticada no sufrágio secreto.


Assim, ante a falta de mecanismos eficazes de controle popular dos atos dos representantes, posto que atualmente as medidas de responsabilização destes estão atreladas à provocação e o uso do aparato judiciário, defende-se o uso do Recall político como mecanismo eficaz de responsabilização ou mesmo de fiscalização dos atos dos nossos representantes.


O Recall se traduz no instituto capaz de decidir sobre medidas punitivas àqueles políticos considerados inoperantes, incompetentes, corruptos, que destoam, fundamentadamente, dos objetivos do seu mandato, qual seja representar a sociedade dando-lhes respostas eficazes e rápidas aos problemas por ela apresentados, sem que seja necessário movimentar o aparato judicial.


Não pairam dúvidas que o Recall mostra-se uma resposta rápida e eficaz à sociedade que, fundamentadamente, insatisfeita como determinado representante, seja pela sua inoperância, seja pela sua incompetência, seja pela comprovação do envolvimento em corrupção, poderá revogar o seu mandato, dando a oportunidade para que outro possa desempenhar a referida função.


A mobilização social foi, é, e sempre será o meio mais eficaz de punibilidade àqueles que não agem de acordo com os preceitos basilares da democracia representativa.


 


Referências

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Notas:

[1] Monografia apresentada ao Instituto de Educação Superior UNYAHNA de Salvador – IESUS como requisito final para obtenção do titulo de Bacharel em Direito. Professor-Orientador: MS Maurício Souza Sampaio.


Informações Sobre o Autor

Elvis Gibson Leite Coutinho

Bacharel em Direito pelo IESUS, pós-graduando em Direito Eleitoral com habilitação para o Magistério Superior pela FUNDACEM


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