Resumo: Busca-se nesse trabalho examinar os efeitos da coisa julgada penal absolutória, analisando tais efeitos de maneira esquemática.
Palavras Chave: Direito Processual Penal. Coisa Julgada. Sentença Absolutória. Coisa Julgada Absolutória. Efeitos da Coisa Penal Absolutória.
Coisa julgada é a qualidade da decisão que não mais pode ser modificada, integrada ou aclarada por novas vias recursais. A coisa julgada é, pois, uma característica de força da sentença, neste sentido, o ordenamento produz regras para preservar a coisa julgada em nome da segurança jurídica.
Pacelli, com acuidade, define da seguinte forma a coisa julgada: “a coisa julgada, sabe-se, não é um efeito, mas uma qualidade da decisão judicial da qual não caiba mais recurso. É a imutabilidade da sentença, de modo a impedir a reabertura de novas indagações acerca da matéria nela contida” (OLIVEIRA, 2008, p. 522). Entrementes, em clara expressão de metonímia, possuindo a sentença a característica da coisa julgada, passa-se a chamá-la por este último nome.
A coisa julgada pode ser formal ou material. É formal quando impossibilita a rediscussão de uma matéria unicamente em relação ao procedimento em que foi proferida, por exemplo, decisão que inadmita o assistente, por força do art. 273 do Código de Processo Penal. Neste sentido, os auspícios de Pacelli (OLIVEIRA, 2008, p. 523):
“Há, com efeito, decisões judiciais que, quando passadas em julgado, impedem rediscussão da matéria unicamente em relação ao contexto em que foi proferida e especificamente no processo em cujo curso foi prolatada. Fala-se, então, em coisa julgada formal”.
É material quando não se pode mais avaliar aquilo que foi objeto da sentença em qualquer outro processo. Abarca, pois, a proteção da coisa julgada material à sentença em relação a qualquer juízo, enquanto a formal se dirige ao processo específico em que foi prolatada. Não é outra a lição de Pacelli (OLIVEIRA, 2008, p. 524):
“[…] nenhum outro órgão do Judiciário poderá rever aquela decisão, se já passada em julgado, diante da impossibilidade de se proceder a qualquer alteração na nova ação penal, no que diz respeito ao fato narrado.
Trata-se, portanto, de coisa julgada tipicamente material, de modo a impedir a reapreciação da matéria em todo e qualquer processo, presente ou futuro.”
Dirige-se o artigo, destarte, a avaliar a amplitude dos efeitos da coisa julgada material, ao invés de fazê-lo em relação à sentença sem tal característica, haja vista que aquela é que estabelece, efetivamente, a solução que o Judiciário deu ao conflito objeto de sua apreciação.
Cumpre, ainda, antes de adentrar no precípuo escopo deste tópico, estabelecer que, para fins deste trabalho, urge não tratar das diversas definições do que seria sentença e de suas classificações, haja vista que apenas será estudada a sentença que resolve o mérito da causa, ou seja, aquela decisão emitida pelo juiz que exaure a cognição do caso concreto pondo fim ao procedimento. Trata-se da chamada decisão definitiva stricto sensu na lição de Tourinho Filho, que em sua obra aduz (TOURINHO FILHO, 2001, p. 553): “as definitivas stricto sensu, propriamente denominadas sentenças, são as que resolvem o mérito da causa, são as que solucionam a lide”. Por derradeiro, ainda no que concerne a sentença, a temática deste artigo cinge-se a aquela absolutória.
A sentença penal deverá ser de absolvição caso o juiz constate no caso concreto qualquer das circunstâncias previstas no art. 386 do Código de Processo Penal que positiva o seguinte:
“Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
I – estar provada a inexistência do fato;
II – não haver prova da existência do fato;
III – não constituir o fato infração penal;
IV – não existir prova de ter o réu concorrido para infração penal;
V – existir circunstância que exclua o crime ou isente o réu de pena.”
Infere-se, da leitura do artigo que deve ser absolvido o réu se provada a inexistência do fato, se não houver prova da existência do fato, se o fato não constituir infração penal, as três regras congruentes com a noção de que o direito penal é do fato e não do autor, nesta esteira, só se pune por infrações penais previamente previstas e não por características do agente ou fato imorais (QUEIROZ, 2009, passim). Outrossim, deve ser absolvido o réu, em homenagem ao princípio da presunção de inocência, se não existir prova de ter ele concorrido para a infração penal, ou se existir algumas das circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena.
Devem ser ainda observadas as hipóteses de absolvição sumárias, conforme previstas no art. 397 do Código de Processo Penal:
“Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
IV – extinta a punibilidade do agente. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008)”.
Com efeito, antes mesmo da instrução, com a produção de provas, o juiz, identificando causa excludente de ilicitude ou de culpabilidade; a extinção da punibilidade ou que o fato, a toda evidência, não constitui crime, deve absolver sumariamente o réu.
Assentado o acima exposto, urge que se parta para os efeitos da Coisa Julgada Absolutória Penal. Sobre o tema o legislador dispõe algumas regras.
Ab initio, há de ser tratado o art. 386, parágrafo único, do Código de Ritos Penais que dispõe o seguinte: “Na sentença absolutória, o juiz: I – mandará, se for o caso, pôr o réu em liberdade; II – ordenará a cessação das medidas cautelares provisoriamente aplicadas; III – aplicará medida de segurança, se cabível”. Fácil é concluir, pela leitura do artigo, alguns dos efeitos da sentença absolutória, sobre os quais, não pousam maiores discussões. Absolvido o réu, deve ser ele posto em liberdade, caso esteja preso, cessadas demais medidas provisórias, por último, se tiver sido o réu absolvido por não ser culpável, haja vista ser inimputável, aplicada a medida de segurança.
Absolvido o réu e configurando-se a coisa julgada, cumpre ressaltar, não pode ser o decisum objeto de revisão criminal, ou seja, não pode o autor da ação penal pleitear que se rescinda a decisão absolutória, pugnando por uma nova que reavalie a demanda que fora proposta. É a ilação que se pode retirar do quanto inscrito no art. 621 do Código de Processo Penal[1].
Possui, por fim, outros efeitos a sentença penal absolutória, dispostos no ordenamento jurídico, e a compreensão destes é que se faz mais importante para as conclusões deste estudo. O Código de Processo Penal, nos arts. 65, 66 e 67, estabelece o seguinte:
“Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.
Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:
I – o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;
II – a decisão que julgar extinta a punibilidade;”
Ademais, positiva o legislador, no Código Civil, a seguinte regra, contida no art. 935: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”.
Corolário é dos artigos retro mencionados que é efeito da coisa julgada penal absolutória obstar à vítima a possibilidade de propositura de ação no juízo cível visando à reparação de dano em determinadas situações, pois que formada a coisa julgada nestes casos, não mais se pode considerar novas discussões sobre o objeto da sentença exarada pelo juiz.
Não mais poderá ser proposta no juízo cível demanda que colime reparação por um delito se, absolvido o réu, foi reconhecida na sentença absolutória uma das justificantes legais elencadas no art. 21 do Código Penal, a saber, legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito, consoante art. 65 do Código de Processo Penal, se nela indicou-se, categoricamente, a inexistência do fato (incidência dos arts. 935 do Código Civil e 66 do Código de Processo Penal), ou seja, houve prova no curso da instrução de que o crime não ocorreu, por exemplo, se em um caso de homicídio, a suposta vítima reaparece, há prova categórica de inexistência do crime, ou se impõe ela não ter sido o réu o autor do delito, seja por inexistência de provas ou por ter sido demonstrado no curso do processo que não foi ele o autor do delito (art. 935 do Código Civil).
Por outro lado, pode ser discutida a reparação no juízo cível, caso a inexistência material do fato não tenha sido refutada categoricamente, ou se a sentença absolutória teve fulcro em atipicidade da conduta do agente, ou seja, se aduziu não ter ser o ato perpetrado pelo agente ação típica.
Mestrando em Direito pela Universidade Federal da Bahia Especialista em Ciências Criminais pelo Juspodivm-IELF Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia Professor da Pós-graduação em Ciências Criminais da Faculdade Baiana de Direito Professor de Direito Penal da Faculdade Baiana de Direito Professor de Direito Penal e Processo Penal da Faculdade Salvador-FACSAL Coordenador Adjunto da Pós-graduação em Ciências Criminais da Faculdade Baiana de Direito Coordenador Adjunto da Pós-graduação em Ciências Criminais do Ciclo
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