Resumo: O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 363.852/MG, em 03/02/2010, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei nº 8.212/91, com redação atualizada até a Lei nº 9.528/97. O presente trabalho busca analisar as questões exsurgidas do referido julgado: se a decisão alcança apenas as partes envolvidas naquele recurso; se os fundamentos utilizados pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal se estendem ao empregador rural pessoa juridical; se as ações judiciais que impugnem a constitucionalidade contribuições sociais previdenciárias substitutivas dos tributos previstas no art. 22, I e II, da Lei nº 8.212/91 ensejam a incidência das contribuições substituídas; se é possível a repetição ou a compensação dos valores recolhidos a título de contribuições substitutivas da parte patronal.
Sumário: 1. Introdução 2. Contribuições sociais previdenciárias devidas por empresas e equiparados, incidentes sobre as remunerações dos empregados e avulsos 2.1. Contribuição básica para custeio do Regime Geral de Previdência Social – RGPS 2.2. Contribuição para o financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho (GILRAT) 3. Regimes de contribuições sociais previdenciárias substitutivas da parte patronal 3.1.Produtor rural pessoa física 3.2. Produtor rural pessoa jurídica 3.3. Agroindústria 4. O RE 363.852/MG 5. Efeitos do RE 363.852/MG 6. Conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O Plenário do Egrégio Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 363.852/MG, relatado pelo Ministro Marco Aurélio, em 03/02/2010, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei nº 8.212/91, com redação atualizada até a Lei nº 9.528/97.
O aludido julgamento originou questões a respeito de se a decisão alcança apenas as partes envolvidas naquele recurso; se os fundamentos utilizados pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal se estendem ao empregador rural pessoa jurídica; se as ações judiciais que impugnem a constitucionalidade contribuições sociais previdenciárias substitutivas dos tributos previstas no art. 22, I e II, da Lei nº 8.212/91 ensejam a incidência das contribuições substituídas; se é possível a repetição ou a compensação dos valores recolhidos a título de contribuições substitutivas da parte patronal.
Tais questões têm sido submetidas à apreciação do Poder Judiciário, não tendo os tribunais um entendimento uniforme sobre alguns pontos.
O presente trabalho tem o modesto intuito de promover a discussão do assunto. Para tanto, analisa as contribuições sociais previdenciárias devidas por empresas e equiparados, incidentes sobre as remunerações dos empregados e avulsos; descreve os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 363.852/MG e discorre sobre os efeitos deste e as questões em liça, à luz, inclusive, da jurisprudência dos tribunais pátrios.
2. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS DEVIDAS POR EMPRESAS E EQUIPARADOS, INCIDENTES SOBRE AS REMUNERAÇÕES DOS EMPREGADOS E AVULSOS
As contribuições em liça se enquadram entre as previstas no art. 195, I, “a” da Constituição Federal:
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)”
Vejamos-las:
2.1. Contribuição básica para custeio do Regime Geral de Previdência Social – RGPS
Conforme inciso I do art. 22 da Lei 8.212/91, as empresas e equiparados devem contribuir com 20% (vinte por cento) sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou de acordo coletivo de trabalho ou de sentença normativa.
2.2. Contribuição para o financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho (GILRAT)
Nos termos do inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, a contribuição social previdenciária a cargo da empresas e equiparados, para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 (aposentadoria especial), e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, incidentes sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhes prestam serviços, é de:
a) 1% (um por cento), para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento), para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado médio;
c) 3% (três por cento), para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado grave.
O enquadramento nos correspondentes graus de risco é de responsabilidade da empresa, devendo ser feito mensalmente, de acordo com a sua atividade econômica preponderante, conforme a Relação de Atividades Preponderantes e Correspondentes Graus de Risco, elaborada com base na Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, prevista no Anexo V do Regulamento da Previdência Social – RPS, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99.
O Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência (EREsp 476885-SC, ERESP 478100-RS, AGRG no AG 602120-SP, RESP 684971-MG e EDCL no RESP 381621-PR) no sentido de que a alíquota da contribuição ora em comento deve corresponder ao grau de risco da atividade desenvolvida em cada estabelecimento da empresa, individualizado pelo seu CNPJ (antigo CGC), culminando na edição da Súmula nº 351, in verbis:
“A alíquota de contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) é aferida pelo grau de risco desenvolvido em cada empresa, individualizada pelo seu CNPJ, ou pelo grau de risco da atividade preponderante quando houver apenas um registro.” (Súmula 351, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/06/2008, DJe 19/06/2008)
O art. 10 da Lei nº 10.666/03 passou a estabelecer que a alíquota de contribuição de um, dois ou três por cento, destinada ao financiamento do benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, poderá ser reduzida, em até cinquenta por cento, ou aumentada, em até cem por cento, conforme dispuser o regulamento, em razão do desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado em conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de frequência, gravidade e custo, calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social.
O Decreto nº 6.042/2007 regulamentou a sobredita alteração de alíquotas, acrescentando o art. 202-A ao RPS e instituindo o Fator Acidentário de Prevenção – FAP, que consiste num multiplicador variável num intervalo contínuo de cinco décimos (0,5000) a dois inteiros (2,0000), aplicado com quatro casas decimais, considerado o critério de arredondamento na quarta casa decimal, a ser aplicado à respectiva alíquota, com a finalidade de reduzi-la em até cinquenta por cento ou aumentá-la em até cem por cento.
Segundo o novel dispositivo, para o cálculo anual do FAP, serão utilizados os dados de janeiro a dezembro de cada ano, até completar o período de dois anos, a partir do qual os dados do ano inicial serão substituídos pelos novos dados anuais incorporados; para a empresa constituída após janeiro de 2007, o FAP deve ser calculado a partir de 1º de janeiro do ano ano seguinte ao que completar dois anos de constituição; excepcionalmente, no primeiro processamento do FAP devem ser utilizados os dados de abril de 2007 a dezembro de 2008.
Cumpre observar que o FAP de cada empresa deve ser disponibilizado anualmente, desde janeiro de 2010, pelo Ministério da Previdência Social em Diário Oficial da União e na Internet, com as informações que lhe possibilitem verificar a correção dos dados utilizados na apuração do seu desempenho.
Gize-se, ainda, que, consoante dispõe o § 6º da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.732/98), para financiamento da aposentadoria especial, as alíquotas de que trata o inciso II do art. 22 da Lei nº 8.212/91 serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente.
3. REGIMES DE CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS SUBSTITUTIVAS DA PARTE PATRONAL
O estudo dos regimes em epígrafe tem o objetivo de mostrar as situações nas quais ocorre a substituição das contribuições a cargo das empresas e equiparados previstas no art. 22, I e II, da Lei nº 8.212/91 pela correspondente a um dos regimes em apreço, doravante estudados.
São beneficiários desses regimes especiais a associação desportiva que mantem equipe de futebol profissional, a empresa optante pelo SIMPLES/Simples Nacional, produtores rurais pessoa física e jurídica, bem como a agroindústria.
Contudo, para o atingimento dos objetivos do presente trabalho, é necessário tão somente o estudo das contribuições substitutivas devidas pelos produtores rurais pessoa física e jurídica, mais a da agroindústria.
3.1.Produtor rural pessoa física (art. 25 da Lei nº 8.212/91)
3.2.Produtor rural pessoa jurídica (art. 25 da Lei nº 8.870/94)
3.3.Agroindústria (art. 22-A da Lei nº 8.212/91)
3.1.Produtor rural pessoa física
Dispõe a Instrução Normativa RFB nº 971, de 13 de novembro de 2009 (DOU de 17.11.2009):
“Art. 165. Considera-se:
I – produtor rural, a pessoa física ou jurídica, proprietária ou não, que desenvolve, em área urbana ou rural, a atividade agropecuária, pesqueira ou silvicultural, bem como a extração de produtos primários, vegetais ou animais, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos, sendo:
a) produtor rural pessoa física:
1. o segurado especial que, na condição de proprietário, parceiro, meeiro, comodatário ou arrendatário, pescador artesanal ou a ele assemelhado, exerce a atividade individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 16 (dezesseis) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem comprovadamente com o grupo familiar, conforme definido no art. 10;
2. a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;”
O art. 25 da Lei nº 8.212/91 prescreve que a contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 do mesmo diploma legal, destinada à Seguridade Social, é de:
I – 2% (dois por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
II – 0,1% (um décimo por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho.
Não obstante, o produtor rural pessoa física (FPAS 604) ainda está sujeito ao recolhimento, sobre a folha de pagamento de empregados e avulsos, de 2,5% (dois e meio por cento) para o FNDE (salário-educação) e 0,2% (dois décimos por cento) para o INCRA. Deve, ainda, contribuir com 0,2% (dois décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para o SENAR – Serviço Nacional de Aprendizagem Rural.
Equipara-se ao empregador rural pessoa física o consórcio simplificado de produtores rurais, assim considerada a união de produtores rurais pessoas físicas que, mediante documento registrado em cartório de títulos e documentos, outorga a um deles poderes para contratar, gerir e demitir trabalhador para a exclusiva prestação de serviços aos integrantes desse consórcio, observado que a formalização do consórcio ocorre por meio de documento registrado em cartório de títulos e documentos, que deverá conter a identificação de cada produtor rural pessoa física, seu endereço pessoal e o de sua propriedade rural, bem como o respectivo registro no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA (ou informações relativas à parceria, à meação, ao comodato ou ao arrendamento e a matrícula de cada um dos produtores rurais no Cadastro Específico do INSS — CEI.
O produtor rural pessoa física está obrigado a descontar e a recolher as contribuições de empregados e demais segurados a seu serviço, incidentes sobre seu salário-de-contribuição.
3.2. Produtor rural pessoa jurídica
Reza a Instrução Normativa RFB nº 971/2009:
“Art. 165. Considera-se:
I – (omissis)
a) (omissis)
b) produtor rural pessoa jurídica:
1. o empregador rural que, constituído sob a forma de firma individual ou de empresário individual, assim considerado pelo art. 931 da Lei nº 10.406, de 2002 (Código Civil), ou sociedade empresária, tem como fim apenas a atividade de produção rural, observado o disposto no inciso III do § 2º do art. 175;
2. a agroindústria que desenvolve as atividades de produção rural e de industrialização da produção rural própria ou da produção rural própria e da adquirida de terceiros, observado o disposto no inciso IV do § 2º do art. 175 e no § 3º deste artigo;”
Nos termos do art. 25 da Lei nº 8.870/94, a contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, em substituição às contribuições sociais incidentes sobre a folha de pagamento dos segurados empregados e trabalhadores avulsos, previstas nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, é de:
I – 2,5% (dois e meio por cento) da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção;
II – 0,1% (um décimo por cento) da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento da complementação das prestações por acidente de trabalho.
O § 2º do referido art. 25 estendeu a referida contribuição substitutiva às pessoas jurídicas que se dedicassem à produção agroindustrial, quanto à folha de salários de sua parte agrícola, mediante o pagamento da contribuição prevista neste artigo, a ser calculada sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado seu preço de mercado. O referido parágrafo foi declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 1.103-DF, nos termos da ementa abaixo colacionada:
“EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTRIBUIÇÃO DEVIDA À SEGURIDADE SOCIAL POR EMPREGADOR, PESSOA JURÍDICA, QUE SE DEDICA À PRODUÇÃO AGRO-INDUSTRIAL (§ 2º DO ART. 25 DA LEI Nº 8.870, DE 15.04.94, QUE ALTEROU O ART. 22 DA LEI Nº 8.212, DE 24.07.91): CRIAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO QUANTO À PARTE AGRÍCOLA DA EMPRESA, TENDO POR BASE DE CÁLCULO O VALOR ESTIMADO DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA PRÓPRIA, CONSIDERADO O SEU PREÇO DE MERCADO. DUPLA INCONSTITUCIONALIDADE (CF, art. 195, I E SEU § 4º) PRELIMINAR: PERTINÊNCIA TEMÁTICA. 1. Preliminar: ação direta conhecida em parte, quanto ao § 2º do art. 25 da Lei nº 8.870/94; não conhecida quanto ao caput do mesmo artigo, por falta de pertinência temática entre os objetivos da requerente e a matéria impugnada. 2. Mérito. O art. 195, I, da Constituição prevê a cobrança de contribuição social dos empregadores, incidentes sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; desta forma, quando o § 2º do art. 25 da Lei nº 8.870/94 cria contribuição social sobre o valor estimado da produção agrícola própria, considerado o seu preço de mercado, é ele inconstitucional porque usa uma base de cálculo não prevista na Lei Maior. 3. O § 4º do art. 195 da Constituição prevê que a lei complementar pode instituir outras fontes de receita para a seguridade social; desta forma, quando a Lei nº 8.870/94 serve-se de outras fontes, criando contribuição nova, além das expressamente previstas, é ela inconstitucional, porque é lei ordinária, insuscetível de veicular tal matéria. 4. Ação direta julgada procedente, por maioria, para declarar a inconstitucionalidade do § 2º da Lei nº 88.870/94.” (ADI 1103, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/1996, DJ 25-04-1997 PP-15197 EMENT VOL-01866-02 PP-00270)
Não se aplica a substituição em apreço, nos termos do art. 175, § 2º, III da IN RFB nº 971/2009, quando o produtor rural pessoa jurídica, além da atividade rural:
a) prestar serviços a terceiros em condições que não caracterize atividade econômica autônoma (aquela exercida mediante estrutura operacional definida, em estabelecimento específico ou não, com a utilização de mão-de-obra distinta daquela utilizada na atividade de produção rural), exclusivamente em relação à remuneração dos segurados envolvidos na prestação dos serviços, excluída a receita proveniente destas operações da base de cálculo das contribuições sociais incidentes sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural, industrializada ou não;
b) exercer outra atividade econômica autônoma, seja comercial, industrial ou de serviços, em relação à remuneração de todos os empregados e trabalhadores avulsos.
No que pertine a tal substituição relativamente à empresa que se dedique ao florestamento e reflorestamento como fonte de matéria prima para industrialização própria, a precitada IN, no § 5º do art. 175 estabelece os seguintes procedimentos:
“§ 5º Em relação à empresa que se dedique ao florestamento e reflorestamento como fonte de matéria-prima para industrialização própria, serão observados os seguintes procedimentos:
I – caberá a substituição prevista no caput, quando:
a) a atividade rural da empresa for exclusivamente de florestamento e reflorestamento e seja utilizado processo industrial que não modifique a natureza química da madeira nem a transforme em pasta celulósica;
b) o processo industrial utilizado implicar modificação da natureza química da madeira ou sua transformação em pasta celulósica e desde que concomitantemente com essa situação, a empresa:
1. comercialize resíduos vegetais, sobras ou partes da produção cuja receita bruta decorrente da comercialização desses produtos represente mais de 1% (um por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção;
2. explore outra atividade rural;
II – não caberá a substituição prevista no caput quando:
a) relativamente à atividade rural, a empresa se dedica apenas ao florestamento e reflorestamento como fonte de matéria-prima para industrialização própria e utiliza processo industrial que modifique a natureza química da madeira ou a transforme em pasta celulósica; e
b) na hipótese de efetuar venda de resíduos vegetais, sobras ou partes da produção rural, a receita bruta dela decorrente represente menos de 1% (um por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção.”
O produtor rural pessoa jurídica (FPAS 604) está, ainda, está sujeito ao recolhimento, sobre a folha de pagamento de empregados e avulsos, de dois e meio por cento para o FNDE (salário-educação) e dois décimos por cento para o INCRA. Deve, ainda, contribuir com dois décimos e meio por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para o SENAR.
Ademais, o produtor rural pessoa jurídica está obrigado a descontar e a recolher as contribuições de empregados e demais segurados a seu serviço, incidentes sobre seu salário-de-contribuição.
3.3. Agroindústria
Agroindústria é o produtor rural pessoa jurídica que desenvolve as atividades de produção rural e de industrialização da produção rural própria ou da produção rural própria e da adquirida de terceiros.
Nos termos do art. 22-A da Lei nº 8.212/91, a contribuição devida à seguridade social pela agroindústria, em substituição às contribuições sociais incidentes sobre a folha de pagamento dos segurados empregados e trabalhadores avulsos, previstas nos incisos I e II do art. 22 da mesma lei, é de:
I – 2,5% (dois e meio por cento) da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção;
II – 0,1% (um décimo por cento) da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade para o trabalho decorrente dos riscos ambientais da atividade.
Não se aplica tal substituição, sendo devidas as contribuições previstas nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212/91:
– às agroindústrias de piscicultura, de carcinicultura, de suinocultura e de avicultura, bem como às sociedades cooperativas, exceto quando os cooperados filiados a cooperativa de produtores rurais se utilizarem dos serviços de segurados empregados por ela contratados para realizarem, exclusivamente, a colheita da produção de seus cooperados (§ 4º do art. 22-A da Lei nº 8.212/91, c/c art. 175, § 2º, I da IN RFB nº 971/2009);
– às indústrias que, embora desenvolvam as atividades relacionadas no art. 2º do Decreto-Lei nº 1.146/70 não se enquadram como agroindústrias nos termos do art. 22-A da Lei nº 8.212/91, por não possuírem produção própria (art. 175, § 2º, II da IN RFB nº 971/2009);
– à pessoa jurídica que, relativamente à atividade rural, se dedique apenas ao florestamento e reflorestamento como fonte de matéria-prima para industrialização própria mediante a utilização de processo industrial que modifique a natureza química da madeira ou a transforme em pasta celulósica (§ 6º do art. 22-A da Lei nº 8.212/91);
– em relação à remuneração dos segurados envolvidos na prestação de serviços a terceiros pela agroindústria, independentemente de ficar a mesma caracterizada como atividade econômica autônoma, sendo, neste caso, excluída a receita proveniente destas operações da base de cálculo da contribuição sobre a receita bruta (art. 175, § 2º, IV da IN RFB nº 971/2009).
A agroindústria está, ainda, sujeita ao recolhimento, sobre a folha de pagamento de empregados e avulsos, de contribuições para terceiros, cujas alíquotas variam em função do ramo de atividade. Deve, ainda, contribuir com dois décimos e meio por cento da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para o SENAR.
4. O RE 363.852/MG
Como já dito, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 363.852/MG, declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei nº 8.212/91, com redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, in verbis:
“Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
V – como equiparado a trabalhador autônomo, além dos casos previstos em legislação específica:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua; (Redação dada pela Lei n° 8.540, de 22.12.92)
b) pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade de extração mineral — garimpo —, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos, com ou sem o auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).
c) o ministro de confissão religiosa e o membro de instituto de vida consagrada e de congregação ou de ordem religiosa, este quando por ela mantido, salvo se filiado obrigatoriamente à Previdência Social em razão de outra atividade, ou a outro sistema previdenciário, militar ou civil, ainda que na condição de inativo; (Redação dada pela Lei n° 8.540, de 22.12.92)
d) o empregado de organismo oficial internacional ou estrangeiro em funcionamento no Brasil, salvo quando coberto por sistema próprio de previdência social; (Redação dada pela Lei n° 8.540, de 22.12.92)
e) o brasileiro civil que trabalha no exterior para organismo oficial internacional do qual o Brasil é membro efetivo, ainda que lá domiciliado e contratado, salvo quando coberto por sistema de previdência social do país do domicílio; (Alínea acrescentada pela Lei n° 8.540, de 22.12.92)
VI – (omissis)
VII – como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam essas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de quatorze anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo. (Redação dada pela Lei n° 8.398, de 7.1.92).(…)
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física e do segurado especial referidos, respectivamente, na alínea “a” do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada a Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).
I – 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).
II – 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para o financiamento das prestações por acidente do trabalho. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997). (…)
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas: (Redação dada pela Lei n° 8.620, de 5.1.93)
IV – a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa ficam sub-rogadas nas obrigações da pessoa física de que trata a alínea “a” do inciso V do art. 12 e do segurado especial pelo cumprimento das obrigações do art. 25 desta Lei, independentemente de as operações de venda ou consignação terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, exceto no caso do inciso X deste artigo, na forma estabelecida em regulamento;” (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).
A inconstitucionalidade foi declarada até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98, viesse a instituir a contribuição.
O referido julgado foi assim ementado:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESSUPOSTO ESPECÍFICO – VIOLÊNCIA À CONSTITUIÇÃO – ANÁLISE – CONCLUSÃO. Porque o Supremo, na análise da violência à Constituição, adota entendimento quanto à matéria de fundo do extraordinário, a conclusão a que chega deságua, conforme sempre sustentou a melhor doutrina – José Carlos Barbosa Moreira -, em provimento ou desprovimento do recurso, sendo impróprias as nomenclaturas conhecimento e não conhecimento. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS – PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS – SUB-ROGAÇÃO – LEI Nº 8.212/91 – ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL – PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – UNICIDADE DE INCIDÊNCIA – EXCEÇÕES – COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – PRECEDENTE – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo – considerações.” (RE 363852, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2010, DJe-071 DIVULG 22-04-2010 PUBLIC 23-04-2010 EMENT VOL-02398-04 PP-00701 RET v. 13, n. 74, 2010, p. 41-69)
Tal entendimento foi confirmado pelo Pleno daquela Egrégia Corte, em sede de recurso repetitivo, quando do julgamento do RE nº 596.177/RS (DJe de 29/08/2011), cuja ementa é transcrita a seguir:
“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL PREVIDENCIÁRIA. EMPREGADOR RURAL PESSOA FÍSICA. INCIDÊNCIA SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. ART. 25 DA LEI 8.212/1991, NA REDAÇÃO DADA PELO ART. 1º DA LEI 8.540/1992. INCONSTITUCIONALIDADE. I – Ofensa ao art. 150, II, da CF em virtude da exigência de dupla contribuição caso o produtor rural seja empregador. II – Necessidade de lei complementar para a instituição de nova fonte de custeio para a seguridade social. III – RE conhecido e provido para reconhecer a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 8.540/1992, aplicando-se aos casos semelhantes o disposto no art. 543-B do CPC.” (RE 596177, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2011, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-165 DIVULG 26-08-2011 PUBLIC 29-08-2011 EMENT VOL-02575-02 PP-00211)
A declaração de inconstitucionalidade teve os seguintes fundamentos, nos termos do voto do Ministro Marco Aurélio:
– O art. 195 da Carta Magna é exaustivo quanto às hipóteses ensejadoras do surgimento da obrigação de financiamento da seguridade social, e somente o texto constitucional pode excetuar a unicidade de incidência de contribuição;
– O § 8º do art. 195 da Lex Legum, no tocante ao produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, estabeleceu a contribuição para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção, por ser impossível fazê-lo valendo-se da mesma base de cálculo da contribuição prevista na alínea “a” do inciso I do mesmo preceptivo constitucional;
– Há ofensa ao princípio da isonomia tributária (art. 150, II da Constituição), porquanto existente duplicidade de contribuição, uma vez que o produtor rural que possua empregados
“estará obrigado não só ao recolhimento sobre a folha de salários, como também, levando em conta o faturamento, da Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS e da prevista – tomada a mesma base de incidência , o valor comercializado – no artigo 25 da Lei nº 8.212/91”
– É necessária a existência de lei complementar para a instituição de nova fonte de custeio para a seguridade social, uma vez que faturamento e resultado da produção não se confundem. Com efeito, por tal motivo, fez-se necessária a existência do § 8º do art. 195 da Constituição Federal e tornou-se impossível considerar-se o previsto no art. 25, I e II do texto constitucional como aumento da alíquota da contribuição prevista na Lei Complementar nº 70/91.
5. EFEITOS DO RE 363.852/MG
Como visto acima, a declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei nº 8.212/91, com redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, foi proferida pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso de constitucionalidade, ao julgar o RE nº 363.852/MG.
Por oportuno, transcreve-se abaixo nota com esclarecimentos sobre o referido julgado divulgada em http://www.senar.org.br/arrecadacao/fund_legal/NOTA_FUNRURAL_REPERCUSS%C3%83O.pdf
“Sobre o julgamento pelo STF do RE nº 363.852/MG , ocorrido em 3 de fevereiro de 2010, em que foram declaradas inconstitucionais as contribuições para a previdência rural constantes dos incisos I e II do art. 25, da Lei nº 8.212/91 (FUNRURAL), cumpre apresentar os seguintes esclarecimentos:
(a) a decisão alcança apenas as partes envolvidas naquele recurso, podendo servir de precedente para casos semelhantes que sejam submetidos ao exame do Poder Judiciário;
(b) os principais reflexos, limites e possibilidades decorrentes da decisão somente poderão ser devidamente precisados com a publicação integral de seu inteiro teor;
(c) a questão poderá, ainda, ser reexaminada pelo STF, sobretudo em face do RE nº 596.177/RS, já com repercussão geral reconhecida pelo plenário da Corte.
(d) eventuais ações judiciais que impugnem a constitucionalidade de tais contribuições previdenciárias podem ter como efeito, dependendo do caso, a retomada do regime de incidência sobre folha de salários, juntamente com sistemática de compensação com o que já foi recolhido.
(e) o juízo sobre a conveniência em propor demanda judicial sobre a questão deve, ainda, considerar os reflexos sobre a obtenção de benefícios previdenciários, visto que, de ordinário, o tempo de contribuição é elemento fundamental.
(f) a contribuição para o SENAR, embora cobrada juntamente com o FUNRURAL, não foi abrangida pela decisão do STF, permanecendo válida sua cobrança nos termos da legislação de regência.
(g) os fundamentos adotados na decisão são específicos do regime das contribuições previdenciárias, não tendo aplicação à contribuição do SENAR por se tratar de espécie tributária de natureza distinta.
Entende a CNA que tais elementos e observações merecem ser ponderados pelos produtores rurais ao examinar a oportunidade e a conveniência de ajuizar ações visando questionar tais exigências fiscais.” (grifos nossos)
Com efeito, no controle difuso, em regra, a decisão que declara a inconstitucionalidade da lei só produz efeitos entre as partes às quais é dada (inter partes), não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Tais efeitos são retroativos (ex tunc), pois atingem a lei desde a sua edição, tornando-a nula pleno jure.
Caso a declaração de inconstitucionalidade seja feita por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal, em julgamento de recurso extraordinário, além dos efeitos acima mencionados, o Senado Federal, no exercício da competência privativa estabelecida no art. 52, X da Constituição Federal, poderá suspender a execução, no todo ou em parte, da lei declarada inconstitucional.
Assim, o Senado Federal, ao suspender a execução da lei declarada inconstitucional, estará conferindo eficácia erga omnes a uma decisão cujos efeitos estavam adstritos às partes do processo, em ordem a fazer com que a lei em apreço não mais possa ser aplicada em relação àqueles que não participaram da relação processual.
Gize-se que os efeitos da decisão do Senado Federal são ex nunc.
Dispõe o Regimento Interno do Senado Federal:
“Art. 386. O Senado conhecerá da declaração, proferida em decisão definitiva pelo Supremo Tribunal Federal, de inconstitucionalidade total ou parcial de lei mediante:
I – comunicação do Presidente do Tribunal;
II – representação do Procurador-Geral da República;
III – projeto de resolução de iniciativa da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Art. 387. A comunicação, a representação e o projeto a que se refere o art. 386 deverão ser instruídos com o texto da lei cuja execução se deva suspender, do acórdão do Supremo Tribunal Federal, do parecer do Procurador-Geral da República e da versão do registro taquigráfico do julgamento.
Art. 388. Lida em plenário, a comunicação ou representação será encaminhada à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, que formulará projeto de resolução suspendendo a execução da lei, no todo ou em parte.”
No que concerne ao aspecto temporal da eficácia da decisão declaratória de inconstitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal, excepcionalmente, tem entendido que, por razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, em sede de controle difuso, poderá, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado, por aplicação analógica do art. 27 da Lei nº 9.868/99.
Após o julgamento do RE nº 363.852/MG, a Fazenda Nacional formulou pedido de modulação dos efeitos da decisão, rejeitado, contra o voto da Ministra Ellen Gracie, ao fundamento de que não estava configurada situação excepcional a ponto de justificar a modulação dos efeitos da decisão que declarou a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92.
Merece destaque a corrente que pugna pela abstrativização do controle difuso, segundo a qual, em recurso extraordinário, a decisão plenária do Supremo Tribunal Federal que declarasse a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo passaria a ter efeito erga omnes e vinculante, tal como no controle concentrado, prescindindo-se da participação do Senado Federal na suspensão da execução da norma declarada inconstitucional, num verdadeiro processo de mutação constitucional na interpretação do art. 52, X da Carta Magna.
É apodíctico que, no RE 363.852/MG, ao declarar a inconstitucionalidade do art. 25, I e II da Lei nº 8.212/91, o Pretório Excelso referiu-se apenas aos produtores rurais pessoas físicas, pelo que é devida a contribuição patronal do produtor rural pessoa jurídica, com fundamento no art. 25, da Lei nº 8.870/94. Nesse sentido:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. CONTRIBUIÇÃO. FUNRURAL. PRODUTOR RURAL PESSOA JURÍDICA. COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. LEI N. 8.213/91. EXTINÇÃO. NOVA EXAÇÃO. TRIBUTO EXIGÍVEL A PARTIR DA LEI N. 8.870/94. 1. Não se depreendendo das razões aventadas qual seria efetivamente a obscuridade, omissão ou contradição vislumbrada pelo embargante, mas o nítido propósito de rediscutir a tese jurídica adotada singularmente, a irresignação deve ser recebida como se agravo regimental fosse, por ser a sede adequada para obter o mero rejulgamento da causa. Aplicação do princípio da fungibilidade recursal. Precedentes. 2. Conforme pacificado nesta instância, a contribuição ao Funrural incidente sobre o valor comercial dos produtos rurais foi extinta a partir da vigência da Lei n. 8.213/91. Nada obstante, em seguida foi instituída outra contribuição – que não se confunde com a do Funrural -, devida pelas empresas produtoras rurais sobre o valor da comercialização de sua produção, por meio da Lei n. 8.870/94. Essa cobrança subsiste até hoje, amparada na redação conferida pela Lei n. 10.256/01. 3. “(…) para o custeio desse sistema, foi mantida, agora com destinação à Seguridade Social e não ao Prorural/Funrural, a incidência de contribuição previdenciária sobre a comercialização da produção devida pelo produtor rural segurado especial (art. 25 da Lei 8.212/91), pelo produtor rural pessoa física que se utiliza do trabalho de empregados (Lei 8.540/92) e pelas empresas rurais (art. 25 da Lei 8.870/94, com exceção do § 2º desse dispositivo, declarado inconstitucional na ADI 1.103-1/DF). Dessa forma, tem-se como exigível, do produtor/empresa rural que se utiliza do trabalho de empregados, a contribuição sobre a comercialização de sua produção rural” (AgRg no REsp 1119692/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 25/11/2009). 4. Agravo regimental não provido. (EDcl no AgRg no REsp 572252/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/04/2010, DJe 05/05/2010)
Há, entretanto, um precedente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que, não obstante reconheça a referibilidade do RE nº 363.852/MG à contribuição empregador rural pessoa física, afirma que os fundamentos utilizados pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal se estendem ao empregador rural pessoa jurídica (art. 25, incisos I e II da Lei nº 8.870/94), por sustentarem a necessidade de lei complementar para instituição de nova fonte de custeio da seguridade social, ocorrência de bitributação e ofensa ao princípio da isonomia. Senão vejamos:
“PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. FUNRURAL. PESSOA JURÍDICA. LEI 10.256/01. ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. 1. As modificações introduzidas no art. 25 da Lei nº 8.870/94, relativamente aos produtores rurais pessoa jurídica , dada a falta de correspondência com a Constituição, acabavam por criar uma nova contribuição para a Seguridade Social, a qual deveria ter sido veiculada por lei complementar. 2. O Supremo Tribunal Federal quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 1.103-DF -, Relator Ministro Néri da Silveira, DJ de 25/04/1997, declarou inconstitucional o parágrafo 2º do art. 25 da Lei nº 8.870/94. 3. Com as alterações levadas a efeito pela Emenda Constitucional nº 20/98, que introduziu no artigo 195, I, b, a expressão “faturamento ou a receita”, afastou-se a necessidade de lei complementar para regulamentar a questão, afigurando-se a Lei nº 10.256/01 como o instrumento normativo legítimo para se cobrar a exação em comento, incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da sua produção. 4. O Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento do Pleno, nos autos do Recurso Extraordinário (RE) nº 363.852/MG, reconheceu a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei n.º 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, todos da Lei n.º 8.212/91, com redação atualizada até a Lei n.º 9.528/97, que cuidavam da constitucionalidade da contribuição social incidente sobre a comercialização de produtos rurais pessoa física, denominada “Novo Funrural; até que nova legislação, arrimada na Emenda Constitucional n.º 20/98, viesse instituir a contribuição. 5. Malgrado debater a inconstitucionalidade da contribuição em relação ao empregador rural pessoa física, os argumentos utilizados pelos Ministros do STF se estendem ao empregador rural pessoa jurídica (art. 25, incisos I e II da Lei nº 8.870/94), pois sustentam a necessidade de lei complementar para instituição de nova fonte de custeio da seguridade social, ocorrência de bitributação e ofensa ao princípio da isonomia. 6. Com a Emenda Constitucional nº 20/98 adveio fundamento de validade para que legislação ordinária regulamentasse a exigência da exação, regulamentação esta vinda com a Lei nº 10.256/01. 7. Após o advento da Lei nº 10.256/01, não há possibilidade de afastar-se a exigência da contribuição previdenciária incidente sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural pelo empregador pessoa jurídica, conquanto observado o princípio da anterioridade nonagesimal. 8. Nossa Carta Magna – artigo 195, parágrafo 6º – adota o princípio da anterioridade mitigada em relação às contribuições sociais. 9. A própria Lei nº 10.256/01, em seu artigo 5º, dispôs que a produção de efeitos, quanto ao disposto no art. 22-A da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, dar-se-ia a partir do dia 1º (primeiro) do mês seguinte ao 90º (nonagésimo) dia daquela publicação (10.07.2001). 10. Entendo, assim, deva ser reformada a r. decisão combatida tão-somente em relação às contribuições previdenciárias incidentes sobre a comercialização da produção rural a partir de 1º de novembro de 2001, estando mantida a inexigibilidade no período anterior. 11. Agravo legal a que se dá parcial provimento.” (AC 200003990100817, DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRF3 – QUINTA TURMA, DJF3 CJ1 DATA:21/07/2011 PÁGINA: 474.)
Ocorre que sobreveio a Emenda Constitucional nº 20/98, ao introduzir no artigo 195, I, b, a expressão “faturamento ou a receita”, como base de cálculo das contribuições sociais previdenciárias do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, passou a servir como fundamento de validade para que legislação ordinária regulamentasse a exigência da exação, regulamentação esta vinda com a Lei nº 10.256/01 (DOU de 10/07/2001), cujo 2º deu a seguinte redação ao art. 25 da Lei nº 8.870/94:
“Art. 25. A contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, em substituição à prevista nos incisos I e II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a ser a seguinte: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 9.7.2001)
I – dois e meio por cento da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção;
II – um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento da complementação das prestações por acidente de trabalho.”
Portanto, a edição da Lei nº 10.256/01 sepultou a cizânia jurisprudencial sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal no RE nº 363.852/MG alcançar também o produtor rural pessoa jurídica, consoante ilustra a ementa colacionada abaixo:
“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. NÃO CARACTERIZADA AS HIPÓTESES LEGAIS (ARTS. 535 USQUE 538 DO CPC). INEXISTÊNCIA NO ACÓRDÃO ATACADO DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE. 1. É incabível, em sede de embargos de declaração, a busca por novo julgamento da matéria já expressamente decidida no acórdão combatido. 2. Não estão caracterizadas nenhuma das hipóteses legais previstas para interposição de embargos declaratórios (CPC, arts. 535 usque 538), descabendo, assim, a utilização de dito recurso para modificação do acórdão regional. 3. Foi expressamente decidido que o STF no RE 363852, ao declarar a inconstitucionalidade do art. 25, I e II da Lei nº 8.212/91, referiu-se apenas aos produtores rurais pessoas físicas. Dessa forma, é devida a contribuição patronal do produtor rural, pessoa jurídica, com fundamento no art. 25, da Lei nº 8.870/94, mormente com a redação da Lei nº10.256/2001 (STJ – EDcl-AgRg-REsp 572.252 – (2003/0114032-0) – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 05.05.2010 – p. 1091) 4. Ausência de ofensa a cláusula de reserva de plenário, pois em 25.06.2008, o Pleno do Eg. TRF da 5ª Região, na Arguição de Inconstitucionalidade na Apelação Cível nº. 419228/PB, sob a Relatoria do Des. Marcelo Navarro declararou a inconstitucionalidade da segunda parte do art. 4º da lc nº 118/2005. 5. No que pertine a análise da incidência ou não da contribuição previdenciária sobre o adicional de férias, férias indenizadas, horas extras e quinze primeiros dias de auxílio-doença e acidente, o acórdão embargado analisou a questão em sua plenitude, inexistindo omissão a ser sanada. 6. Os embargos de declaração não se prestam à pretensão de novo julgamento da causa, nem são cabíveis para fins de prequestionamento, na ausência de omissão, obscuridade ou contradição. 7. Embargos Declaratórios do particular e da União não providos.” (EDAC 0008092682010405830002, Desembargador Federal Manuel Maia, TRF5 – Segunda Turma, DJE – Data::31/03/2011 – Página::244.)
No que pertine à pessoa física qualificada como empregadora rural, a Lei n° 10.256/2001 lhe impôs a obrigação de recolher contribuição sobre a receita proveniente da comercialização da produção rural, uma vez que deu a seguinte redação ao art. 25 da Lei nº 8.212/91:
“Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 2001)
I – 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
II – 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho.” (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
Merece relevo o fato de que o afastamento da incidência das contribuições substitutivas acima estudadas até o 90º (nonagésimo) dia da publicação da Lei nº 10.256/01 (10/07/2001), em respeito ao observado o princípio da anterioridade nonagesimal (art. 195 § 6º da Constituição), deve ter como efeito a incidência das contribuições substituídas, quais sejam, aquelas incidentes sobre a folha de pagamento dos segurados empregados e trabalhadores avulsos, previstas nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212/91, sem, entretanto, poder haver repetição ou compensação do que já foi recolhido, tendo em vista que o encargo financeiro correspondente às referidas contribuições substitutivas já foi absorvido e incorporado ao preço da produção rural, sendo, assim, transferido a terceiros.
A respeito do último ponto abordado no parágrafo anterior, FONTES colaciona o escólio da Ministra Ellen Gracie no julgamento do RE 363.852, in verbis:
“o pagamento desse tributo já foi absorvido e incorporado ao preço cobrado por essas mercadorias. De modo que, estabelecer o Tribunal, nesse momento, a possibilidade de recuperação desses valores, consistiria em admitir um enriquecimento indevido, parece-me”
Demais disso, o referido autor faz uma pertinente observação sobre a matéria.
Por fim, aproveita-se a oportunidade para se trazer à tona uma última questão: como garantir ao empregador rural o direito de restituição das contribuições se este já repassou o encargo financeiro ao longo da cadeia comercial? Se o comprador da produção foi quem arcou economicamente com as contribuições, em virtude do natural aumento de preço decorrente da carga tributária, admitir que o produtor rural possa receber da União os valores referentes às contribuições gerará o enriquecimento sem causa do empregador rural, o qual será reembolsado duas vezes (questão que envolve a sempre controvertida interpretação do art. 166 do CTN).
À luz do art. 166 do Código Tributário Nacional, tendo havido a transferência do encargo financeiro correspondente ao tributo, só poderia haver a repetição do indébito ou a compensação se o primeiro adquirente da produção rural autorizasse expressamente o contribuinte de direito a receber o que indevidamente pagou.
6. CONCLUSÃO
Os produtores rurais pessoa física e jurídica, bem como a agroindústria, estão sujeitos aos respectivos regimes de contribuições sociais previdenciárias substitutivas das exações previstas no art. 22, I e II, da Lei nº 8.212/91.
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE nº 363.852/MG, ao declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos arts. 12, V e VII, 25, I e II, e 30, IV, da Lei nº 8.212/91, com redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, referiu-se apenas aos produtores rurais pessoas físicas, pelo que é devida a contribuição patronal do produtor rural pessoa jurídica com fundamento na redação original do art. 25, da Lei nº 8.870/94.
Com a superveniência da Emenda Constitucional nº 20/98, que introduziu no artigo 195, I, b, a expressão “faturamento ou a receita”, como base de cálculo das contribuições sociais previdenciárias do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, passou a existir fundamento de validade para que legislação ordinária regulamentasse a exigência da exação, regulamentação esta vinda com a Lei nº 10.256/01 (DOU de 10/07/2001), que deu nova redação ao art. 25 da Lei nº 8.212/91, legitimando a cobrança afastada pelo Pretório Excelso, e ao art. 25 da 8.870/94, evitando questionamentos judiciais quanto ao dispositivo, na sua redação original, não ter fundamento de validade na Carta Magna.
O afastamento da incidência das contribuições substitutivas referidas ao longo do presente trabalho até o 90º (nonagésimo) dia da publicação da Lei nº 10.256/01 (10/07/2001), deve ensejar a incidência das exações incidentes sobre a folha de pagamento dos segurados empregados e trabalhadores avulsos, previstas nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212/91.
Não pode haver repetição ou compensação do que já foi recolhido, tendo em vista que o encargo financeiro correspondente às referidas contribuições substitutivas já foi absorvido e incorporado ao preço da produção rural, sendo, assim, transferido a terceiros, salvo se estes, na condição de primeiros adquirentes da produção rural, autorizassem expressamente o contribuinte de direito a receber o que indevidamente pagou.
Informações Sobre o Autor
Iuri Cardoso de Oliveira
Procurador Federal, pós-graduado em Direito Constitucional do Trabalho e pós-graduando em Direito Tributário pela Universidade Federal da Bahia