Os recursos no projeto de reforma do Código de Processo Penal

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I – INTRODUÇÃO[1]


Coube-me nesta obra coletiva tratar especificamente dos recursos em espécie previstos no Código de Processo Penal projetado, ora em tramitação na Câmara dos Deputados (Projeto de Lei do Senado nº. 156/2009), depois de ter sido aprovado no Senado Federal (Parecer nº. 1.636/2010). 


Seguindo orientação do coordenador da obra, não houve preocupação em abordar a reforma processual penal brasileira como um todo, pois este aspecto geral já foi enfrentado em artigos anteriores constantes deste mesmo livro.


Igualmente, não escreverei sobre as disposições gerais pertinentes aos recursos, também alvo de trabalho nesta mesma obra.


Tampouco, e por evidente, tratarei das ações autônomas de impugnação – Revisão Criminal, Habeas Corpus e Mandado de Segurança – também estudados em um capítulo deste livro.


Portanto, incumbir-me-ei especificamente em analisar cada um dos meios recursais estabelecidos no Projeto de Lei do Senado nº. 156/2009.


II – DO AGRAVO


Os arts. 473 a 479 tratam do recurso denominado simplesmente de agravo, em substituição ao “atual” Recurso em Sentido Estrito.  Lamentavelmente, repetiu-se o equívoco em indicar exaustivamente as decisões agraváveis, ao invés de estabelecer, genericamente, a possibilidade deste recurso contra as decisões interlocutórias[2], o que acabaria, em grande parte, com a (forçosa) interposição da correição parcial e com a impetração de mandados de segurança (por parte acusação), pois muitas decisões interlocutórias de natureza penal simplesmente continuarão irrecorríveis por força da taxatividade do rol estabelecido no art. 473, impelindo o Ministério Público, o querelante (na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública) e, algumas vezes, o assistente da acusação, a continuar manejando a correição parcial e o mandado de segurança para combaterem decisões que lhe foram desfavoráveis. Quanto ao réu, continuará tendo o caminho do habeas corpus, nada obstante as restrições inadmissíveis impostas pelos nossos tribunais a esta garantia constitucional (vide, a título de exemplo, o Enunciado 691 da súmula do Supremo Tribunal Federal e a impossibilidade de revolvimento do conjunto probatório e do aprofundado exame de provas, conforme iterativa jurisprudência do Pretório Excelso).


De toda maneira, e nada obstante a taxatividade das hipóteses elencadas no referido artigo, será possível a utilização da analogia e a interpretação extensiva, com fundamento no disposto no art. 6º., do projeto, segundo o qual “a lei processual penal admitirá a analogia e a interpretação extensiva, vedada, porém, a ampliação do sentido de normas restritivas de direitos e garantias fundamentais”. A vedação legal, evidentemente e muito pelo contrário, não atinge os dispositivos que tratam de recursos. O que não será possível, em respeito à regra da taxatividade dos recursos, é ampliar a utilização do agravo para situações não previstas no rol estabelecido na lei e não passíveis de serem abrangidas por interpretação extensiva.[3]


O agravo poderá ser interposto no prazo de dez dias.


Caberá contra a decisão que receber, no todo ou em parte, a denúncia, a queixa subsidiária ou os respectivos aditamentos, bem como da que indeferir o aditamento da denúncia ou da queixa subsidiária (aqui temos um exemplo do chamado recurso pro et contra, cabível nas duas hipóteses de sucumbência, ao contrário daquele secundum eventum litis).


Ainda que cabível o recurso, entendo que se as decisões de recebimento da denúncia, queixa subsidiária e aditamentos traduzirem manifesta ilegalidade ou abuso de poder, e tendo em vista a potencial ameaça ao direito à liberdade (ínsita sempre que alguém responde a um processo por crime), não se poderá deixar de admitir, ainda que excepcionalmente, a impetração de habeas corpus para afastar imediatamente, e com mais eficácia, a referida ameaça. Como se sabe, esta garantia constitucional deve ser também conhecida e concedida sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Logo, se a medida foi abusiva (não necessária), cabível a utilização do habeas corpus que visa a tutelar a liberdade física, a liberdade de locomoção do homem: ius manendi, ambulandi, eundi ultro citroque. Como já ensinava Pontes de Miranda, em obra clássica sobre a matéria, é uma ação preponderantemente mandamental dirigida “contra quem viola ou ameaça violar a liberdade de ir, ficar e vir.”[4] (grifo nosso). Para Celso Ribeiro Bastos “o habeas corpus é inegavelmente a mais destacada entre as medidas destinadas a garantir a liberdade pessoal. Protege esta no que ela tem de preliminar ao exercício de todos os demais direitos e liberdades. Defende-a na sua manifestação física, isto é, no direito de o indivíduo não poder sofrer constrição na sua liberdade de se locomover em razão de violência ou coação ilegal.”[5] Aliás, desde a Reforma Constitucional de 1926 que o habeas corpus, no Brasil, é ação destinada à tutela da liberdade de locomoção, ao direito de ir, vir e ficar, e, “desde a Constituição de 1946 é admissível a tutela antecipada mesmo em situações em que a prisão constitua evento apenas possível a longo prazo – essa característica tem permitido que o habeas corpus seja, entre nós, um remédio extremamente eficaz para o controle da legalidade de todas as fases da persecução criminal.[6] 


E da decisão que não receber a denúncia ou a queixa subsidiária? Caberá apelação, já que se trata de uma decisão que extingue o processo, nos termos do art. 267, I e II: “São causas de extinção do processo, sem resolução do mérito, a qualquer tempo e grau de jurisdição: I – o indeferimento da denúncia ou queixa subsidiária; II – a ausência de quaisquer das condições da ação ou de justa causa, bem como dos pressupostos processuais”.


Será igualmente agravável a decisão interlocutória na qual o Juiz decida acerca da competência do Juízo, seja declarando ou infirmando a competência (recurso também pro et contra). A propósito, segundo o projeto de lei, a incompetência territorial poderá ser reconhecida pelo Juiz de ofício (arts. 95, § 1º. e 443) ou no julgamento da respectiva exceção (art. 442). Em ambos os casos, as decisões serão agraváveis.


A decisão de pronúncia (art. 327) também desafiará este recurso, hipótese em que terá sempre efeito suspensivo, impedindo, portanto, a realização da sessão do Tribunal do Júri.


Também comportarão recurso de agravo as várias decisões relativas às medidas cautelares, sejam reais ou pessoais, a saber: as que deferirem, negarem, impuserem, revogarem, prorrogarem, mantiverem ou substituírem-nas. Estas medidas cautelares, reais e pessoais, estão disciplinadas e indicadas nos arts. 525 a 654 do PLS. Nada obstante a previsão recursal, entendo, pelos mesmos motivos ditos acima, ser cabível, excepcionalmente, o remédio heróico para evitar dano imediato e irreparável à liberdade de locomoção do indiciado ou acusado, quando patente a ilegalidade ou o abuso de poder (por exemplo, quando decretada a medida cautelar por Juiz incompetente ou tratar-se de decisão sem fundamentação[7]).


Também caberá agravo sempre que o Juiz conceder, negar ou revogar a suspensão condicional do processo, em qualquer das hipóteses previstas no Código (ou mesmo, e eventualmente, em lei extravagante, salvo disposição em contrário). Veja-se no projeto de lei o art. 266 (“Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal)”, bem como o art. 150: “Se o acusado, citado por edital, não apresentar resposta escrita, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar, mediante requerimento do Ministério Público ou do defensor público, a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar quaisquer das medidas cautelares previstas no art. 533”.


Outrossim, são passíveis da utilização do agravo as decisões sobre produção e licitude da prova e seu desentranhamento (“Art. 167. São inadmissíveis as provas obtidas por meios ilícitos e as delas derivadas. Parágrafo único. A prova declarada inadmissível será desentranhada dos autos e arquivada sigilosamente em cartório”), e também quando o Juiz recusar a homologação do acordo no procedimento sumário, previsto no art. 283.


Da decisão que inadmitir a apelação também caberá agravo, no prazo de dez dias, nos próprios autos do processo. Neste caso, o Juiz de Direito não poderá negar seguimento ao agravo, ainda que intempestivo. Se o fizer, para a acusação será cabível a interposição de correição parcial (ou mandado de segurança), e para a defesa o habeas corpus. Observa-se, mutatis mutandis, que a orientação já firmada pelo Supremo Tribunal Federal é a de que “os órgãos jurisdicionais de origem não podem reter o processamento de agravo de instrumento, destinado a assegurar o conhecimento de recurso extraordinário que sofreu juízo negativo de admissibilidade.” (Reclamação 6074, relator Ministro Joaquim Barbosa).


Por fim, nos tribunais, da decisão que inadmitir o recurso extraordinário ou o recurso especial caberá agravo, no prazo de dez dias, para o Supremo Tribunal Federal ou para o Superior Tribunal de Justiça.


Quanto ao procedimento, o agravo deverá ser interposto diretamente no tribunal competente (todavia, poderá a petição do agravo ser postada no correio com aviso de recebimento ou transmitida por meio eletrônico, na forma da lei ou dos regimentos internos dos tribunais), e a sua interposição não retardará o andamento do processo O relator sorteado para o recurso poderá, a seu critério, dar-lhe efeito suspensivo quando, sendo relevante a fundamentação do pedido, da decisão puder resultar lesão irreparável ou de difícil reparação (presentes, portanto, o fumus boni juris e o periculum in mora). Esta decisão somente é passível de reforma no julgamento do agravo, salvo se antes o relator a reconsiderar. Neste caso, ou seja, havendo reconsideração por parte do relator, entendo cabível o agravo regimental previsto no art. 39 da Lei nº. 8.038/90, caso haja evidente gravame causado ao agravante.


A petição de agravo será obrigatoriamente instruída com cópias da denúncia ou da queixa subsidiária, aditamentos e respectivas decisões de recebimento ou indeferimento, bem como da decisão agravada, certidão da respectiva intimação, além de outras peças que o agravante entender úteis; a formação do instrumento ficará a cargo do agravante, que declarará, sob as penas da lei, a autenticidade dos documentos juntados


É necessário e imprescindível que o recorrente, no prazo de três dias, requeira a juntada, aos autos do processo principal, de cópia da petição do agravo e do comprovante de sua interposição, assim como a relação dos documentos que o instruíram. Se não o fizer, o agravo será inadmitido. Neste caso, também entendo cabível o agravo regimental acima referido.


Caberá o juízo de retratação, ou seja, o juiz, em face de cópia da petição do agravo, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos que o instruíram (peças estas que também foram juntadas aos autos), poderá reformar a decisão, devendo ser o relator informado desta nova decisão, a fim de que se considere prejudicado o agravo. Se o Juiz reformar a decisão, entendo ser cabível a interposição de um novo agravo naquelas hipóteses em que cabe o recurso pro et contra (agora impetrado pela parte contrária), ou mesmo a apelação (art. 480, caput, c/c arts. 267 e 268).


No respectivo tribunal, e após a regular distribuição, o relator poderá negar-lhe seguimento, liminarmente, em caso de intempestividade ou quando for manifestamente inadmissível ou estiver prejudicado. Aqui também cabível o agravo regimental.


Se não for o caso de rejeição liminar, o recurso deverá ser conhecido e julgado no mérito se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com Enunciado de súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal. Também se houver Enunciado de súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça no mesmo sentido da decisão recorrida.


Caso entenda necessário, o relator poderá requisitar informações ao Juiz, que deverá prestá-las em até dez dias. O agravado deverá ser notificado para responder no prazo de dez dias, facultando- lhe juntar documentação que entender conveniente. Atentar para o art. 467 do projeto que exige a resposta do defensor a recurso interposto como condição recursal de validade (“A resposta do defensor é condição de validade do recurso, mesmo que a decisão seja anterior ao oferecimento da denúncia”). Porém, no caso de agravo contra o indeferimento de pedido de produção de prova, o agravado não será notificado se a medida puder comprometer a eficácia do recurso (quando, por exemplo, e por razões óbvias, tratar-se de um indeferimento da interceptação das comunicações telefônicas – arts. 245 e seguintes). Neste caso, entendo, o Juiz deverá fundamentadamente justificar as razões pelas quais não determinou a notificação do agravado, em respeito ao contraditório e à dialeticidade que caracteriza todo e qualquer procedimento recursal.


III – DA APELAÇÃO


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Os arts. 480 a 491 tratam do recurso de apelação, cujo prazo de interposição será de quinze dias[8], sendo cabível contra decisões que extingam o processo, com ou sem resolução do mérito, dentre outras, aquelas elencadas no próprio projeto de lei, a saber (arts. 267 e 268):


 Indeferimento da denúncia ou queixa subsidiária;


Ausência de quaisquer das condições da ação;


Ausência de justa causa;


Ausência dos pressupostos processuais;


Impronúncia (art. 328);


Absolvição sumária[9];


Extinção da punibilidade;


Aplicação da pena no procedimento sumário (art. 283);


Condenação (art. 423);


Absolvição própria e imprópria (art. 421).


De se observar, como dito acima, que caberá agravo quando o Juiz receber, no todo ou em parte, a denúncia, a queixa subsidiária ou os respectivos aditamentos, bem como da que indeferir o aditamento da denúncia ou da queixa subsidiária. As decisões de pronúncia (art. 327) e de desclassificação (art. 332) também desafiarão o agravo.


No caso de extinção da punibilidade, a apelação será cabível, segundo penso, ainda que a decisão tenha sido tomada antes de proposta a ação penal (art. 51), já que se trata de uma decisão de mérito, não agravável, portanto.


Das decisões proferidas pelo Tribunal do Júri caberá apelação:


Quando ocorrer nulidade posterior à pronúncia[10] (devendo o réu ser submetido a novo júri, caso procedente a apelação);


Quando a sentença do Juiz presidente for contrária a lei expressa ou à decisão dos jurados (caso em que o tribunal apenas fará a devida retificação);


Se houver erro ou injustiça no tocante à aplicação da pena ou da medida de segurança (também neste caso o tribunal tão-somente procederá à devida retificação) e, por último,


Na hipótese de veredicto manifestamente contrário à prova dos autos. Neste último caso, procedente o apelo, o tribunal sujeitará o acusado a novo julgamento, não se admitindo, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação, prevalecendo aqui a soberania dos veredictos (art. 5º., XXXVIII, c).


Caso o réu seja submetido a novo Júri (hipóteses 1 e 4), impossível a reformatio in pejus indireta, ou seja, a nova sentença a ser proferida no segundo julgamento, em nenhuma hipótese, poderá ser mais gravosa que a primeira; neste sentido, ainda que despiciendo (pois decorreria de interpretação constitucional[11]), há regra expressa contendo a proibição (art. 471).


A propósito, por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal concedeu pedido de Habeas Corpus (HC 89544) para cassar sentença que agravou a pena de um condenado por homicídio qualificado no terceiro julgamento pelo Tribunal do Júri. Pela decisão, não é possível reformar para pior uma sentença quando somente o réu houver apelado, mesmo em um julgamento do Júri Popular. Segundo afirmou o relator do processo, Ministro Cezar Peluso, a regra da reformatio in pejus, prevista no Código do Processo Penal, também se aplica ao Juiz do Tribunal do Júri. De acordo com ele, esse Magistrado deve “reverenciar” essa regra “no momento do cálculo da pena, sem que isso importe limitação de nenhuma ordem à competência do Conselho de Sentença nem à soberania de seus veredictos”. O beneficiado pelo habeas corpus foi julgado três vezes pelo Tribunal do Júri. Na primeira vez, ele foi absolvido. O Ministério Público recorreu e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte determinou um novo julgamento, em que ele foi condenado por homicídio simples a seis anos de reclusão em regime inicial semiaberto. Dessa decisão quem recorreu foi a defesa do acusado, e um terceiro julgamento foi determinado pelo Tribunal de Justiça. Dessa vez, a condenação foi a 12 anos de reclusão em regime integralmente fechado por homicídio qualificado. Com o habeas corpus do Supremo Tribunal Federal, ficou restabelecida a condenação determinada no segundo Tribunal do Júri (Fonte: STF).


Atendendo-se à regra processual da unirrecorribilidade das decisões, o projeto de lei estabelece que quando cabível a apelação, não se admitirá agravo, ainda que se recorra somente de parte da decisão. Exemplo: caberá apelação, e não agravo, contra sentença condenatória, ainda que o apelante se insurja apenas em relação a medida cautelar imposta, mantida, revogada, substituída, etc. (art. 423, parágrafo único).


Quando interposto em favor do acusado, este recurso será recebido também no efeito suspensivo, devendo o juiz decidir, fundamentadamente, sobre a necessidade de manutenção ou, se for o caso, de imposição de medidas cautelares, sem prejuízo do seu conhecimento. Aqui deve prevalecer o princípio constitucional da presunção de inocência e a garantia ao duplo grau de jurisdição. A relativização do princípio e da garantia deve ser absolutamente excepcional e devidamente fundamentada.


Obviamente, como fiscal da lei e órgão de Justiça, o Ministério Público poderá apelar em favor do acusado (“Art. 57. O Ministério Público é o titular da ação penal, incumbindo-lhe zelar, em qualquer instância e em todas as fases da persecução penal, pela defesa da ordem jurídica e pela correta aplicação da lei”).[12]


Nos crimes da competência do Tribunal do Júri ou do Juiz singular, se da sentença absolutória, de impronúncia ou que extinguir a punibilidade não for interposta apelação pelo Ministério Público no prazo legal, terão legitimidade para o recurso a vítima ou, no caso de menoridade ou de incapacidade, seu representante legal, ou, na sua falta, por morte ou ausência, seus herdeiros, conforme o disposto na legislação civil, ainda que não tenha se habilitado como assistente. Neste caso, o prazo, contado a partir do dia seguinte em que terminar o do Ministério Público (recurso supletivo, portanto), será de cinco dias para o assistente e de quinze dias para a vítima não habilitada e demais legitimados.


Uma observação: a doutrina sempre justificou e admitiu este prazo em triplo concedido à vítima não habilitada como assistente (e aos seus sucessores), exatamente em razão do ofendido (e aquelas demais pessoas) não terem sido intimados da sentença (arts. 425 e 426 do projeto de lei[13]), razão pela qual se justificava um prazo maior pela dificuldade de conhecimento oficial da decisão. No entanto, estabelecendo o projeto de lei que da sentença será também comunicada a vítima, parece-nos, à luz do princípio da igualdade, que o prazo deve ser o mesmo de cinco dias (art. 91: “São direitos assegurados à vítima, entre outros: (…) V – ser comunicada: (…) d) da condenação ou absolvição do acusado. (…) § 2º. As comunicações de que trata o inciso V do caput deste artigo serão feitas por via postal ou endereço eletrônico cadastrado e ficarão a cargo da autoridade responsável pelo ato.”).


Ressalte-se, com Humberto Ávila, que a igualdade (que ele denomina de postulado) “estrutura a aplicação do Direito quando há relação entre dois sujeitos em função de elementos (critério de diferenciação e finalidade da distinção) e da relação entre eles (congruência do critério em razão do fim).” Para ele, a proporcionalidade (que também seria um postulado) “aplica-se nos casos em que exista uma relação de causalidade entre um meio e um fim concretamente perceptível. A exigência de realização de vários fins, todos constitucionalmente legitimados, implica a adoção de medidas adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito.[14]


Tal princípio está previsto expressamente no art. 5º., caput da Constituição Federal e “significa a proibição, para o legislador ordinário, de discriminações arbitrárias: impõe que a situações iguais corresponda um tratamento igual, do mesmo modo que a situações diferentes deve corresponder um tratamento diferenciado.” Segundo ainda Mariângela Gama de Magalhães Gomes, a igualdade “ordena ao legislador que preveja com as mesmas conseqüências jurídicas os fatos que em linha de princípio sejam comparáveis, e lhe permite realizar diferenciações apenas para as hipóteses em que exista uma causa objetiva – pois caso não se verifiquem motivos desta espécie, haverá diferenciações arbitrárias.[15]


Para Ignacio Ara Pinilla, “la preconizada igualdad de todos frente a la ley (…) ha venido evolucionando en un sentido cada vez más contenutista, comprendiédose paulatinamente como interdicción de discriminaciones, o, por lo menos, como interdicción de discriminaciones injustificadas.[16] 


Como ensina Celso Antônio Bandeira de Mello, “há ofensa ao preceito constitucional da isonomia quando a norma singulariza atual e definitivamente um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas, ou uma pessoa futura e indeterminada.[17] E se a vítima já faleceu? Entendemos que subsiste a obrigação de comunicação aos seus sucessores. Parece-nos que somente assim poderemos preservar a mens legislatoris (ver art. 92: “Os direitos previstos neste Título estendem-se, no que couber, aos familiares próximos e ao representante legal, quando a vítima não puder exercê-los diretamente, respeitadas, quanto à capacidade processual e legitimação ativa, as regras atinentes à assistência e à parte civil”).


Ainda neste caso, observa-se o Enunciado 448 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, in verbis: “O prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público” (é bem verdade que a redação deste enunciado encontra-se pendente de revisão preliminar, segundo questão de ordem resolvida pelo Pleno no julgamento do HC 50417 – RTJ 68/604).


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O assistente da acusação arrazoará em cinco dias, após o prazo do Ministério Público. Em caso de ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública, o Ministério Público terá vista dos autos para arrazoar, no mesmo prazo.


A apelação devolverá inteiramente ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada pela acusação, podendo também, neste caso, o tribunal conhecer de matéria que, de qualquer modo, favoreça o acusado, pois, como se sabe, é perfeitamente possível no processo penal a reformatio in pejus para a acusação ou a impropriamente chamada reformatio in mellius (art. 471, § 2º.).


Por óbvio, não terá efeito suspensivo a apelação da sentença absolutória devendo o réu ser posto imediatamente em liberdade. Tratando-se, porém, de apelação contra sentença absolutória imprópria (art. 421, parágrafo único, III), entendo que o recurso tem sim efeito suspensivo, devendo-se aguardar o trânsito em julgado do acórdão para o início do cumprimento da medida de segurança (como é cediço, trata-se de uma sentença em que o Juiz afirma a tipicidade e ilicitude de um fato, certifica a autoria e aplica uma medida de segurança restritiva – tratamento ambulatorial, ou privativa da liberdade – internação, razões pelas quais não pode ser executada imediatamente, em homenagem ao princípio da presunção de inocência).


Quanto ao procedimento no Juízo a quo, deverá o Juiz, ao receber a apelação, mandar dar vista ao apelado para responder, no prazo de quinze dias. Se houver mais de um recorrido, o prazo será comum, contado em dobro, devendo o juiz assegurar aos interessados o acesso aos autos. De toda maneira, em qualquer caso, o prazo será contado a partir da data da notificação das partes.


A propósito, entendo não ser possível a subida do recurso sem as razões e contrarrazões, em obediência ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório. Neste sentido, atentar para o disposto no art. 467: “A resposta do defensor é condição de validade do recurso, mesmo que a decisão seja anterior ao oferecimento da denúncia. Ademais, é indispensável a intervenção do Ministério Público nas ações penais públicas e na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública. Neste sentido, conferir o art. 57 do projeto de lei: “O Ministério Público é o titular da ação penal, incumbindo-lhe zelar, em qualquer instância e em todas as fases da persecução penal, pela defesa da ordem jurídica e pela correta aplicação da lei”; bem como o art. 158, II: “Serão absolutamente nulos e insanáveis os atos de cuja irregularidade resulte violação dos direitos e garantias fundamentais do processo penal, notadamente no que se refere à observância do contraditório e da ampla defesa”); além, evidentemente, do art. 129, I da Constituição. Apenas em relação ao assistente da acusação admito a subida dos autos sem as razões ou contrarrazões recursais.


A propósito, ao comentarem o art. 601 do atual Código de Processo Penal (que admite a subida dos autos sem as razões), afirmam Ada Pelegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Magalhães Gomes Filho que o dispositivo “infringe o princípio do contraditório”, ferindo, outrossim, o princípio da dialeticidade dos recursos, pois deixa de estabelecer “o imprescindível contraditório em matéria recursal.[18]


Como se sabe, o devido processo legal vem consagrado pela Constituição Federal, ao estabelecer que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal e ao garantir a qualquer acusado em processo judicial o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; todos estes direitos e garantias[19] estão estabelecidos taxativamente no texto constitucional.  Aliás, dispõe o art. 3º. do projeto de lei que “todo processo penal realizar-se-á sob o contraditório e a ampla defesa, garantida a efetiva manifestação do defensor técnico em todas as fases procedimentais.”


Como ensina Alberto Binder, “ninguém pode ficar indiferente em face da efetiva vigência destes direitos e garantias. Eles são o primeiro – e principal – escudo protetor da pessoa humana e o respeito a estas salvaguardas é o que diferencia o Direito – como direito protetor dos homens livres – das ordens próprias dos governos despóticos, por mais que estas sejam redigidas na linguagem das leis.”[20]


Além do texto constitucional, refiro-me aos pactos internacionais subscritos e adotados pelo nosso Direito Positivo. Assim, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos firmado em Nova York, em 19 de dezembro de 1966 e promulgado pelo Governo brasileiro através do Decreto nº. 592/92, estabelece em suas cláusulas alguns preceitos garantidores e reveladores de um devido processo legal, assim como citado o Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, promulgado entre nós pelo Decreto nº. 678/92 (Convenção Americana sobre Direitos Humanos).


A propósito, Fábio Comparato ensina que “a tendência predominante, hoje, é no sentido de se considerar que as normas internacionais de direitos humanos, pelo fato de expressarem de certa forma a consciência ética universal, estão acima do ordenamento jurídico de cada Estado. (…) Seja como for, vai-se afirmando hoje na doutrina a tese de que, na hipótese de conflitos entre regras internacionais e internas, em matéria de direitos humanos, há de prevalecer sempre a regra mais favorável ao sujeito de direito, pois a proteção da dignidade da pessoa humana é a finalidade última e a razão de ser de todo o sistema jurídico[21]: é o chamado princípio da prevalência da norma mais favorável.[22]


Segundo o Ministro Gilmar Mendes, “(…) o direito de defesa constitui pedra angular do sistema de proteção dos direitos individuais e materializa uma das expressões do princípio da dignidade da pessoa humana. Como se sabe, na sua acepção originária, este princípio proíbe a utilização ou transformação do homem em objeto dos processos e ações estatais. O Estado está vinculado ao dever de respeito e proteção do indivíduo contra exposição a ofensas ou humilhações. A propósito, em comentários ao art. 1º da Constituição alemã, afirma Günther Dürig que a submissão do homem a um processo judicial indefinido e sua degradação como objeto do processo estatal atenta contra o princípio da proteção judicial efetiva (“rechtliches Gehör”) e fere o princípio da dignidade humana [“Eine Auslieferung des Menschen an ein staatliches Verfahren und eine Degradierung zum Objekt dieses Verfahrens wäre die Verweigerung des rechtlichen Gehörs.”] (MAUNZ-DÜRIG, Grundgesetz Kommentar, Band I, München, Verlag C.H.Beck , 1990, 1I 18).“ (HC 85294).


Por outro lado, não há devido processo legal sem o contraditório, mesmo porque, “para que haya un proceso penal propio de un Estado de Derecho es irrenunciable que el inculpado pueda tomar posición frente a los reproches formulados en su contra, y que se considere en la obtención de la sentencia los puntos de vista sometidos a discusión”.[23] A exigência do contraditório representa a plena igualdade de oportunidades processuais. A respeito, Willis Santiago Guerra Filho afirma:


Daí podermos afirmar que não há processo sem respeito efetivo do contraditório, o que nos faz associar o princípio a um princípio informativo, precisamente aquele político, que garante a plenitude do acesso ao Judiciário (cf. Nery Jr., 1995, p. 25). Importante, também, é perceber no princípio do contraditório mais do que um princípio (objetivo) de organização do processo, judicial ou administrativo – e, logo, um princípio de organização de um instrumento de atuação do Estado, ou seja, um princípio de organização do Estado, um direito. Trata-se de um verdadeiro direito fundamental processual, donde se poder falar, com propriedade em direito ao contraditório, ou Anspruch auf rechliches Gehör, como fazem os alemães.” (grifos no original).[24]


Importante, outrossim, extrairmos esta lição de Bacigalupo, ao afirmar que o devido processo legal “aparece como un conjunto de principios de carácter suprapositivo y supranacional, cuya legitimación es sobre todo histórica, pues proviene de la abolición  del procedimiento inquisitorial, de la tortura como medio de prueba, del sistema de prueba tasada, de la formación de la convicción del juez sobre la base de actas escritas en un procedimiento fuera del control público. Es, como la noción misma de Estado democrático de Derecho, un concepto previo a toda regulación jurídico positiva y una referencia reguladora de la interpretación del Derecho vigente.” (grifo no original).[25]


A propósito, vejamos estes julgados, mutatis mutandis:


 “O princípio da ampla defesa, no aspecto da defesa técnica, exige que sejam apresentadas as razões recursais em recurso interposto pela defesa. – É nulo o julgamento realizado sem que tenham sido apresentadas as razões recursais da defesa. – Se o Tribunal constatar que o apelo não se fez acompanhar das razões recursais, deve transformar o julgamento em diligência para que na comarca de origem elas sejam apresentadas pelo defensor e, caso este não o faça, nem seja indicado pelo réu outro advogado, deve ser nomeado um defensor público para fazê-lo, visando resguardar o princípio da ampla e efetiva defesa. – Ordem concedida para anular o julgamento e determinar a restituição do prazo para oferecimento de razões recursais (STJ, HC nº 44.994/RO, Quinta Turma, Rel. Des. Convocada Jane Silva, j. 07/08/2007, v.u., DJ 03/09/2007, p. 193). Grifo nosso.

Habeas corpus. Processual penal. Recurso especial admitido sem as contra-razões. Ilegalidade. Resposta ao recurso devidamente protocolizada, dentro do prazo legal. Cerceamento de defesa. 1. In casu, o Desembargador 2.º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, na decisão de admissibilidade do recurso especial do Ministério Público, ressaltou não ter havido o oferecimento das contra-razões pela Defesa do ora Paciente. Contudo, ao que se denota dos documentos apresentados na impetração e das informações prestadas pelo Tribunal a quo, a resposta ao recurso especial foram devidamente protocolizadas, dentro do prazo legal. 2. Nesse contexto, afigura-se patente o constrangimento ilegal contra o Paciente, uma vez que, mesmo com o oferecimento das contra-razões, de forma tempestiva, acabou não sendo juntada aos autos, caracterizando, assim, evidente cerceamento ao seu direito de defesa. 3. Ordem concedida para determinar que as contra-razões apresentadas pela Defesa do ora Paciente sejam juntadas ao recurso especial interposto pelo Ministério Público.” (STJ/DJU de 20/11/06, pág. 344, HABEAS CORPUS N.º 45.929-SC – Rel.: Min. Laurita Vaz/5.ª Turma –).


Apresentada a resposta, o Juiz, se for o caso, reexaminará os requisitos de admissibilidade do recurso. Da decisão que inadmitir a apelação caberá agravo, no prazo de dez dias, para o tribunal competente, nos próprios autos do processo. Como adiantei acima, neste caso, o Juiz de Direito não poderá negar seguimento ao agravo, ainda que intempestivo (se o fizer, poderá o apelante utilizar-se dos remédios constitucionais – mandado de segurança ou habeas corpus, conforme o caso – ou mesmo a correição parcial). Observa-se, mutatis mutandis, que a orientação já firmada pelo Supremo Tribunal Federal é a de que “os órgãos jurisdicionais de origem não podem reter o processamento de agravo de instrumento, destinado a assegurar o conhecimento de recurso extraordinário que sofreu juízo negativo de admissibilidade.” (Reclamação 6074, relator Ministro Joaquim Barbosa).


O processo subirá em traslado se houver mais de um acusado e todos não tiverem sido julgados ou todos não tiverem apelado, o qual deverá ser remetido ao tribunal no prazo de quinze dias, cabendo ao serviço judiciário promover a extração das peças dos autos.


No Juízo ad quem, o tribunal, câmara, turma ou outro órgão fracionário competente poderá, mediante requerimento do apelante, proceder a novo interrogatório do acusado, reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências. É óbvio que neste caso, nada obstante o silêncio do projeto de lei deverão estar presentes um dos membros do Ministério Público que atuem junto ao respectivo órgão julgador e o advogado da defesa (ou um Defensor Público), sob pena de nulidade absoluta do ato processual, tendo em vista o descumprimento do devido processo legal.


Durante o processamento da apelação, as questões relativas à situação do preso provisório serão decididas pelo juiz da execução (e não mais pelo Juiz da causa), se necessário em autuação suplementar, ressalvada a competência do relator para decidir sobre a concessão ou não do efeito suspensivo, bem como acerca da necessidade de manutenção ou substituição das medidas cautelares, com comunicação da decisão ao juízo e posterior encaminhamento dos autos ao Ministério Público. Esta decisão do relator poderá ser contestada pelo já referido agravo regimental ou mesmo por habeas corpus, pelas razões acima expostas.


Lembremos que as decisões do Juiz da Vara de Execuções Penais sujeitam-se ao agravo previsto no art. 197 da Lei nº. 7.210/84 (Lei de Execução Penal, c/c Enunciado 700 da súmula do Supremo Tribunal Federal.


A apelação não será incluída em pauta antes do agravo interposto no mesmo processo. Se ambos os recursos houverem de ser julgados na mesma sessão, terá precedência o agravo.


IV – DOS EMBARGOS INFRINGENTES


Os embargos infringentes são tratados entre os arts. 492 a 496 do projeto de lei, sendo oponíveis em relação a acórdãos condenatórios não unânimes que, apenas em grau de apelação, houver reformado sentença de mérito, em prejuízo do réu.


É, portanto, recurso privativo da defesa e devem ser opostos no prazo de dez dias. Todavia, entendo também ter o Ministério Público legitimidade e interesse para recorrer em favor do réu, tendo em vista a sua destinação constitucional e legal. Neste sentido, conferir o art. 57 do projeto de lei, acima transcrito.


O efeito devolutivo do recurso limita-se à matéria objeto da divergência no tribunal. Observa-se que só é cabível tal recurso em relação a acórdãos proferidos no julgamento de apelações, donde não ser oponível quando se tratar de acórdãos proferidos em ações penais originárias ou no julgamento de quaisquer outros recursos ou ações autônomas de impugnação (habeas corpus, mandado de segurança ou revisão criminal). O recorrido tem o mesmo prazo de dez dias para oferecer contrarrazões, após devidamente notificado.


Os regimentos internos dos tribunais deverão estabelecer o procedimento para o processamento e julgamento dos embargos, devendo o órgão julgador ser obrigatoriamente composto de modo a garantir a possibilidade de reforma do acórdão da apelação; ou seja, os integrantes deste órgão de revisão não podem ser todos os mesmos que compuseram o órgão que julgou a apelação, mesmo porque estes já expuseram, decidindo, o seu entendimento. Exatamente por isso, do sorteio do novo relator será excluído aquele que exerceu tal função no julgamento da apelação.


Como é perfeitamente possível que somente capítulo do acórdão não tenha sido unânime, em relação aos demais capítulos (decididos unanimemente) poderão ser cabíveis os recursos constitucionais – especial e extraordinário – em clara exceção à regra da unirrecorribilidade das decisões judiciais. Neste caso, o prazo para interposição dos recursos extraordinário e especial ficará sobrestado até que o recorrente seja intimado da decisão dos embargos infringentes, inclusive em relação à parte unânime do acórdão recorrido.


V – DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO


Segundo dispõem os arts. 497 e 498 do projeto de lei caberão embargos de declaração quando houver na decisão proferida obscuridade ou contradição ou quando for omitido ponto sobre o qual devia pronunciar-se o Juiz ou tribunal (uma questão federal ou constitucional, por exemplo) e só poderão ter efeitos infringentes (ou modificativos) na medida do esclarecimento da obscuridade, da eliminação da contradição ou do suprimento da omissão, devendo, neste caso, ser ouvida a parte contrária no prazo de cinco dias. A propósito, admito perfeitamente que em sede de embargos de declaração possa ser a pena aplicada alterada, “sendo preferível corrigir o erro em embargos de declaração – nos limites da contradição ou omissão – do que chegar ao mesmo resultado pela via de outro recurso”, como afirmam Ada Pelegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Magalhães Gomes Filho.[26]


Dispõe o projeto de lei que os embargos serão opostos uma única vez. Com base na doutrina acima citada e em farta jurisprudência, não vejo sentido nesta limitação, ou seja, em não aceitar a possibilidade de oposição de novos embargos declaratórios da decisão proferida nos primeiros embargos: “o que não pode haver é a reprodução da crítica feita nos primeiros embargos” ou a “arguição pela primeira vez da existência de qualquer dos defeitos apontados na decisão já embargada.[27] É preciso, portanto, amoldar esta limitação legal à garantia constitucional ao duplo grau de jurisdição e à da fundamentação das decisões judiciais.


O prazo para os embargos é de cinco dias (também nos Juizados Especiais Criminais, caso em que poderão ser opostos também oralmente – art. 310) e devem ser oponíveis em petição escrita dirigida ao Juiz (contra sentença) ou relator (em relação a acórdão), com indicação do ponto obscuro, contraditório ou omisso. Quando opostos contra sentença, deverão ser julgados no prazo de cinco dias. Já nos tribunais, o relator apresentará os embargos em mesa na sessão subsequente, independentemente de notificação, proferindo voto.


É importante observar que se forem tempestivamente interpostos, interrompem o prazo de interposição de recursos para qualquer das partes, ainda quando não admitidos e inclusive no procedimento sumariíssimo (art. 310, §2º.). Em caso de intempestivamente, por óbvio, não terão tal efeito.


VI – DO RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL


Atendendo à determinação constitucional, os arts. 499 a 503 tratam do recurso ordinário ao Superior Tribunal de Justiça das decisões denegatórias de habeas corpus e de mandado de segurança. O prazo de interposição será de dez dias e deve ser apresentado nos próprios autos e apenas quando a decisão for proferida em única ou última instância pelos tribunais (não pelas turmas recursais, quando, então, cabível será outro habeas corpus dirigido ao respectivo tribunal, tendo em vista que no julgamento do HC 86834 – DJ de 09/03/2007, o Supremo Tribunal Federal superou o Enunciado 690, decidindo que a competência para julgar o writ contra decisões das turmas recursais será dos tribunais).


Perante o Supremo Tribunal Federal, é cabível o mesmo recurso, no mesmo prazo e também nos próprios autos, em relação às decisões denegatórias de habeas corpus e de mandado de segurança originários do Superior Tribunal de Justiça.


O recurso deverá ser interposto perante o tribunal recorrido e remetido ao tribunal ad quem, devendo ser aplicadas, no que couber, as disposições relativas à apelação.


O Ministério Público terá vista dos autos pelo prazo de dez dias. Conclusos ao relator, este submeterá o feito a julgamento na primeira sessão. No caso de impossibilidade de observância de qualquer dos prazos pelo julgador, os motivos da demora serão declarados nos autos. Não havendo o julgamento na sessão designada, o processo deverá ser imediatamente incluído em pauta. Não observado o prazo legal para manifestação do Ministério Público, o relator requisitará os autos para prosseguir ao julgamento. Neste caso, deverá ser oficiado ao Procurador Geral da República, caso não tenha sido ele próprio o responsável pela dilação indevida.


Nada obstante o recurso previsto, admite-se, como se sabe, o habeas corpus substitutivo do recurso ordinário, não havendo qualquer vedação legal ou constitucional neste sentido. Outrossim, segundo já decidiu o Supremo Tribunal Federal, para a interposição deste recurso não é necessária a procuração dada ao advogado (HC 86.307-8, RT 853/500). Ademais, compartilho com o entendimento doutrinário, segundo o qual “a decisão denegatória do habeas corpus não impede que os mesmos fundamentos e as mesmas provas sejam reapresentados em sede recursal.”[28] Tais permissivos jurisprudenciais decorrem da natureza e do objeto deste recurso que visa a evitar a privação da liberdade por ilegalidade ou abuso de poder. Não esqueçamos que “a interpretação das leis processuais penais orientar-se-á pela proibição de excesso, privilegiando a dignidade da pessoa humana e a máxima proteção dos direitos fundamentais, considerada, ainda, a efetividade da tutela penal.” (Art. 5º.).


Por fim, ressalte-se que o projeto de lei revoga expressamente os arts. 30 a 32 da Lei nº. 8.038/90 que tratam hoje do recurso ordinário em habeas corpus.


VII – DOS RECURSOS ESPECIAL E EXTRAORDINÁRIO


– Considerações Gerais a Respeito dos Recursos Constitucionais


Inicialmente, atente-se ser perfeitamente possível a interposição simultânea dos recursos especial e extraordinário “se houver fundamentos legais e constitucionais que autorizem as duas impugnações.”[29]


O recurso especial somente é cabível contra decisão de única ou última instância, sendo inadmissível quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido pelo tribunal de origem (Súmula 207 do Superior Tribunal de Justiça).[30] Não é cabível contra decisões proferidas por turmas recursais. Observe-se, porém, que na lição de Ada Grinover, Scarance Fernandes e Magalhães Gomes Filho, não se pode excluir “a reapreciação de questões atinentes à disciplina legal da prova e também à qualificação jurídica de fatos assentados no julgamento de recursos ordinários.”[31] A esse respeito, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “o erro sobre critérios de apreciação da prova ou errada aplicação de regras de experiência são matérias de direito e, portanto, não excluem a possibilidade de recurso especial.” (STJ, RT 725/531). Esta errada valoração da prova pressupõe contrariedade a um princípio ou a uma regra jurídica no campo probatório e não que se colha das provas produzidas nova conclusão.[32]


Ainda: “A revaloração do contexto probatório firmado pelo Tribunal a quo, diferente do reexame de provas vedado pela Súmula 7/STJ, é permitida em sede de recurso especial.” (STJ – 6ª T. – REsp 705.416/SC – rel. Paulo Medina – j. 23.05.2006 – DJU 20.08.2007, p. 311). “A valoração da prova refere-se ao valor jurídico desta, sua admissão ou não em face da lei que a disciplina, podendo ser ainda a contrariedade a princípio ou regra jurídica do campo probatório, questão unicamente de direito. O reexame da prova implica a reapreciação dos elementos probatórios para concluir-se se eles foram ou não bem interpretados, constituindo matéria de fato, soberanamente decidida pelas instâncias ordinárias.” (AgREsp 165226, 2.ª T STJ, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 04/03/02). “O recurso especial não se presta para simples reexame da prova. Súmula 07 do STJ. Distinto, porém, promover a valoração da prova, que não se confunde com a análise dos fatos probantes.” (REsp 4678/SP, 2.ª T STJ, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJ 17/12/90).


Ambos os recursos, a par de servir às partes sucumbentes, têm como escopo tutelar o próprio direito federal ou constitucional acaso atingido pela decisão guerreada. Ademais, não é cabível perquirir-se acerca de matéria fática, devendo ser analisadas apenas as questões de direito já examinadas pelo Juízo a quo, mesmo porque, se assim não o fosse, o recurso se prestaria a uma segunda apelação. Neste sentido, atente-se para o Enunciado nº. 07 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.”


Eles, a princípio, não teriam efeito suspensivo, segundo dispõe o art. 27, § 2º. da Lei nº. 8.038/90. Atente-se, porém, para a lição de Ada Pellegrini Grinover, segundo a qual o art. 27, § 2º. da Lei nº. 8.038/90 “visa a regulamentar os recursos de forma genérica, não sendo aplicável, quanto aos efeitos prisionais, à esfera penal.”[33] Neste mesmo sentido, Paganella Boschi, para quem este parágrafo “endereça-se unicamente aos processos cíveis, porque nestes a execução provisória da sentença, mediante caução pelo autor, é perfeitamente admissível. Jamais as sentenças proferidas nos processos criminais, por implicar ofensa aberta, direta e frontal à garantia da presunção de inocência, antes citada.”[34]


Aliás, não é mesmo possível admitir-se o efeito somente devolutivo do recurso especial (e mesmo do extraordinário) na esfera penal, pois estaríamos contrariando o princípio constitucional da presunção de inocência.[35]


Ora, se o art. 5º., LVII, da Constituição proclama que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, é de todo inadmissível que alguém seja preso antes de definitivamente julgado, salvo a hipótese desta prisão provisória se revestir de caráter cautelar, independentemente de primariedade e de bons antecedentes. Soa, portanto, estranho alguém ser presumivelmente considerado não culpado (pois, ainda não foi condenado definitivamente) e, ao mesmo tempo, ser obrigado a se recolher à prisão, mesmo não representando a sua liberdade nenhum risco seja para a sociedade, seja para o processo, seja para a aplicação da lei penal. Mais estranho se nos afigura ao atentarmos que aquela presunção foi declarada constitucionalmente.


Desta forma, esta prisão provisória anterior a uma decisão transitada em julgado, ditada automaticamente pelo só motivo do recurso não ter efeito suspensivo, só se revestirá de legitimidade caso seja devidamente fundamentada (art. 5º., LXI, Constituição) e reste demonstrada a sua necessidade (periculum libertatis[36]).


Ora, se temos a garantia constitucional da presunção de inocência, é evidente que não pode ser efeito de um acórdão recorrível, pura e simplesmente, um decreto prisional, sem que se perquira quanto à necessidade do encarceramento.


Se assim o é, fácil é interpretar este art. 27, § 2º. da Lei nº. 8.038/90 da seguinte forma e nos seguintes termos: a prisão será uma decorrência do acórdão confirmatório da sentença condenatória sempre que, in casu, seja cabível a prisão preventiva contra o réu. O que definirá se o acusado aguardará preso ou em liberdade o julgamento final do processo é a comprovação da presença de um daqueles requisitos acima referidos.


Conclui-se que a necessidade é o fator determinante para alguém aguardar preso o julgamento final do seu processo, já que a Constituição garante que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”


Por outro lado, como a ampla defesa (e no seu bojo a garantia do duplo grau de jurisdição) também está absolutamente tutelada pela Carta Magna, aquele artigo de lei não pode ser interpretado literalmente, mas em conformidade com aquele Diploma, lendo-o da seguinte forma: não se pode admitir que o recurso especial (ou extraordinário) interposto contra uma decisão de natureza condenatória/penal tenha, tão-somente, efeito devolutivo.


Observa-se que mesmo sendo cabível o encarceramento provisório (por ser, repita-se, necessário), o não recolhimento do acusado não pode ser obstáculo à interposição de eventual recurso especial pela defesa, e se recurso houver, a fuga posterior não lhe obstará o regular andamento.


Vê-se que não optamos pela interpretação literal do art. 27, § 2º., o que seria desastroso, tendo em vista as garantias constitucionais acima vistas. Por outro lado, utilizamo-nos do critério da interpretação conforme a Constituição, procurando adequar o texto legal com o Texto Maior e evitando negar vigência ao dispositivo, mas, antes, admitindo-o válido a partir de uma interpretação garantidora e em consonância com a Constituição.


Afinal de contas, como já escreveu Cappelletti, “a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que a torna válida perante todas.”[37]


Só poderíamos interpretar este artigo literalmente se este modo interpretativo fosse possível à luz da Constituição. Por outro lado, não entendemos ser o caso de, simplesmente, reconhecer inválida a norma insculpida naquele artigo de lei. A nós nos parece ser possível interpretá-la em conformidade com o texto constitucional, sem que se o declare inválido e sem “ultrapassar os limites que resultam do sentido literal e do contexto significativo da lei.”[38]


Se verdade é que “por detrás da lei está uma determinada intenção reguladora, estão valorações, aspirações e reflexões substantivas, que nela acharam expressão mais ou menos clara”, também é certo que “uma lei, logo que seja aplicada, irradia uma acção que lhe é peculiar, que transcende aquilo que o legislador tinha intentado. A lei intervém em relações da vida diversas e em mutação, cujo conjunto o legislador não podia ter abrangido e dá resposta a questões que o legislador ainda não tinha colocado a si próprio. Adquire, com o decurso do tempo, cada vez mais como que uma vida própria e afasta-se, deste modo, das idéias dos seus autores.” (grifo nosso).[39]


Portanto, não se pode ler o referido artigo de lei e inferir o que se traduz gramaticalmente desta leitura. A interpretação literal efetivamente deve ser o início do trabalho, mas não o completa satisfatoriamente.[40]


Maximiliano já escreveu que o “Direito objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma no seu lugar próprio.”[41]


Pois bem.


Para que sejam conhecidos estes recursos constitucionais, indispensável o prequestionamento que nada mais é senão a necessidade de que tenha havido no Juízo recorrido o debate e a decisão sobre a matéria federal ou constitucional objeto dos recursos, “emitindo juízo de valor sobre o tema[42]. Se tal circunstância não ocorreu deverão ser utilizados os embargos declaratórios[43] visando a provocar efetivamente a discussão do tema objeto do recurso.


Admite-se, excepcionalmente, o chamado prequestionamento implícito, “exigindo apenas que a questão tenha sido posta na instância de origem” (Resp. 2.336-MG, RT 659/192). “É chamado de prequestionamento implícito o que reputa uma questão implicitamente apreciada, em razão de expressa apreciação de questão outra, que daquela é decorrente. Um exemplo de prequestionamento implícito consiste na questão da competência do Juiz: se ele julga a questão de mérito, implicitamente reconhece sua competência”, segundo o ensinamento de Bruno Mattos e Silva.[44]. Considera-se ocorrido o prequestionamento implícito, quando a matéria tratada no dispositivo tido por violado tiver sido apreciada e solucionada pelo Tribunal de origem, de tal forma categórica e induvidosa, que se possa reconhecer qual norma direcionou o decisum objurgado[45].


É importante também ressaltar que somente será admissível tais recursos se esgotadas as vias recursais ordinárias. A propósito, veja o Enunciado 207 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: “É inadmissível recurso especial quando cabíveis embargos infringentes contra o acórdão proferido no tribunal de origem.”


Das Disposições Gerais Previstas no Projeto de Lei


Atendendo às disposições constitucionais, os arts. 504 a 514 disciplinam o manejo dos recursos extraordinário e especial, que poderão ser interpostos no prazo de quinze dias[46], perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido (ou da turma recursal, tratando-se de recurso extraordinário), em petições distintas, que conterão a exposição do fato e do direito, a demonstração do cabimento do recurso interposto e as razões do pedido de reforma da decisão recorrida. Interpostos tais recursos, o prazo prescricional ficará suspenso até a conclusão do julgamento.


Observe-se que estas disposições projetadas não fazem “mais do que repetir os referidos textos legais e a sistemática que vem sendo tradicionalmente adotada pelos Tribunais Superiores”, conforme anota Francisco de Assis do Rêgo Monteiro Rocha Júnior.[47] Este autor, aliás, anota a omissão legislativa futura, consistente na falta de previsão sobre a possibilidade de utilização do protocolo integrado (p. 334).


Dispõe o projeto de lei que quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial sobre lei federal, o recorrente fará a prova da divergência mediante certidão, cópia autenticada ou citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sido publicada a decisão divergente, ou, ainda, mediante reprodução de julgado disponível na internet, com indicação da respectiva fonte, demonstrando, em qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. Neste caso, deve o recorrente “transcrever os trechos dos acórdãos que configurem o dissídio, mencionando as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados, não servindo à demonstração de divergência a mera reprodução de ementas.[48] No mesmo sentido, “não se conhece da divergência jurisprudencial em relação a aresto cuja cópia não foi juntada aos autos, nem houve a citação de seu repositório oficial pelo recorrente, mesmo porque, o conhecimento do recurso especial fundado na alínea “c” do permissivo constitucional requisita, em qualquer caso, a demonstração analítica da divergência jurisprudencial invocada, por intermédio da transcrição dos trechos dos acórdãos que configuram o dissídio e da indicação das circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, não se oferecendo, como bastante, a simples transcrição de ementas ou votos (artigo 255, parágrafos 1º e 2º, do RISTJ).”[49]


O procedimento estabelecido na lei prevê que, recebida a petição pela secretaria do tribunal, será notificado o recorrido, abrindo-se-lhe vista para apresentar contrarrazões. Findo o prazo para apresentação de contrarrazões, serão os autos conclusos para admissão ou não do recurso, no prazo de quinze dias, em decisão fundamentada. Como afirmamos em relação à apelação, entendemos que não é possível a subida dos recursos sem as razões e contrarrazões (ver supra).

Em relação ao recurso extraordinário, não será emitido juízo de admissibilidade se o recurso deva ser sobrestado em virtude da aplicação da sistemática da repercussão geral (sobre repercussão geral, ver adiante).


Proferido juízo de admissibilidade positivo, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça. Concluído o julgamento do recurso especial, serão os autos remetidos ao Supremo Tribunal Federal, para apreciação do recurso extraordinário, se este não estiver prejudicado. Na hipótese do relator do recurso especial considerar que o recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível (cabendo, nada obstante, os embargos declaratórios[50]), sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal, para o julgamento do recurso extraordinário. Neste último caso, se o relator do recurso extraordinário, em decisão irrecorrível (idem), não o considerar prejudicial, devolverá os autos ao Superior Tribunal de Justiça, para o julgamento do recurso especial.


– Da Repercussão Geral


Dispõe o Código de Processo Penal projetado que o Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível (idem), não conhecerá do recurso extraordinário, quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo.  Para este efeito, será considerada a existência, ou não, de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos da causa, o que deverá ser demonstrado pelo recorrente em preliminar, para apreciação exclusiva do Supremo Tribunal Federal. Ademais, haverá repercussão geral sempre que a decisão for contrária a Enunciado da súmula ou jurisprudência dominante do tribunal. Se a turma decidir pela existência da repercussão geral por, no mínimo, quatro votos, ficará dispensada a remessa do recurso ao Plenário. No entanto, caso seja negada a existência da repercussão geral, a decisão valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, que serão indeferidos liminarmente, salvo revisão da tese, tudo nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.


O relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, também nos termos do Regimento Interno (trata-se da já conhecida figura do amicus curiae[51]). A súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão.


Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do regimento interno do Supremo Tribunal Federal, cabendo ao tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo desta última Corte. Negada a existência de repercussão geral, os recursos sobrestados considerar-se-ão automaticamente inadmitidos. Porém, julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados serão apreciados pelos tribunais ou pelas turmas recursais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se, independentemente da análise dos requisitos de admissibilidade. Mantida a decisão e admitido o recurso, poderá o relator reformar, liminarmente, o acórdão contrário à orientação firmada na Suprema Corte.


– Do Recurso Repetitivo


Caso haja multiplicidade de recursos especiais com fundamento em idêntica questão de direito, caberá ao Presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo deste último Tribunal. Não adotada esta última providência, o relator, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. O relator também poderá solicitar informações, a serem prestadas no prazo de quinze dias, aos tribunais federais ou estaduais a respeito da controvérsia.


Aqui também, o relator, na forma do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça e considerando a relevância da matéria, poderá admitir manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia (aqui mais uma vez trata-se do amicus curiae). Recebidas as informações (e, se for o caso, após a manifestação do amicus curiae), terá vista o Ministério Público pelo prazo de quinze dias, findo o qual será remetida cópia do relatório aos demais Ministros, a fim de que o processo seja incluído em pauta na seção ou na Corte Especial, devendo ser julgado com preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus.


Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem terão seguimento denegado, na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça ou serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça. Nesta segunda hipótese, mantida a decisão divergente pelo tribunal de origem, far-se-á o exame de admissibilidade do recurso especial quando, então, o relator poderá, liminarmente, reformar o acórdão contrário à orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça.


O Superior Tribunal de Justiça e os tribunais de segunda instância deverão regulamentar, no âmbito de suas competências, os procedimentos relativos ao processamento e julgamento do recurso especial em matéria penal.


– Da Inadmissão do Recurso Extraordinário e do Recurso Especial


Da decisão que inadmitir o recurso extraordinário ou o recurso especial caberá agravo, no prazo de dez dias, para o Supremo Tribunal Federal ou para o Superior Tribunal de Justiça, nos próprios autos do processo, salvo quando o acórdão impugnado não der causa à extinção do processo, caso em que o agravo dependerá da formação do instrumento.


No que diz respeito ao procedimento, dispõe o projeto de lei que a respectiva petição será dirigida à presidência do tribunal de origem. O agravado será intimado para, no prazo de dez dias, oferecer resposta. Em seguida, subirão os autos ao tribunal superior, onde será processado na forma regimental. Observa-se, neste caso, que a orientação já firmada pelo Supremo Tribunal Federal é a de que “os órgãos jurisdicionais de origem não podem reter o processamento de agravo de instrumento, destinado a assegurar o conhecimento de recurso extraordinário que sofreu juízo negativo de admissibilidade.” (Reclamação 6074, relator Ministro Joaquim Barbosa).


Na Suprema Corte e na Corte Superior, o julgamento obedecerá ao disposto nos respectivos regimentos internos, podendo o relator não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada. Caso contrário, conhecerá do agravo, para lhe negar provimento, se correta a decisão que não admitiu o recurso ou para negar seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal, bem como (e ainda) para dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido estiver em confronto com Enunciado ou jurisprudência dominante no tribunal.


Quando o agravo depender da formação do instrumento, deverá ser instruído com as peças que forem indicadas pelo agravante e pelo agravado, devendo constar, obrigatoriamente, sob pena de não conhecimento, cópias do acórdão recorrido, da certidão da respectiva intimação, da petição de interposição do recurso denegado e das contrarrazões, da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e da procuração do defensor do agravante ou agravado.


Provido o agravo, o recurso especial prosseguirá com o seu processamento e julgamento. Este mesmo procedimento aplica-se ao agravo contra denegação de recurso extraordinário, salvo quando, na mesma causa, houver recurso especial admitido e que deva ser julgado em primeiro lugar.


Na hipótese de ser provido o agravo interposto da inadmissão do recurso especial ou extraordinário, não caberá novo recurso, salvo quanto à admissibilidade daquele a que se deu provimento.


VIII – DO PROCESSO E DO JULGAMENTO DOS RECURSOS NOS TRIBUNAIS


Os arts. 515 a 524 tratam do processo e julgamento dos recursos nos tribunais (apelação, agravo e embargos), que deverão ser julgados de acordo com as normas de organização judiciária e de seus regimentos internos.


Tratando-se de recurso intempestivo, manifestamente inadmissível ou prejudicado, o relator deverá negar-lhe seguimento (caberá o agravo regimental acima referido). Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com Enunciado de súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal, o relator poderá dar provimento ao recurso; havendo súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça no mesmo sentido do acórdão recorrido, poderá conhecer do agravo para negar provimento ao recurso.


No agravo de instrumento e no recurso de apelação, ressalvado o caso de requerimento expresso de concessão de efeito suspensivo, os autos serão remetidos ao Ministério Público, independentemente de despacho, para manifestação em dez dias. O relator, ou órgão instituído por norma de organização judiciária, decidirá sobre a concessão ou não do efeito suspensivo, bem como acerca da necessidade de manutenção ou substituição das medidas cautelares, com comunicação da decisão ao juízo e posterior encaminhamento dos autos ao Ministério Público. Conclusos os autos, e salvo disposição regimental expressa em contrário, o relator os examinará em dez dias, enviando-os, em seguida, quando for o caso, ao revisor por igual prazo. Não haverá revisor no julgamento de recursos de agravo e de apelação, ressalvada a hipótese de processo da competência do Tribunal do Júri. Das decisões do relator que não admitir o recurso, negar-lhe provimento ou reformar a decisão recorrida, caberá agravo (interno ou regimental – art. 39 da Lei nº. 8.038/90), no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso. Não havendo retratação, o processo será apresentado em mesa. Observa-se que as decisões que inadmitirem ou sobrestarem recursos com aplicação da sistemática da repercussão geral são irrecorríveis (sendo cabíveis apenas os embargos de declaração, conforme entendimento acima declinado).


Na sessão de julgamento, o recorrente poderá sustentar oralmente suas razões, cabendo ao recorrido se manifestar no mesmo prazo. No caso de recurso da defesa, poderá ela se manifestar novamente, após o Ministério Público (a inversão gerará nulidade absoluta, em homenagem ao contraditório).


Atentando-se para o disposto no art. 5º., LXXVIII da Constituição, caso haja impossibilidade de observância de qualquer dos prazos estabelecidos pela lei, o julgador deverá declarar nos autos, expressa e obrigatoriamente, os motivos da demora. Outrossim, não havendo o julgamento na sessão designada, o processo deverá ser imediatamente incluído em pauta. Igualmente, não observado o prazo legal para manifestação do Ministério Público, o relator requisitará os autos para prosseguir ao julgamento.


Nos julgamentos, o tribunal decidirá por maioria de votos, prevalecendo a decisão mais favorável ao acusado, em caso de empate (princípio do favor libertatis).


Após a tomada de votos, o resultado será proclamado pelo presidente, observando-se, sob sua responsabilidade, o seguinte: caso prevaleça o voto do relator e ressalvada a hipótese de retificação da minuta de voto, o acórdão será assinado ao final da sessão de julgamento ou, no máximo, em cinco dias; no caso de não prevalecer o voto do relator, o acórdão será lavrado pelo relator designado, no prazo de dez dias, sendo obrigatória a declaração de voto vencido, se favorável ao acusado; no caso de retificação da minuta de voto, o acórdão será assinado no prazo máximo de dez dias.


IX – CONCLUSÃO


O nosso Código de Processo Penal é do ano de 1941 e ao longo desse período poucas alterações sofreu em que pese serem evidentes as mudanças sociais ocorridas no País e tendo em vista a nova ordem constitucional vigente.


O seu surgimento, em pleno Estado-Novo[52], traduziu de certa forma a ideologia de então, mesmo porque “las leyes son e deben ser la expresión más exacta de las necesidades actuales del pueblo, habida consideración del conjunto de las contingencias históricas, en medio de las cuales fueron promulgadas” (grifo nosso).[53]


Temos hoje um Código elaborado sob a égide e “os influxos autoritários do Estado Novo”, decididamente não é, como já não era “um estatuto moderno, à altura das reais necessidades de nossa Justiça Criminal”, como dizia Frederico Marques. Segundo Frederico Marques, “continuamos presos, na esfera do processo penal, aos arcaicos princípios procedimentalistas do sistema escrito (…) O resultado de trabalho legislativo tão defeituoso e arcaico está na crise tremenda por que atravessa hoje a Justiça Criminal, em todos os Estados Brasileiros. (…) A exemplo do que se fizera na Itália fascista, esqueceram os nossos legisladores do papel relevante das formas procedimentais no processo penal e, sob o pretexto de por cobro a formalismos prejudiciais, estruturou as nulidades sob princípios não condizentes com as garantias necessárias ao acusado, além de o ter feito com um lamentável confusionismo e absoluta falta de técnica.”[54]


Assim, se o velho Código de Processo Penal teve a vantagem de proporcionar a homogeneidade do processo penal brasileiro, trouxe consigo, até por questões históricas, o ranço de um regime totalitário e contaminado pelo fascismo, ao contrário do que escreveu na exposição de motivos o Dr. Francisco Campos, in verbis: “Se ele (o Código) não transige com as sistemáticas restrições ao poder público, não o inspira, entretanto, o espírito de um incondicional autoritarismo do Estado ou de uma sistemática prevenção contra os direitos e garantias individuais.”


Pois bem. Este é o quadro atual. Além de algumas alterações pontuais, seja no próprio texto consolidado, seja por intermédio de leis esparsas, nada mais foi feito para modernizar o nosso diploma processual penal, mesmo após a nova ordem constitucional consagrada pela promulgação da Carta Política de 1988.


E, assim, o atual código continua com os vícios de anos atrás, maculando em muitos dos seus dispositivos o sistema acusatório, não tutelando satisfatoriamente direitos e garantias fundamentais do acusado, refém de um excessivo formalismo, assistemático e confuso em alguns dos seus títulos e capítulos (bastando citar a disciplina das nulidades[55]).


Destarte, podemos apontar como finalidades precípuas desta reforma que ora se avizinha a modernização do velho código e a sua adaptação ao modelo acusatório, com os seus consectários lógicos, tais como a distinção nítida entre o julgador, o acusador e o acusado, a publicidade, a oralidade, o contraditório, etc. (diz expressamente o art. 4º. que “o processo penal terá estrutura acusatória”).


Tais idéias serviram também de base para outras reformas feitas (ou por serem realizadas) em outros países, como a Argentina, Guatemala, Costa Rica, El Salvador, Chile, Venezuela, Bolívia, Paraguai, Honduras, Equador, Itália e Portugal.[56]


Aliás, “el Derecho procesal penal de los países latinoamericanos, observado como conjunto, ingresó, a partir de la década del’80, en un período de reformas totales, que, para el lector europeo, puede compararse con la transformación que sufrió el Derecho procesal penal de Europa continental durante el siglo XIX. No se trata, así, de modificaciones parciales a un sistema ya adquirido y vigente, sino, por lo contrario, de una modificación del sistema según otra concepción del proceso penal. Descrito sintéticamente, se puede decir que este proceso de reformas consiste en derogar los códigos antiguos, todavía tributarios de los últimos ejemplos de la Inquisición – recibida con la conquista y la colonización del continente -, para sancionar, en más o en menos, leyes procesales penales conformes al Estado de Derecho, con la aspiración de recibir en ellas la elaboración cumplida en la materia durante el siglo XX.[57]


Pode-se, portanto, inferir que as reformas processuais penais já levadas a cabo em vários países da América Latina e por virem em tantos outros, são frutos, na verdade, de modificações no sistema político destes países que foram, paulatinamente, saindo de períodos autoritários para regimes democráticos. É como se a redemocratização impulsionasse o sistema processual do tipo inquisitivo para o sistema acusatório. Aliás, é inquestionável a estreita ligação entre o sistema processual penal de um país e o seu sistema político. Um país democrático[58] evidentemente deve possuir, até porque a sua Constituição assim o obriga, um Código de Processo Penal que adote o sistema acusatório, eminentemente garantidor. Ao contrário, em um sistema autoritário, o processo penal, a serviço do Poder, olvida os direitos e garantias individuais básicos, privilegiando o sistema inquisitivo, caracterizado, como genialmente escreveu Ferrajoli, por “una confianza tendencialmente ilimitada en la bondad del poder y en su capacidad de alcanzar la verdad”. O sistema inquisitivo, portanto, “confía no sólo la verdad sino también la tutela del inocente a las presuntas virtudes del poder que juzga”.[59]


Assim, a “uniformidade legislativa latino-americana – na verdade compreendendo agora a comunidade cultural de fala luso-espanhola – apoiada em bases comuns e sem prejuízo das características próprias de cada região, é uma velha aspiração de muitos juristas do nosso continente. Além disso, ela foi o sonho de alguns grandes homens, fundadores de nossos países ou de nossas sociedades políticas. (…) “Em nossos países, geralmente, a justiça penal tem funcionado como uma ‘caixa-preta’, afastada do controle popular e da transparência democrática. O apego aos rituais antigos; As fórmulas inquisitivas, que na cultura universal já constituem curiosidades históricas; a falta de respeito à dignidade humana; a delegação das funções judiciais; o segredo; a falta de imediação; enfim, um atraso político e cultural já insuportável, tornam imperioso começar um profundo movimento de reforma em todo o continente.”[60]


Este movimento reformista não se limita à América Latina. Na Europa também se encontram em franco desenvolvimento reformas no sistema processual penal. A título de exemplo, podemos referir a Alemanha, onde “también el Derecho procesal penal há sido modificado en varias ocasiones entre 1997-2000[61], a Itália[62] e a Polônia, país que “desde hace 12 años se realizan reformas en la legislación, relacionadas con el cambio de régimen político, económico y social, que tuvo lugar en 1989 y también con la necesidad de adaptar las soluciones jurídicas polacas a las soluciones aceptadas en la Unión Europea. (…) Las reformas de la legislación penal e procesal penal constituyen una parte esencial del ‘movimiento legislativo reformador’, segundo nos informa a Drª. Barbara Kunicka-Michalska, do Instituto de Ciências Jurídicas da Academia de Ciências da Polônia, em Varsóvia.[63].


Notas:

[1] Este trabalho faz parte de uma coletânea de artigos a ser publicada pela Editora JusPodivm, ainda este ano de 2011, todos tratando de aspectos da reforma do Código de Processo Penal, obra coordenada pelo Professor e Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais, Leonardo Barreto Moreira Alves.

[2] Note-se que “são irrecorríveis as decisões interlocutórias tomadas no âmbito do Sistema dos Juizados Especiais, salvo no que se refere às medidas cautelares pessoais ou reais.” (art. 308, § 2º., do PLS).

[3] Neste sentido, Ada Pelegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, na obra “Recursos no Processo Penal”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 7ª. ed., 2011, pp. 34 e 133.

[4] História e Prática do Habeas Corpus, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1999, p. 39.

[5] Comentários à Constituição do Brasil, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 312.

[6] Ada Pelegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6ª. ed., 2009, p. 272.

[7] Mesmo porque, segundo dispõe o art. 158 do projeto de lei, “serão absolutamente nulos e insanáveis os atos de cuja irregularidade resulte violação dos direitos e garantias fundamentais do processo penal, notadamente no que se refere: (…) V – à obrigatoriedade de motivação das decisões judiciais; (…) § 1º. São absolutamente nulas as medidas cautelares ordenadas por juiz ou tribunal constitucionalmente incompetente. § 2º. Em se tratando de incompetência territorial, as medidas cautelares poderão ser ratificadas ou, se for o caso, renovadas pela autoridade competente.

[8] Nos Juizados Especiais Criminais, o prazo para apelar é de dez dias, sendo cabível “da decisão de indeferimento da denúncia e da sentença, que poderá ser julgada por turma composta de 3 (três) Juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição, reunidos na sede do Juizado.” (art. 309).

[9]Art. 275. Desde logo caberá absolvição sumária quando o juiz, prescindindo da fase de instrução, verificar: I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade, salvo quando cabível a imposição de medida de segurança; III – a manifesta atipicidade do fato, nos termos e nos limites em que narrado na denúncia.” (grifo meu).

Art. 316. Apresentada a resposta, o relator designará dia para que o tribunal delibere sobre o recebimento da denúncia ou da queixa, se não for o caso de extinção da punibilidade ou de absolvição sumária, quando tais questões não dependerem de prova, nos limites e nos termos em que narrada a peça acusatória.” (procedimento na ação penal originária).

Art. 329. O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: I – provada a inexistência do fato;II – provado não ser ele autor ou partícipe do fato; III – o fato não constituir infração penal; IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no inciso IV do caput deste artigo ao caso de inimputabilidade previsto no caput do art. 26 do Código Penal, salvo quando esta for a única tese defensiva.” (sublinhei).

[10] Atentar para as disposições do projeto de lei atinentes às nulidades, especialmente o art. 157: “a decretação de nulidade e a invalidação de ato irregular dependerão de manifestação específica e oportuna do interessado, sempre que houver necessidade de demonstração de prejuízo ao pleno exercício de direito ou de garantia processual da parte, observadas as seguintes disposições: I – nenhum ato será declarado nulo se da irregularidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa; II  –  não  se  invalidará  o  ato  quando,  realizado  de  outro  modo,  alcance  a  mesma finalidade da lei, preservada a amplitude da defesa.” Outrossim, “serão absolutamente nulos e insanáveis os atos de cuja irregularidade resulte violação dos direitos e garantias fundamentais do processo penal, notadamente no que se refere: I – à observância dos prazos; II – à observância do contraditório e da ampla defesa; III – às regras de impedimento; IV – à obrigatoriedade de motivação das decisões judiciais; V – às disposições constitucionais relativas à competência.” (art. 158). Também “a parte não poderá arguir nulidade a que haja dado causa ou para a qual tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só interesse  à  parte contrária, ressalvada a função custos legis do Ministério Público.” (art. 159). Por fim, dispõem os arts. 162 a 164 que “as nulidades que dependam de provocação dos interessados deverão ser arguidas   até   as   alegações   finais.   As   posteriores   deverão   ser   alegadas   na   primeira oportunidade. A nulidade de um ato do processo, uma vez declarada, causará a dos atos que dele diretamente dependam ou sejam consequência, ressalvadas as hipóteses previstas neste Código. O juiz que pronunciar a nulidade declarará os atos a que ela se estende, ordenando as providências necessárias para a sua retificação ou renovação.”

[11] Eugênio Pacelli, por exemplo, reconhece a natureza constitucional da ne reformatio in pejus. Segundo ele, trata-se de “uma das manifestações da ampla defesa” porque “a garantia do duplo grau, como conteúdo da ampla defesa, deve abranger também a garantia da vedação da reformatio in pejus. O risco inerente a todas as decisões judiciais poderia ter efeitos extremamente graves em relação ao acusado, no ponto em que atuaria como fator de inibição do exercício do direito ao questionamento dos julgados.” (Curso de Processo Penal. 9ª. ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 669).

[12] A propósito, veja o nosso Curso Temático de Direito Processual Penal, Editora Juruá: Curitiba, 2010, páginas 200 a 208, quando tratamos da ética do Promotor de Justiça criminal.

[13]Art. 425. O querelante ou o assistente será intimado da sentença, pessoalmente ou na pessoa de seu advogado. Se nenhum deles for encontrado no lugar da sede do juízo, a intimação será feita mediante edital, com o prazo de 10 (dez) dias, afixado no lugar de costume. Art. 426. A intimação da sentença será feita: I – ao réu e ao seu defensor no processo, pessoalmente; II – mediante edital, se o réu não for encontrado, e assim o certificar o oficial de justiça. § 1º.  Se o defensor não for encontrado, o juiz intimará o réu para constituir um novo no prazo de 48 (quarenta e oito) horas. Não o fazendo, a autoridade judicial designará outro defensor para receber a intimação. § 2º. O prazo do edital será de 90 (noventa) dias, se tiver sido imposta pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a 1 (um) ano, e de 60 (sessenta) dias, nos outros casos. § 3º. O prazo para apelação correrá após o término do fixado no edital, salvo se, no curso deste, for feita a intimação na forma prevista no inciso I do caput deste artigo. § 4º. Na intimação do réu, o oficial de justiça consignará a intenção de recorrer, quando manifestada no referido ato processual.”

[14] Teoria dos Princípios, São Paulo: Malheiros, 4ª. ed., 2004, p. 131.

[15] O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 67.

[16] “Reflexiones sobre el significado del principio constitucional de igualdad”, artigo que compõe a obra coletiva denominada “El Principio de Igualdad”, coordenada por Luis García San Miguel, Madri: Dykinson, 2000, p. 206.

[17] Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, São Paulo: Malheiros, 1999, 3ª. ed., 6ª. tiragem, p. 47.

[18] Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6ª. ed., 2009, p. 36.

[19] O direito tem um caráter declaratório, enquanto a garantia tutela a sua efetividade. Ex.: o direito à liberdade vem garantido pelo habeas corpus.

[20] Introdução ao Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 43, na tradução de Fernando Zani.

[21] Apud Sylvia Helena de Figueiredo Steiner, A Convenção Americana sobre Direitos Humanos e sua Integração ao Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 91.

[22]Este princípio, perseguido pelo direito internacional geral, e vigorosamente defendido por setores da doutrina brasileira, parece não haver ganho, até o presente, expressiva concreção na jurisprudência brasileira, devendo ser lembrada a questão do depositário infiel.”  (Bahia, Saulo José Casali, Tratados Internacionais no Direito Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 116).

[23] Klaus Tiedemann, Introducción al Derecho Penal y al Derecho Penal Procesal, Barcelona: Ariel, 1989, p. 184.

[24] Introdução ao Direito Processual Constitucional, São Paulo: Síntese, 1999, p. 27.

[25] El Debido Proceso Penal, Buenos Aires: Hammurabi, 2005, p. 13.

[26] Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6ª. ed., 2009, p. 181.

[27] Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6ª. ed., 2009, p. 182.

[28] Teoria e Prática dos Recursos Criminais, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 169.

[29] Ada Pelegrini Grinover et alii, Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3ª. ed., 2001, p. 37.

[30] AgRg no Agravo de Instrumento n.º 774.162-SP – Rel.: Min. Aldir Passarinho Júnior/4.ª Turma.

[31] Obra citada, p. 270.

[32] AgRg no Agravo de Instrumento n.º 769.722-RS – Rel.: Min. Aldir Passarinho Júnior/4.ª Turma.

[33] Apud Roberto Delmanto Junior, in As modalidades de prisão provisória e o seu prazo de duração, Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 206.

[34] Revista de Estudos Criminais nº. 05, Porto Alegre: Editora NotaDez, 2002.

[35] De toda maneira, temos a Súmula 267 do STJ: “A interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão.”

[36] Expressão preferida pelos italianos, ao invés do periculum in mora (cfr. Delmanto Junior, Roberto,  in As Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração, Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 67).

[37] Apud José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal, Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.

[38] Idem, p. 481

[39] idem, ibidem, p. 446.

[40]Toda a interpretação de um texto há-de iniciar-se com o sentido literal” (idem, p. 450).

[41] Idem, p. 165.

[42] Alexandre de Moraes, Constituição do Brasil Interpretada, São Paulo: Atlas, 2002, p. 1.401.

[43] Observa-se, contudo, que “os embargos declaratórios não servem de expediente para forçar o ingresso na instância extraordinária, se não ocorreu omissão do acórdão, que se limitou a examinar o pedido tal como foi formulado, sob o aspecto da legalidade do ato.” (STJ, ED no MS 632-0, DJU 25/05/92, p. 7.352).

[44] Prequestionamento, Recurso Especial e Recurso Extraordinário, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 10. Sobre o assunto, conferir a obra de José Miguel Garcia Medina, “O prequestionamento nos recursos especial e extraordinário”, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3ª. ed., 2002.

[45] Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n.º 769.722-RS – Rel.: Min. Aldir Passarinho Júnior.

[46] Enunciado 418 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: “É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação”.

[47]Recurso Especial e Extraordinário no Anteprojeto de Reforma do CPP”, artigo integrante da obra coletiva “O Novo Processo Penal Á Luz da Constituição”, p. 333, da Editora Lumen Juris, 2010, organizada por Jacinto Nelson de Miranda Coutinho e Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho.

[48] Ag. Rg. no ag. n.º 13.972-MG-DJU de 16-10-91, p. 14.4773.

[49] STJ – RESP 220188 / MG – DJ DATA:04/02/2002 PG:00580 – Rel. Min. Hamilton Carvalhido.

[50] Afirmam Ada Pelegrini Grinover et alii, Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 7ª. ed., 2011, p. 173: “Ainda quando o texto legal, expressis verbis ,qualifique a decisão como irrecorrível, deve entender-se que o faz com a ressalva implícita aos embargos de declaração”.

[51] A propósito, ver os trabalhos dos Professores Dirley Cunha Jr., “A intervenção de terceiro no processo de controle abstrato de constitucionalidade – a intervenção do particular, do co-legitimado e do amicus curiae na ADIn, ADC e ADPF” e de Fredie Didier Jr., “Aspectos polêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil”, São Paulo: RT, 2004”, além de Edgard Silveira Bueno Filho, “A democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade”, publicado na Revista de Direito Constitucional Internacional, nº. 12, abril/junho de 2004.

[52] Período que abrange parte do governo de Getúlio Vargas (1937 – 1945) que encomendou ao jurista Francisco Campos uma nova Constituição, extra-parlamentar, revogando a então Constituição legitimamente outorgada ao País por uma Assembléia Nacional Constituinte (1934).

[53] Fiore, Pascuale, De la Irretroactividad e Interpretación de las Leyes, Madri: Reus, 1927, p. 579 (tradução do italiano para o espanhol de Enrique Aguilera de Paz).

[54] Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 104.

[55] Comentando a respeito do Título que trata das nulidades no processo penal, o saudoso Frederico Marques adverte que “não primou pela clareza o legislador pátrio, ao disciplinar o problema das nulidades processuais penais, pois os respectivos artigos estão prenhes de incongruências, repetições e regras obscuras, que tornam difícil a sistematização coerente de tão importante instituto. (…) Ainda aqui, dá-nos mostra o CPP dos grandes defeitos de técnica e falta de sistematização que pululam em todos os seus diversos preceitos e normas, tornando bem patente a sua tremenda mediocridade como diploma legislativo” (ob. cit., Vol. II, p. 366/367).

[56] Grinover, Ada Pallegrini, “A reforma do Processo Penal”, in www.direitocriminal.com.br, 15.01.2001.

[57] Maier, Julio B. J.. e Struensee, Eberhard, Las Reformas Procesales Penales en América Latina, Buenos Aires: Ad-Hoc, 2000, p. 17.

[58] Norberto Bobbio assinala, muito a propósito,  que “Direitos do homem, democracia e paz são três momentos necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos. Em outras palavras, a democracia é a sociedade dos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando lhes são reconhecidos alguns direitos fundamentais” , in A Era dos Direitos, Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 1.

[59] Ferrajoli, Luigi, Derecho y Razón, Madrid: Editorial Trotta, 3ª. ed., 1998, p. 604.

[60] Exposição de Motivos do Projeto de Código Processual Penal-Tipo para Ibero-América, com a colaboração dos Professores Ada Pellegrini Grinover e José Carlos Barbosa Moreira, in Revista de Processo, nº. 61, p. 111.

[61] Walter, Tonio, Professor da Universidade de Friburgo, in Revista Penal, “Sistemas Penales Comparados”, Salamanca: La Ley, p. 133.

[62] Segundo Daniele Negri, da Universidade de Ferrara, “quizá nunca como en estos últimos cinco años había sufrido el procedimiento penal italiano transformaciones tan amplias, numerosas y frecuentes. (…) La finalidad de dotar de eficiencia a la Justicia se ha presentado como la auténtica meta de las innovaciones normativas que se han llevado a cabo en los últimos años (1997-2001).”, in Revista Penal, “Sistemas Penales Comparados”, Salamanca: La Ley, p. 157.

[63] Revista Penal, “Sistemas Penales Comparados”, Salamanca: La Ley, p. 164.


Informações Sobre o Autor

Rômulo de Andrade Moreira

Procurador de Justiça no Estado da Bahia. Foi Assessor Especial do Procurador-Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador-UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). É Coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da UNIFACS. Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador-UNIFACS (Curso coordenado pelo Professor J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático. Integrante, por duas vezes consecutivas, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação da Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, do Curso JusPodivm e do Curso IELF. Autor das obras “Curso Temático de Direito Processual Penal”, “Comentários à Lei Maria da Penha” (em co-autoria com Isaac Sabbá Guimarães) e “Juizados Especiais Criminais”– Editora JusPodivm, 2009, além de organizador e coordenador do livro “Leituras Complementares de Direito Processual Penal”, Editora JusPodivm, 2008. Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados na Bahia e no Brasil.


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