Parcelamento do solo em zona urbana. Qualificação urbanística da zona urbana e da zona rural

Segundo o Professor José Afonso da Silva, o zoneamento consiste na repartição do território municipal de acordo com a destinação da terra, o uso do solo ou as características arquitetônicas. Sob o primeiro aspecto, dividimos o território do Município em zona urbana, zonas de expansão urbana, zona de urbanização específica e zona rural. O segundo aspecto divide o território do Município em zonas de uso do solo. Já o terceiro fixa as características que as construções deverão ter em cada zona[1].

Dos ensinamentos do Professor Diógenes Gasparini, compreende-se que zona urbana é constituída por imóveis destinados a fins urbanos. Entende-se por fins urbanos os destinados a edificação (residencial, comercial ou industrial), dotados de equipamentos urbanos (rede de água, de esgoto, de iluminação pública, de telefonia, entre outros) e comunitários (áreas de recreio, educação, cultura, lazer, entre outros). A zona rural, por sua vez, é constituída por imóveis destinados a fins rurais. Na verdade, o legislador apenas conceituou o que são imóveis para fins rurais, extraindo-se daí, por exclusão, o conceito de imóvel urbano. Fins urbanos são os que se obtêm por exclusão, já que o ordenamento jurídico só indica os rurais, comenta o Professor Diógenes Gasparini[2]. Tudo aquilo que não está inserido no conceito de imóvel rural, é considerado como imóvel urbano. A Lei Federal nº 4.504/64 (Estatuto da Terra), no artigo 4º inciso I, conceitua imóvel rural como sendo o prédio rústico, de área contínua qualquer que seja a sua localização que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada. O Decreto Federal nº 59.428/66, que regulamenta o Estatuto da Terra, define em seu artigo 93 o imóvel rural como sendo o prédio rústico de área contínua, localizado em perímetro urbano ou rural dos Municípios, que se destine a exploração extrativa, agrícola, pecuária ou agroindustrial, através de planos públicos ou particulares de valoração. A Lei Federal nº 8.629/93 (Lei de Reforma Agrária) manteve o conceito de imóvel rural, como sendo o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial. Segundo o Professor Toshio Mukai, “tem se concluído daí, por exclusão, que os imóveis não enquadrados nessas características, independente de sua localização, se no meio urbano ou rural, são urbanos. Na sistemática legal brasileira, o critério geotopográfico, como diferenciador da divisão dos imóveis em rurais ou urbanos, cede lugar ao critério teleológico ou finalístico”[3].

Em função da ausência de uma lei urbanística prevendo o conceito de zona urbana, a doutrina têm admitido o conceito previsto no Código Tributário Nacional, tanto para efeitos tributários como para efeitos urbanísticos, até mesmo para que haja uma lógica na regência dos atos normativos e dos atos administrativos pelos Municípios, seja no lançamento do IPTU, seja no licenciamento urbanístico e edilício. Segundo o artigo 32, do Código Tributário Nacional, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal, observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: I – meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II – abastecimento de água; III – sistema de esgotos sanitários; IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

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Além disso, lei municipal pode declarar áreas municipais como zonas de expansão urbana e zonas de urbanização específica, destinadas à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que fora dos critérios definidos no §1º, do artigo 32, do Código Tributário Nacional, os quais somente devem ser exigidos para definição da zona urbana. A zona de expansão urbana é área reservada para o crescimento das cidades e vilas, adjacente a zona urbana. A zona de urbanização específica está relacionada a possibilidade de ser exercida atividades tipicamente urbanas em determinado terreno da cidade, isolado, separado, não contíguo as demais zonas urbanas do Município.

O parcelamento para fins urbanos é o que se destina à urbanização, edificação e ocupação, com a finalidade de habitação, indústria ou comércio, enquanto parcelamento para fins rurais é o que se destina à exploração econômica da terra – agrícola, pecuária, extrativa ou agroindustrial. Somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal (artigo 3º, Lei nº 6.766/79). Não é possível, portanto, o parcelamento para fins urbanos em zona rural.

O Promotor de Justiça José Carlos de Freitas, do Ministério Público de São Paulo, em artigo publicado pela Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo, “o parcelamento para fins urbanos em zona rural encontra óbice na Lei 6.766/79, que limita esse tipo de parcelamento (para fins urbanos) exclusivamente para zona urbana, de expansão urbana ou de urbanização específica (art. 3º, caput). Conforme explica Diógenes Gasparini, "Na zona rural, dada a luminar clareza desse dispositivo, nenhum terreno pode ser loteado ou desmembrado para fins urbanos, ou seja, para a implantação de novo núcleo residencial, comercial, industrial ou de lazer". Sob a ótica penal, considera-se crime contra a Administração Pública (art. 50, I, c.c. art. 3º, caput, Lei 6.766/79) executar parcelamento do solo, para fins urbanos, em zona rural, onde não se admite essa prática, ainda que seja para chácaras ou sítios de recreio, pois essa atividade (lazer) é tipicamente urbana”.

O artigo 14, do Decreto-lei nº 57/66, incluiu as chácaras ou sítios de recreio, em zona rural, na competência tributária do Município. Todavia, este artigo foi expressamente revogado pelo artigo 12, da Lei Federal nº 5.868/73. Já o Decreto Federal nº 59.428/66, em seus artigos 94, 95 e 96, previu a possibilidade de desmembramento de imóvel rural para a formação de sítios de recreio. Explica o Professor José Afonso da Silva que lazer é o entregar-se à ociosidade repousante, enquanto recreação é o entregar-se ao divertimento, ao esporte, ao brinquedo. São o lazer e a recreação funções urbanas, portanto. O Professor Diógenes Gasparini adverte, “não se alegue, para sustentar tese contrária, que os sítios ou chácaras de recreio submetem-se ao disposto no art. 96, do Decreto Federal nº 59.428/66, que regulou, em parte, o Estatuto da Terra, escapando assim da disciplina da Lei Federal nº 6.766/79. Ledo engano. Essa disposição, por abrigar matéria só disciplinada pela Lei Federal nº 6.766/79, foi por essa revogada já que só por ela podem reger-se os loteamentos para fins urbanos. O parcelamento do solo para fins urbanos, prescreve o art. 1º da Lei federal nº 6.766/79, "será regido por esta Lei". Sendo dessa Lei a regência exclusiva dos parcelamentos para fins urbanos, excluída está qualquer outra que porventura disciplinasse a mesma matéria. A Lei federal nº 6.766/79 chamou para si e unicamente para si a disciplina relativa ao pedido, aprovação, registro e execução dos parcelamentos para fins urbanos. Além disso, não se pode ter como permitida por outra legislação existente (art. 96, do Decreto federal nº 59.428/66) a implantação de parcelamentos de gleba situada em zona rural para fins urbanos, quando legislação mais recente (art. 3º, da Lei federal n. 6.766/79) só admite tais parcelamentos em zonas urbanas e de expansão urbana. A admissão de parcelamentos para fins urbanos "somente" em zonas urbana e de expansão urbana exclui tais parcelamentos em zona rural. Assim, as zonas rurais, por exclusão, não podem servir para a implantação de parcelamentos destinados a fins urbanos. Por essa razão, também pode-se dizer que o art. 96, do Decreto federal n. 59.428/66, está revogado[4]. Sobre a ilegalidade dos sítios de recreio em imóveis qualificados como de destinação rural, não é outro o entendimento do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a respeito:

“Ementa – Ação Civil Pública – Loteamento Clandestino de imóvel rural de fins urbanos – Sítio de Recreio. (…) Parcelamento do solo para fins urbanos – Aplicação da Lei 6.766/79 a imóveis rurais. Importante verificar a finalidade do imóvel. Hipótese em que estão configurados os usos urbanos do imóvel rural. (…) Obrigação de fazer. Devida. Condenação dos réus em regularizar o empreendimento, no prazo de dois anos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00.” (Ação Civil Pública promovida pelo Ministério Público – Apelação nº 9256425-32.2008.8.26.0000 – TJSP)

Por sua vez, de modo muito mais amplo que o Decreto Federal nº 59.428/66, o Decreto Federal nº 62.504/68, no artigo 2º, inciso II, estabelece que os desmembramentos de imóvel rural que visem constituir unidades com destinação diversa da finalidade rural (exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial), não precisarão atender a fração mínima do módulo rural, que aqui em São Paulo, dependendo do Município, é fixada entre 02 ou 03 hectares. Para tanto, estes desmembramentos em zona rural deveriam destinar-se a um dos seguintes fins: I – Desmembramentos decorrentes de desapropriação por necessidade ou utilidade pública, na forma prevista no Artigo 390, do Código Civil Brasileiro, e legislação complementar. II – Desmembramentos de iniciativa particular que visem a atender interesses de Ordem Pública na zona rural, tais como: a) Os destinados a instalação de estabelecimentos comerciais, quais sejam: 1 – postos de abastecimento de combustível, oficinas mecânicas, garagens e similares; 2 – lojas, armazéns, restaurantes, hotéis e similares; 3 – silos, depósitos e similares. b) os destinados a fins industriais, quais sejam: 1 – barragens, represas ou açudes; 2 – oleodutos, aquedutos, estações elevatórias, estações de tratamento de água, instalações produtoras e de transmissão de energia elétrica, instalações transmissoras de rádio, de televisão e similares;3 – extrações de minerais metálicos ou não e similares; 4 – instalação de indústrias em geral. c) os destinados à instalação de serviços comunitários na zona rural quais sejam: 1 – portos marítimos, fluviais ou lacustres, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias e similares; 2 – colégios, asilos, educandários, patronatos, centros de educação física e similares; 3 – centros culturais, sociais, recreativos, assistenciais e similares; 4 – postos de saúde, ambulatórios, sanatórios, hospitais, creches e similares; 5 – igrejas, templos e capelas de qualquer culto reconhecido, cemitérios ou campos santos e similares; 6 – conventos, mosteiros ou organizações similares de ordens religiosas reconhecidas; 7 – Áreas de recreação pública, cinemas, teatros e similares.

A doutrina antiga, em vigor na década de 60, admitia a existência dos decretos independentes ou autônomos, dispondo sobre matéria ainda não regulamentada especificamente em lei. A doutrina aceitava esses provimentos administrativos para suprir a omissão do legislador, desde que não invadissem aquelas matérias que somente por lei poderiam ser reguladas. Os decretos regulamentares são os que visam explicar a lei e facilitar a sua execução[5]. Já o Decreto Federal nº 62.504/68 não pode ser considerado como um decreto autônomo, já que ele prevê expressamente na epígrafe que regulamenta o artigo 65, da Lei Federal nº 4.504/64. Como decreto regulamentador, certamente é inconstitucional, pois entra em conflito com o próprio artigo 65 que ele visa regulamentar, o qual proíbe a divisão do imóvel rural abaixo da fração mínima. O decreto contradiz a lei. Ele permite o parcelamento de imóvel rural abaixo da fração mínima. Abre exceções não previstas na lei. Inova o conceito de imóvel rural ditado pela mesma lei que ele regulamenta. Disse Pontes de Miranda, se o regulamento cria direitos ou obrigações novas, estranhos à lei, ou faz reviver direitos, deveres, pretensões, obrigações, ações ou exceções, que a lei apagou, é inconstitucional. Não pode o regulamento ordenar o que a lei não ordena. Vale dentro da lei. Fora da lei a que se reporta, ou das outras leis, não vale[6].

Não bastasse isso, a Lei Federal nº 5.868/72, portanto posterior ao Decreto Federal nº 62.504/68, estabeleceu que para fins de transmissão, a qualquer título, na forma do artigo 65 da Lei Federal nº 6.504/68, nenhum imóvel rural poderá ser desmembrado ou dividido em área de tamanho inferior à do módulo calculado para o imóvel ou da fração mínima de parcelamento. Nesse contexto, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região decidiu que embora o Decreto Federal nº 62.504/68, em seu artigo 4º, trata da autorização do INCRA para a efetivação de desmembramentos, a Lei Federal nº 5.868/72, artigo 8º, caput, e §3º, destaca o conceito de fração mínima de parcelamento, demonstrando a nulidade dos desmembramentos dos imóveis rurais abaixo das extensões correspondentes ao módulo rural ou à fração mínima[7].

Ademais, o Decreto Federal nº 62.504/68, podemos afirmar, foi revogado pela Lei Federal nº 6.766/79, pois o parcelamento do solo (loteamento ou desmembramento) para fins urbanos (residência, comércio, indústria, lazer, serviços e instituições) passou a ser integralmente regido pela Lei Federal nº 6.766/79, tal como constou do seu artigo 1º: “O parcelamento do solo para fins urbanos será regido por esta Lei.” E o seu artigo 3º estabelece que “somente será admitido o parcelamento do solo para fins urbanos em zonas urbanas, de expansão urbana ou de urbanização específica, assim definidas pelo plano diretor ou aprovadas por lei municipal”. Todas as atividades mencionadas no artigo 2º, inciso II, do Decreto Federal nº 62.504/68 (postos de combustíveis, lojas, oficinas, restaurantes, hotéis, cinemas, aeroporto, colégios) são tipicamente de fins urbanos e por isso mesmo jamais poderiam ser objeto de desmembramento em imóvel inserido em zona considerada legalmente como rural. Se o Município pretende que atividades urbanas (restaurantes, hotéis, residências, lojas, padarias, lanchonetes, postos de combustíveis, oficinas mecânicas) sejam licenciados em zona rural, deve transformar a zona rural em zona urbana, de acordo com os critérios definidos na legislação de regência. Não é que o Município esteja proibido de licenciar um posto de combustível, um colégio ou uma lanchonete em zona rural, é que para fazer isso ele precisa observar um procedimento ditado pela doutrina e acolhido pela jurisprudência, ou seja, transformar a zona rural em zona urbana, mediante lei municipal. Atualmente, não há outra alternativa para o licenciamento de atividades tipicamente urbanas em zona rural que não seja a fixação por lei municipal daquilo que é zona urbana e, por exclusão, zona rural, mesmo que seja um posto de combustível ou uma lanchonete em locais absolutamente isolados, será necessária a edição de lei municipal fixando como zona de urbanização específica, por exemplo, a área do imóvel a ser licenciado ou até mesmo uma área maior, segundo o interesse público. Isto é de absoluta competência municipal e caberá unicamente ao INCRA proceder a alteração dos cadastros, emitindo a respectiva certidão. A competência do Município para tratar desse assunto, é absoluta, mas a forma como o Poder Público define o zoneamento urbano é por lei, atendendo aos requisitos do artigo 42-B, do Estatuto da Cidade e o artigo 32, do Código Tributário Nacional.

O Provimento nº 40/13, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, manteve regra antiga, no item 66.2, que proíbe o Tabelião de Notas, sob pena de responsabilidade, lavrar escrituras de desmembramento de bem imóvel rural, se a área a ser desmembrada e a remanescente não forem iguais ou superiores à fração mínima de parcelamento, podendo fazê-lo nas exceções previstas no Decreto Federal nº 62.504/68.  Só que este dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o item 169, do Provimento nº 37/13, o qual determina que o parcelamento de imóvel rural para fins urbanos deve ser precedido de: a) lei municipal que o inclua na zona urbana ou de expansão urbana do Município; b) averbação de alteração de destinação do imóvel, de rural para urbano, com apresentação de certidão expedida pelo INCRA. A Corregedoria Geral da Justiça, em parecer de lavra do Juiz Auxiliar da Corregedoria Álvaro Luiz Valery Mirra, já enfrentou situação semelhante e opinou pela legalidade de desmembramento em zona rural, abaixo da fração mínima, para fins urbanos, desde que atendidos os requisitos mencionados no atual item 169, do Provimento nº 37/13[8], isto é, lei municipal definindo a qualificação urbanística do terreno e a averbação no INCRA da alteração aprovada por lei municipal.

Além disso, o Professor Diógenes Gasparini, ao comentar sobre os dispositivos revogados pela Lei Federal nº 6.766/79, incluiu o Decreto Federal nº 62.504/68: “do mesmo modo estão revogadas as disposições da Lei Federal nº 4.504/64, do Decreto Federal nº 62.504/68, entre outros diplomas legais, que cuidaram do loteamento e do desmembramento de imóveis para fins urbanos”. O artigo 55, da Lei Federal nº 6.766/79 revogou todas as disposições contrárias, passando a regular de modo completo os institutos do loteamento e desmembramento e como o artigo 2º do mencionado decreto trata de desmembramento de imóvel rural para fins urbanos, também foi revogado tacitamente[9].

MUDANÇA DE ZONA RURAL PARA ZONA URBANA

Como vimos acima, o parcelamento para fins urbanos é o que se destina à urbanização, edificação e ocupação, com a finalidade de habitação, indústria ou comércio, enquanto parcelamento para fins rurais é o que se destina à exploração extrativa agrícola, pecuária ou agroindustrial, quer através de planos públicos de valorização, quer através de iniciativa privada (artigo 4º, I, do Estatuto da Terra).

A competência para definir o zoneamento é do Município. Cabe a ele definir o que é zona urbana dentro do perímetro municipal. Todas as áreas não consideradas pelo Município como zona urbana, serão, por exclusão, zona rural. Mas, o Poder Executivo Municipal deverá fundamentar a sua decisão de mudança de qualificação urbanística, de zona rural, para zona urbana, segundo os critérios definidos no artigo 32, do Código Tributário Nacional, tal como já comentamos em capítulos anteriores. Pelo artigo 32, do Código Tributário Nacional , entende-se como zona urbana a definida em lei municipal, observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público: I – meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais; II – abastecimento de água; III – sistema de esgotos sanitários; IV – rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar; V – escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.

Além da zona urbana, o §2º, do mencionado artigo 32, autoriza o Município declarar, por lei, áreas municipais como zonas de expansão urbana e zonas de urbanização específica, destinadas à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que fora dos critérios definidos no §1º, do citado artigo 32, os quais somente devem ser exigidos para definição da zona urbana. A zona de expansão urbana é área reservada para o crescimento das cidades e vilas, adjacente a zona urbana. A zona de urbanização específica está relacionada a possibilidade de ser exercida atividades tipicamente urbanas em determinado terreno da cidade, isolado, separado, não contíguo as demais zonas urbanas do Município.

Portanto, pretendo o Poder Público autorizar a instalação de parcelamentos (desmembramento ou loteamento) em zona rural, deverá promover a sua transformação para zona urbana, fundamentando a decisão no artigo 32, do Código Tributário Nacional e também observando o procedimento e os requisitos definidos no artigo 53, da Lei nº 6.766/79, artigo 42-B, do Estatuto da Cidade, a Instrução Normativa nº 17-B do INCRA e as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado, que esclarecem bem a questão:

“SEÇÃO VII

DOS LOTEAMENTOS DE IMÓVEIS URBANOS E RURAIS

Subseção I

Disposições Gerais

168. O parcelamento do solo para fins urbanos será precedido de averbação de lei municipal que incluiu o imóvel parcelado em zona urbana, bem com o da com provação da ciência do INCRA.

168.1. A ciência será com provada pela apresentação da certidão do INCRA ou do comprovante de protocolo da cientificação.

168.2. No caso de ser apresentado comprovante de protocolo de cientificação, registrado o parcelamento do solo, o Oficial de Registro de Imóveis enviará ao INCRA certidão com probatória do citado ato para

conhecimento e respectivas providências.

169. O parcelamento de imóvel rural para fins urbanos deve ser precedido de:

a) lei municipal que o inclua na zona urbana ou de expansão urbana do Município;

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b) averbação de alteração de destinação do imóvel, de rural para urbano, com apresentação de certidão expedida pelo INCRA”.

Ocorre que, após a data de publicação da Lei Federal nº 12.608/12 (11/04/2012), a lei municipal exigida para alterar a qualificação urbanística de rural para urbana, ampliando o perímetro urbano do Município, deverá primeiramente elaborar projeto específico, que passou a ser exigido no artigo 42-B, do Estatuto da Cidade. A aprovação de projetos de parcelamento do solo no novo perímetro urbano ficará condicionada à existência do projeto específico e deverá obedecer às suas disposições.  O projeto específico deverá ser instituído por lei municipal e atender às diretrizes do plano diretor, quando houver. Quando o plano diretor contemplar tais exigências, o Município ficará dispensado da elaboração do projeto específico.

O projeto específico deverá conter, no mínimo: I – demarcação do novo perímetro urbano; II – delimitação dos trechos com restrições à urbanização e dos trechos sujeitos a controle especial em função de ameaça de desastres naturais; III – definição de diretrizes específicas e de áreas que serão utilizadas para infraestrutura, sistema viário, equipamentos e instalações públicas, urbanas e sociais; IV – definição de parâmetros de parcelamento, uso e ocupação do solo, de modo a promover a diversidade de usos e contribuir para a geração de emprego e renda; V – a previsão de áreas para habitação de interesse social por meio da demarcação de zonas especiais de interesse social e de outros instrumentos de política urbana, quando o uso habitacional for permitido; VI – definição de diretrizes e instrumentos específicos para proteção ambiental e do patrimônio histórico e cultural; e VII – definição de mecanismos para garantir a justa distribuição dos ônus e benefícios decorrentes do processo de urbanização do território de expansão urbana e a recuperação para a coletividade da valorização imobiliária resultante da ação do poder público. (artigo 42-B, incluído no Estatuto da Cidade, pela Lei nº 12.608/12)

Portanto, para que ocorra a alteração de zona rural para zona urbana, é necessário que haja um projeto específico, tal como definido no artigo 42-B, do Estatuto da Cidade, que deverá acompanhar o projeto de lei a ser submetido para deliberação dos Vereadores.

Aprovado o projeto de lei municipal, sancionado, promulgado e publicado, deverá ser elaborado requerimento ao INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) solicitando a alteração cadastral, para qualificar a área pretendida como zona urbana. Alterados os cadastros, deverá ser emitida certidão pelo INCRA.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo segue nessa direção, com inúmeros julgados sobre o tema, e outros, ainda, exigindo o cumprimento da Lei nº 6.766/79 em todos os parcelamentos para fins urbanos realizados em zona rural, mesmo sem prévia lei municipal alterando o zoneamento.

 

Notas:
[1] José Afonso da Silva. Direito Urbanístico Brasileiro. Editora Malheiros.
[2] O Município e o Parcelamento do Solo. Diógenes Gasparini. Editora Saraiva. 2ª edição, Pág. 04.

[3] Toshio Mukai. Alaor Caffé Alves. Paulo José Villela Lomar.  Loteamentos e Desmembramentos Urbanos. Editora Sugestões Literárias S.A.

[4] O Município e o Parcelamento do Solo. Diógenes Gasparini. Editora Saraiva. 2ª edição, Pág. 19/20.

[5] Hely Lopes Meirelles. Direito Administrativo Brasileiro. Atos Administrativos. IV – Espécies de Atos Administrativos. Editora Malheiros.

[6] Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo. VI – O Regulamento no Direito Brasileiro. Editora Malheiros.

[7] Apelação Cível nº 213786 PB (2000.05.00020350-8). TRF 5ª Região Relator Desembargador Frederico Azevedo 24.10.02

[8] Processo nº 2009/00086907 – CGJ – TJSP – 17.11.09

[9] O Município e o Parcelamento do Solo. Diógenes Gasparini. Editora Saraiva. 2ª edição, Pág. 183.


Informações Sobre o Autor

Jamilson Lisboa Sabino

Professor de Direito Administrativo. Pós-Graduado em Licitações e Contratos Públicos pela Fundação Getúlio Vargas. Foi Procurador Municipal. Autor, dentre outros, dos livros “Lei de Licitações comentada segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais” e “Lei de Licitações comentada segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo”


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