Ementa: Decreto estadual que isenta servidor público do Estado de Goiás do regime de co-participação no custeio do vale-transporte. Extensão do benefício aos empregados públicos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho. Disciplinamento do vale-transporte devido aos celetistas por regramento próprio (Lei federal n. 7.418/85). Impossibilidade de interpretação extensiva do benefício conferido pelo ato normativo estadual de forma a alcançar empregado público. Competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho (art. 22, I, da CF/88).
1. Cinge-se a presente manifestação em perscrutar se a disposição contida no art. 1º do Decreto estadual n. 4.403/95, que isentou o servidor público do Estado de Goiás do regime de co-participação no custeio do vale-transporte, bem como art. 2º da Lei estadual n. 13.938/01 (fl. 14), que extingui o Fundo do Vale Transporte criado pela Lei estadual n. 9.862, de 30 de outubro de 1985, repercutem sobre os empregados públicos do Estado de Goiás, vale dizer, se os servidores cujos contratos de trabalho são regidos pelo regime empregatício da Consolidação das Leis do Trabalho ainda estão sujeitos ao desconto de 6% de sua remuneração, para que possam fazer jus à percepção do vale-transporte.
2. A previsão de fornecimento de vale-transporte para deslocamento do servidor público do Estado de Goiás encontra-se enunciada na Lei estadual nº. 9.682, de 30 de outubro de 2005 (fl. 17/20), diploma legal posteriormente alterado pela Lei n. 13.938, de 01 de novembro de 2001.
3. Nesta senda, preceitua o art. 2º da Lei estadual nº. 9.682, de 30 de outubro de 2005, acerca dos beneficiários do vale-transporte:
A”Art. 2° – É o Poder Executivo autorizado a antecipar aos servidores da administração direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo, que utilizam o Sistema de Transporte Urbano, nas condições e nos limites definidos nesta lei e em seu regulamento, Vales-Transporte, para utilização no Sistema Integrado de Transporte Urbano de Goiânia.” (destaquei)
3. Quanto ao regime de co-participação do servidor público no custeio do vale-transporte, este encontrava previsão no art. 3º do mesmo diploma legal, verbis:
A”Art. 3º – Para fazer jus ao benefício instituído por esta lei, o servidor deverá participar dos gastos com o seu deslocamento, autorizando o desconto mensal, em folha de pagamento, da parcela correspondente a 6% (seis por cento) da sua remuneração, em favor do fundo instituído pelo art. 9º, cabendo ao Estado arcar com a quantia que exceder o valor a ser consignado na forma deste artigo.
§ 1º – Em hipótese alguma a parcela de responsabilidade do servidor excederá o valor de aquisição dos Vales-Transporte que lhe forem concedidos em cada mês.
§ 2º – Não se compreendem na remuneração, para efeito do disposto neste artigo, o salário família e as vantagens de caráter transitório.”
5. Pois bem. No que atine aos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, o disciplinamento legal do vale-transporte está contido na Lei Federal n. Lei n° 7.418, de 16 de dezembro de 1985 (fl. 21/28), devidamente regulamentada pelo Decreto Federal nº 95.247, de 17 de novembro de 1987, que dispõe em seu art. 1º, verbis:
“Art. 1° São beneficiários do Vale-Transporte, nos termos da Lei n° 7.418, de 16 de dezembro de 1985, alterada pela Lei n° 7.619, de 30 de setembro de 1987, os trabalhadores em geral e os servidores públicos federais, tais como:
I – os empregados, assim definidos no art. 3° da Consolidação das Leis do Trabalho;
II – os empregados domésticos, assim definidos na Lei n° 5.859, de 11 de dezembro de 1972;
III – os trabalhadores de empresas de trabalho temporário, de que trata a Lei n° 6.019, de 3 de janeiro de 1974;
IV – os empregados a domicílio, para os deslocamentos indispensáveis à prestação do trabalho, percepção de salários e os necessários ao desenvolvimento das relações com o empregador;
V – os empregados do subempreiteiro, em relação a este e ao empreiteiro principal, nos termos do art. 455 da Consolidação das Leis do Trabalho;
VI – os atletas profissionais de que trata a Lei n° 6.354, de 2 de setembro de 1976;
VII – os servidores da União, do Distrito Federal, dos Territórios e suas autarquias, qualquer que seja o regime jurídico, a forma de remuneração e da prestação de serviços.
Parágrafo único. Para efeito deste decreto, adotar-se-á a denominação beneficiário para identificar qualquer uma das categorias mencionadas nos diversos incisos deste artigo.” (destaquei)
6. Impende notar que, quanto ao sistema de custeio do vale-transporte, a legislação do Estado de Goiás se espelha na Lei federal n. 7.418/85, prevendo, a primeira, participação do servidor mediante desconto de 6% (seis por cento) de sua remuneração (Lei estadual n. 9862/85[1]), ao passo que a segunda estatui desconto de 6% (seis por cento) do salário básico do empregado (art. 4º, parágrafo único da Lei Federal n. 7.418/85[2]). Assemelham-se, ainda, as normas, quando estipulam que o empregador deve participar com a quantia necessária para fazer face ao gasto de transporte que sobejar os valores descontados do servidor.
7. Conquanto similares as legislações, fato é que a lei estadual nunca regulou a cobrança do vale-transporte dos empregados públicos que laboram na administração pública direta, autárquica e fundacional, bem como nas empresas públicas e sociedades de economia do Estado de Goiás, vez que tais servidores, como empregados celetistas que são, submetem-se exclusivamente à Lei federal n. 7.418/85 (art. 1º, I).
8. Tal conclusão é imperativa face à competência privativa da União para legislar sobre direito do trabalho (art. 22, I, da CF/88), pelo que o alcance da lei estadual circunscreve-se apenas e tão somente aos servidores públicos da administração direta, autárquica e fundacional submetidos ao regime estatutário.
9. Destarte, dada a impossibilidade de legislação estadual dispor acerca de vale-transporte dirigido aos empregados submetidos à Consolidação das Leis do Trabalho, forçoso concluir que o Decreto estadual n. 4.403/95 (fl. 14), que isentou o servidor público do Estado de Goiás do regime de co-participação do vale-transporte, bem como a Lei estadual n. 13.938/01, que extinguiu o fundo do vale-transporte criado pela Lei 9.862/85, não trazem qualquer repercussão no custeio do vale-transporte devido aos empregados públicos do Estado de Goiás, vez que o disciplinamento de tal benefício, para esta espécie de servidores públicos, é feita por lei própria, repise-se Lei federal n. 7.418/85.
10. Conclusão diversa implicaria em flagrante inconstitucionalidade da Lei estadual n. 9.862/85, vez que, ao disciplinar benefício de servidor celetista, invadiria competência privativa da União para ordenar o direito trabalhista, regulado por legislação federal.
11. Por todo o exposto, opino no sentido de que as disposições contidas nos Decretos estaduais nº 4.079/1993 e nº 4.403/1995 e Lei estadual n. 13.938/01 não trouxeram qualquer reflexo sobre os contratos de trabalho dos empregados públicos que laboram na administração pública direta, autárquica e fundacional, bem como nas empresas públicas e sociedades de economia do Estado de Goiás, pelo que mantido o regime de co-participação de tais obreiros no custeio do vale-transporte, conforme preceito contido no art. 4º da Lei federal n. 7.418/85 e art. 9º, I do Decreto Federal nº 95.247, de 17 de novembro de 1987.
È o Parecer, s.m.j.
Alan Saldanha Luck
Procurador do Estado de Goiás
Informações Sobre o Autor
Alan Saldanha Luck
Procurador do Estado de Goiás, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho pela UNIDERP-LFG