Paternidade socioafetiva

Resumo: A paternidade socioafetiva tem o escopo em demonstrar diversas maneiras de construções familiares e de filiações. A mesma traz que, a socioafetividade nada mais é uma paternidade embasada em fatores alheios à questão genética. Os pais afetivos são aqueles que desconsideram a questão biológica, e levam em estima todo o afeto, carinho e amor que possa exteriorizar àquele que deseja ter como seu filho, seu dependente e seu companheiro, cultivando uma boa estrutura familiar, estrutura está adquirida na forma de convivência, atenção, em um meio de união e afeto. A socioafetividade tem como foco principal, e embasamento, o princípio da afetividade, e o da dignidade da pessoa humana, nos quais, deixam claros o real valor e a maneira de constituir uma família de sucesso. A paternidade socioafetiva tem como objetivo maior a construção de uma estrutura familiar, com a afetividade entre pais e filhos, e se faça desenvolver uma família equilibrada, harmônica, uma família de grandes virtudes, na qual as questões genéticas não implicarão, pois não serão as relações biológicas que iram definir o que é uma família.[1]

Palavras-chave: Paternidade socioafetiva. Filiação. Posse do estado de filho. Dignidade humana.

Abstract: The socio-affective paternity has scope to demonstrate different ways of family structures and affiliations. The same meant that the social affectivity is nothing paternity grounded on factors unrelated to the genetic matter. Affective parents are those who disregard the biological matter, and lead throughout esteem affection, warmth and love that can externalize him who want to have as your son, your dependent and his companion, cultivating a good family structure, structure is obtained in the form of coexistence, attention, in an environment of unity and affection. The social affectivity main focus, and foundation, the principle of affectivity, and the dignity of the human person, in which, make clear the real value and how to be a successful family. The socio-affective paternity has as its highest goal the construction of a family structure, with the affection between parents and children, and do develop a balanced family, harmonica, a family of great virtues, in which the genetic issues will not lead, they will not be the biological relationships that iRAM define what is a family.

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Keywords: socio-affective paternity. Membership. Possession of child status. Human dignity.

Sumário: Introdução. 1. Espécie de Filiação. 1.1. Filiação biológica. 1.2. Filiação Jurídica. 1.3.Filiação afetiva. 2. Função dos pais sócioafetivos. 3. A evolução da paternidade socioafetiva e seus pressupostos. 4. A paternidade socioafetiva e a proteção integral do núcleo familiar. 5. O afeto como dever jurídico e o principio constitucionalmente protegido. 5.1. Divergências jurisprudenciais. 6. Fundamento para garantia da segurança jurídica e proteção da dignidade da pessoa humana. 7. Prova de filiação paternal. 8. Posse do estado de filho. Conclusão. Referências.

Introdução

O presente trabalho tem o objetivo de problematizar a paternidade socioafetiva em seus amplos aspectos diante das abordagens jurídicas e embasamentos constitucionais que fazem referência ao tema, estabelecendo o liame da filiação, fronte a atualidade do direito de família.

A filiação já teve previsão legal desde o Direito Romano, onde somente eram considerados filhos legítimos, aqueles gerados dentro de uma união já consolidada entre um homem e uma mulher e por isso, filhos que viessem a ser gerados fora de uma união, eram reconhecidos como ilegítimos deixando assim, de ter direitos fundamentais respeitados; como eram ilegítimos, esses filhos gerados fora de uniões já consolidadas não possuíam reconhecimento jurídico, no Brasil, o reconhecimento desses filhos somente se deu através da sanção da Constituição Federal de 1988, a qual desmanchou a ideia de filiação presumida através da união estabelecida entre homem e mulher.

A Constituição Federal de 1988 trouxe ao campo jurídico brasileiro a possibilidade de desenvolvimento de filiações as quais não eram fundamentais a existência de laços consanguíneos entre os genitores e seus filhos. Dentre essas possibilidades trazidas pela Constituição Federal, estão: a filiação sanguínea, a afetiva e a jurídica; que serão tratadas de forma sucinta em momento oportuno, mas, que de maneira simples e momentânea podemos defini-las como:

– Filiação sanguínea: aquela onde é considerado somente os laços biológicos existentes entre os indivíduos do núcleo familiar.

– Filiação afetiva: é aquela onde os laços que ligam os indivíduos são apenas afetivos, não sendo considerado os laços biológicos existentes.

– Filiação jurídica: é aquela onde é necessária que haja um ato jurídico o qual deve ser formalizado pelo possível pai da criança, para que dessa forma, através de vias judiciais seja dado a ele o título de pai.

A complexidade do direito de família recente importuna diversas dúvidas e tumultos acerca da paternidade no contexto social, afetivo e jurídico. Além da amplitude que a Constituição Federal de 1988 trouxe para o direito de família, ainda abrangeu o princípio de igualdade entre os filhos, e o princípio da afetividade.

De acordo com os princípios supracitados, os filhos não poderão sofrer distinção por conta de sua filiação, ou seja, o filho biológico não poderá ser tratado de maneira distinta da que se trata o filho afetivo; dessa forma, não importa o vínculo gerado, sendo ele biológico ou não, os filhos deverão ser tratados de maneira igualitária considerando que os laços afetivos são de suma importância para o desenvolvimento do núcleo familiar.

A filiação socioafetiva tem sua base fixada nos laços afetivos que são criados entre o pai, e a criança, dessa forma, deixando de ser fundamental e essencial o laço sanguíneo entre os indivíduos. Como os laços afetivos são reforçados com o passar do tempo, a convivência e a afinidade, acabam por se tornar essenciais para o desenvolvimento psicomotor da prole, fazendo com que assim, os laços consanguíneos não tenham demasiada importância.

Ao decorrer do texto, há de se demonstrar como a paternidade socioafetiva cria pontes para os novos conceitos de família, e como uma família não depende exclusivamente da questão biológica, e sim de união construída com carinho, amor e afeto.

1 Espécies de filiação

A filiação antes da entrada em vigência da Carta Magna, tinha sua base no direito romano, onde se trazia a ideia de que eram legítimos os filhos que eram gerados dentro de uma união já estabelecida entre um homem e uma mulher; e trazia a ideia de que eram filhos ilegítimos os filhos que eram gerados fora de uma união matrimonial previamente estabelecida, ou era gerado por uma mãe solteira. De acordo com o direito romano, a ideia de maternidade e paternidade, era ligada de forma direta com a relação matrimonial, dessa forma, prejulgando que a maternidade se daria por parte da esposa, e a imagem da paternidade se daria ao marido.

Na ideia inicial do direito romano e que na época fora adotado pelo direito brasileiro, trazia a ideia de que os filhos que fossem gerados por indivíduos que não tinha uma união estabelecida de forma correta, ou por pessoas que não tinham vínculo algum, não tinha o direito de reconhecimento jurídico, já que sua imagem era definida como proles ilegítimas. Porém, com a chegada do texto constituinte do ano de 1988, o vínculo era pregado entre a instituição do casamento e a questão da legitimidade perdeu força, fazendo com que abrisse espaço para se acolher novas uniões, uniões essas que eram independentes e por isso permitiam novas perfilhações, dando ensejo a uma evolução Constitucional.

Com a evolução Constitucional, que foi obtida através das possibilidades de novas uniões e novas perfilhações, trouxesse ao campo jurídico brasileiro o princípio da afetividade, o qual tem como base principal o afeto destinado àquele que sobreveio das relações alheias ao matrimonio civil, dessa forma origem a hipótese de váriasespécies diferentes de filiação XXXXX.

1.1 Filiação biológica

A filiação biológica, é aquela em que são considerados os laços consanguíneos, ou seja, são considerados apenas os vínculos de sangue que ligam os genitores à criança, adolescente ou jovem, dessa forma, pode se estabelecer que a filiação biológica, seria aquela em que a ligação existiria única e exclusivamente da origem biológica, a qual se daria através de conjunção carnal entre indivíduos de sexos opostos, que acarretaria em uma gestação, dessa forma, a imagem da paternidade estaria diretamente relacionada com a questão sanguínea, a qual deveria ser comprovada através de teste de DNA quando necessário para que fosse possível reconhecer o laço existente.

No que concerne ao campo da filiação biológica, cabe trazer a tela, que foi de suma importância a quebra da ideia de que a paternidade em si estaria ligada diretamente com a ideia do casamento, uma vez que, a ideia de paternidade do filho gerado era feita de forma presumida e entendida como uma verdade real, uma vez que existia entre um homem e uma mulher uma união já estabelecida; com a quebra da ideia de que a figura paterna estaria ligada diretamente à está união já constituída, a ideia de verdade real, passou a ser encarada como um princípio investigatório, o qual deveria ser amparado e levado a ideia de que para se comprovar efetivamente a paternidade, seria necessário um exame de DNA, para se analisar a evolução biogenética, dessa forma dando fim ao vácuo existente que a presunção da paternidade dava.

A questão biológica prevê o estado de filiação que ainda não foi adquirido, não dependendo, portanto, da convivência familiar, formando-se apenas pelo vinculo sanguíneo.

Tendo como base a filiação biológica, e a ideia da verdade real como princípio investigatório, deu a segurança de que filhos gerados durante a constância ou não de uma união, poderiam ter sua paternidade reconhecida, dessa forma possibilitando que os filhos gerados passassem a ter um verdadeiro conhecimento dos seus ascendentes, com o reconhecimento biológico, é possível garantir ao menor seus direitos em âmbito jurídico, dando garantias de fins sucessórios.

Cabe trazer à baila que, no que compete à filiação biológica a mesma só foi devidamente reconhecida e apoiada, com a entrada em vigência da Constituição Federal de 1988, e apoiado e previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual traz em seu art. 27, que a filiação é um direito personalíssimo do menor, direito esse que é imprescritível e indisponível.

1.2 Filiação jurídica

Como já citado antes, a paternidade presumida na vigência da Constituição Federal de 1916, a qual já foi revogada, tinha como principal objetivo proteger à instituição familiar, para que, dessa forma quando houvesse a ocorrência de algum tipo de conflito relacionadoà filiação biológica ou a filiação jurídica, a própria presunção de paternidade conseguiria resolver o conflito.

De acordo com o entendimento da Constituição Federal de 1916, era muito mais importante a verdadeira consolidação da família, do que saber a verdadeira realidade dos fatos, porém, quando a paternidade dizia respeito a filhos gerados fora da união estabelecida entre um homem e uma mulher, a presunção de paternidade não existia, dessa forma sendo necessário que se buscasse o reconhecimento da paternidade através de um reconhecimento voluntário de paternidade, que quase nunca ocorria; ou através de vias judiciais, fazendo uso da ação de reconhecimento de paternidade, que tinha como finalidade comprovar de forma efetiva e correta a real existência do vínculo da paternidade do indivíduo com o menor.

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Nesses casos, é necessário que haja a pratica de atos jurídicos, os quais deverão ser realizados pelo ‘suposto’ pai, que mesmo não sendo biológico, proporcionará ao menor o acesso ao direito sucessório, que se dará a partir do momento em que ocorrer o registro do nascimento da criança em um cartório, esse registro comprovará que o ‘suposto’ pai, reconhece o menor como seu filho.

A filiação jurídica, se dará com o registro público realizado pelo ‘suposto’ pai do menor, esse registro público serve para fazer prova da existência da filiação jurídica, que possuirá a presunção de veracidade através de sua publicidade, a qual deve ser inerente a todo e qualquer documento público, através desse registro público é possível que se gere direitos e deveres de forma imediata.

1.3 Filiação afetiva

A filiação sócio afetiva, é filiação que não deriva de relação biológica, ou seja, não são explicadas pelo casamento, e nem por vínculos genéticos. A filiação por socioafetividade é justificada por sentimento, e afeto entre pais e filhos. É a construção de uma realidade fática.

A filiação afetiva, diz respeito a uma verdade aparente e que decorre do direito à filiação, essa verdade deverá ser consolidada nos laços de afetos que são desenvolvidos entre a imagem paterna e o menor, nesse sentido tem-se a existência da previsão legal do art. 1.593 do Código Civil“Art. 1.593. O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”, onde traz em seu texto a existência da possibilidade de tipos variados de filiação, dentre eles a filiação afetiva.

A ideia da paternidade socioafetiva, é estabelecida com base no Princípio da Proteção Integral da Criança e do Adolescente, princípio este, que é previsto e elencado na Constituição Federal de 1988. De acordo com esse princípio, é possível compreender que a paternidade socioafetiva é uma situação a qual um indivíduo passa a assumir o papel de pai e outro sujeito passa a assumir o papel de filho.

Pelo princípio da proteção integral da criança e do adolescente, é possível notar que tal instituto sugerea relação de posse do pai sobre ofilho, posse esta que está ligada a existência do fato, ou seja, quando tem pais que assumem as responsabilidades pelos filhos, tanto no âmbito educacional, quanto no afetivo, mesmo que estes não sejam seus genitores.

Para que seja possível ser efetivamente estabelecida a filiação afetiva, é necessário que se consiga chegar ao verdadeiro sentimento existente em relações entre pais e filhos, para que dessa forma, possa ser realmente caracterizada a filiação afetiva, e dessa forma fazendo jus a tão dita frase: “pai é aquele quem cria”, e com isso fazendo se tornar real os laços desenvolvidos entre o pai afetivo e seu filho.

2 Função dos pais sócios afetivos

A lei estabelece que os pais tenham como função, auxiliar na educação, e assistências básicas aos filhos afetivos. Os deveres não estão apenas ligados diretamente nos quesitos biológicos. A obrigação para com os filhos afetivos é de afetividade, de amparo emocional, e dar base para que se desenvolva uma pessoa de caráter.

Assim leciona o artigo 22 do Estatuto da Criança e Adolescente, que explana: “Art. 22: Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”.

Considerando o dispositivo, verifica-se que além do dever material com o filho afetivo que descumprido pode gerar sanção penal prevista no artigo 244 do CP, lhe é incumbido o dever de amar e dar possibilidades para que este filho cresça dentro de um ambiente agradável e de união. Algumas dessas punições vêm apontadas nos artigos; 24 do ECA e no 1.638 e incisos do código civil. “Art.24: A perda e a suspensão do pátrio poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como nas hipóteses de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o artigo 22.

“Art. nº 1638: Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I- Castigar imoderadamente o filho;

II- Deixar o filho em abandono;

III-  Praticar atos contraditórios a moral e aos bons costumes;

IV- Incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente”.

Essa perfilhação ainda gera discussões pois, obtém divergências a respeito das questões patrimoniais, no entanto, a doutrina majoritária entende que, é possível o filho possuir dos pais sócios afetivos as relações patrimoniais.

3 A evolução da paternidade socioafetiva e seus pressupostos

No que concerne a paternidade socioafetiva, é de grande valia salientar, que a mesma tem sua evolução pautada na situação de que a ideia da filiação, deixou de ter um caráter exclusivamente patrimonial, deixando também de ser baseada nos laços sanguíneos e na presunção, passando a ser considerado, as relações de afeto para que fosse possível justificar as principais características e necessidades das relações entre pais e filhos.

São pressupostos fundamentais e necessários, para que seja possível caracterizar a paternidade socioafetiva, a relação cotidiana, relação essa, que deve ser desenvolvida de forma sadia, duradoura e sólida, para que dessa forma seja capaz de criar laços de paternidade, uma vez que nos casos da filiação com base no afeto, cria-se a ideia de que, pai é aquele que está sempre ao lado do menor, que cuida, que educa, que dá carinho, ou seja, na filiação afetiva, a frase “pai é quem cria” passa a fazer todo sentido.

Cabe trazer a tela, que no caso da socioafetividade, o vínculo biológico passa a ser um mero detalhe sem importância, uma vez, que em alguns casos, os pais biológicos não se fazem presentes na vida dos menores, e em decorrência disso, fazendo com que o vínculo afetivo existente se torne mais forte e importante do que o vínculo biológico.

A presença de uma figura paterna é fundamental no desenvolvimento de uma criança, e em decorrência disso, a figura paterna afetiva, vem ganhando cada vez mais espaço, uma vez que a afetividade entre os pais e os filhos proporciona um melhor desenvolvimento, já que o afeto é uma das características fundamentais para a construção de vínculos familiares.

4 A paternidade socioafetiva e a proteção integral do núcleo familiar

Presentemente, a característica do estado de filiação peremptória da socioafetividade, apresenta-se através de três elementos entrelaçados para a existência da posse de estado de filho, que são: os tratos dispensados ao filho, o nome que herdará da família, e a fama perante a sociedade em geral, pelo fato da exposição do vínculo paternal.

A afetividade foi convertida em princípio jurídico tendo força normativa, impondo dever e obrigação aos membros da família, ainda que, na prática destes o afeto tenha desaparecido. A nova vertente do direito de família é a socioafetividade com importante fundamento o princípio da dignidade humana como garantia das relações afetivas, com o intuito de proteger o interesse do filho afetivo, onde são interrompidos os direitos dos pais quando se dá início os inerentes à criança, que são assegurados no corpo da Carta Magna.

O Código Civil trás em seus dispositivos, cristalinas referencias que manifestam a preferência do legislador pela escolha da paternidade socioafetiva que abre a possibilidade de outra origem de paternidade, elencado no art. 1.593, e ainda a igualdade entre os filhos, biológicos ou não, gerados no casamento ou não. E se tratando de presunção de paternidade, é elucidado no art. 1605: “Art.1605: Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito. ” O reconhecimento da posse do estado de filiação, originado do comportamento afetivo perante o filho, senão, vejamos:

Sendo assim, a partir do momento em que for constatada a socioafetividade na esfera familiar, não poderá ser desfeita. A paternidade socioafetiva não pode ser revogada, pois, o que é realmente frisado nessa relação é a presença do pai, a proteção, os cuidados, todo o amor, carinho que é depositado no filho, os laços afetivos que são construídos dentro do lar e diante da sociedade, como menciona Nogueira: “O verdadeiro sentido nas relações pai-mãe-filho transcende a lei e o sangue, não podendo ser determinado de forma escrito nem comprovado cientificamente, pois tais vinculados são mais sólidos e mais profundos, são invisíveis aos olhos científicos, mas são visíveis para aqueles que não têm os olhos limitados, que podem enxergar os verdadeiros laços que fazem de alguém um pai: os lações afetivos, tal forma que os verdadeiros pais são os que amam e dedicam a sua vida a uma criança, pois o amor depende de detê-lo e de dispor a dá-lo. Pais, conforto, sendo estes para os sentidos dela só seu “porto-seguro”. Esse vínculo, por certo, nem a lei e nem o sangue garantem. O vínculo de sangue tem um papel definitivamente secundário para a determinação da paternidade; a era da veneração biológica cede espaço a um novo valor que se agiganta: o afeto, porque o relacionamento mais profundo entre pais e filhos transcende os limites biológicos, ele se faz no olhar amoroso, no pagá-lo nos braços, em afaga-lo, em protege-lo, e este é o vínculo que se cria e não que se determina […]”.” (NOGUEIRA, 2001, p.84 e 85.)

Perante ao exposto, para figurar a paternidade socioafetiva, leva-se em consideração a questão afetiva, e não a semelhança sanguínea.

5 O afeto como dever jurídico e o princípio constitucionalmente protegido

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A constituição federal não expressa o princípio da afetividade, sendo preciso levar em consideração a real importância na resolução de conflitos, consistindo na valoração do princípio da dignidade humana, segundo Maria Helena Diniz: “Princípio da afetividade, corolário do respeito da dignidade da pessoa humana, como norteador das relações familiares e da solidariedade familiar”. (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 5: Direito de Família. 30 ed. São Paulo. Saraiva, 2015, p. 38).

No direito de família, a afetividade é vista como base para toda e qualquer discussão que envolva o vínculo familiar e é usada para a construção do novo direito de família como extensão do princípio da dignidade da pessoa humana.

A questão da afetividade pode ser vista de duas formas; como estrutura para o vínculo paterno-filiais e como uma maneira de impedir o fim destes vínculos, dificultando, logo a descaracterização da família. Nesse sentido, ensina o ilustre doutrinador Paulo Lobo: “Em outras palavras, para que possa ser impugnada a paternidade independentemente do tempo de seu exercício, terá o marido da mãe que provar não ser o genitor, no sentido biológico (por exemplo, o resultado de exame de DNA) e, por esta razão, não ter sido constituído o estado de filiação, de natureza sócio afetiva; e se foi o próprio declarante perante o registro de nascimento, comprovar que teria agido induzido em erro ou em razão de dolo ou coação. A Constituição rompeu com os fundamentos da filiação na origem biológica e na legitimidade, quando igualou os filhos de qualquer origem, inclusive os gerados por outros pais. Do mesmo modo, o Código Civil de 2002 girou completamente da legitimidade e de sua presunção, em torno da qual a legislação anterior estabeleceu os requisitos da filiação, para a paternidade de qualquer origem, não a radicando mais e exclusivamente na origem genética. Portanto, a origem genética, por si só,não é suficiente para atribuir ou negar a paternidade, por força da interpretação sistemática do Código Civil e de sua conformidade com a Constituição. (LÔBO, 2009, p. 224)

O princípio da dignidade da pessoa humana está manifestado no art. 1º, inciso III e art. 226, caput da Constituição Federal. “Art. 1º. A república federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos estados e municípios e do Distrito Federal, constitui-se em estado democrático de direito e tem como fundamentos:

III- A dignidade da pessoa humana;

Art. 226º. A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado “.

É nítido que a paternidade afetiva tem resguardo constitucional, tanto para a estrutura familiar, como quanto para meios iniciais de construção da família.

5.1 Divergência jurisprudencial

Não obstante o amparo explanado no texto constituinte, bem como na legislação infraconstitucional, a os entendimentos ainda não são pacíficos, pois, mesmo que a convivência esteja caracterizada, não é certa a concessão da paternidade socioafetiva, destacando-se os consecutivos julgados. “DIREITO DE FAMÍLIA. AÇAO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. EXAME DE DNA NEGATIVO. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Em conformidade com os princípios do Código Civil de 2002 e da Constituição Federal de 1988, o êxito em ação negatória de paternidade depende da demonstração, a um só tempo, da inexistência de origem biológica e também de que não tenha sido constituído o estado de filiação, fortemente marcado pelas relações sócio afetivas e edificado na convivência familiar. Vale dizer que a pretensão voltada à impugnação da paternidade não pode prosperar, quando fundada apenas na origem genética, mas em aberto conflito com a paternidade sócio afetiva. 2. No caso, as instâncias ordinárias reconheceram a paternidade sócio afetiva (ou a posse do estado de filiação), desde sempre existente entre o autor e as requeridas. Assim, se a declaração realizada pelo autor por ocasião do registro foi uma inverdade no que concerne à origem genética, certamente não o foi no que toca ao desígnio de estabelecer com as então infantes vínculos afetivos próprios do estado de filho, verdade em si bastante à manutenção do registro de nascimento e ao afastamento da alegação de falsidade ou erro. 3. Recurso especial não provido”. (STJ -REsp 1059214 RS 2008/0111832-2, REL MININSTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, Julgamento: 16/02/2012)

“EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA. ADOÇÃO INFORMAL. PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO. PATERNIDADE AFETIVA. POSSE DO ESTADO DE FILHO. PRINCÍPIO DA APARÊNCIA. ESTADO DE FILHO AFETIVO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PRINCÍPIOS DA SOLIDARIEDADE HUMANA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ATIVISMO JUDICIAL. JUIZ DE FAMÍLIA. DECLARAÇÃO DA PATERNIDADE. REGISTRO. A paternidade sociológica é um ato de opção, fundando-se na liberdade de escolha de quem ama e tem afeto, o que não acontece, às vezes, com quem apenas é a fonte geratriz. Embora o ideal seja a concentração entre as paternidades jurídica, biológica e socioafetiva, o reconhecimento da última não significa o desapreço à biologização, mas atenção aos novos paradigmas oriundos da instituição das entidades familiares. Uma de suas formas é a "posse do estado de filho", que é a exteriorização da condição filial, seja por levar o nome, seja por ser aceito como tal pela sociedade, com visibilidade notória e pública. Liga-se ao princípio da aparência, que corresponde a uma situação que se associa a um direito ou estado, e que dá segurança jurídica, imprimindo um caráter de seriedade à relação aparente. Isso ainda ocorre com o "estado de filho afetivo", que além do nome, que não é decisivo, ressalta o tratamento e a 73 reputação, eis que a pessoa é amparada, cuidada e atendida pelo indigitado pai, como se filho fosse. O ativismo judicial e a peculiar atuação do juiz de família impõe, em afago à solidariedade humana e veneração respeitosa ao princípio da dignidade da pessoa, que se supere a formalidade processual, determinando o registro da filiação do autor, com veredicto declaratório nesta investigação de paternidade socioafetiva, e todos os seus consectários. APELAÇÃO PROVIDA, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70008795775, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 23/06/2004)

E em sentido oposto, entendeu-se também que o fator biológico é imprescindível para que seja reconhecida a paternidade: “ APELAÇÃO CÍVEL – NEGATÓRIA DE PATERNIDADE – REGISTRO DE NASCIMENTO – VÍCIO DE CONSENTIMENTO – AUSÊNCIA DE VÍNCULO GENÉTICO – PATERNIDADE SÓCIO-AFETIVA NÃO CONFIGURADA – ALIMENTOS – EXONERAÇÃO. 1. PROVADO QUE O AUTOR NÃO É O PAI BIOLÓGICO DO RÉU E QUE HOUVE VÍCIO DE CONSENTIMENTO NO MOMENTO EM QUE REGISTROU O RÉU COMO SEU FILHO NATURAL, NÃO HAVENDO VÍNCULO AFETIVO APTO A CARACTERIZAR A PATERNIDADE SÓCIO-AFETIVA, O REGISTRO DE NASCIMENTO DO RÉU DEVE SER RETIFICADO. 2. NÃO HAVENDO RELAÇÃO DE PARENTESCO E NÃO SENDO RECONHECIDA A PATERNIDADE SÓCIO-AFETIVA, DEVE O AUTOR SER EXONERADO DA OBRIGAÇÃO DE PAGAR PENSÃO ALIMENTÍCIA AO RÉU. 3. DEU-SE PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR. (TJ-DF – APC: 20100210012815 DF 0001273-90.2010.8.07.0002, Relator: SÉRGIO ROCHA, Data de Julgamento: 07/05/2014, 2ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 09/05/2014 . Pág.: 114)

Tomando por base as jurisprudências expostas, é nítido que, em uma o julgador tomou o afeto como principal visão e no outro, baseou-se apenas nas questões biológicas.

6 Fundamento para garantia da segurança jurídica e proteção da dignidade humana.

Ao decorrer do trabalho, foi demonstrado que a jurisprudência tem se posicionado atualmente, adotando a relação paterno-filial em decorrência da posse de estado de filho.

A paternidade sociológica é fato, sendo estimada como valor jurídico no atual direito de família. A filiação não leva ao pé da letra o vínculo biológico que existe entre indivíduos, mas sim, o liame afetivo, fraternal voluntaria. O tempo amoldaa sociedade fazendo com que existam novas necessidades, partindo barreiras antes instransponíveis. A partir do momento em que o direito de família fora constitucionalizado, promoveu um novo entendimento do sistema que antes era estagnado.

Valer-se das palavras de Maria Berenice Dias: “É no direito das famílias onde mais se sente o reflexo dos princípios eleitos pela Constituição Federal, que consagrou como fundamentais valores sociais dominantes. Os princípios que regem o direito das famílias não podem distanciar-se da atual concepção da família dentro de sua feição desdobrada em múltiplas facetas. A Constituição consagra alguns princípios, transformando-se em direito positivo, primeiro passo para a sua aplicação” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – Direito de Família – São Paulo: Saraiva, 2007.)

É valido destacar que a constitucionalização do direito de família foi demasiadamente importante no avanço dos direitos e garantias fundamentais da proteção do instituto familiar, baseando-se no princípio da dignidade humana.

7 Prova da filiação paternal

A certidão de nascimento é a prova mais importante no quesito da filiação, preceituado no art. 1603 do CC, até que se tenha provas contraditórias. Ainda, o art. 1605 do mesmo dispositivo legal prevê outras maneiras de filiação, quais sejam: “Art. 1.605. Na falta, ou defeito, do termo de nascimento, poderá provar-se a filiação por qualquer modo admissível em direito:

I – quando houver começo de prova por escrito, proveniente dos pais, conjunta ou separadamente;

II – quando existirem veementes presunções resultantes de fatos já certos”.

Embora não seja expresso, a posse de estado de filho é fator determinante para a condição de paternidade, e o intuito basilar do registo de certidão de nascimento é fazer prova da filiação.

8 Posse do estado de filho

O estado de filho permite o estabelecimento da filiação, podendo ocorrer por um fato natural, ou seja, por meio de gestação ou por meio da adoção. Originando-se da verdade biológica ou jurídica, alguns doutrinadores afirmam que existe uma nova forma de estado de filho, sendo a verdade afetiva, possuindo quatro características:

– A indivisibilidade: afirma que que a pessoa não pode possuir mais de um estado ao mesmo tempo, ou seja, ser filho decorrente de um matrimonio civil e ser filho de uma relação não matrimonializada.

– A indisponibilidade: diz que o indivíduo não pode dispor do que a lei atribui, não devendo abrir mão destes.

– A imprescritibilidade: é aquela que, mesmo quando o detentor do direito se mantem inerte por tempo indeterminado, ou como o passar do tempo, poderá reivindica-los a qualquer tempo.

– A aquisição mediante posse: esta existia mesmo antes de institutos de registro de nascimento, pois, tinha-se a paternidade presumida.

A posse do estado de filho, é a relação clara e publica de um vínculo natural existente entre pais e filhos, assim como conceitua José Bernardo Ramos Boeira: “A posse de estado de filho é uma relação afetiva, íntima e duradoura, caracterizada pela reputação frente a terceiros como se filho fosse, e pelo tratamento existente na relação paterno-filial, em que há o chamamento de filho e a aceitação do chamamento de pai”.

Dessa maneira, a doutrina é elencado três elementos da posse de estado de filho: o nome, o trato e a fama; que são inerentes ao estado de filiação.

– O nome: é elemento da posse do estado de filho, pois caracteriza o uso do patronímico do pai, ou seja, adquire o nome da família que a cria;

– O trato: é o elemento analisado que é dispensado à criança referente aos seus direitos inerentes, como educação, criação;

– A fama: é o fato publicamente notório, que chega a conhecimento da maior parte da sociedade, levando o conhecimento da relação de posse do estado de filho.

O Código Civil de 1916 estabelece em prol da proteção da família, a presunção da paternidade, e em nada mencionou acerca da posse do estado de filho; entretanto, o atual dispositivo legal não reconhece a posse do estado de filho, mas abre possibilidade de reconhecer pela paternidade socioafetiva, nos arts. 1953 e 1605, citados acima.

A posse do estado de filho não deve ser apenas por meios probatórios, mas deve ter o caráter jurídico como principal elemento de perfilhação na paternidade socioafetiva.

Conclusão

Em suma, a afetividade é cada vez mais latente, deixando de lado questões engessadas, antiquadas e formais, dando espaço para os interesses reais para os quais as leis são destinadas, que é a proteção e bem estar de todos.

A Constituição Federal de 1988, e o Código Civil de 2002, e ainda diversos doutrinadores e entendimentos, preencheram a latente lacuna relacionada à paternidade socioafetiva, pois esses dispositivos determinaram deveres e obrigações, e ainda, garantiram ao filho afetivo a oportunidade de ter a brecha paternal recheada, podendo assim ser usufrutuário da condição d de filho.

Sendo assim, não há que se discutir que a equiparação dos filhos biológicos e afetivos está cada vez mais distante de ocorrer, pois o direito à reconhecimento do estado de filho afetivo lhe é garantido, já que as vertentes do direito brasileiro acompanham a evolução da sociedade, e prioriza considerar o conceito social e caracteriza um avanço benéfico e protecionista da legislação vigente, além de fazer apontamentos para as novas leis que virão.

 

Referências
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JusBrasil. Jurisprudência – Paternidade Sócio afetiva. Disponível em: <http://www. jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=PATERNIDADE+S%C3%93CIO-AFETIVA>. Acesso em 01 de Maio de 2016
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NOGUEIRA, Jaqueline Filgueiras. A Filiação que se costrói: O reconhecimento do afeto como valor jurídico. São Paulo: Memória Jurídica, 2001. Acesso em 01 de Maio de 2016
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NOGUEIRA, Jaqueline Filgueiras. A Filiação que se constrói: O reconhecimento do afeto como valor jurídico. São Paulo: Memória Jurídica, 2001, p.84 e 85. Acesso em 01 de Maio de 2016
ARP. Arnaldo, Rizzardo& Porto, Advogados associados. Paternidade sócioafetiva – Disponível em: <http://www.rizzardoadvogados.com.br/artigos/paternidade-socio-afetiva.html>Acesso em 01 de Maio de 2016
BENTO, Daniela Roberta. A importância da paternidade socioafetiva frente ao direito brasileiro. Disponível em: <http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/669/692>Acesso em 01 de Maio de 2016
DE LIMA, Adrian Karla. Reconhecimento da paternidade socioafetiva e suas consequências no mundo jurídico. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/monografia-tcc-tese,reconhecimento-da-paternidade-socioafetiva-e-suas-consequencias-no-mundo-juridico,31839.html>Acesso em 01 de Maio de 2016
 
Nota
[1] Trabalho orientado pelo Prof. Paulo Cesar Colombo, professor, advogado especialista em Direito Educacional.


Informações Sobre os Autores

Ana Carolina Schimicoski

Acadêmica de Direito nas Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul

Paulo Cesar Colombo

especialista em Direito Processual Civil e em Direito de Família e Sucessões, professor das Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul-SP FUNEC


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