A morosidade na tramitação dos processos e a falta de efetividade das decisões judiciais fazem parte de uma realidade, com a qual, há muito tempo, vem se deparando o Poder Judiciário.
Tais problemas tornam-se ainda mais evidentes no âmbito das execuções de títulos judiciais e extrajudiciais, que, na prática, têm-se mostrado campo fértil para a utilização, por parte do devedor, de toda sorte de expedientes protelatórios, com o único objetivo de dificultar, ao máximo, a satisfação de um direito legitimamente reconhecido e conferido ao credor.
Esta situação contribui, sobremaneira, para aumentar o descrédito no sistema judicial brasileiro e o clima de insegurança nas relações sociais e econômicas.
Dentro deste contexto, e com o escopo de aperfeiçoar e racionalizar a atividade jurisdicional desempenhada pelo Estado, foi promulgada a Emenda Constitucional n.º45, que, além de acrescentar ao rol dos direitos e garantias fundamentais “o direito à razoável do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (art. 5.º, LXXVIII), apresentou medidas diversas, tais como o instituto da repercussão geral nos recursos extraordinários e a súmula vinculante, que refletem uma preocupação com a tempestividade e efetividade na solução dos litígios.
Estes mesmos objetivos serviram de inspiração para as recentes reformas implementadas no Código de Processo Civil, especialmente no tocante ao processo de execução, que, como é cediço, nem sempre consegue propiciar ao exeqüente o bem da vida pleiteado.
Dentre as alterações legislativas, merece destaque a regra contida no art. 655-A do CPC, introduzido pela lei 11.382/06, que passou a prever expressamente, no ordenamento jurídico pátrio, a penhora de dinheiro por meio eletrônico, a denominada penhora on-line.
Muito embora não se trate de um novo método de penhora, posto que já vinha sendo empregado, desde o ano de 2001, por alguns tribunais (destacando-se, neste ponto, a Justiça do Trabalho), a sua inclusão no diploma processual serve para conferir-lhe uma maior legitimidade, bem como para ampliar a sua utilização.
A penhora on-line surgiu como uma alternativa ao vetusto sistema de bloqueio de valores mediante a expedição de ofício, em papel, dirigido ao Banco Central, o que acarretava demora no processamento das determinações judiciais e assegurava ao devedor tempo suficiente para retirar todo o dinheiro de sua conta, frustrando, com esta atitude, os propósitos da execução.
A Ministra Fátima Nancy Andrighi, ao discorrer sobre o tema, asseverou com muita propriedade que, naquele momento, vigorava um processo de execução sem resultados, que traduzia, com precisão, o dito popular “ganhar e não levar”.[1]
Fazia-se necessário, portanto, aprimorar o procedimento de penhora de ativos financeiros, de modo a adaptá-lo às exigências do direito processual civil moderno, que visa à produção de resultados concretos, dentro de um prazo razoável.
Através de um esforço conjunto do Banco Central e de diversos segmentos do Poder Judiciário, fora criado (e, posteriormente, aperfeiçoado) o sistema BacenJud, permitindo que os pedidos de informações e as ordens de bloqueio, desbloqueio e transferência de valores fossem realizados e processados por via eletrônica, circunstância que, indubitavelmente, contribuiu para imprimir maior celeridade à execução de créditos de quantia certa.
No entanto, o advento deste método de operacionalização da penhora fez surgir, tanto em sede doutrinária, quanto jurisprudencial, inúmeros questionamentos e, até mesmo, críticas.
A resistência de parte dos operadores do direito ao novo modelo tem como fundamento uma suposta violação a direitos fundamentais do devedor e aos princípios que norteiam o processo de execução.
Porém, uma análise mais detida das normas que regulam a penhora on-line é capaz de mostrar a fragilidade dos argumentos contrários e, ao mesmo passo, revelar o importante papel desempenhado por este mecanismo na incessante busca pela efetividade da tutela jurisdicional.
O primeiro aspecto a se ressaltar sobre a penhora realizada através do sistema BacenJud é o fato deste encontrar-se em harmonia com as regras processuais atinentes à execução por quantia certa, mais especificamente com o art. 655 do CPC, que estabelece a ordem preferencial de penhora, determinando que a constrição judicial recaia primeiramente sobre “dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituições financeiras” (inciso I).
Há quem sustente ser a penhora on-line uma violação ao direito à intimidade do executado, porquanto permite que o exeqüente, para satisfazer seu crédito, tenha acesso às contas bancárias daquele.
A tese, contudo, deve ser rechaçada. Consoante a dicção do caput do art. 655-A do CPC, poderá o juiz requisitar “informações sobre a existência de ativos em nome do executado” e, no mesmo ato, “determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução”.
Vê-se, claramente, que as informações a que têm acesso o juiz e o exeqüente limitam-se à existência de créditos suficientes para garantir a dívida, não havendo qualquer comunicação a respeito do saldo ou dos movimentos bancários na conta do executado.
Não há, portanto, que se falar em quebra de sigilo bancário.
Aliás, como bem observou Luiz Guilherme Marinoni, “se o exeqüente não tivesse direito de saber se o executado possui conta corrente ou aplicação financeira, o executado certamente não teria dever de indicar à penhora dinheiro depositado ou aplicado em instituição financeira. Ou melhor, todos teriam o direito de esconder da justiça as suas contas correntes e aplicações financeiras!”.[2]
Também destituída de qualquer fundamento a alegação de que a penhora on-line ofende o princípio da menor onerosidade para o executado.
A penhora de dinheiro por meio eletrônico vem se revelando, na prática, menos onerosa para o devedor, uma vez que elimina despesas com publicação de editais, depósito do bem, remuneração de leiloeiro e outros gastos normalmente verificados nas situações em que a constrição recai sobre outros bens, despesas estas suportadas pelo devedor / executado.
Em linhas gerais, é possível afirmar que a denominada penhora on-line é um instrumento legítimo colocado à disposição do exeqüente, para assegurar a plena satisfação de seu direito e, não obstante as críticas a ele dirigidas, não se pode negar a sua utilidade na defesa do direito fundamental a uma tutela jurisdicional tempestiva e dotada de efetividade.
Informações Sobre o Autor
Rossana dos Santos Tavares
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Amazonas – UFAM. Pós-graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL