Princípio da igualdade e a teoria do impacto desproporcional

Resumo: O presente artigo tem por objetivo a análise do princípio da igualdade, sob os aspectos material e formal, bem como das ações afirmativas e da teoria do impacto desproporcional. Foi estudado também o posicionamento do Supremo Tribunal Federal quanto à matéria, principalmente no que diz respeito às ações afirmativas e teoria do impacto desproporcional. O método usado foi o dedutivo, fundamentado por meio de livros, doutrinas, artigos científicos e jurisprudência.

Palavras-chave: Princípio da Igualdade – Igualdade Material- Igualdade Formal – Ações afirmativas – Teoria do Impacto Desproporcional

Abstract: This article aims to analyze the principle of equality under the aspects formal and material, as well as affirmative action and the theory of disproportionate impact. They were also studied the position of the Supreme Court on the matter, especially with regard to affirmative action and theory of disproportionate impact. The method used was deductive, based through books, doctrines, scientific articles and jurisprudence.

Keywords: Principle of Equality – Equality materially Formal Equality – Affirmative action – Disproportionate Impact Theory

Sumário: Introdução. 1. Princípio da Igualdade. 1.1. Igualdade Formal. 1.2 Igualdade Material. 2. Ações Afirmativas 3. Teoria do Impacto Desproporcional. Conclusão. Referências.

INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é analisar a teoria do impacto desproporcional e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.

Inicialmente será estudado o princípio da igualdade, seu conceito e aspectos material e formal. Serão ainda objeto de apreciação as ações afirmativas, desdobramento da igualdade formal, que no prisma étnico-racial foi objeto de ação de descumprimento de preceito fundamental- ADPF julgada pelo Supremo Tribunal Federal- STF.

Por fim, o trabalho aprofundou-se no estudo da Teoria do Impacto Desproporcional, com exemplos práticos de sua ocorrência.

1. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Fruto da Revolução Francesa, a declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada em 02 de outubro de 1789, já previa em seu primeiro artigo: "Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundamentar-se na utilidade comum".

Em 10 de dezembro de 1948, foi adotada pela Assembleia Geral da Organização das nações Unidas- ONU a Declaração Universal dos Direitos Humanos- DUDH, em que diversos países, abalados pela barbárie ocorrida na Segunda Guerra Mundial, comprometeram-se a adotar medidas para garantir o cumprimento e fortalecimento dos direitos humanos. Em seu artigo I, a declaração preconiza: "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação  uns aos outros com espírito de fraternidade."

Na esteira desses relevantes documentos, a Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988, no art. 5°, caput, positivou o princípio da igualdade, quando firmou que "todos são iguais perante a lei".

Como se pode perceber, desde a Revolução Francesa, o princípio da igualdade ganha forças e vem se estabelecendo como imprescindível para os regimes republicanos e democráticos.

Nas palavras de Dirley da Cunha Júnior,

“A respeito do tema, cumpre mencionar que Rosseau viu, na espécie humana, duas modalidades de desigualdade. Uma desigualdade natural ou física, imposta pela natureza, consistente na distinção de idades, da saúde, das forças do corpo e das qualidades do espírito ou da alma. E uma desigualdade moral ou política, decorrentes de convenções estabelecidas ou autorizada pelo consentimento dos homens, e que consiste nos diferentes privilégios que alguns gozam em detrimento de outros, como serem mais ricos, mais importantes e mais poderosos.

Em sua clássica obra Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens, Rosseau vai apontar o momento em que a natureza foi substituída pela lei, e, consequentemente, a partir de quando o homem, outrora livre, passou a sofrer distinções. Afirma que "a desigualdade, sendo quase nula no estado de natureza, extrai sua força e seu crescimento do desenvolvimento de nossas faculdades e do progresso do espírito humano e torna-se enfim estável e legítima pelo estabelecimento da propriedade e das leis. Conclui-se ainda que a desigualdade moral, autorizada unicamente pelo direito positivo, é contrária ao direito natural todas as vezes em que não coexiste, na mesma proporção, com a desigualdade física; distinção que determina suficientemente o que se deve pensar a esse respeito da espécie de desigualdade que reina entre todos os povos policiados, já que é claramente contra a lei da natureza, seja qual for a maneira por que a definamos, uma criança mandar num velho, um imbecil conduzir um homem sábio e um punhado de gente regurgitar de superfluidades enquanto a multidão esfaimada carece do necessário[1]”.

Mas em que consiste a igualdade? A doutrina costuma classificar o princípio sob dois aspectos: o formal e o material.

1.1 Igualdade Formal

O princípio da igualdade formal, num primeiro momento, está voltado para o legislador, que deve observar a equivalência dos indivíduos quando da formulação das leis, para que não haja em seu texto algum fator de discriminação capaz de violar a isonomia. Num prisma mais concreto, refere-se à aplicação da lei, momento em que é vedada a adoção de critérios que ensejem tratamento seletivo ou discriminatório.

Destarte, a igualdade formal tem como característica uma concepção estática, negativa, fundada na mera abstenção estatal na constituição de privilégios, resultante da instituição do Estado de Direito em oposição ao regime monárquico absolutista.

José Afonso da Silva faz uma relevante distinção de igualdade na lei e igualdade perante a lei:

“A igualdade perante a lei corresponde a obrigação de aplicar as normas jurídicas gerais aos casos concretos, na conformidade como o que eles estabelecem, mesmo se delas resultar uma discriminação, o que caracteriza a isonomia puramente formal, enquanto a igualdade na lei exige que, nas normas jurídicas, não haja distinções que não sejam autorizadas pela própria constituição. Enfim, segundo a doutrina, a igualdade perante a lei seria uma exigência feita a todos aqueles que aplicam as normas jurídicas gerais aos casos concretos, ao passo que a igualdade na lei seria uma exigência dirigida tanto àqueles que criam as normas jurídicas gerais como àqueles que as aplicam aos casos concretos”.

A igualdade formal, embora tenha relevantíssimo valor axiológico, é incapaz, por si só, de contribuir para a reversão de situações de desigualdade, missão atribuída aà igualdade material.

1.2 Igualdade Material

A igualdade material busca concretizar o preceito constitucional por meio de instrumentos de promoção social e jurídica, tenso em vista que a mera igualdade formal não seria capaz de fornecer a alguns indivíduos as mesmas oportunidades de que desfrutam aqueles socialmente privilegiados.

Isso porque a igualdade prevista na Constituição Federal de 1988 não prevê a total equivalência entre indivíduos, mas sim aquilo que os doutrinadores chamam de isonomia: equivalência apenas daqueles que se encontram na mesma situação.  Segundo célebre frase de Rui Barbosa,

“A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade… Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real[2].”

Do exposto extrai-se a impossibilidade de qualquer fator que viole a isonomia, seja na edição da lei, seja na sua aplicação. Contudo, há critérios discriminatórios que mostram-se legítimos, autorizando a distinção de pessoas e situações para fins de tratamento jurídico diverso. Essa interpretação visa da concretude ao princípio da isonomia. Trata-se das discriminações positivas e das ações afirmativas.

2. AÇÕES AFIRMATIVAS

As ações afirmativas caracterizam-se pela adoção de medidas por qualquer dos poderes da República, voltada para grupos sociais que, por razões históricas, estão em situação de desigualdade material.

Assim, cria-se um critério positivo de discriminação, alguns inclusive previstos na Constituição, como a adoção de incentivos específicos para a proteção do mercado de trabalho da mulher (art. 7º, XX) e a determinação de reserva de percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência (art. 37, VIII).

Nesse cenário está inserida a política de cotas, discriminações positivas adotadas pelo critério étnico-racial (reserva de 20% das vagas em concursos e instituições de ensino superior públicas), tema objeto de Ação de Descumprimento de Preceito Constitucional, ajuizada pelo Partido Democratas- DEM sob o argumento de que tal ação ofenderia a igualdade estabelecida na Constituição, haja vista a discriminação supostamente existente no Brasil ser fruto de uma questão social, e não racial.

O Supremo Tribunal Federal, analisando o caso, assim decidiu (destaques não existentes no original):

“Ementa: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. ATOS QUE INSTITUÍRAM SISTEMA DE RESERVA DE VAGAS COM BASE EM CRITÉRIO ÉTNICO-RACIAL (COTAS) NO PROCESSO DE SELEÇÃO PARA INGRESSO EM INSTITUIÇÃO PÚBLICA DE ENSINO SUPERIOR. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 1º, CAPUT, III, 3º, IV, 4º, VIII, 5º, I, II XXXIII, XLI, LIV, 37, CAPUT, 205, 206, CAPUT, I, 207, CAPUT, E 208, V, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. I – Não contraria – ao contrário, prestigia – o princípio da igualdade material, previsto no caput do art. 5º da Carta da República, a possibilidade de o Estado lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminados de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares. II – O modelo constitucional brasileiro incorporou diversos mecanismos institucionais para corrigir as distorções resultantes de uma aplicação puramente formal do princípio da igualdade. III – Esta Corte, em diversos precedentes, assentou a constitucionalidade das políticas de ação afirmativa. IV – Medidas que buscam reverter, no âmbito universitário, o quadro histórico de desigualdade que caracteriza as relações étnico-raciais e sociais em nosso País, não podem ser examinadas apenas sob a ótica de sua compatibilidade com determinados preceitos constitucionais, isoladamente considerados, ou a partir da eventual vantagem de certos critérios sobre outros, devendo, ao revés, ser analisadas à luz do arcabouço principiológico sobre o qual se assenta o próprio Estado brasileiro. V – Metodologia de seleção diferenciada pode perfeitamente levar em consideração critérios étnico-raciais ou socioeconômicos, de modo a assegurar que a comunidade acadêmica e a própria sociedade sejam beneficiadas pelo pluralismo de ideias, de resto, um dos fundamentos do Estado brasileiro, conforme dispõe o art. 1º, V, da Constituição. VI – Justiça social, hoje, mais do que simplesmente redistribuir riquezas criadas pelo esforço coletivo, significa distinguir, reconhecer e incorporar à sociedade mais ampla valores culturais diversificados, muitas vezes considerados inferiores àqueles reputados dominantes. VII – No entanto, as políticas de ação afirmativa fundadas na discriminação reversa apenas são legítimas se a sua manutenção estiver condicionada à persistência, no tempo, do quadro de exclusão social que lhes deu origem. Caso contrário, tais políticas poderiam converter-se benesses permanentes, instituídas em prol de determinado grupo social, mas em detrimento da coletividade como um todo, situação – é escusado dizer – incompatível com o espírito de qualquer Constituição que se pretenda democrática, devendo, outrossim, respeitar a proporcionalidade entre os meios empregados e os fins perseguidos. VIII – Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente.” (ADPF 186, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-205 DIVULG 17-10-2014 PUBLIC 20-10-2014)

Assim, estabeleceu a Suprema Corte a validade de discriminação positiva com vistas a estimular a inclusão social de grupos excluídos. Segundo Celso Antônio Bandeira de Melo, para que sejam válidas, as ações afirmativas devem guardar uma pertinência lógica entre a distinção inserida na lei e o tratamento distinto dela consequente.

3. TEORIA DO IMPACTO DESPROPORCIONAL

A teoria do impacto desproporcional nasceu nos Estados Unidos da América e trata-se de uma distorção na aplicação do princípio da igualdade.

Percebeu-se que em algumas oportunidades, o Estado ou o particular, adota uma medida buscando promover a igualdade; contudo, na prática, essa ação que nasceu bem intencionada, acaba gerando uma discriminação indireta de algum grupo vulnerável.

No âmbito legislativo, isso ocorre porque nem sempre é possível ao legislador, quando da formulação da lei, ter a dimensão do impacto da sua obra legislativa. É o caso da lei que, pelo texto, não se extrai qualquer vulneração à isonomia, mas sua aplicação, no caso concreto, incorre em discriminação. É a chamada teoria do impacto desproporcional.

Segundo Joaquim Barbosa, ex- Ministro do Supremo Tribunal Federal, a teoria do impacto desproporcional consiste em:

“Toda e qualquer prática empresarial, política governamental ou semigovernamental, de cunho legislativo ou administrativo, ainda que não provida de intenção discriminatória no momento de sua concepção, deve ser condenada por violação do princípio constitucional da igualdade material se, em consequência de sua aplicação, resultarem efeitos nocivos de incidência especialmente desproporcional sobre certas categorias de pessoas” (Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade, Renovar, 2001, p. 24).

O leading case foi um caso (Griggs v. Duke Power Co., 1971), julgado pela Suprema Corte Norte Americana: como critério para promoção de funcionários, uma empresa americana aplicava testes de conhecimentos gerais. A medida, aparentemente neutra, acabou por possibilitar a promoção somente daqueles funcionários que tinham estudado nas melhores escolas. Como tais funcionários eram, em regra, brancos, a ação provocou uma distorção: só funcionários brancos eram promovidos; os negros, por terem estudados em escolas piores, eram preteridos. Isso levou a Suprema Corte Americana a vedar o teste, por afronta à isonomia.

Registre-se, como dito alhures, que em tese, a prática foi pensada como atividade imparcial, e só com sua aplicação foi possível verificar a ocorrência de discriminação indireta.

É imperioso ressaltar que no caso americano a discriminação não foi fruto de lei, mas de prática empresarial, também submetida ao princípio da igualdade, por força da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

No Brasil, a teoria foi aplicada pelo Supremo Tribunal Federal- STF numa ação direta de inconstitucionalidade que tratava do salário maternidade (ADI 1946/DF), quando consignou que , a pretexto de proteger a mulher, no caso concreto, a lei poderia dificultar a inserção da mulher no mercado de trabalho, mercê dos encargos trabalhistas.

Eis elucidativo trecho do voto da lavra do Ministro Sidney Sanches, quando do julgamento da medida cautelar:

“Na verdade, se se entender que a Previdência Social, doravante, responderá por apenas R$1.200,00 (hum mil e duzentos reais) por mês, durante a licença gestante, e que o empregador responderá, sozinho, pelo restante, ficará sobremaneira facilitada e estimulada a opção deste pelo trabalhador masculino, ao invés da mulher trabalhadora.

Estará, então, propiciada a discriminação que a  Constituição buscou combater, quando proibiu a diferença de salários, exercícios de funções e critérios de admissão, por motivo de sexo (art. 7°, inc. XXX, da C.F./88), proibição que, em substancia, é um desdobramento do princípio da igualdade de direitos, entre homens e  mulheres, previsto no inciso I do art 5° da Constituição Federal.”

Logo após relembrar o caso Griggs v.Duke Power Co., afirmou o Min. Nelson Jobim no seu voto:

“A regra da EC. 20/98, aparentemente neutra, produz discriminação não desejada pelo próprio legislador. As práticas de mercado passarão a responder com discriminação, quanto ao emprego da mulher. Não podem ser mantidos os atos que induzem às práticas

discriminatórias. A doutrina chama de efeitos ou impactos desproporcionais ("disparate impact").

O Tribunal tem que examinar as conseqüências da legislação para constatar se estão, ou não, produzindo resultados contrários à Constituição. A discriminação positiva introduz tratamento desigual

para produzir, no futuro e em concreto, a igualdade. É constitucionalmente legítima, porque se constitui em instrumento para obter a igualdade real. No caso, a regra induz à discriminação proibida, como demonstrei.

Ter-se-ia um resultado contrário à regra constitucional proibitiva da discriminação, em matéria de emprego, de sexo, origem, raça ou profissão.

Por essas razões, acompanho o Relator e dou interpretação conforme a Constituição. À licença-maternidade não se aplica a limitação estabelecida no artigo 14 da EC. 20.”

Em outro caso bastante significativo, o STF foi chamado a se manifestar acerca da recepção, ou não, pela Constituição Federal de 1988, do crime militar de pederastia (art. 235, CPM). Eis o dispositivo impugnado:

“Art. 235. Praticar, ou permitir o militar que com êle se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito a administração militar:

Pena – detenção, de seis meses a um ano”.

O julgado declarou a recepção do delito, mas não das expressões alusivas à homossexualidade. Utilizando-se da teoria do impacto desproporcional, o Ministro Luis Roberto Barroso assim consignou (ADPF291):

 “60. Torna-se, assim, evidente que o dispositivo, embora em tese aplicável indistintamente a atos libidinosos homo ou heterossexuais, é, na prática, empregado de forma discriminatória, produzindo maior impacto sobre militares gays. Esta é, portanto, uma típica hipótese de

discriminação indireta, relacionada à teoria do impacto desproporcional (disparate impact), originária da jurisprudência norte-americana8. Tal teoria reconhece que normas pretensamente neutras podem gerar efeitos práticos sistematicamente prejudiciais a um determinado grupo, sendo manifestamente incompatíveis com o princípio da igualdade9.(…)

62. Justamente, a aplicação prática do art. 235 do CPM o transforma em um instrumento de criminalização e discriminação de uma determinada opção sexual, de modo a violar a isonomia (CRFB/1988, art. 5º, caput). Em outras palavras, a manutenção de um dispositivo que torna crime militar o sexo consensual entre adultos, ainda que sem a carga pejorativa das expressões “pederastia” e “homossexual ou não”, produz, apesar de sua aparente neutralidade e em razão do histórico e das características das Forças Armadas, um impacto desproporcional sobre homossexuais, o que é incompatível com o princípio da igualdade.”

CONCLUSÃO

O postulado da igualdade afigura-se como um dos pilares do Estado Democrático de Direito, e sendo positivado, desde o século XVIII, em Constituições dos mais diversos Estados.

No ordenamento jurídico brasileiro, a igualdade deve ser vista por dois aspectos: o formal e o material. O formal busca a igualdade na lei; o material, por sua vez, requer a adoção de medidas para diminuir as disparidades existentes entre vários grupos sociais.

Entre as medidas que podem ser adotadas, estão as ações afirmativas, que caracterizam-se pela adoção critérios de discriminação positiva por qualquer dos poderes da República, voltada para grupos sociais que, por razões históricas, estão em situação de desigualdade material.

A igualdade deve ser promovida também por meio de ações afirmativas, tanto pelo Estado, quanto pelo particular, haja vista a eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Contudo, algumas medidas, apesar de bem intencionadas em sua formulação, mostram-se violadoras da isonomia quando da sua aplicação prática.

Assim, tanto o legislador, quanto particulares, devem redobrar os cuidados quando da elaboração de iniciativas de promoção da igualdade, perquirindo-se acerca de aspectos práticos da medida, a fim de evitar o chamado impacto desproporcional, que é a violação da igualdade por meio de medida aparentemente isonômica.

Contudo, apesar da precaução, caso detectada a ocorrência do impacto desproporcional, a medida deve ser considerada inconstitucional, por violação ao princípio da igualdade.

 

Referências
Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade – O Direito como instrumento de transformação social. A experiência dos EUA. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.
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Notas:
[1] Rosseau, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. Trad. Maria Ermantina Galvão, São Paulo: Martins Fontes, 1999, p.243.

[2] Trecho de discurso no Largo de São Francisco, em São Paulo, intitulado de Oração aos Moços.


Informações Sobre o Autor

Luiza Helena da Silva Guedes

Procuradora da Fazenda Nacional. Graduada em Administração e Direito. Pós-graduada em Direito Constitucional Direito Civil e Processual Civil


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