Sumário: Preâmbulo. Princípios Fundamentais.
Preâmbulo
Antes de entender precisamente o que significa ´princípio fundamental`, é necessária a compreensão do preâmbulo constitucional, que precedente ao próprio texto constitucional.
O preâmbulo de uma Constituição é o documento que define as suas intenções. Para Alexandre de MORAES ele consiste em uma certidão de origem e legitimidade do novo texto e uma proclamação de princípios, rompendo com o ordenamento constitucional anterior e demonstrando o surgimento jurídico de um novo Estado.[1]
Tradição em nosso Direito Constitucional, nele devem constar os antecedentes e o enquadramento histórico da Constituição, bem como as suas justificativas, grandes objetivos e finalidades.
O preâmbulo não faz parte do próprio texto constitucional, mas, no entanto, deve ser observado como elemento de interpretação e integração dos artigos que lhe seguem.
Ele não poderá prevalecer contra o texto expresso da Constituição nem poderá servir de paradigma para uma declaração de inconstitucionalidade. Ele poderá servir, entretanto, como uma das linhas de interpretação da Constituição.
Princípios Fundamentais
O título I da Constituição brasileira é denominado “Dos Princípios Fundamentais” e estabelece que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em um Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos cinco princípios. São eles a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Estes princípios são os fundamentos do Estado Democrático de Direito que é a República Federativa do Brasil.
Estes são os termos em que estão previstos os princípios fundamentais no texto constitucional brasileiro vigente.
Os princípios constituem as vigas mestras do sistema, devendo vincular o intérprete.[2] São eles os princípios mais importantes, daí receberem a qualificação de fundamentais.
A colocação dos princípios fundamentais no início da Constituição expressa o objetivo de permitir ao intérprete fazer uma leitura adequada do texto constitucional de acordo com os objetivos, fundamentos e formas de convívio internacional do Estado brasileiro.[3]
O fato de o Brasil ser um Estado Democrático de Direito significa que o país acolhe o sistema democrático pelo qual o povo elege seus representantes políticos, podendo, inclusive, participar das ações governamentais diretamente. Também significa que o Poder Público deve cumprir a lei antes de tudo, só podendo fazer o permitido e tendo que fazer o que por ela é determinado.
O Estado de Direito resulta de uma evolução dos Estados Nacionais que, a partir da consolidação das revoluções burguesas até o século XVIII, viram-se obrigados a cumprir as leis que eles mesmos faziam. Isto porque outrora, os Monarcas absolutistas não se sentiam obrigados a cumprir determinações legais, afinal, eles “eram” o Estado e faziam as leis.
O regime escolhido pelo sistema brasileiro é o representativo, ou seja, o da democracia indireta. Entretanto, podemos encontrar exemplos de democracia direta, como a iniciativa popular, o plebiscito e o referendum.[4]
Podemos constatar que estamos em um regime republicano do tipo federalista. Isto porque a união indissolúvel entre Estados-membros, Municípios e Distrito Federal forma o Estado republicano do tipo federal. A colocação do Município como ente federado demonstra a posição de destaque que o mesmo ocupa hoje no ordenamento constitucional brasileiro.[5]
A soberania é a característica do Estado não ser subordinado senão ao poder político de sua ordem interna. Isto quer dizer que o Brasil é soberano para não aceitar imposições de qualquer outro país.
A cidadania é um conceito mais amplo e pode significar um conjunto de direitos e obrigações que os cidadãos brasileiros possuem na vida cotidiana para permitir uma convivência pacífica, ordenada e harmoniosa entre todos.
Por cidadania classicamente entendida tínhamos a característica de se fazer parte do povo de um país. Exemplo disto era o título de eleitor usado no Brasil para comprovar a cidadania brasileira nos casos em que alguém impetrava uma ação popular. Isto porque a ação popular somente pode ser impetrada por cidadãos brasileiros.
A dignidade da pessoa humana deve passar por conceitos fluidos como honra e outros. Em virtude de sermos racionais e fazermos partes de uma sociedade composta por muitas pessoas humanas, entende-se por dignidade o respeito ao ser humano nos seus direitos mais importantes e fundamentais.
Origina-se do latim dignitas e quer dizer virtude honra, consideração. O dicionário jurídico define o termo dignidade qualidade moral, que, possuída por uma pessoa humana, serve de base ao próprio respeito em que é tida. Também podemos compreender como o procedimento da pessoa, pelo qual se faz merecedor do conceito público.
Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa podem ser compreendidos como uma síntese entre o capitalismo (livre iniciativa) e a preocupação social com os que trabalham. Busca-se evitar que sejam cometidos abusos como os da época reinante do livre capital em que os seres humanos trabalhavam como empregados sem qualquer direito básico e sujeitos, por exemplo, a jornadas de mais de quatorze horas de trabalho, sem, contudo, o Estado dificultar a atividade econômica por meio de suas intervenções. São as diferentes gerações – primeira e segunda – do direito constitucional convergindo em objetivos fundamentais do Brasil.
O pluralismo político pode ser entendido como a existência de diferentes partidos políticos representando as mais diversas camadas sociais no âmbito político. Ou seja, com o pluralismo político cada grupo social organizado pode instituir um partido político que represente os seus pensamentos e interesses na esfera da produção legislativa.
O pluralismo partidário, por sua vez, conforme DE PLÁCIDO E SILVA, é a doutrina que admite a existência igualitária de vários partidos políticos concorrendo ao exercício do poder público por meio das eleições.
O poder emana do povo e em nome dele é exercido pelos representantes eleitos, ou diretamente, conforme a determinação constitucional. O povo é titular do Poder Constituinte.
Também são estabelecidos os Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, que são o Poder Legislativo, Executivo e Judiciário. Assim, a tripartição de poderes ou das funções do Estado é princípio fundamental, assegurada a autonomia e a harmonia a cada uma das funções legislativa, executiva ou judiciária.
Além do mais, ela é uma cláusula pétrea que não pode ser modificada pelo Poder Reformador. A separação dos poderes é, desta forma, princípio fundamental e cláusula pétrea da Constituição de 1988.
Ao lado das tarefas típicas de cada Poder, existem as tarefas atípicas que servem para assegurar a sua independência e harmonia.
Temos aqui que a separação das funções estatais constitui-se em garantia democrática, por colocar cada um dos membros dos Três Poderes independentes para o exercício das suas funções constitucionais.
Os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil são o de construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e, por último, promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Nas suas relações internacionais, a República Federativa do Brasil deve reger-se pelos princípios da independência nacional; prevalência dos direitos humanos; autodeterminação dos povos; não intervenção; igualdade entre os Estados; defesa da paz; solução pacífica dos conflitos; repúdio ao terrorismo e ao racismo; cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e concessão de asilo político.
A República Federativa do Brasil deve buscar a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.
Os princípios de regência das relações internacionais do Estado brasileiro estão inseridos no art. 4º da nossa Constituição.
Já no campo das relações internacionais, a independência nacional é princípio fundamental a ser observado e assegurado pelo nosso governo no sentido de sempre afirmarmos a nossa independência, a nossa vontade própria, sem sujeição à vontade de outros Estados, sejam eles quais forem.
O princípio da prevalência dos direitos humanos é resultante do movimento internacional pela defesa dos direitos humanos iniciado após o fim da segunda guerra mundial, pela Organização das Nações Unidas. Os direitos humanos continuam sendo cotidianamente violentados e necessitam de uma constante afirmação pelos diferentes países pela sua proteção e garantias dos seres humanos.
A autodeterminação dos povos tem a ver com a independência de cada povo e sua não sujeição a qualquer forma de agressão externa contrária à sua vontade interna, seja ela qual for. Internacionalmente, no entanto, podemos assistir a exemplos de povos que têm a sua auto-determinação vilipendiada pela imposição de valores distintos provenientes das mais diversas potências econômicas.
A não intervenção é no nosso entender parte de um conjunto composto por todas estas formas de convivência internacional em análise. Ou seja, se cada país é soberano, ele também não pode estar sujeito a sofrer intervenção de qualquer outro país, seja ele qual for.
O princípio da igualdade entre os Estados é uma conseqüência da própria realidade de cada Estado nacional, isto é, se todos os Estados possuem um governo, um território e um povo próprio, nenhum deles poderá ser superior ou mais importante no cenário internacional para justificar qualquer desigualdade entre os mesmos.
A defesa da paz é um princípio que pode ser considerado um sonho de toda a humanidade que, a cada dia que passa, encontra-se mais difícil de ser realizado.
A solução pacífica dos conflitos também.
O repúdio ao terrorismo é de primordial importância para a convivência pacífica na sociedade humana. Temos que estar alertas, entretanto, para este repúdio não tornar uma política internacional de usurpação dos direitos humanos dos povos que não possuem meios para defenderem-se, nem muito menos para provarem que não são terroristas.
O Repúdio ao racismo é necessário para eliminar, de uma vez por todas, a mácula da escravização dos seres humanos de diferentes raças, nos mais diversos locais do planeta terra. O racismo de negros, de orientais, ou de qualquer outra raça humana deve ser repudiado no Brasil.
O progresso humano é de interesse de todos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade deve ser tratado como objetivo fundamental do nosso país de forma que não se torne mais uma norma constitucional que não é aplicada pela omissão dos nossos governantes.
A concessão de asilo político é a recepção de estrangeiro por um Estado diferente do seu, em virtude de perseguição por ele sofrida e realizada pelo seu próprio país ou por terceiro. As causas são geralmente dissidência política, livre manifestação do pensamento ou crimes com relação à segurança do Estado que não são delitos no direito penal comum.
Apresenta natureza territorial, bastando ao requerente adentrar nas fronteiras do novo Estado.
Ato de soberania estatal, de competência do Presidente da República. Concedido, o Ministro da Justiça estabelece o prazo de estada e as condições adicionais aos deveres que lhe impõem o direito internacional e a legislação vigente.
A concessão de asilo não é obrigatória para o Estado. Cada Estado e as suas contingências determinarão a escolha do seu governo.
As viagens ao exterior do asilado necessitam de autorização especial do Ministro da Justiça.
A saída sem autorização governamental importa em renúncia ao asilo e impedirá o seu reingresso nessa condição.
O asilado político poderá ser extraditado, desde que, no entanto, o fato que possa ensejar do pedido não apresente características de crime político ou de opinião, pois nestes casos há expressa vedação constitucional (CF, art. 5º, LII).
Observações finais.
Tudo isto é muito bonito, no entanto, o problema é que vivemos hoje num mundo onde os seres humanos estão sendo tratados como meros consumidores. Os povos que representam qualquer barreira para não serem submetidos ao ímpeto comercial dos países que ganham com a globalização, via de regra, são apontados como terroristas e devem ser eliminados. Isto é algo parecido com o que aconteceu com o Afeganistão e vem acontecendo com o Iraque, no início do século XXI, tudo disfarçado sob o manto da democracia.
Informações Sobre o Autor
Francisco Mafra.
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.