Princípios norteadores da Política Nacional das Relações de Consumo

Introdução


É sabido que o Estado intervém nas relações de consumo com o objetivo de atender às necessidades dos consumidores. Objetiva também estabelecer a paz e o equilíbrio nessas relações, compatibilizando os interesses que estão em jogo. Não se pode dizer, assim, que o Código de Defesa do Consumidor constitui um instrumento de combate aos fornecedores de produtos e serviços, mas sim um instrumento para a harmonização das relações de consumo, buscando a satisfação coletiva e o bem-estar social.


A criação de um instrumento legal de defesa do cidadão consumidor é recente no Brasil. Com a implementação do CDC, houve uma inovação no estabelecimento das relações contratuais, propiciando novas formas de contratos. Com isso, o consumidor – considerado parte mais fraca na relação de consumo – passou a dispor de instrumentos capazes de protegê-lo na relação com o fornecedor de produtos e serviços. Preocupado com a intervenção do Estado na sociedade de consumo, o CDC criou um capítulo específico sobre a matéria. Especificamente, no segundo capítulo, trouxe um breve disciplinamento das políticas que o Brasil deve seguir e adotar para que os direitos básicos dos consumidores venham a ser respeitados e protegidos.


Intitulado Da Política Nacional das Relações de Consumo, o capítulo contém apenas dois artigos, estabelecendo os princípios do direito do consumidor e os instrumentos para a execução dessa política, que será efetivada pelo poder público e, principalmente, pela sociedade. Serão estabelecidos, primeiramente, os objetivos e os princípios que regem essa política, para depois apresentar-se os instrumentos.


Objetivo da Política Nacional das Relações de Consumo


O Código de Defesa do Consumidor instituiu a política nacional das relações de consumo com o objetivo de disponibilizar ao consumidor instrumentos capazes de colocá-lo em condições de igualdade perante o fornecedor. A intenção foi fazer com que a defesa do consumidor passasse a constituir-se em um meio de compatibilizar e harmonizar os interesses envolvidos entre os sujeitos da relação de consumo, sem, no entanto, caracterizar-se como um instrumento de confronto entre produção e consumo.


Para que essa política venha a ser efetivada, o legislador estabeleceu, no caput do art. 4.º, seus principais objetivos: o atendimento às necessidades dos consumidores; o respeito à sua dignidade, saúde e segurança; a proteção de seus interesses econômicos; a melhoria da sua qualidade de vida; a transparência e harmonia nas relações de consumo. Especialmente, a política nacional das relações de consumo prevê a transparência de conduta como princípio do vínculo entre os sujeitos da relação de consumo, ou seja, entre consumidor e fornecedor. Essa transparência exige que as relações de consumo sejam claras quanto às informações, tanto de forma quantitativa como qualitativa.


Na verdade, a transparência decorre do princípio da boa-fé objetiva, também indicado no caput do art. 4.º do Código de Defesa do Consumidor. Esse princípio exige que as partes da relação de consumo atuem com estrita boa-fé, ou seja, com veracidade, lealdade, seriedade, sinceridade, transparência e clareza. Considerando o princípio da transparência como corolário do princípio da boa-fé, Anna Luiza de Castro Gianasi[1] afirma:


“Impossível cogitar do princípio da transparência sem antes explanar o princípio da boa-fé. Há entre ambos uma relação de causa e efeito. A confiança (boa-fé subjetiva) e a lealdade (boa-fé objetiva) são resultantes dos preceitos éticos e morais prevalecentes em um meio social, que por força da necessidade da regulação e estabelecimento de uma ordem e principalmente da segurança, seja ela jurídica ou não, ganham um tratamento diferenciado.”


A doutrina considera o princípio da boa-fé como elemento orientador das condutas sociais, estando ligado ao princípio da razoabilidade. Trata-se de um dever de conduta em torno da qual as partes devem se pautar, não se admitindo a conduta abusiva nem do consumidor nem do fornecedor, pois isso iria de encontro às normas jurídicas. Esse princípio realiza-se pela boa-fé objetiva. Não se trata, portanto, da boa-fé subjetiva, aquela que se refere à ignorância de uma pessoa sobre um fato modificador, impeditivo ou violador de seu direito. Nesse caso, o indivíduo acredita em algo por desconhecer a verdadeira situação.


De acordo com Rizzatto Nunes[2], esse princípio tem como função viabilizar os ditames constitucionais da ordem econômica, compatibilizando interesses aparentemente contraditórios, como a proteção do consumidor e o desenvolvimento econômico. Com efeito, o princípio da boa-fé envolve a atuação de cada uma das partes na relação de consumo. Busca garantir o respeito entre ambas, a ação sem abuso, sem interrupção ou obstrução, impedindo que haja lesão a alguém. Para isso, deve haver a cooperação entre consumidor e fornecedor, de modo que cada um satisfaça o seu interesse e haja equilíbrio na relação de consumo.


Sobre o assunto, João Batista de Almeida[3] aponta o atendimento das necessidades dos consumidores como o objetivo principal da política nacional das relações de consumo. Entende, também, que a transparência e a harmonia das relações de consumo devem ser objeto de preocupação dessa política. Portanto, a política nacional das relações de consumo tem por objetivo harmonizar as relações consumeristas. Busca estabelecer um equilíbrio e uma compatibilização entre os interesses dos fornecedores e as necessidades dos consumidores. Visa ainda à proteção do meio ambiente, com o intuito de assegurar o desenvolvimento tecnológico, social e econômico de toda a sociedade. A esse respeito, enfatiza o referido autor:


O objetivo do Estado, ao legislar sobre o tema, não será outro que não o de eliminar ou reduzir tais conflitos, sinalizar para a seriedade do assunto e anunciar sua presença como mediador, mormente para garantir proteção à parte mais fraca e desprotegida.


Objetivo importante dessa política é também a postura do Estado de garantir a melhoria da qualidade de vida da população consumidora, quer exigindo o respeito à sua dignidade, quer assegurando a presença no mercado de produtos e serviços não nocivos à vida, à saúde e à segurança dos adquirentes e usuários, quer, por fim, coibindo os abusos praticados e dando garantias de efetivo ressarcimento, no caso de ofensa a seus interesses econômicos”[4].


Cristiane Miziara Mussi[5] comunga do mesmo entendimento:


“Esta política está voltada para atender as necessidades dos consumidores, respeitando a sua dignidade, a sua segurança e a sua saúde, bem como para a proteção dos interesses econômicos dos mesmos, com a conseqüente melhoria da qualidade de vida. Refere-se a uma política que traz uma ideologia de respeito aos direitos da personalidade.”


Princípios norteadores da Política Nacional das Relações de Consumo


Convém esclarecer que o Código de Defesa do Consumidor não se preocupou apenas em estabelecer um objetivo para a política nacional das relações de consumo. Estabeleceu, também, alguns princípios que devem ser atendidos, tais como o princípio da vulnerabilidade, da boa-fé objetiva, do equilíbrio contratual absoluto, da educação, da informação, dentre outros, que estão dispostos no art. 4.°, incisos I a VIII.


Esses princípios que envolvem a defesa do consumidor são preceitos jurídicos basilares, tendo em vista que buscam introduzir uma nova forma de pensar nos postulados da consciência jurídica. Eduardo C. B. Bittar[6] enumera algumas características inerentes à política nacional das relações de consumo:


Assim, sistematicamente, a ideologia de uma política nacional de consumo envolve:


a)uma política nacional de desenvolvimento;


b)uma política nacional de proteção ao consumidor;


c)uma política nacional de incentivo ao respeito dos direitos fundamentais;


d)uma política nacional de cultura (empresarial e consumerista) do consumo;


e)uma política nacional de estudos, informação e divulgação de dados do setor;


f)uma política nacional de fiscalização e efetivação de direitos neste setor.”


O princípio da vulnerabilidade do consumidor é considerado como elemento essencial de proteção ao consumidor. Não existem dúvidas de que o consumidor é a parte mais fraca das relações de consumo diante do poder econômico. A Constituição Federal de 1988 reconheceu essa vulnerabilidade, ao preceituar, no seu art. 5.º, inciso XXXII, que o Estado promoverá a defesa do consumidor. Esse princípio expressa-se também como elemento informador da política nacional das relações de consumo e como o núcleo de onde se irradiam todos os outros princípios informadores do sistema consubstanciado no Código de Defesa do Consumidor. Desse núcleo nascem também os instrumentos criados para a proteção do consumidor, a exemplo da inversão do ônus da prova e da responsabilidade objetiva do fornecedor de produtos e serviços.


O referido princípio surge do fato de que o consumidor não tem controle sobre a produção de bens e a prestação de serviços. Fica à mercê do que lhe é ofertado pelo fornecedor, o qual determina o direcionamento da sua produção, juntamente com a fixação dos preços dos produtos e serviços. Assim, a vulnerabilidade do consumidor pode surgir de vários fatores, como as práticas abusivas do fornecedor, o oferecimento de produtos e serviços sem a observância dos princípios que regem as relações de consumo, a inserção de cláusulas abusivas nos contratos de consumo, a falta de informação suficiente e adequada sobre os produtos e serviços, dentre outros fatores.


Na verdade, não importa qual o fator que origina a vulnerabilidade do consumidor, mas sim que, em razão dessa vulnerabilidade, o consumidor precisa ser tutelado legalmente. Ele é considerado vulnerável, quando se sujeita às práticas de oferta, publicidade e fornecimento de produtos e serviços.


No entendimento de Roberto Senise Lisboa[7], o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor decorre do princípio constitucional da isonomia. Esse princípio parte da idéia de que os desiguais devem ser tratados desigualmente na proporção de suas desigualdades, a fim de que se obtenha a igualdade desejada.  Carolina Dias Tavares Guerreiro Cruz[8], reconhecendo que o consumidor é a parte mais fraca nas relações de consumo, enfatiza:


“A vulnerabilidade pode ser entendida, genericamente, como uma situação de desigualdade determinada por uma certa dependência, capaz de reduzir ou anular não apenas o entendimento do que se pretende contratar, como também reduzir ou anular a liberdade entre contratar ou não contratar. Segundo um monografista especializado, vulnerabilidade vem a ser o princípio pelo qual se reconhece (no direito positivo) a qualidade daquele ou daqueles sujeitos mais fracos na relação de consumo, tendo em vista a possibilidade de que venham a ser ofendidos ou feridos, na sua incolumidade física ou psíquica, bem como no âmbito econômico, por parte do sujeito mais potente da mesma relação.”


Esse também é o pensamento de Eros Roberto Grau[9]:


“Esse conceito (de consumidor) há de ser esboçado a partir da verificação de que, adotando os mercados formas assimétricas, consumidor é, em regra, aquele que se encontra em uma posição de debilidade e subordinação estrutural em relação ao produtor do bem ou serviço de consumo. Essa concepção tem a virtude, ademais, de bem apartar as situações de consumo e de fruição, esta como aquela na qual se coloca o ‘usuário’ (contemplativo) do patrimônio histórico-artístico-natural.”


Com efeito, o consumidor é vulnerável em relação ao fornecedor. O que caracteriza a sua desigualdade na relação de consumo é a falta de conhecimento quando da aquisição de produtos ou contratação de serviços, em razão da própria relação jurídica existente entre o consumidor e o fornecedor.


A vulnerabilidade do consumidor também se expressa na sua falta de informação. Muitas vezes, ele não está preparado para o consumo, vindo a ser lesado pelo fornecedor de produtos e serviços. Isso fere um dos direitos básicos do consumidor, que é o direito à informação adequada e clara sobre os produtos e serviços, com a especificação correta referente à quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentam (art. 6.º, III, do CDC).


Efetivamente, é do princípio da vulnerabilidade que decorrem os demais. Em tais hipóteses, justifica-se a intervenção estatal nas relações de consumo. Além disso, deve ser facilitado o acesso dos consumidores aos instrumentos de defesa em juízo, como forma de compatibilizar as necessidades dos consumidores com os interesses dos fornecedores. A esse respeito, afirma João Batista de Almeida[10]:


“É facilmente reconhecível que o consumidor é a parte mais fraca na relação de consumo. A começar pela própria definição de que consumidores são “os que não dispõem de controle sobre bens de produção e, por conseguinte, devem se submeter ao poder dos titulares destes”. Para satisfazer suas necessidades de consumo, é inevitável que ele compareça ao mercado e, nessas ocasiões, submeta-se às condições que lhe são impostas pela outra parte, o fornecedor”.


A presença do Estado nas relações de consumo constitui uma conseqüência do princípio da vulnerabilidade do consumidor. Na hipótese de ocorrer essa vulnerabilidade, o Estado deve ser chamado para proteger o consumidor, que é a parte mais fraca da relação de consumo. Essa proteção pode ser efetivada tanto por meios legislativos, como judiciários ou administrativos, com o intuito de garantir o respeito aos interesses dos consumidores.


A proteção do consumidor, por estar prevista constitucionalmente, é uma norma hierarquicamente superior e, portanto, deve ser seguida por todo o sistema jurídico. Mas, para isso, faz-se necessária a crescente presença do Estado na atividade econômica dos consumidores e dos fornecedores. Essa tutela constitui liberdade pública positiva, de modo que o Estado tem o dever de garantir sua efetivação. No entendimento de Cláudia Lima Marques[11], o Estado passou a ter uma força positiva no sentido de realizar determinadas tarefas:


“Tendo em vista a evolução do direito, como um instrumento de mudança social, os direitos previstos no texto constitucional, tanto os direitos políticos (os chamados direitos fundamentais de 1ª geração), quanto os direitos econômicos e sociais (direitos fundamentais de 2ª e 3ª gerações), passam a ter também uma eficácia positiva. Se tradicionalmente estas previsões constitucionais possuíam um efeito meramente negativo, no sentido de proibir o Estado de certas atitudes frente aos cidadãos, agora tais previsões ganham uma nova força positiva, no sentido de obrigar o Estado a tomar certas atitudes, inclusive a intervenção na atividade privada para proteger determinado grupo difuso de indivíduos, como os consumidores. Daí a tendência do legislador moderno, que procura garantir a eficácia prática dos novos direitos fundamentais do indivíduo, dentre eles os direitos econômicos, através da inclusão destes objetivos constitucionais em normas ordinárias de direito privado, como é o caso do próprio Código de Defesa do Consumidor.”


O Código de Defesa do Consumidor no seu art. 4.º, inciso II, prevê essa presença do Estado, no sentido de proteger efetivamente o consumidor através de iniciativa direta, incentivos à criação e desenvolvimento de associações representativas, presença do Estado no mercado de consumo e garantia dos produtos e serviços com padrões adequados de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho.


A harmonização de interesses, conforme se verifica, está configurada dentre os objetivos da política nacional das relações de consumo, mas também como princípio a ser seguido. Interessa tanto ao consumidor como ao fornecedor implementar a relação de consumo para que haja o atendimento das necessidades do primeiro e o cumprimento do fornecimento de bens e serviços que justifica a existência do segundo. Só assim é possível chegar-se ao equilíbrio entre as partes.


A tutela do consumidor não significa apenas o atendimento das necessidades deste, mas sim, e principalmente, a harmonização dos seus interesses com os do fornecedor. Nesse sentido, o CDC, no seu art. 1.º, capta o preceito do art. 170, V, da Constituição Federal de 1988, ao enfatizar a necessidade de equilíbrio entre a proteção do consumidor e o desenvolvimento econômico do país.


De acordo com João Batista de Almeida[12], essa proteção do consumidor também deve ser compatibilizada com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, em face da dinâmica própria das relações de consumo. Como resultado, surgem novos produtos e novas tecnologias na sociedade de massa, que devem ser seguros e eficientes. Foi em razão dessa situação que o legislador decidiu estabelecer como um dos princípios da política nacional das relações de consumo o estudo constante das modificações no mercado de consumo.


  Os abusos praticados no mercado de consumo também mereceram a atenção do legislador, que buscou coibi-los. Essa medida está prevista no inciso VI do art. 1.º do CDC, como forma de garantir a coibição e repressão eficiente dos abusos ocorridos, com a punição de seus autores e o respectivo ressarcimento. Além disso, o CDC estabelece medidas preventivas, como forma de evitar a ocorrência de novas práticas abusivas que podem causar prejuízos aos consumidores, a exemplo da concorrência desleal, da utilização indevida de inventos e das criações industriais.


O Estado funciona como um mediador nas relações de consumo, tentando equilibrar as partes nessa relação e evitar ou, se for o caso, solucionar os conflitos de consumo.  Mas esse não pode ser o único papel do Estado quanto à defesa do consumidor. Mais do que isso, deve cuidar para que todas essas providências sejam tomadas pelos próprios fornecedores, através da utilização de mecanismos alternativos por eles criados e custeados. Trata-se, no caso, do incentivo ao autocontrole, que pode ser verificado de várias maneiras.


Esse incentivo pode se dar pelo eficiente controle da qualidade e segurança de produtos defeituosos no mercado. Efetiva-se também pela prática do recall, que é a convocação dos consumidores de bens produzidos em série e que contenham defeitos de fabricação, através de anúncios publicitários, arcando o fornecedor com as despesas de substituição das peças defeituosas. Realiza-se, por fim, pela criação de centros ou serviços de atendimento ao consumidor por parte das empresas, resolvendo o fornecedor, de forma direta, a reclamação ou queixa apresentada contra seu produto ou serviço.


O controle da qualidade e segurança dos produtos e serviços deve ser feito de modo a haver um detalhamento eficaz das informações e formas de uso, riscos e acidentes relacionados a eles, cláusulas contratuais, especificação detalhada de quantidade, características, composição, qualidade, preços e tarifas, leis e regulamentos, rotulagem e empacotamento dos produtos, proteção contra a publicidade enganosa, dentre outros aspectos. Todas essas providências buscam proteger os direitos dos consumidores estabelecidos no art. 6.º do Código de Defesa do Consumidor.


A partir da análise desses princípios, percebe-se que a intenção do legislador, ao criar o Código de Defesa do Consumidor, foi buscar o equilíbrio das relações de consumo entre consumidor e fornecedor. Por isso, a educação e a informação de fornecedores e consumidores no que se refere aos seus direitos e deveres constituem também fatores importantes para o atendimento da política nacional das relações de consumo.


Para João Batista de Almeida[13], a regra disposta no art. 4.º, inciso IV, do CDC busca conscientizar o consumidor e o fornecedor, através da educação formal e informal para o consumo, bem como da informação do consumidor e do fornecedor. Segundo ele, quanto maior o grau de conscientização das partes envolvidas, menor será o índice de conflito nas relações de consumo.


Efetivamente, a educação é um instrumento de auxílio ao consumidor, no sentido de torná-lo mais consciente de suas responsabilidades, direitos e obrigações, protegendo-o dos enganos e fraudes. É uma forma de possibilitar-lhe o acesso efetivo à lei e aos mecanismos de reparação de danos eventualmente causados. A racionalização e a melhoria dos serviços públicos foram também inseridas no Código de Defesa do Consumidor como elementos da política nacional das relações de consumo. O objetivo foi exigir do poder público a prestação de serviços seguros e eficientes, que não atentem contra a vida, a saúde e a segurança do consumidor. Esta também é uma obrigação do setor privado.


Alguns autores destacam como princípios fundamentais da política nacional das relações de consumo o da vulnerabilidade, do dever governamental, da garantia de adequação, da boa-fé nas relações de consumo, da informação e do acesso à justiça. Thierry Bourgoignie[14] entende que a proteção do consumidor transformou a realidade de todos os países. Esse fato ocasionou a adoção de iniciativas, no sentido de promover os interesses dos consumidores no cenário econômico e no mercado. Segundo ele, três grandes avanços podem ser apontados como as bases da política de proteção do consumidor:


1) a adoção de uma estrutura legislativa adequada, comumente sob a forma de uma ampla Lei de Proteção do Consumidor;


2) o estabelecimento de instituições estatais especificamente responsáveis por assuntos ligados ao consumidor, tanto para elaboração de leis quanto para controle;


3) o surgimento de organizações independentes, não governamentais e não-lucrativas, cujo único ou principal objetivo é o de promover os interesses dos consumidores.”


Com efeito, verifica-se o interesse crescente na defesa do consumidor tanto por parte dos órgãos públicos como pela iniciativa privada, o que possibilita o entendimento de que a instituição da política nacional das relações de consumo se constituiu como um passo importante e um avanço junto a essa defesa.


Considerações finais


Com a instituição de leis específicas para a proteção e defesa do consumidor e com o surgimento de associações e órgãos encarregados dessa defesa, criou-se uma política de proteção do consumidor. Tais medidas fizeram com que esse sujeito da relação de consumo passasse a ter condições de igualdade em relação ao fornecedor.


O objetivo dessa política é a promoção dos interesses do consumidor, em face de sua vulnerabilidade perante a classe dos fornecedores, fazendo com que haja um equilíbrio na relação de consumo que existe entre eles. Nesse sentido, a política nacional das relações de consumo estabelece um rol de objetivos e princípios que devem ser seguidos, de forma efetiva, pelos consumidores, fornecedores e também pelo Estado. Sendo obedecidos os ditames legais, construir-se-á um mecanismo eficaz de proteção ao consumidor.


 


Referências

ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

BITTAR, Eduardo C. B. Direitos do consumidor e direitos da personalidade: limites, intersecções, relações. Revista de Direito do Consumidor [do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor]. São Paulo: Revista dos Tribunais, n.o 37, janeiro/março, 2001.

BOURGOIGNIE, Thierry. A política de proteção do consumidor: desafios à frente. Revista de Direito do Consumidor. n. 41. Revista dos Tribunais: jan – mar. 2002.

CRUZ, Carolina Dias Tavares Guerreiro. Contratos internacionais de consumo: lei aplicável. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

GIANASI, Anna Luiza de Castro. As relações de consumo e o princípio da transparência: uma proposta de integração jurídico-normativa para o Mercosul. Revista de Direito do Consumidor. n. 58. Revista dos Tribunais: abr – jun. 2006.

GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002.

LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

MUSSI, Cristiane Miziara. O princípio da boa-fé objetiva na sociedade contemporânea. Teresina, ano 9, n. 528, 17 dez. 2004. Disponível em: <http:// jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6056>. Acesso em: 22 out. 2006.

NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004.

 

Notas:

[1] GIANASI, Anna Luiza de Castro. As relações de consumo e o princípio da transparência: uma proposta de integração jurídico-normativa para o Mercosul. Revista de Direito do Consumidor. n. 58. Revista dos Tribunais: abr – jun. 2006. p. 33.

[2] NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 571.

[3] ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 16.

[4] Ibid., p. 16.

[5] MUSSI, Cristiane Miziara. O princípio da boa-fé objetiva na sociedade contemporânea. Teresina, ano 9, n. 528, 17 dez. 2004. Disponível em: <http:// jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6056>. Acesso em: 22 out. 2006.

[6] BITTAR, Eduardo C. B. Direitos do consumidor e direitos da personalidade: limites, intersecções, relações. Revista de Direito do Consumidor [do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor]. São Paulo: Revista dos Tribunais, n.o 37, janeiro/março, 2001. p. 203.

[7] LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 95.

[8] CRUZ, Carolina Dias Tavares Guerreiro. Contratos internacionais de consumo: lei aplicável. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 46.

[9] GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 280.

[10] ALMEIDA, João Batista de. Op. cit. p. 24 (nota 90).

[11] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 164/165.

[12] ALMEIDA, João Batista de. Op. cit. (nota 90).

[13] Ibid., p. 20.

[14] BOURGOIGNIE, Thierry. A política de proteção do consumidor: desafios à frente. Revista de Direito do Consumidor. n. 41. Revista dos Tribunais: jan – mar. 2002. p. 30-31.


Informações Sobre o Autor

Fernanda Holanda de Vasconcelos Brandão

Mestre e Doutoranda em Ciências Jurídicas pela UFPB. Professora da UFPB e UNIPÊ


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