Resumo:No Controle de Constitucionalidade a intervenção do amicuscuriae é, relativamente, um tema novo, e ganhou relevo quando regulamentado pelas Leis 9868/99 e 9882/99, inovando a prática constitucional nos julgamentos das ações diretas e em arguição de descumprimento de preceito fundamental, refletindo na prática decisória da Corte Suprema. A partir de uma abordagem no seu tríplice aspecto – legal, doutrinário e jurisprudencial, entende-se que o amicus funciona como especial terceiro interessado, que ingressa no feito pendente visando a enriquecer o debate judicial sobre as mais diversas questões fáticas e jurídicas, quer por iniciativa própria, quer por requisição judicial. Dessa forma, o amicuscuriae transporta para o Judiciário questões dispersas na sociedade civil e no próprio Estado, porquanto sua situação poderá ser afetada quando da tomada da decisão pelo Poder Judiciário. A atuação do “amigo da corte” no feito é, portanto, uma decorrência do princípio democrático, o que possibilita uma abertura procedimental, de acesso e garantia à Justiça.
Palavras-chave: Acesso à Justiça. Sociedade. Instante procedimental. Democracia.
Abatract:The intervention of amicus curiae is relatively a new theme, and gained relief when regulated by Laws 9868/99 and 9882/99, innovating the constitutional practice in the direct actions and judgments complaint of breach of fundamental precept, reflecting on decisions of the Supreme Court. From an approach in its triple aspect – legal, doctrinal and jurisprudential, is understood that the amicus works as a special interested party, who entered the pending done in order to enrich the judicial debate on various factual and legal issues, either by own initiative or by judicial request. Thus, the amicus curiaecarries for judicial matters dispersed in civil society and the state itself, because your situation may be affected when the judiciary takes the decision. The performance of "friend of the court" in done is, therefore, a result of the democratic principle, which enables a procedural opening, and guarantee access to Justice.
Keywords: Access to Justice. Society. Instant procedural. Democracy.
Propedêutica
É crescente a relevância prática da atuação do amicuscuriae no processo de controle concentrado de constitucionalidade brasileiro, e, por isso, faz-se necessário analisar o tema em tríplice abordagem, quais sejam, aspectos legais, aspectos doutrinários e a evolução jurisprudencial do referido instituto.
A inserção do instituto no controle de constitucionalidade é relativamente atual, embora antes mesmo de possuir regulamentação o mesmo já tenha recebido referências na jurisprudência brasileira. No entanto, ganhou maior relevo quando veio a ser regulamentado pelas Leis 9868/99 e 9882/99, inovando a prática constitucional nos julgamentos das ações diretas e em arguição de descumprimento de preceito fundamental. Desta forma, a atuação dos amicicuriae passou a interferir constantemente na prática decisória do Supremo Tribunal Federal, o que tornou de extrema importância tal participação desses interessados no processo nas decisões da Corte, decisões tais que poderiam apresentar menor legitimidade caso a discussão ficasse restrita apenas aos argumentos do legitimado ativo, do Procurador Geral da República, do Advogado Geral da União e do órgão que produziu o ato normativo.
Assim, por existir a possibilidade de não serem suscitadas questões relevantes no curso do processo pelos seus partícipes, é que, mesmo embora a regra seja a proibição da intervenção de terceiros no processo de Ação Direta de Inconstitucionalidade, o dispositivo consagra, excepcionalmente, a intervenção de quaisquer órgãos e entidades no processo. Além disso, o artigo 6º, § 2º da Lei 9882 permite a manifestação de amicicuriae na ADPF, autorizando também a participação de particulares (“interessados no processo”) e não só de órgãos ou entidades. Já em relação à ADC foi vetada a parte da Lei 9868 que previa a participação de amicicuriae. Entretanto, o Pretório Excelso considerou possível a manifestação de interessados em ADC a critério do relator. A doutrina pátria então argumenta pela democratização no controle abstrato de constitucionalidade, reforçando a ideia de uma dimensão inclusivo-participativa no debate constitucional, porquanto os amicicuriae contribuem com seus pareceres, opiniões mesmo que de caráter não jurídico, para a interpretação da norma e consequente julgamento das referidas ações.
É bem verdade que o amicuscuriae, na realidade atual do Brasil, é um instituto que se faz presente não só no controle concentrado de constitucionalidade. O tema da intervenção de partes alheias a processos já fora previsto na legislação ordinária e o próprio Poder Judiciário reconhecera situações tais como interferências de amicuscuriae, no que tange pessoas jurídicas de direito público, a exemplo do Conselho Administrativo de Defesa econômica (Lei 8884/94), Comissão de Valores Mobiliários (Lei 6385/76) e o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Lei 9279/96), sendo legalmente autorizados a desempenhar poder de polícia, de forma a fiscalizar e acompanhar processos judiciais atinentes ao conteúdo de sua área de atuação.É certo também que a regulamentação do referido instituto no controle concentrado veio a afetar o controle difuso, pois inseriu nova regulamentação no Código de Processo Civil no que tange a questões incidentais de discussão de constitucionalidade.
Porém, o que se pretende neste estudo é analisar a importância do instituto amicuscuriae no que diz respeito ao controle concentrado de constitucionalidade, a qual se revela pela abertura da jurisdição constitucional, permitindo que haja legitimidade na aproximação do exercício da função precípua do STF de guarda da Constituição da sociedade brasileira como um todo, e não apenas em seus efeitos inter partes, como ocorre no controle difuso, embora neste exista a possibilidade do contrário ocorrer quando da manifestação do Senado nesse sentido.
Apesar da ausência de uma definição legal exata do termo, pela atuação dos “amigos da corte”, como costuma chamar a doutrina, percebe-se que, trata-se de um terceiro que intervém em um processo do qual não é parte, para oferecer à Corte a sua própria concepção acerca da questão colocada no processo, contribuindo com informações que, de certa forma, exorbitam o campo legal, ou, até mesmo, para a defesa de interesses dos grupos representados, que, por essa condição, possam vir a ser afetados direta ou de forma reflexa pela decisão tomada pelo Supremo.
Contudo, qualquer assunto no ramo do Direito deve ser analisado sob o aspecto legal, doutrinário e jurisprudencial, sob pena de não se obter informações suficientes para o entendimento do mesmo. Por isso a análise tríplice do referido tema. É necessário desenvolver um estudo crítico sobre as questões doutrinárias e jurisprudenciais, baseadas no texto normativo que disciplina a matéria.
O instante procedimental em que o amicus curiae é admissível e seus prazos
O artigo 7º § 2º da Lei 9868/99 é silente no que diz respeito ao instante procedimental da intervenção do amicuscuriae na ADI genérica. Há, portanto, acirrada controvérsia sobre o assunto. Referido dispositivo estabelece que a manifestação dos órgãos e entidades deva observar o prazo fixado no parágrafo anterior (§ 1º do artigo 7º da Lei 9868/99). Ora, se o próprio § 1º foi vetado, não há dispositivo regulando a questão.
Em relação a ADI por omissão, como o artigo 12 – E da Lei 9868/99 dispõe que neste tipo de ação serão observadas, no que for possível, as regras que disciplinam a ADI genérica, fácil identificar a ausência de regras determinando o instante procedimental do amicus, quando órgãos ou entidades, com base no artigo 12-E c/c 7º § 2º. Entretanto, quando se tratar dos demais titulares do artigo 2º, os quais poderão manifestar-se, por escrito, sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis para o exame da matéria, bem como apresentar memoriais, o prazo é sim estabelecido, qual seja, o das informações.[1]
Em sede de ADC, surgem quanto ao instante e ao prazo da manifestação do amicuscuriae, as mesmas dúvidas com relação a ADI, porquanto os §§ 1º e 2º do artigo 18 da Lei 9868/99 foram vetados. Nas razões de veto [2]: “Cabe observar que o veto a esses dispositivos repercute na compreensão dos artigos 19 e 20, na parte em que enunciam, respectivamente, ‘Decorrido o prazo do artigo anterior’, e ‘Vencido o prazo do artigo anterior’. Entretanto, eventual dúvida poderá ser superada contando-se o prazo de manifestação do Procurador Geral da República a partir de despacho do relator determinando a abertura de vista”.
Além disso, a doutrina é divergente acerca do assunto[3] e, portanto, fica a critério da jurisprudência fixar qual o momento em que o amicusé admissível.[4]
Quanto a ADPF, dois pontos se estabelecem. Quando a participação do amicus é voluntária, há limitação temporal na sua participação: para a apresentação de manifestação por escrito ou juntada de documentos, limite é até o lançamento do relatório, que, pela leitura do artigo 7º da Lei 9882/99, é ato imediatamente anterior ao julgamento; já para sustentação oral, as condições são determinadas caso a caso pelo relator, e a manifestação ocorre no próprio julgamento. Quando, em sede de ADPF, a manifestação do amicus se perfaz por requisição do relator, surgem as mesmas dúvidas com relação a ADI e ADC, já citadas.[5]
Diante da análise legal e doutrinária acerca da questão em tela, cabe analisar a evolução jurisprudencial no que a tange. No ano seguinte a edição das Leis (9868/99 e 9882/99), a função do amicuscuriae no processo constitucional, especificamente no controle abstrato, foi explanada pela jurisprudência, conforme se depreende de parte do julgado:
“A idéia (sic) nuclear que anima os propósitos teleológicos que motivaram a formulação da norma legal em causa, viabilizadora da intervenção do "amicus curiae" (sic) no processo de fiscalização normativa abstrata, tem por objetivo essencial pluralizar o debate constitucional, permitindo, desse modo, que o Supremo Tribunal Federal venha a dispor de todos os elementos informativos possíveis e necessários à resolução da controvérsia, visando-se, ainda, com tal abertura procedimental, superar a grave questão pertinente à legitimidade democrática das decisões emanadas desta Suprema Corte, quando no desempenho de seu extraordinário poder de efetuar, em abstrato, o controle concentrado de constitucionalidade.”[6]
Entretanto, o instante procedimental não foi estabelecido, e, a cada ano, o entendimento do Pretório Excelso abarcava maiores divergências sobre o tema. Na busca por jurisprudências no site do STF, especificamente sobre a questão em análise, entre 1999 a 2015, algumas foram selecionadas.
Em 2001, a Associação Paulista dos Magistrados teve o pedido de intervenção como amicuscuriae deferido, mesmo após início do julgamento, pois não se entendeu que o transcurso dos trinta dias estabelecido no artigo 6º da lei 9868/99 findaria o prazo para a manifestação:
“ADI 2238 / DF – DISTRITO FEDERAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Rel. Min. ILMAR GALVÃO
Julgamento: 27/08/2001“A Associação Paulista dos Magistrados – APAMAGIS requer, com base no art. 7.º, § 2.º, da Lei n.º 9.868/99, seja admitida sua manifestação, na qualidade de amicuscuriae (sic), nesta ADI 2.238, que tem como objeto a Lei Complementar n.º 101/2000. A representatividade da associação postulante é inconteste, sendo entidade voltada aos interesses dos magistrados paulistas e que, conforme estabelecido em seus estatutos colabora com a direção do Poder Judiciário do Estado de São Paulo. Por outro lado, é patente a excepcional relevância da matéria (…) Tais circunstâncias, portanto, permitem a extraordinária aplicação da regra do mencionado § 2.º do art. 7.º da Lei n.º 9.868/99, com a conseqüente (sic) manifestação de órgãos e entidades alheias ao processo de controle abstrato de constitucionalidade. Isto posto, defiro o pedido formalizado pela APAMAGIS, determinando sua inclusão, como interessada, na autuação do presente feito.”[7]
Diversamente, em 2003, o Ministro Cezar Peluso indeferiu a intervenção como amicuscuriaerequerida por Esporte Clube Juventude, Sport Club Internacional, Clube Atlético Mineiro, Paulista Futebol Clube LTDA, Londrina Esporte Clube, pois entendeu que o veto do § 1º do artigo 7º da Lei 9868/99 não exclui a necessidade de observância do prazo constante do § único do artigo 6º da referida Lei:
“ADI 2937/DF. Rel. Min. CezarPeluso. Julgamento: 26/09/2003
“O veto aposto ao § 1º do art. 7º da Lei federal nº 9.868, de 10 de novembro de 1999, não excluiu anecessidade de observância de prazo prevista no § 2º, paraadmissão dos chamados "amicicuriae" (sic). A inteligência sistemática do disposto no § 2º, não podendo levar ao absurdo da admissibilidade ilimitada de intervenções, com graves transtornos ao procedimento, exige seja observado, quando menos por aplicação analógica, o prazo constante do § único do art. 6º.De modo que, tendo-se exaurido tal prazo, na espécie, aliás pela só apresentação das informações, a qual acarretou preclusão consumativa, já não é lícito admitir a intervenção requerida por ESPORTE CLUBE JUVENTUDE, SPORT CLUB INTERNACIONAL, CLUBE ATLÉTICO MINEIRO, PAULISTA FUTEBOL CLUBE LTDA, LONDRINA ESPORTE CLUBE. Indefiro, pois, os pedidos, sem prejuízo de oportuna juntada "por linha" das respectivas petições.”[8]
Contudo, mesmo em 2003, o Ministro Maurício Corrêa, na ADIN 2735/RJ, de 04.02.2003 determinou, por despacho, prazo diverso:
“Faculto ao interessado o prazo de 05 (cinco) dias para manifestação” [9]
Além disso, na ADI 1498, julgada em 05/05/2004, opostos por terceiros que pretendiam ingressar no processo como amicuscuriae após proferido acórdão, embargos de declaração não foram conhecidos. Não obstante a recusa a tal recurso, a questão colocada não foi propriamente a legitimidade recursal, mas a tempestividade do recurso, conforme se depreende de trecho da decisão:
“ADI 1498 EDAgR/RS Agravo Regimental nos embargos declaratórios na ação direta de inconstitucionalidade. Rel. Min. Marco Aurélio. Julgamento: 05/05/2004
“Por meio da decisão de folha 732, neguei seguimento aos embargos de declaração interpostos por Maria do Carmo Tremarim e outros, registrando a extemporaneidade do recurso. Daí o agravo de folha 787 a 789, na qual se afirma que, em 15 de dezembro de 2003, último dia do prazo, foram recebidos nesta Corte (…)Pretende-se, assim, seja afastado o vício de intempestividade.”[10]
Em 2005, o ministro Cezar Peluso autorizou a intervenção da Associação dos Auditores dos Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios da Bahia como amicuscuriae. O Ministro entendeu que, já que a norma que estabelecia o instante procedimental foi vetada, sequer integrou o ordenamento jurídico e, desta forma, não poderia condicionar a possibilidade de intervenção. Entendeu também que o amicuscuriae poderia ser admitido mesmo quando já escoado o prazo para as informações, e, dessa forma, recebendo o interveniente o processo no estado em que se encontre, com a consequente impossibilidade de praticar atos cujo prazo tenha exaurido:
“ADI 3474/BA. Relator(a):Min. Cezar Peluso. Julgamento: 13/10/2005
“A Associação dos Auditores dos Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios da Bahia (ASSAUDI-BA) requer admissão no processo, na condição de amicuscuriae (sic) (…). Para tanto, aduz ser entidade representativa dos interesses dos auditores e auditores substitutos dos Tribunais de Contas do Estado e dos Municípios da Bahia, órgãos de onde emanaram as normas impugnadas na ação. 2.A intervenção deve serautorizada. Em suma: a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 – que contém a base normativa legitimadora da intervenção processual do amicuscuriae (sic) – tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional" (…)Se o dispositivo que previa prazo para o ingresso do amicuscuriae (sic) no processo foiobjeto de veto, não descubro fundamento normativo para induzir aplicabilidade do que se projetava como norma, que, vetada sem remédio, não chegou a integrar o ordenamento jurídico positivo, de modo a condicionar a possibilidade da intervenção. No silêncio da lei, mais razoável é reputá-la admissível, ainda ao depois do termo do prazo das informações, interpretação que, já acolhida neste Tribunal (…), encontra suporte analógico na disciplina da intervenção do assistente (art. 50, § único, do CPC). A conseqüência(sic) da intervenção tardia do amicus (sic) há de ser apenas a impossibilidade de praticar atos processuais cujo prazo já se tenha exaurido. Em outras palavras, o interveniente recebe o processo no estado em que o encontre. 3. Defiro, portanto, o ingresso da requerente na qualidade de amicuscuriae (sic), devendo a Secretaria proceder às anotações pertinentes. Autorizo a ASSAUDI-BA a sustentar oralmente suas razões congruo tempore (sic)
(…).”[11]
Também em 2005, outra decisão que merece destaque é a ADI 2548 de 18/10/2005, porquanto elucida o assunto ora em comento, além de ser esclarecedora sobre a função desempenhada pelo amicuscuriae no controle abstrato de constitucionalidade. Na decisão, o Ministro Gilmar Mendes afirma que, diante da relevância do caso ou em face da notória contribuição que a manifestação possa trazer para o julgamento da causa, é possível cogitar de hipóteses de admissão de amicuscuriae, mesmo que fora do prazo para as informações, (constante do parágrafo único do artigo 6º da Lei 9868/99), embora, nesse sentido, não unânime o STF:
“ADI 2548/PR – Relator Min. Gilmar Mendes.
Julgamento: 18/10/2005
No tocante à Petição (…) da Federação das Indústrias do Estado do Paraná, requerendo seu ingresso no feito na qualidade de amicuscuriae (sic), compete ao Relator, por meio de despacho irrecorrível, acolher ou não pedido de interessados para que atuem na situação de amicicuriae (sic), hipótese diversa da figura processual da intervenção de terceiros. Esclareço que, em princípio, a eventual manifestação deveria ocorrer no prazo das informações (arts. 6o e 7o , § 2o , da Lei no 9.868/1999). Em recente julgamento, porém, o Supremo Tribunal Federal, por maioria, resolveu questão de ordem no julgamento das ADIn's nos 2.675-PE (Rel. Min. Carlos Velloso) e 2.777-SP (Rel. Min. Cezar Peluso), ambas julgadas em 27.11.2003, para reconhecer, excepcionalmente, a possibilidade de realização de sustentação oral por terceiros, admitidos no processo de fiscalização abstrata de normas, sob a condição de amicuscuriae (sic). Essa nova orientação, apesar de ter contrariado os precedentes existentes (…) garante a possibilidade de que o procedimento de instrução da ação direta de inconstitucionalidade seja subsidiado por novos argumentos e diferentes alternativas de interpretação da Constituição. Esse parece ser, pelo menos, o espírito da norma constante da parte final do art. 7o, § 2o da Lei no 9.868/1999. É verdade que essa disposição remete ao parágrafo anterior – § 1º -, que restou vetado pelo Presidente da República (O § 1º do art. 7o da Lei no 9.868/1999 dispunha que: "Os demais titulares referidos no art. 2° poderão manifestar-se, por escrito, sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis para o exame da matéria, no prazo das informações, bem como apresentar memoriais.") No entanto, especialmente diante da relevância do caso ou, ainda, em face da notória contribuição que a manifestação possa trazer para o julgamento da causa, é possível cogitar de hipóteses de admissão de amicuscuriae (sic), ainda que fora desse prazo. Necessário é ressaltar, contudo, que essa possibilidade não é unânime na jurisprudência do STF. A esse respeito, vale mencionar a ADIn no 2.238-DF, Rel. Min. IlmarGalvão. Nesse caso, o relator considerou ser impossível a admissão de amicuscuriae (sic) quando o julgamento do feito já estiver em andamento, por considerar tal manifestação destinada, unicamente, a instruir a ADIn.NaADIn no 2.690-RN (Rel. Min. Gilmar Mendes), o Relator, considerando a conversão da ação para o rito do art. 12 da Lei no 9.868/99, admitiu a participação do Distrito Federal, dos Estados de Goiás, de Pernambuco, do Rio de Janeiro, da Associação Brasileira de Loterias Estaduais (ABLE) e, ainda, determinou uma nova audiência da Procuradoria Geral da República. Essa construção jurisprudencial sugere a adoção de um modelo procedimental que ofereça alternativas e condições para permitir, de modo cada vez mais intenso, a interferência de uma pluralidade de sujeitos, argumentos e visões. Essa nova realidade pressupõe, além de amplo acesso e participação de sujeitos interessados no sistema de controle de constitucionalidade de normas, a possibilidade efetiva de o Tribunal Constitucional lançar mão de quaisquer das perspectivas disponíveis para a apreciação da legitimidade de um determinado ato questionado. A constatação de que, no processo de controle de constitucionalidade, se faz, necessária e inevitavelmente, a verificação de fatos e prognoses legislativos, sugere a necessidade de adoção de um modelo procedimental que outorgue ao Tribunal as condições necessárias para proceder a essa aferição. Esse modelo pressupõe não só a possibilidade de o Tribunal se valer de todos os elementos técnicos disponíveis para a apreciação da legitimidade do ato questionado, mas também um amplo direito de participação por parte de terceiros (des)interessados. Evidente, assim, que essa fórmula procedimental constitui um excelente instrumento de informação para a Corte Suprema. Não há dúvida, outrossim, de que a participação de diferentes grupos em processos judiciais de grande significado para toda a sociedade cumpre uma função de integração extremamente relevante no Estado de Direito. (…) Assim, em face do art. 7o, § 2o, da Lei no 9.868/1999, defiro o pedido da Federação das Indústrias do Estado do Paraná – FIEP, para que possa intervir no feito, na condição de amicuscuriae (sic).”[12]
Em maio de 2006, na ADI 3329, o Ministro Cezar Peluso deferiu o pedido de intervenção do Conselho Nacional de Chefes de Polícia Civil como amicuscuriae. O Ministro entendeu que no silêncio da Lei, mesmo após o prazo das informações ter escoado, seria possível a admissão do amicus, tendo, como consequência da intervenção tardia, a impossibilidade de praticar atos processuais cujo prazo já se tenha exaurido.
Dessa forma, o amicusintervém no processo no estado tal qual se encontre:
“ADI 3329 / SC Rel. Min. CezarPeluso.
Julgamento: 17/05/2006
1. O Conselho Nacional de Chefes de Polícia Civil (CONCPC) requer admissão no processo, na condição de amicuscuriae (sic). (…) A manifestação do interveniente veio aos autos após o prazo de colheita das informações. Mas deferi, recentemente, em caso análogo, a admissão do interessado, nos seguintes termos: "É verdade que a manifestação da interveniente veio aos autos após o decurso do prazo destinado à colheita das informações. E conhece-se a interpretação segundo a qual o termo final das informações seria o único reservado à intervenção do amicuscuriae (sic), a despeito do veto imposto ao § 1º do art. 7º da Lei nº 9.868, de 1999, no qual estava previsto aquele prazo(…). Eu próprio já o sustentei alhures. Mas já não me parece deva ser esse o resultado da interpretação sistemática e teleológica da modalidade interventiva de que se cuida. (…) Como já bem se asseverou:"A admissão de terceiro, na condição de amicuscuriae (sic), no processo objetivo de controle normativo abstrato, qualifica-se como fator de legitimação social das decisões da Suprema Corte, enquanto Tribunal Constitucional, pois viabiliza, em obséquio ao postulado democrático, a abertura do processo de fiscalização concentrada de constitucionalidade, em ordem a permitir que nele se realize, sempre sob uma perspectiva eminentemente pluralística, a possibilidade de participação formal de entidades e de instituições que efetivamente representem os interesses gerais da coletividade ou que expressem os valores essenciais e relevantes de grupos, classes ou estratos sociais. Em suma: a regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº 9.868/99 – que contém a base normativa legitimadora da intervenção processual do amicuscuriae (sic) – tem por precípua finalidade pluralizar o debate constitucional" (…) Se o dispositivo que previa prazo para o ingresso do amicuscuriae (sic) no processo foi objeto de veto, não descubro fundamento normativo para induzir aplicabilidade do que se projetava como norma, que, vetada sem remédio, não chegou a integrar o ordenamento jurídico positivo, de modo a condicionar a possibilidade da intervenção. No silêncio da lei, mais razoável é reputá-la admissível, ainda ao depois do termo do prazo das informações, interpretação que, já acolhida neste Tribunal (ADInº 1.104, rel. Min. GILMAR MENDES, DJ de 29.10.2003), encontra suporte analógico na disciplina da intervenção do assistente (art. 50, § único, do CPC). A conseqüência da intervenção tardia do amicus (sic) há de ser apenas a impossibilidade de praticar atos processuais cujo prazo já se tenha exaurido. Em outras palavras, o interveniente recebe o processo no estado em que o encontre" (…) 3. Defiro, portanto, o ingresso do requerente na qualidade de amicuscuriae (sic) (…).”[13]
Por outro lado, também em 2006, o pedido de intervenção como amicuscuriae do Estado de Sergipe foi indeferido pelo Ministro Maurício Corrêa, por razões outras que não o prazo. Neste julgado, três votos já tinham sido proferidos, faltando apenas o voto vista do Ministro Gilmar Mendes. O Ministro Maurício Corrêa entendeu que, não obstante o fato de que o Tribunal reconhece a relevância do papel desempenhado pelos amicina jurisdição constitucional, tendo desta forma, proferido decisões admitindo o ingresso dos mesmos na causa após o término do prazo das informações, após a inclusão do feito na pauta de julgamento e, até mesmo, quando já iniciado o julgamento, para a realização de sustentação oral logo depois da leitura do relatório, no caso presente, contudo, o pedido de intervenção se deu num momento do julgamento definitivo em que já foram proferidos três votos, estando o Ministro Gilmar Mendes na iminência de proferir seu voto-vista. Além disso, entendeu que o veto ao art. 7º, § 1º, da Lei 9.868/99 não poderia representar uma completa ausência de limitação temporal à atividade do amicuscuriae:
“ADI 1842 / RJ Rel.Min. Maurício Corrêa.
Julgamento: 27/06/2006
O Estado de Sergipe requer o ingresso na ADI 1.842 na qualidade de amicuscuriae (sic). Observo que o pedido foi apresentado após prolatados os votos do relator, Ministro Maurício Corrêa, em 12.04.04, e dos Ministros Joaquim Barbosa e Nelson Jobim, em 08.03.06, quando,então, o Ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos. (…) 3. É certo que esta Corte, na interpretação do art. 7º, § 2º, da Lei 9.868/99, tem destacado a importância de uma maior participação do amicuscuriae (sic) nos processos de fiscalização abstrata da constitucionalidade dos atos normativos. Conforme asseverou o eminente Ministro Gilmar Mendes em despacho proferido na ADI 3.599 (DJ 22.11.05), "essa inovação institucional, além de contribuir para a qualidade da prestação jurisdicional, garante novas possibilidades de legitimação dos julgamentos do Tribunal no âmbito de sua tarefa precípua de guarda da Constituição". Exatamente pelo reconhecimento da alta relevância do papel em exame é que o Supremo Tribunal Federal tem proferido decisões admitindo o ingresso desses atores na causa após o término do prazo das informações (ADI 3.474, rel. Min. Cezar Peluso, DJ 19.10.05), após a inclusão do feito na pauta de julgamento (ADI 2.548, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 24.10.05) e, até mesmo, quando já iniciado o julgamento, para a realização de sustentação oral, logo depois da leitura do relatório, na forma prevista no art. 131, § 3º do RISTF (ADI 2.777-QO, rel. Min.Cezar Peluso). 4. No presente caso, todavia, o requerente busca atuar formalmente no processo num momento do julgamento definitivo em que já foram, como visto, proferidos três votos, estando o Ministro Gilmar Mendes na iminência de proferir seu voto-vista. Entendo que o veto ao art. 7º, § 1º, da Lei 9.868/99 não pode representar uma completa ausência de limitação temporal à atividade do amicuscuriae (sic). (…) chega o momento em que se faz necessária a manifestação decisória e fundamentada dos componentes do Tribunal, pondo-se à parte, nesse instante, a dialética travada pelos grupos que defenderam ou que se opuseram ao ato normativo questionado. Uma nova e inédita intervenção de agentes outros após o início dessa fase deliberatória desvirtuaria, ao meu ver, a pluralização do debate constitucional, pois caracterizaria uma indevida interferência circunstancial, movida pelo balanço das águas da conveniência, a depender, na sucessiva colheita de votos, da prevalência desta ou daquela posição.”[14]
Em 2007, analisando a possibilidade de intervenção da Associação Brasileira de Distribuidores de Combustíveis na ADI 2675, o Ministro Carlos Velloso indeferiu o ingresso na condição de amicuscuriae, pois o pedido foi apresentado após prolatados os votos dos ministros da Corte, inclusive o do relator, faltando apenas o do Carlos Britto:
“ADI 2675 / PE Rel. Min. Carlos Velloso. Julgamento: 10/05/2007
Associação Brasileira de Distribuidores de Combustíveis – ABCOM requer o ingresso na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.675 na qualidade de amicuscuriae (sic). Observo que o pedido foi apresentado após prolatados os votos do eminente relator, Ministro Carlos Velloso e de todos os demais integrantes da Corte, à exceção do eminente Ministro Carlos Britto, que proferirá, em data oportuna, voto de desempate.(…) 3. É certo que esta Corte, na interpretação do art. 7º, § 2º, da Lei 9.868/99, tem destacado a importância de uma maior participação do amicuscuriae (sic) nos processos de fiscalização abstrata da constitucionalidade dos atos normativos. (…) 6. Ante o exposto, indefiro o pedido formulado. Todavia, considerando a relevância da matéria e a representatividade da peticionária, admito a manifestação que acompanha a presente petição, que deverá ser juntada aos autos por linha.”[15]
Nesse sentido, também em 2007 o Relator Ministro Octávio Gallotti também indeferiu o pedido de intervenção como amicuscuriae da Federação das Empresas de Transporte de cargas do Nordeste, pois considerou o fato da peticionária ter buscado atuar formalmente no processo num momento do julgamento cautelar em curso em que já tinham sido prolatados em Plenário os votos de seis dos onze integrantes desta Suprema Corte. Entendeu ainda que o veto ao art. 7º, § 1º, da Lei 9.868/99 não pode representar uma completa ausência de limitação temporal à atividade do amicuscuriae:
“ADI 2139 Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI. Julgamento: 10/09/2007
A Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Nordeste -FETRACAN requer (…)o ingresso na ADI 2.139-MC na qualidade de amicuscuriae (sic).Observo que o pedido foi apresentado após proferidos, nojulgamento plenário do pedido de medida cautelar, os votos dorelator, Ministro Octavio Gallotti, e do Ministro Marco Aurélio,em 30.06.2000, bem como (…) É certo que esta Corte, na interpretação do art. 7º, § 2º, daLei 9.868/99, tem destacado a importância de uma maior participação do amicuscuriae nos processos de fiscalização abstrata da constitucionalidade dos atos normativos. (…) Exatamente pelo reconhecimento da alta relevância do papel em exame é que o Supremo Tribunal Federal tem proferido decisões admitindo o ingresso desses atores na causa após o término do prazo das informações(…), após a inclusão do feito na pauta dejulgamento(…) e,até mesmo, quando já iniciado o julgamento (…) 4. No presente caso, todavia, a peticionaria busca atuar formalmente no processo num momento do julgamento cautelar em curso em que já foram, como visto, prolatados em Plenário os votos de seis dos onze integrantes desta Suprema Corte. Entendo que o veto ao art. 7º, § 1º, da Lei 9.868/99 não pode representar uma completa ausência de limitação temporal à atividade do amicuscuriae. (sic) Trazidos à Corte todos os dados advindos dos diversos canais formais e informais abertos no processamento do controle concentrado de normas (petição inicial, informações das autoridades requeridas, manifestação da AGU, parecer da PGR, arrazoados e estudos dos amicicuriae (sic), memoriais, perícias, audiências públicas e sustentações orais), chega o momento em que se faz necessária a manifestação decisória e fundamentada dos componentes do Tribunal, pondo-se à parte, nesse instante, a dialética travada pelos grupos que defenderam ou que se opuseram ao ato normativo questionado.”[16]
Em 2008, o pedido de intervenção formulado pela Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro foi deferido pelo Ministro Menezes Direito, considerando os requisitos constantes do § 2º do artigo 7º da Lei 9868/99, além de outros julgados da Corte Suprema, em face da notória contribuição que a manifestação possa trazer para o julgamento da causa:
“ADI 3725 / RJ Rel.Min. Menezes Direito.
Julgamento: 01/08/2008
(…)Neste momento, por petição de 19/6/08 (nº 87860), vem aos autos a Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro requerer a sua admissão no feito na qualidade de amicacuriae (sic). Como bem se sabe, o §1º do art. 7º da Lei nº 9.868/98 foi vetado pelo Presidente da República, do que resultou certa dúvida quanto ao prazo que se deve observar para a admissão de pedidos de ingresso dos amicicuriae (sic) nos processos de fiscalização abstrata perante este Supremo Tribunal Federal, haja vista a expressão “observado o prazo no parágrafo anterior” contida logo no §2º desse mesmo dispositivo. O que se observa atualmente, contudo, é que a Corte tem sido flexível na admissão dos amicicuriae (sic) mesmo depois de passado o prazo das informações, como ilustra o seguinte trecho da decisão que proferiu o Ministro Gilmar Mendes, na ADI nº 3.998, DJ de 4/4/08, verbis: “Assim, em princípio, a manifestação dos amicicuriae (sic) haveria de se fazer no prazo das informações. No entanto, especialmente diante da relevância do caso ou, ainda, em face da notória contribuição que a manifestação possa trazer para o julgamento da causa, é possível cogitar de hipóteses de admissão de amicuscuriae (sic), ainda que fora desse prazo. Necessário é ressaltar, contudo, que essa possibilidade não é unânime na jurisprudência do STF”. (…) Ante o exposto, admito o ingresso da amicacuriae (sic)”.[17]
Em 2009, na ADI 4071, o Ministro determinou que oamicus curiae somente pudesse demandar a sua intervenção até a data em que o Relator liberasse o processo para pauta. O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, rejeitou a admissão do amicuscuriae, ao assentar que a sua intervenção estaria limitada à data da remessa dos autos à mesa para o julgamento, momento em que o relator, possivelmente, já teria a sua convicção firmada. Desta forma, entendeu que o amicuspoderia, com a sua intervenção, trazer pouca utilidade em seus fundamentos, e, além disso, trazer transtornos em relação à pluralidade de intervenções à véspera do julgamento:
“ADI 4071 AgR / DF Rel. Min. Menezes Direito. Julgamento:22/04/2009
Agravo regimental. Ação direta de inconstitucionalidade manifestamente improcedente. Indeferimento da petição inicial pelo Relator. Art. 4º da Lei nº 9.868/99. 1. É manifestamente improcedente a ação direta de inconstitucionalidade que verse sobre norma (art. 56 da Lei nº 9.430/96) cuja constitucionalidade foi expressamente declarada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, mesmo que em recurso extraordinário. 2. Aplicação do art. 4º da Lei nº 9.868/99, segundo o qual "a petição inicial inepta, não fundamentada e a manifestamente improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator". 3. A alteração da jurisprudência pressupõe a ocorrência de significativas modificações de ordem jurídica, social ou econômica, ou, quando muito, a superveniência de argumentos nitidamente mais relevantes do que aqueles antes prevalecentes, o que não se verifica no caso. 4. O amicus curiae (sic) somente pode demandar a sua intervenção até a data em que o Relator liberar o processo para pauta. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (…) Decisão – Preliminarmente, o Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, rejeitou a admissão do amicuscuriae (sic), vencidos a Senhora Ministra Cármen Lúcia e os Senhores Ministros Carlos Britto, Celso de Mello e o Presidente. (…)”[18]
Em 2010, o entendimento foi seguido na ADI 4067. O Ministro Joaquim Barbosa entendeu que o pedido para admissão nos autos na qualidade de amicuscuriae tem como prazo a liberação do processo para julgamento:
“ADI 4067 AgR/DF Rel. Min. Joaquim Barbosa. Julgamento:10/03/2010
EMENTA: PROCESSSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE CONCENTRADO. ADMISSÃO DE AMICUS CURIAE (sic). PRAZO. Segundo precedente da Corte, é extemporâneo o pedido para admissão nos autos na qualidade de amicus curiae (sic) formulado após a liberação da ação direta de inconstitucionalidade para julgamento. Agravo regimental ao qual se nega provimento.”[19]
Também em 2010, na ADI 2316, o Ministro Cezar Peluso indeferiu o pedido de intervenção na qualidade de amicuscuriae, porquanto o julgamento já teria sido iniciado, proferidos alguns votos. Apesar disso, possibilitou ao interessado apresentar memoriais, e quando do julgamento da causa, determinou que seus dados fossem considerados:
“ADI n. 2.316/DF – Rel. Min. CezarPeluso. 2010.
Verifica-se que o julgamento da ADI n. 2.316/DF já foi iniciado, tendo sido proferidos os votos do relator, Ministro Sydney Sanches e dos Ministros Carlos Velloso, Cármen Lúcia, Menezes Direito, Marco Aurélio e Carlos Britto.Por esse motivo, com base no entendimento fixado pelo Plenário, não é possível admitir intervenção de terceiros neste momento. Entretanto, ressalto que o indeferimento do pedido de intervenção não obsta que o interessado apresente memoriais aos Senhores Ministros desta Corte e que os dados por ele apresentados sejam considerados no julgamento da causa. Ante o exposto, indefiro o pedido de intervenção no feito na condição de amicuscuriae. (sic)”[20]
Contudo, certo é que, diante da evolução jurisprudencial do instituto no que tange o instante procedimental, marcou o julgamento da ADI-AgR nº 4.071 (Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 15.10.2009), em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os pedidos de ingresso dos amicicuriae somente poderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento. O entendimento na jurisprudência atual confirma o entendimento. A doutrina também tem acolhido como marcante a decisão do Ministro Menezes Direito na ADI 4071 de 2009.[21] Até maio de 2012, foi encontrada, na busca pelo termo “curiae” [22], o qual abrange tanto “amicuscuriae”, quanto “amicicuriae” ou “amicacuriae”, no site do Supremo, especificamente sobre o instante procedimental, a marcante ADPF 153, Relator Ministro Luiz Fux:
“ADPF 153 ED/ DF. Rel. Min. LuizFux.
Julgamento: 03/05/2012
Trata-se de Embargos de Declaração interpostos pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil por suposta omissão no acórdão proferido pelo Pleno desta Corte que reconheceu a constitucionalidade da Lei da Anistia.
Em petição de nº 16. 582/2012 e 17.250/2012, o Centro Acadêmico XI de Agosto formula pedido de seu ingresso nos autos como amicuscuriae (sic). Em breve síntese, a referida entidade sustenta que possui representatividade e que o tema debatido nos autos acarretará considerável repercussão social. Passo a apreciar o pleito. Ab initio, cumpre registrar que, na sessão do dia 22 de abril de 2009, no julgamento da ADI-AgR nº 4.071 (Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 15.10.2009), o Plenário deste Supremo Tribunal Federal decidiu que os pedidos de ingresso dos amicicuriae (sic) poderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento. A ementa do julgado é a que segue: (…) 4. O amicuscuriae (sic) somente pode demandar a sua intervenção até a data em que o Relator liberar o processo para pauta. (…) Incasu, o feito foi liberado para julgamento pelo Plenário e já foi, inclusive, incluído em pauta. De acordo com a orientação desta Corte acima transcrita, essa razão impede o deferimento do pedido formulado pelo Centro Acadêmico XI de Agosto, instituição de reconhecida idoneidade e de elevada representatividade, de ingresso como amicuscuriae (sic) nos autos.”[23]
A Corte Suprema mantém o posicionamento em decisões mais recentes ainda:
“ADI 4713 MC / DF – DISTRITO FEDERAL
MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator(a):Min. LUIZ FUX
Julgamento: 11/12/2012
O Estado de São Paulo requer sua admissão no feito na qualidade de amicuscuriae, (sic) conforme petição de n. 11.748/2012 – STF. A pertinência do tema a ser julgado por este Tribunal com as atribuições institucionais da requerente legitima a sua atuação. Ademais, na sessão do dia 22 de abril de 2009, no julgamento da ADI-AGR n. 4.071 (Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 15.10.2009), o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os pedidos de ingresso dos amicicuriae (sic) poderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento, o que revela a tempestividade deste pedido. Assinalo, por necessário, que, em face de precedentes desta Corte, notadamente daquele firmado na ADI 2.777-QO/SP, o amicuscuriae (sic), uma vez formalmente admitido no processo de controle abstrato de constitucionalidade, tem o direito de proceder à sustentação oral de suas razões, observado, no que couber, o § 3º do artigo 131 do RISTF, na redação conferida pela Emenda Regimental n. 15/2004. Ex positis, (sic) admito o ingresso do Estado de São Paulo no feito, na qualidade de amicuscuriae, (sic)na forma do artigo 7º da Lei n. 9.868/99. [24]
ADI 4772 MC / DF – DISTRITO FEDERAL
MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator(a):Min. LUIZ FUX
Julgamento: 11/12/2012
Publicação PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-245 DIVULG 13/12/2012 PUBLIC 14/12/2012O Governador do Estado do Rio de Janeiro requer sua admissão no feito na qualidade de amicuscuriae, (sic) conforme petição de n. 41.569/2012 – STF. A pertinência do tema a ser julgado por este Tribunal com as atribuições institucionais da requerente legitima a sua atuação. Ademais, na sessão do dia 22 de abril de 2009, no julgamento da ADI-AGR n. 4.071 (Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 15.10.2009), o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os pedidos de ingresso dos amicicuriae (sic) poderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento, o que revela a tempestividade deste pedido. Assinalo, por necessário, que, em face de precedentes desta Corte, notadamente daquele firmado na ADI 2.777-QO/SP, o amicuscuriae, (sic) uma vez formalmente admitido no processo de controle abstrato de constitucionalidade, tem o direito de proceder à sustentação oral de suas razões, observado, no que couber, o § 3º do artigo 131 do RISTF, na redação conferida pela Emenda Regimental n. 15/2004. Ex positis, admito o ingresso do Governador do Estado do Rio de Janeiro no feito, na qualidade de amicuscuriae, (sic) na forma do artigo 7º da Lei n. 9.868/99.[25]
ADI 4817 MC / DF – DISTRITO FEDERAL
MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Relator(a):Min. LUIZ FUX
Julgamento: 11/12/2012
Publicação PROCESSO ELETRÔNICO
O Ministério Público do Estado do Paraná requer sua admissão no feito na qualidade de amicuscuriae, (sic) conforme petição
(…).Ademais, na sessão do dia 22 de abril de 2009, no julgamento da ADI-AGR n. 4.071 (Rel. Min. Menezes Direito, DJ de 15.10.2009), o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os pedidos de ingresso dos amicicuriae (sic) poderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento, o que revela a tempestividade deste pedido.Assinalo, por necessário, que, em face de precedentes desta Corte, notadamente daquele firmado na ADI 2.777-QO/SP, o amicuscuriae,(sic) uma vez formalmente admitido no processo de controle abstrato de constitucionalidade, tem o direito de proceder à sustentação oral de suas razões, observado, no que couber, o § 3º do artigo 131 do RISTF, na redação conferida pela Emenda Regimental n. 15/2004.”[26]
Assim, conforme se depreende das decisões do STF, até o momento atual o entendimento predominante é que os pedidos de ingresso dos amicicuriaepoderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento.
Considerações finais
Mesmo antes de possuir regulamentação, o instituto amicuscuriae recebera referências na jurisprudência brasileira. Apesar disso, no controle de constitucionalidade é, relativamente, um tema novo, e ganhou relevo quando regulamentado pelas Leis 9868/99 e 9882/99, inovando a prática constitucional nos julgamentos das ações diretas e em arguição de descumprimento de preceito fundamental, passando a interferir na prática decisória da Corte Suprema.
O instituto amicuscuriae, conforme foi analisado, é, no Brasil, presente não apenas no controle concentrado de constitucionalidade. O tema da intervenção de certos terceiros a processos fora previsto na legislação ordinária e o próprio Poder Judiciário reconhecera situações tais como interferências de amicuscuriae, no que tange pessoas jurídicas de direito público, e, também, a regulamentação do referido instituto no controle concentrado veio a afetar o controle difuso, pois inseriu nova regulamentação no Código de Processo Civil no que tange a questões incidentais de discussão de constitucionalidade.
Entretanto, este estudo analisou a importância do referido instituto no controle concentrado de constitucionalidade, revelada pela abertura da jurisdição constitucional, pluralizando o debate, permitindo que haja legitimidade na aproximação do exercício da função precípua do STF de guarda da Constituição da sociedade brasileira como um todo, e não apenas em seus efeitos inter partes, como ocorre no controle difuso.
Com a Constituição de 1988, inaugurou-se uma nova ordem constitucional. Pela ampliação do rol de legitimados ativos para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade e pela previsão de mecanismos de controle abstrato, foi possível uma abertura na jurisdição constitucional, o que de fato contribuiu para o objetivo de ampliar a participação da sociedade no controle judicial de questões nas quais a ordem constitucional é violada.
Inspirou-se então o legislador da Lei 9868/99 e da Lei 9882/99 a instaurar no ordenamento pátrio modelo aberto de constitucionalidade, o qual caracterizou-se, a priori, pela possibilidade de requisição de informações e a abertura à manifestação de alheios ao processo, enfatizando o princípio democrático adotado expressamente pelo constituinte de 88.
Desta forma, o amicus funciona como especial terceiro interessado, que, ao intervir no feito, enriquece o debate judicial sobre questões fáticas e jurídicas, seja por iniciativa própria ou por requisição judicial, de maneira a transportar para o judiciário questões dispersas na sociedade civil e no próprio Estado, tendo em vista que a tomada da decisão pelo Poder Judiciário pode refletir na sua situação.
Questões polêmicas sobre o referido instituto foram estudadas. O artigo 7º § 2º da Lei 9868/99 é silente no que diz respeito ao instante procedimental da intervenção do amicuscuriae na ADI genérica. Há, portanto, acirrada controvérsia sobre o assunto. Referido dispositivo estabelece que a manifestação dos órgãos e entidades deva observar o prazo fixado no parágrafo anterior (§ 1º do artigo 7º da Lei 9868/99). Ora, se o próprio § 1º foi vetado, não há dispositivo regulando a questão. Em relação a ADI por omissão, como o artigo 12 – E da Lei 9868/99 dispõe que neste tipo de ação serão observadas, no que for possível, as regras que disciplinam a ADI genérica, fácil identificar a ausência de regras determinando o instante procedimental do amicus, quando órgãos ou entidades, com base no artigo 12-E c/c 7º § 2º. Entretanto, quando se tratar dos demais titulares do artigo 2º, os quais poderão manifestar-se, por escrito, sobre o objeto da ação e pedir a juntada de documentos reputados úteis para o exame da matéria, bem como apresentar memoriais, o prazo é sim estabelecido, qual seja, o das informações.
Quando tratar-se de ADC, surgem, quanto ao instante e ao prazo da manifestação do amicuscuriae, as mesmas dúvidas com relação a ADI, porquanto os §§ 1º e 2º do artigo 18 da Lei 9868/99 foram vetados. Além disso, a doutrina é divergente acerca do assunto e, portanto, fica a critério da jurisprudência fixar qual o momento em que o amicusé admissível.
Em relação à ADPF,devem ser analisadas duas vertentes. Quando voluntária a participação do amicus, há limitação temporal: para a apresentação de manifestação por escrito ou juntada de documentos, limite é até o lançamento do relatório, que, pela leitura do artigo 7º da Lei 9882/99, é ato imediatamente anterior ao julgamento; já para sustentação oral, as condições são determinadas caso a caso pelo relator, e a manifestação ocorre no próprio julgamento. Quando, em sede de ADPF, a manifestação do amicus se perfaz por requisição do relator, surgem as mesmas dúvidas com relação a ADI e ADC, já citadas.
Diante da análise legal e doutrinária coube analisar a evolução jurisprudencial no que a tange, em busca de uma possível solução. O entendimento predominante no Pretório Excelso, até o momento, é que os pedidos de ingresso dos amicicuriaepoderão ser formulados até a inclusão do processo em pauta para julgamento.
Ao cabo das considerações precedidas, contudo, a intervenção do amicuscuriae na jurisdição constitucional e sua consequente atuação no feito é uma decorrência do princípio democrático. Isso possibilita uma abertura procedimental, de acesso e garantia à justiça. A atuação dos amicipermite que o processo vá para além da história meramente narrativa, dando voz à sociedade brasileira, manejando poderes indispensáveis do tecido social à percepção do julgador.
Informações Sobre o Autor
Ana Beatriz Passos Tinoco
Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense UFF. Mediadora formada pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro EMERJ