Já analisamos as questões relativas às obtenções de dados cadastrais
de pessoas físicas e jurídicas, e também de obtenção de extratos de pessoas
jurídicas. Passamos agora ao tema da quebra de sigilo bancário de pessoas
físicas.
Mais do que somente em relação às Pessoas Jurídicas, há quem sustente,
e de forma bastante convincente, a possibilidade do Ministério Público
requisitar também a quebra de sigilo bancário em relação às Pessoas Físicas.
Sustentam em síntese que, tendo
recebido poderes para receber diretamente os dados relativos aos extratos
bancários por parte do Banco Central (Art. 4º
da Lei nº 4728/65); tendo poderes investigatórios determinados pelas
Leis Orgânicas Nacionais do MP (Lei Complementar nº 40/81 e a sua revogadora Lei nº
8.625/93 – art. 26); como também pela Constituição Federal (art. 129
VI), que as recepcionou; tendo recebido também poderes da própria Constituição
Federal para receber estes dados diretamente das CPIs (art. 58); e ainda tendo
recebido do legislador, no âmbito da Ministério Público da União esta
incumbência perfeitamente descrita (Lei nº
7.492/86 – art. 29), não pode restar qualquer dúvida de que possa
fazê-lo diretamente, sem necessidade de autorização judicial. Veja-se, a propósito, FERNANDES DE LIMA,
Walberto, – em “A Quebra do sigilo
bancário por ato do Ministério Público Estadual“. Revista do
Ministério Público – Rio de Janeiro, V.1 nº 1, 1995, págs. 167 e segs., cuja
Leitura recomendamos até por se tratar de análise impressionantemente bem
construída da sistemática da legislação vigente e sua evolução a respeito do
tema.
Não só na doutrina, mas também na jurisprudência a solução parece
começar a se posicionar no mesmo sentido. Há decisões recentes dos Tribunais no
sentido de que o Ministério Público pode quebrar sigilo bancário de pessoas
físicas – inclusive estes – extratos, boletos, saldos de movimentações etc.,
sem autorização judicial. Veja-se a decisão unânime proferida pela 2a turma do
TRF da 2a Região, nos autos de HC de número 2001.02.01.033100-1, que sentencia
e define: “O Ministério Público tem
que ser poderoso sim, principalmente porque o Brasil é um dos países em que há
mais desiquilíbrio entre os ditos interesses públicos e o real interesse da
sociedade; um país onde muitos que deveriam ser os primeiros a dar o exemplo
não cumprem a Lei. Diante disso, como não se vai investigar?”.
Constata-se que a tendência incontestável do nosso sistema jurídico é
seguir o caminho já trilhado pelos países europeus em direção ao fortalecimento
do Ministério Público no âmbito da investigação criminal.
Quebra
de sigilo das operações de Cartões de Crédito
Não há previsão legal expressa a respeito de eventual obrigatoriedade
de manutenção de sigilo em relação às operações realizadas através das
Administradoras de cartões de créditos. A Lei n° 4.595/64 refere-se a
“Instituições Financeiras” – e as Administradoras de cartões não o são.
Há que se considerar então que elas não têm a mesma natureza das
operações bancárias. As transações realizadas por instituições financeiras são
caracterizadas pelo ingresso e saída de dinheiro ou de aplicações e resgates no
mercado financeiro. Já as operações realizadas através da utilização dos
cartões de crédito decorrem sempre de aquisição de produtos com pagamento a
posteriori e/ou a prazo. Referem-se, portanto, à concessão de linha de crédito
que não são prestados por Instituição Financeira, mas por Entidades privadas
diversas.
Tampouco há sigilo protegido pela intimidade das pessoas decorrente da
aquisição de produtos. Por tudo isso não se justifica a aplicação por analogia
do artigo 38 da Lei n° 4.595/64 para as operações realizadas através dos
cartões de crédito, o que torna desnecessária a ordem judicial e viabiliza a
sua requisição direta do Ministério Público nos termos do artigo 26, I e II da
Lei n° 8.625/93.
Por outro lado, ainda que se considere comparável a situação das
Instituições Financeiras e das Administradoras de Cartões de Créditos, a
fundamentação acima referida com relação às Pessoas Físicas elimina qualquer
dúvida a respeito da possibilidade do Ministério Público, com base na
sistemática legislativa atual, ter poderes para requisitar-lhes qualquer
informação a respeito de operações, transações, dados cadastrais etc.
A obtenção dos dados das
operações realizadas através da utilização de cartões de crédito também podem
configurar importante elemento de prova do processo relativo à investigação do
crime organizado. Por esse instrumento pode ser possível, por exemplo, a
caracterização, entre outros, de gastos evidentemente maiores do que a renda
possível e declarada, a formação de vínculos entre pessoas de m mesmo grupo,
etc.
Informações Sobre o Autor
Marcelo Batlouni Mendroni
Promotor de Justiça/SP – GEDEC, Doutor em Processo Penal pela Universidad de Madrid, Pós-Doutorado na Università di Bologna/Italia