Recursos nos juizados especiais cíveis: Visão Pragmática

Resumo: Sem pretensão de esgotar o tema, o presente estudo é dirigido para auxiliar os profissionais do direito que militam na seara dos Juizados Especiais, procurando abordar de forma pragmática quais os recursos cabíveis nas três principais fases do processo (instrução processual, sentença singular e acórdão das Turmas Recursais), mas sem se aprofundar demais nas questões doutrinárias que permeiam o assunto, como possível ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição e devido processo legal, matéria complexa que desafia estudo mais aprofundado, quiçá numa próxima oportunidade. O presente estudo analisa, portanto, o cabimento ou não de recursos na seara dos Juizados Especiais Cíveis, de forma objetiva e prática, com vistas a fornecer elementos que propiciam ao aplicador do direito valer-se de instrumentos aptos a modificar decisões contrárias aos interesses das partes que representa.

Palavras-chave: Juizados Especiais Cíveis; Recursos; Ação Rescisória; Revisão das Decisões Judiciais.

Sumário: 1. Introdução 2. Breve visão do processo no juizado especial cível Lei 9.099/95. 3. Recursos nos juizados especiais cíveis. Principais Recursos. 3.1 Fase Instrutória. 3.2. Sentença Singular 3.3. Acórdão 4. Ação rescisória. 5. Principais enunciados do FONAJE em matéria recursal. 6. Quadro sinótico. 7. Conclusão. Referências.

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1. INTRODUÇÃO

Trata-se de um tema pouco explorado pela doutrina e difícil compreensão para aplicadores do direito que não militam na seara dos Juizados Especiais, causando até certa perplexidade quando descobrem que pouco, ou quase nada podem fazer com relação a decisões proferidas durante a instrução processual e até mesmo em audiência. Não raro são às vezes que diante da falta de afinidade com o tema os procuradores das partes valem-se do famoso ‘protesto’, contra alguma decisão proferida em audiência, como se isso fosse algum recurso ou tivesse alguma serventia para depois tomar as providências que entender cabíveis. Com relação ao acórdão proferido pela Turma Recursal, igualmente, o tema causa estranheza aos mais desavisados quando se deparam com o ‘Julgamento por Súmula’ ao confirmar a sentença singular por seus próprios fundamentos, cujo expediente recursal cabível é quase inexistente.

Procura-se demonstrar de forma clara e objetiva quais os recursos cabíveis e um pouco do seu processamento, destacando-se as principais diferenças com os recursos delineados no Código de Processo Civil e procurando estancar as dúvidas mais freqüentes e corriqueiros equívocos que normalmente são verificados na seara dos Juizados Especiais.

2. BREVE VISÃO DO PROCESSO NO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL – LEI 9.099/95

É de vital relevância conhecer a sistemática do processo no Juizado Especial, Lei n. 9.099/95, para só então compreender e entender as formas de se revisar as decisões proferidas ao longo da lide. Sem se ter uma idéia ainda que geral e aproximada desse edifício chamado processo sumaríssimo no Juizado Especial, dificilmente ter-se-ia a exata compreensão de uma dessas bases e alicerces do sistema, a saber, a matéria recursal delineada no rito processual e procedimental dos Juizados Especiais.

Numa rápida leitura dos artigos 14 a 40 da Lei 9.099/95 já se é possível conhecer um pouco do rito sumaríssimo dos Juizados Especiais, destacando-se nestes dispositivos o pedido, a resposta do réu e conseqüências da inércia, as audiências de tentativa de conciliação, instrução e julgamento e a sentença.

Como se pode ver, de forma muito rápida e singela, o legislador contemplou todos os elementos do processo moderno: Jurisdição, Ação, Defesa e Processo, ou seja, pedido (ação, arts. 14-19), defesa (resposta ou contestação, arts. 20, 30-31), jurisdição (decisão, arts. 38-40) e processo (atos e procedimentos tendentes à resposta jurisdicional, arts. 14-40).

Destarte, o sistema recursal num ambiente tão célere e simples (art. 2º, Lei 9.099/95), não haveria de se destoar desses princípios informadores, destacando-se a presença pessoal do juiz togado, obrigatoriamente exigível somente no momento da homologação da sentença (art. 40), sem olvidar, obviamente, que o juiz titular exerce a supervisão durante todo o tramitar do processo nos Juizados Especiais, mas sua presença física e para falar nos autos somente será obrigatória no momento da homologação da proposta de sentença pelo juiz leigo ou quando instado pelas partes a se manifestar, durante a instrução do processo, como por exemplo, algum pedido de liminar ou intimação de testemunha.

Na primeira instância não há, portanto, previsão legal para nenhum recurso![1]

Preferiu a lei, dessa forma, prestigiar o desenrolar do processo deixando todas as hipóteses recursais para somente após o juiz falar nos autos e decidir a lide. Então, com o Recurso Inominado (art. 41), as partes poderiam deduzir toda e qualquer irregularidade ocorrida durante o tramitar do processo, sem qualquer problema quanto à preclusão, tal como ocorre no processo civil, notadamente, com o Recurso de Agravo Retido e por Instrumento.

Como se vê, o processo do Juizado Especial é célere. Não há espaço para recursos antes da sentença, não havendo como falar, então, em preclusão recursal durante a instrução processual, sendo absolutamente desnecessários os famigerados pedidos de ‘protestos’ declinados pelos advogados das partes durante as audiências. Ora, se não há previsão recursal contra decisão proferida na fase instrutória, então, não há qualquer necessidade de pedido de protesto para consignar na ata o indeferimento desse ou daquele requerimento, bastando declinar essa insatisfação por ocasião do Recurso Inominado, sem qualquer obstáculo preclusivo.

 Sem embargo, fomenta o processo sumaríssimo relevante avanço em favor da desburocratização com a instalação do sistema gestacional, gerencial ou de controle a posteriori.

Sabe-se que num sistema burocrático a forma típica de controle dos atos praticados é a priori, ou seja, antes de serem praticados, enquanto no sistema gerencial ou de gestão, o controle dos atos praticados é realizado a posteriori, traduzindo inegável celeridade, eficiência e efetividade dos atos praticados.

Nesse cenário é que começam as primeiras críticas e alusões de ofensa a princípios tradicionalmente invocados como devido processo legal e duplo grau de jurisdição. Nessa questão, como delineado, não se há de ousar imiscuir, pois a discussão do que é válido ou inválido não traria, nesse momento, qualquer benefício aos fins que o estudo se destina: basicamente, demonstrar a sistemática recursal nos Juizados Especiais.

Consigne-se apenas nossa posição incomensurável de apoio a atual sistemática dos Juizados Especiais, pois, de lege ferenda o processo ordinário ou comum tende a seguir um pouco desse espírito inovador e célere dos Juizados Especiais, deixando para depois discussões de somenos quanto à validade formal ou de atos praticados, até porque é cabível Mandado de Segurança para afastar eventuais atos de ilegalidade e abuso de poder praticados durante a instrução processual e, também, a hipótese excepcional do recurso de Agravo, nos termos do art. 544 e 557, do Código de Processo Civil, na forma preconizada no Enunciado 15 do Fonaje – “Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC.” (Modificado no XXI Encontro – Vitória/ ES).   

Partindo-se dessas premissas, começamos a compreender a exígua hipótese recursal nos Juizados Especiais e podemos avançar sem maiores delongas no presente estudo.

3. RECURSOS NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.

A Lei 9099/95 prestigiou o principio da oralidade na tônica do processo dos Juizados Especial, deduzindo a concentração dos atos processuais em audiência.

Como tal, em primeira instância, há apenas um único Recurso previsto na citada lei, art. 41, sem nominá-lo especificamente, recebendo o batismo pela doutrina de “Recurso Inominado”. Propositadamente, a lei o fez para evitar naturais comparações com a apelação do Código de Processo Civil.

Há também a previsão legal dos Embargos de declaração (art.48), que não são tidos pela doutrina, à unanimidade, como recurso, pois a priori seria apenas um incidente de complementação do julgado.

Isso se deve porque, via de regra, somente haverá pronunciamento oficial pelo Estado-juiz no momento em que receber os autos para homologar a proposta de sentença lançada pelo juiz leigo, após o encerramento da fase postulatória e instrutória, não havendo necessidade, portanto, de previsão recursal antes do pronunciamento do juiz togado.

É consabido, no entanto, que vários casos necessitam de resposta do juiz antes da sentença, por exemplo, apreciar pedido de liminar, produção de alguma prova em outra comarca, intimação de testemunhas e até mesmo parecer técnico em audiência, e havendo decisão que colide com o interesse da parte, o que fazer, uma vez que inexiste previsão recursal?

A primeira resposta, nos termos da lei, seria aguardar a sentença. Se ela conflitasse a pretensão da parte interessada, então, poderia alegar a ofensa em preliminar do Recurso Inominado e aguardar a resposta pela instância superior, por outro lado, se a sentença fosse favorável, então, não haveria necessidade de recurso algum.

Mas a resposta não atende às mais variadas espécies de conflitos, pois não há como duvidar a multiplicidade de demandas e casos em que o direito da parte seria irreparável ou de difícil reparação, caso se aguardasse o final da demanda.

Por exemplo, o nome de uma pessoa no cadastro de inadimplentes, a produção de uma prova em outra comarca ou a intimação de testemunhas, todos esses casos traduzem conseqüências que a sentença, mesmo sendo favorável, pode não surtir efeito almejado ou benéfico em favor da parte interessada, como resolver, então, a decisão que conflita esses interesses ou que determina apenas que a parte aguarde o pronunciamento final?

Como não há previsão recursal, a única forma de se reverter decisão prolatada antes da sentença é interpor outra ação, o Mandado de Segurança.

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É absolutamente ineficaz e sem necessidade nenhuma ‘protestar’ ou pedir para o juiz leigo colocar na ata de audiência a insatisfação com aquela decisão. Não vai resolver nada!

Ou se ingressa com Mandado de Segurança ou, o mais correto, aguardar a sentença final: se for favorável, termina-se bem e não há necessidade recursal; se for contrária, alega-se aquela decisão conflitante em sede preliminar do Recurso Nominado.

Há também a recente hipótese preconizada no Enunciado 15 do Fonaje: Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC. Essa hipótese objetiva fazer subir recurso que foi liminarmente negado o seguimento pelo próprio órgão julgador, no caso do art. 544, para instância superior, as Turmas Recursais e, no caso do art. 557, para os Tribunais Superiores, o Supremo Tribunal Federal, tratando-se de decisão de Turma Recursal que nega seguimento a recurso destinado ao STF.

Principais Recursos

Didaticamente, apresentaremos a seguir os principais recursos cabíveis nas três principais fases do processo sumaríssimo nos Juizados Especiais. Lembrando-se que recurso, em sentido estrito, é o instrumento destinado a modificar uma decisão judicial à luz do interesse da parte prejudicada no decorrer de uma ação.

Portanto, embora, o mandado de segurança não seja recurso em sentido estrito, arrolaremos ele como se recurso fosse, diante das peculiaridades do Juizado Especial já delineadas acima.

3.1 Fase Instrutória.

Petição Inicial:

Como demonstrado acima, a rigor, o processo sumaríssimo orienta a conclusão do processo ao juiz titular somente por ocasião da homologação da proposta de sentença lançada pelo juiz leigo, porém, é sabido que em muitos juizados a praxe determina a remessa dos autos ao juiz para fazer uma análise preliminar e marcar a audiência conciliatória, conforme as condições e peculiaridades locais.

Ainda que não seja essa a determinação da lei, podem ocorrer algumas situações, dentre as quais destacamos:

O juiz recebe a petição inicial: trata-se de mero despacho e, por isso, não comporta qualquer recurso.

O juiz indefere de plano: ainda que não esteja previsto em lei é pacífico o cabimento do Recurso Inominado (art. 41).

Pedido de Liminar:

O juiz defere ou Indefere: cabe Mandado de Segurança.

Audiências Conciliação ou Instrução e Julgamento:

O juiz designa, adia, cancela ou determina a continuação do ato em outra data: mero despacho que não cabe recurso. Eventualmente, pode comportar mandado de segurança para evitar a prova cingida ou violação a direito da ampla defesa.

Intimação de Testemunhas / Produção de provas em outra comarca:  O juiz defere a produção da prova na forma requerida: mero despacho que não cabe recurso – só objeção com relação às testemunhas nos termos do art. 405 e ss do CPC, no momento da qualificação da testemunha

O juiz indefere a produção de prova: a princípio não cabe Mandado de Segurança, pois essa decisão não afronta lei. Pode-se alegar cerceamento de direito em preliminar de Recurso Inominado se se comprovar prejuízo.

Produção de Prova Pericial/ Perícia Técnica:

Em caso de indeferimento pode-se alegar cerceamento de direito em preliminar de Recurso Inominado se se comprovar prejuízo.

Caso seja deferida, essa decisão será irrecorrível, pois se pode produzir essa prova desde que seja em audiência, nos termos dos arts. 32, 33 e 35 da Lei 9099/95[2].

Oitiva de Testemunhas em Audiência:

Tanto em casos de deferimento ou indeferimento pode-se alegar cerceamento de direito em preliminar de Recurso Inominado e comprovar prejuízo.

Eventualmente, caberá Mandado de Segurança se a decisão deferir oitiva de testemunha impedida, suspeita ou menor, caracterizando ofensa ao art. 405, do CPC, observando-se o §4º do mesmo artigo[3].

Agravo de Instrumento:

Não se tem admitido, mesmo sob relevantes protestos doutrinários em sentido contrário:

Joel Dias Figueira Júnior defende a admissibilidade excepcional do agravo de instrumento na hipótese da decisão interlocutória tratar sobre o mérito, em casos de tutelas de urgência (concessiva ou denegatória) e a decisão puder causar prejuízo à parte interessada, face ao decurso do tempo, ou na hipótese de negativa de processamento de recurso ou meio de impugnação. Erick Linhares, por sua vez, entende o não cabimento da interposição de agravo de instrumento, face a falta de previsão legal, salvo nas hipóteses de denegação de recurso extraordinário”[4]

Sem embargo, continua o escólio do eminente professor:

“O Juizado Especial Federal, regido pela Lei 10.259/2001, prevê em seu art. 4º a possibilidade da concessão de medidas cautelares no curso do processo. Por sua vez, o art. 5º, admite a possibilidade da interposição de recurso sobre a decisão que concede medida cautelar incidental. Vejamos:Art. 4º O Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferirem medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação. ‘Art. 5º Exceto nos casos do art. 4º, somente será admitido recurso de sentença definitiva’.

Porém, tal regra não vem sido aplicada por analogia pelas Turmas Recursais dos juizados especiais estaduais. A justificativa reside no fato de que o art. 1º da Lei 10.259/2001 estabelece: "São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta lei, o disposto na Lei 9.099/95, de 26 de setembro de 1995" (grifamos).

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Por outro lado, a recíproca não seria verdadeira, pois a Lei 10.249/2001 não determina sua aplicação, no que não conflitasse, ao procedimento previsto na Lei 9.099/95, razão pela qual, as regras processuais dos juizados especiais federais não poderiam ser manejadas perante os juizados especiais estaduais.”[5]

Assim, apesar da divergência doutrinária, o entendimento consolidado pelo FONAJE e pela jurisprudência majoritária das Turmas Recursais defende que a interposição de agravo de instrumento só tem lugar em questões pertinentes a subida ou não de Recurso Extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, cujo seguimento pela Turma Recursal tenha sido irregularmente negado.

3.2. Sentença Singular

Recurso Inominado.

O recurso inominado delineado no art. 41 da Lei 9099/95 é cabível contra a sentença proferida em primeira instância, excetuadas as homologatórias de acordo ou de laudo arbitral, as quais são irrecorríveis.

Relembramos, por esse motivo, qualquer outra decisão interlocutória não preclui e pode ser atacada, ao final, pelo recurso inominado do art. 41 da Lei 9099/95.

Ademais, em razão da celeridade que preside o sistema dos Juizados Especiais, não há previsão legal para agravo, recurso adesivo, embargos infringentes e outros recursos eventualmente admitidos nos regimentos internos de tribunais ou leis de organização judiciária local, salvo aquele Agravo delineado nos arts. 544 e 557 do CPC, já mencionados, e que serve para determinar a remessa dos autos ao tribunal ad quem.

O prazo de interposição é de 10 (dez) dias, mesmo prazo para as contrarrazões, contados da intimação da sentença, e não da juntada aos autos da intimação (art. 42).

Por motivos que não convém delinear nesse estudo, pretendeu a lei houvesse exigir a presença de advogado para a interposição desse recurso (art.41, parágrafo 2°), talvez como forma de se delimitar dificuldades para a revisão do julgado e retardar o transito em julgado, talvez pelo motivo louvável de se evitar prejuízos à parte, que poderia ter dificuldade em elaborar a peça técnica recursal, demonstrando o equívoco da decisão.

Em primeira instância não se contam custas processuais na seara dos Juizados Especiais (art. 55), porém, pretendendo a parte modificar o resultado da demanda, deverá antecipar o valor das custas inerentes e mais o preparo recursal (art. 42).

Tratando-se de pessoa pobre na forma da lei, ao contrário de entendimento diverso, com a devida vênia temos que não há qualquer necessidade da parte autora pleitear na petição inicial os benefícios da justiça gratuita, assim como o réu na contestação, pois a necessidade de tal pedido somente exsurge a partir do momento em que a parte pretende recorrer. Ademais a Lei 1060/50 preconiza que o pedido de justiça gratuita pode ser formulado a qualquer tempo, no ‘curso da ação’[6], cujo processamento não se dá em apartado, senão nos próprios autos.

Tais exigências (assistência por advogado e pagamento de custas) revelam nítido propósito do legislador em desestimular a interposição de recursos, mas que reafirmamos, tais motivações não nos interessam momentaneamente o presente estudo.

O juízo prévio de admissibilidade é realizado pelo próprio Juízo recorrido, a quo, tão-logo seja ele interposto, e comporta reexame pela Turma Recursal. O recurso tem efeito apenas devolutivo, podendo ser postulado o efeito suspensivo, se a execução imediata do julgado puder causar ao sucumbente, dano irreparável ou de difícil reparação (art. 43).

Caso seja negado seguimento ao recurso ou rejeitado o pedido de justiça gratuita, o interessado pode-se valer do recurso de Agravo ou Mandado de Segurança.

Como já demonstrado, a sentença de primeiro grau não impõe ao vencido o ônus da sucumbência, ressalvados os casos de litigância de má-fé. Em grau de recurso, no entanto, o recorrente vencido arcará com as custas e honorários advocatícios, que serão fixados pela Turma Recursal, de 10% a 20% do valor da condenação ou do valor corrigido da causa, nos termos do art.55[7].

Importa reconhecer que somente o Recorrido vencedor poderá obter a verba sucumbencial de honorários advocatícios, caso contrário, ainda que o recorrente seja parcialmente vencedor estará dispensado desse pagamento, nos termos do citado art. 55, pois “o recorrente, vencido, pagará as custas e honorários de advogado”.

Embargos de declaração:

Parte da doutrina entende que não se trata de recurso propriamente dito, pois seu objetivo é apenas complementar uma decisão eivada de vício de obscuridade, contradição, omissão ou dúvida (art. 48 da Lei 9099/ 95).

Esses Embargos diferem-se daquele do Código de Processo Civil, na medida em que, nestes, cabem em caso de ‘dúvida’[8], situação não preconizada naquele e, também, o prazo do recurso principal é apenas suspenso na seara dos Juizados Especiais, enquanto que, naquele, o prazo do recurso principal é interrompido.

Os embargos de declaração são oferecidos no prazo de 05 (cinco) dias, contados da ciência da decisão e, uma vez recebidos, suspendem (e não, interrompem) o prazo recursal, que, após a ciência da decisão dos embargos, volta a fluir pelo prazo eventualmente restante (art.49 e 50).

Recurso adesivo:

Não é cabível. Enunciado 88, Fonaje – Não cabe recurso adesivo em sede de Juizado Especial, por falta de expressa previsão legal (Aprovado no XV Encontro – Florianópolis/SC).

Tem-se admitido que questões de ordem pública tais como termo inicial da incidência de correção monetária e juros legais podem ser suscitadas em preliminar de contrarrazões, pois essas questões podem ser declaradas de ofício pelo julgador, mas mesmo assim, não se trata de recurso adesivo.

3.3. Acórdão[9]

Não há previsão de recurso específico contra o Acórdão proferido pela Turma Recursal, senão os Embargos de Declaração (art. 48), como forma de se corrigir eventuais vícios de obscuridade, omissão, contrariedade e dúvida.

Subsunção ao Tribunal de Justiça Estadual.

Apreciado o recurso cível pela Turma Recursal, não há lugar para reexame pelo Tribunal de Justiça. Em acórdão de 1993, o Superior Tribunal de Justiça já reconhecia não ter o Tribunal Estadual competência originária, nem recursal, para rever as decisões do Colégio Recursal do, então, Juizado de Pequenas Causas[10], matéria pacífica e que dispensa maiores comentários.

Recurso Especial.

Não é cabível, a teor da súmula 203 do Superior Tribunal de Justiça: "Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais".

Sua interposição, nos termos do art. 105 da Constituição Federal, só é admissível, quando a decisão recorrida for proferida em única ou última instancia, por Tribunais. Ora, as Turmas Recursais não constituem Tribunal, senão mero órgão colegiado, não sendo possível, portanto, a utilização deste expediente recursal.

Há, porém, a possibilidade do STJ determinar uma ordem de natureza cautelar que afeta todo o trâmite da ação perante os Juizados Especiais. É que subsistindo dúvida quanto a competência para apreciar determinada matéria, submetida ao crivo do STJ por intermédio de conflito positivo ou negativo entre determinado Juizado e a Justiça Comum de outra unidade da federação, p.ex, o E. STJ poderá determinar medida de natureza cautelar e suspender todos os processos em trâmite perante os Juizados Especiais até que o conflito de competência seja dirimido.

Mas essa hipótese não se trata de recurso, senão mera conseqüência de natureza cautelar proveniente de uma decisão proferida em sede de conflito de competência.

Malgrado entendimento em sentido contrário, cuja posição orienta a possibilidade da utilização desse remédio recursal sob pena de ofensa ao princípio da isonomia[11], encontra-se hoje pacífico o entendimento de inadmissibilidade de recurso especial na seara dos Juizados Especiais:

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO DE ÓRGÃO DO SEGUNDO GRAU DOS JUIZADOS ESPECIAIS. SÚMULA 203 DO STJ. 1. A matéria encontra-se devidamente consolidada no verbete sumular nº 203 desta Casa, cujo teor enuncia: "Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de 2º grau dos Juizados Especiais". 2. Agravo regimental improvido” (AgRg no Ag 786640/SP; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2006/0138314-0)

Recurso Extraordinário.

Quanto ao recurso extraordinário, cujo objetivo é preservar a ordem constitucional, tem sido admitida sua interposição contra decisões preferidas pelas Turmas Recursais, pois não se poderia deixar de submeter ao STF, questões em que houvesse a possibilidade de violação da norma constitucional, e, ao contrário do que acontece com o recurso especial, o legislador constituinte não especificou qual o órgão responsável pelas decisões que seriam objeto de recurso extraordinário, pelo que, podem ser elas oriundas das Turmas Recursais dos Juizados Especiais.

Seu processamento, prazo e demais requisitos são os mesmos do Código de Processo Civil (art. 541 e seguintes).

Súmula 640, do STF: "É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por Turma Recursal de juizado especial cível e criminal."

Caso seja negado seguimento ao recurso é cabível Agravo do 557 do Código de Processo Civil, nos termos do Enunciado 15 do Fonaje, mas sem efeito suspensivo, de maneira que o processo principal é remetido ao Juizado de origem para processamento do cumprimento provisória da sentença.

4. AÇÃO RESCISÓRIA.

É incabível, nos termos do art. 59 da Lei dos Juizados Especiais: “não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao procedimento instituído por esta Lei.”

Para os casos de flagrante ilegalidade ou abuso de poder cabe o Mandado de Segurança e até mesmo a hipótese do parágrafo único do art. 48 da citada lei: “os erros materiais podem ser corrigidos de ofício.”

5. PRINCIPAIS ENUNCIADOS DO FONAJE EM MATÉRIA RECURSAL.[12]

ENUNCIADO 15 – Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC. (Modificado no XXI Encontro – Vitória/ ES).

ENUNCIADO 62 – Cabe exclusivamente às Turmas Recursais conhecer e julgar o mandado de segurança e o habeas corpus impetrados em face de atos judiciais oriundos dos Juizados Especiais.

ENUNCIADO 7 – A sentença que homologa o laudo arbitral é irrecorrível.

ENUNCIADO 102 – O relator, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão monocrática, poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em desacordo com Súmula ou jurisprudência dominante das Turmas Recursais ou de Tribunal Superior, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo de cinco dias (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)

ENUNCIADO 103 – O relator, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão monocrática, poderá dar provimento a recurso se a decisão estiver em manifesto confronto com Súmula do Tribunal Superior ou Jurisprudência dominante do próprio Juizado, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo de cinco dias (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)

ENUNCIADO 124 – Das decisões proferidas pelas Turmas Recursais em mandado de segurança não cabe recurso ordinário. (Aprovado no XXI Encontro – Vitória/ES)

ENUNCIADO 125 – Nos juizados especiais, não são cabíveis embargos declaratórios contra acórdão ou súmula na hipótese do art. 46 da Lei nº 9.099/1995, com finalidade exclusiva de prequestionamento, para fins de interposição de recurso extraordinário (Aprovado no XXI Encontro – Vitória/ES)

6. QUADRO SINÓTICO:

13563a

13563b

7. CONCLUSÃO

Enganam-se aqueles que enxergam o rito dos Juizados Especiais como um ‘pequeno processo comum ordinário’, pois, como vimos acima, as hipóteses recursais são bastante exíguas e as conseqüências para a parte desidiosa bastantes graves, acarretando, p. ex., a extinção do processo para a parte autora e a revelia para a parte demandada que não comparecer em audiência previamente agendada, e, principalmente, não há previsão legal para ação rescisória.

Vimos que a Lei dos Juizados Especiais enumerou basicamente um único recurso para reexame de suas decisões, o Recurso Inominado (art. 41), porém, como o sistema jurídico não é estanque e a Lei dos Juizados Especiais submete-se à Constituição Federal, admite-se a interposição de diversos instrumentos que, em última análise, são suficientes para evitar ilegalidades ou abuso de poder, tais como o Mandado de Segurança, o Recurso de Agravo para remessa de recursos que tiveram seguimento negado pelo julgador a quo às instâncias superiores e o Recurso Extraordinário, para submeter ao C. Supremo Tribunal Federal eventual afronta à Constituição Federal.

Desse modo, nosso estudo procurou delinear as hipóteses de cabimento de recursos ou instrumentos aptos a modificar decisões eventualmente contrárias ao interesses das partes e ao arrepio da lei, podendo-se concluir, mesmo sem se adentrar perfunctoriamente nas questões doutrinárias sobre possíveis ofensas a princípios constitucionais, que o microssistema recursal dos Juizados Especiais atende com razoável garantia de proteção a direitos processuais o direito de revisão dos julgados.

 

Referências
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TOURINHO Neto, Fernando da Costa e Figueira Júnior, Joel Dias. Juizados especiais federais cíveis e criminais: Comentários à Lei 10.259, de 10.07.2001. 2ºed. Rev atual e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
 
Notas:
[1] Cabe Mandado de Segurança para afastar atos de ilegalidade ou abuso de poder e também o recurso de agravo nos moldes delineados no Enunciado 15 do Fonaje – “Nos Juizados Especiais não é cabível o recurso de agravo, exceto nas hipóteses dos artigos 544 e 557 do CPC.” (Modificado no XXI Encontro – Vitória/ ES). 

[2]      Art. 32. Todos os meios de prova moralmente legítimos, ainda que não especificados em lei, são hábeis para provar a veracidade dos fatos alegados pelas partes.
Art. 33. Todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, ainda que não requeridas previamente, podendo o Juiz limitar ou excluir as que considerar excessivas, impertinentes ou protelatórias.
Art. 35. Quando a prova do fato exigir, o Juiz poderá inquirir técnicos de sua confiança, permitida às partes a apresentação de parecer técnico.

[3] CPC, 405, § 4o Sendo estritamente necessário, o juiz ouvirá testemunhas impedidas ou suspeitas; mas os seus depoimentos serão prestados independentemente de compromisso (art. 415) e o juiz Ihes atribuirá o valor que possam merecer.

[4] Prof. Jailson Araújo, Mestrando em Direito pela PUC/PR. Atualmente é professor de graduação (presencial) e especialização (ensino à distância) da Faculdade Internacional de Curitiba – FACINTER

[5] Ob. Cit. P. 12-13

[6] Art. 6º. O pedido, quando formulado no curso da ação, não a suspenderá, podendo o juiz, em face das provas, conceder ou denegar de plano o benefício de assistência.

[7]  Art. 55. A sentença de primeiro grau não condenará o vencido em custas e honorários de advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé. Em segundo grau, o recorrente, vencido, pagará as custas e honorários de advogado, que serão fixados entre dez por cento e vinte por cento do valor de condenação ou, não havendo condenação, do valor corrigido da causa.

[8] Segundo escólio do Prof. Barbosa Moreira, “a dúvida não existe na decisão, mas é gerada por ela, em face da obscuridade ou da contradição.”

[9] Enunciado 63, Fonaje – Contra decisões das Turmas Recursais são cabíveis somente os embargos declaratórios e o Recurso Extraordinário.

[10] Apud Ana Maria Pereira de Oliveira, http://www.oocities.org/collegepark/center/8386/artigo4.html

[11] Fugindo da adoção restritiva da escola processual de São Paulo e quebrando conceitos, Marinoni e Arenhart, apontam, in verbis: "Da comparação dos arts. 102, III, e 105, III, da CF, salta aos olhos uma diferença essencial: o recurso especial exige que a decisão recorrida seja de tribunal (estadual ou federal), enquanto o recurso extraordinário não. Assim, certas situações, cujo exame não é levado, pela lei brasileira, a uma segunda instancia recursal caracterizada como tribunal, jamais admitirão a interposição de recurso especial, não obstante possam ser reapreciadas pelo Supremo Tribunal Federal, em sede extraordinária, e para o controle da aplicação da Constituição Federal. Imagine-se a situação dos juizados especiais ou das execuções fiscais de menos de cinqüenta OTN: as últimas comportam apenas, como já restou visto, embargos infringentes e embargos de declaração para o próprio juiz da causa, enquanto as primeiras admitem recurso (inominado) para um colegiado de juízes de primeiro grau, não sendo, nenhuma destas causas, levada ao exame dos tribunais locais. Contra estas decisões, então, proferidas ou pelo juiz da execução fiscal, ou pelo colegiado do Juizado Especial, não será cabível recurso especial (porque não se trata de decisão de "tribunal"), mas sim recurso extraordinário, desde que, obviamente, os demais pressupostos de cabimento estejam preenchidos. Naturalmente, é de se questionar a ratio desta distinção, posta pela Constituição Federal, que parece efetivamente não ter razão. De lege ferenda, seria razoável uniformizar o cabimento destes recursos, não havendo sentido no tratamento díspar, conferido a cada um deles" (Marinoni, Luiz Guilherme e Arenhart, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, v. 2, Manual do Processo de Conhecimento, RT, 5ª edição, 2006, p. 571). http://jus.com.br/revista/texto/9535/o-recurso-especial-e-as-decisoes-proferidas-pela-turma-recursal/2#ixzz2KDnSHQsI

[12] Fonte: http://www.fonaje.org.br/2006/enunciados.asp


Informações Sobre o Autor

Marco Antonio Inácio do Amaral

Especialista em Direito Processual Civil pela Facinter Curitiba-PR. Analista Judiciário. Assistente Executivo de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul-TJMS


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