Resumo: Considerações sobre a visão da doutrina, dos tribunais de contas e do Superior Tribunal de Justiça acerca da doação de bens móveis pela Administração Pública.
Palavras-chave: doação – bens móveis – administração pública.
Abstract: Considerations about the vision of the doctrine, accounts courts and the Superior Court of Justice on the donation of properties by Public Administration.
Keywords: donation – real estate assets – public administration
Sumário: 1 – Introdução, 2 – A doação de bens móveis da Administração Pública à luz dos comentadores do Código Civil e da Lei Federal nº 8.666/93, 2.1. – Alienação de bens públicos pelo Estado (e por suas empresas), 2.2. – Linhas gerais sobre a doação de bens móveis, 2.3. – Dispensa de licitação para doação de bens móveis da Administração: Licitação dispensada ou dispensável?, 2.4. – Interesse e público e avaliação prévia como requisitos para a dispensa de licitação para a alienação de bens pela Administração, 2.5. – Exigências legais para a licitação dispensada nos casos de doação de bens móveis da Administração, 2.6. – Peculiaridades da doação de bens móveis da Administração Pública Federal, 3 – A doação de bens móveis da Administração Pública à luz da jurisprudência dos órgãos do Controle Externo e do Superior Tribunal de Justiça, 3.1. – A visão dos Tribunais de Contas, 3.2. – A visão do Superior Tribunal de Justiça, 4 – A questão da legislação eleitoral, 5 – Conclusão.
Summary: 1 – Introduction, 2 – Donation of Public Administration real estate assets as seen by commentators of the Civil Code and Federal Law 8.666/93, 2.1. Conveyance of public assets by the state (and its companies), 2.2. – Guidelines on donating real estate assets, 2.3. – Exemption from tender in donating Administration real estate: Tender waived or dispensable?, 2.4. – Interest, public and prior assessment as requirements for the waiving of tender in the sale of real estate assets by the administration, 2.5. – Legal requirements for the waiver of tender in cases of donating Administration real estate assets, 2.6. – Peculiarities in the donation of Federal Public Administration real estate assets, 3 – Donating Public Administration real estate assets from External Controlling entity jurisprudence perspective and that of the Superior Court, 3.1. – The Account Courts’ Vision, 3.2. – The Superior Court’s Vision, 4 – The issue of electoral legislation, 5 – Conclusion.
1. Introdução
Visando atender o interesse público, o Estado finda por adquirir (com ou sem licitação, e neste último caso nas hipóteses admitidas em lei) bens e equipamentos dos mais diversos, tais como medicamentos para hospitais, postos de saúde e programas de assistência farmacêutica, armas e munições para suas forças militares e policiais, material de expediente para escritórios administrativos, computadores e veículos.
Alguns destes bens são de maior ou menor durabilidade, mas todos, sem exceção, assim que integram o patrimônio público, restam afetados ao regime jurídico de direto público que, dentre outras imposições, exige a indisponibilidade da coisa pública e a impenhorabilidade dos bens públicos.
Todavia, os efeitos inexoráveis do tempo (sendo o avanço tecnológico um dos seus desdobramentos) atingem indistintamente os bens públicos e os bens privados, de modo que, deve ser resguardada à Administração a possibilidade de se desfazer daqueles seus bens que, por desgaste natural do uso ou pela obsolescência tecnológica, já não estão mais a desempenhar com eficiência as funções que deles se esperam.
Como a Administração deve atender o interesse público de modo eficiente, não pode ela se valer de bens desgastados e obsoletos, cujo desempenho seja aquém daquele que é esperado para atender a população (lembrando que a Lei Federal nº 8.987 de 1995 incita a prestação de serviços públicos adequados, ou seja, de qualidade).
Para ficarmos com poucos exemplos, podemos dizer que: (a) não seria admissível que os serviços públicos de processamento de dados se valessem de computadores datados com mais de 10 (dez) anos, com uma velocidade de processamento muitíssimo inferior aos computadores mormente encontrados no mercado e (b) também não há como se cogitar que a polícia empregue veículos com mais de uma década de operação e que, ao invés de estarem nas ruas para permitir que os policias garantam a segurança da população estejam frequentemente em oficinas para infindáveis reparos.
Destarte, chega um momento em que a Administração precisa se desfazer dos seus bens móveis, e, para tanto a lei autoriza que tal alienação se dê desde que sejam atendidos alguns requisitos.
E dentre as formas com que o Estado pode alienar os seus bens, resolvemos nos debruçar sobre a doação que, dada a possibilidade de atendimento a interesses de cunho social, despertou o interesse para a confecção do presente estudo.
2. A doação de bens móveis da Administração Pública à luz dos comentadores do Código Civil e da Lei Federal nº 8.666/93
2.1. Alienação de bens públicos pelo Estado (e por suas empresas)
Coube ao Código Civil em seu artigo 98 trazer a definição do que são bens públicos:
“Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.
Art. 99. São bens públicos:
I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;
II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;
III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.
Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.”
As pessoas jurídicas de direito público interno mencionadas no artigo 98, por sua vez, estão conceitualmente delineadas também nas disposições do Código Civil:
“Art. 41. São pessoas jurídicas de direito público interno:
I – a União;
II – os Estados, o Distrito Federal e os Territórios;
III – os Municípios;
IV – as autarquias, inclusive as associações públicas;
V – as demais entidades de caráter público criadas por lei.”
Interpretando tais lições do Código Civil, Edmir Netto de Araújo assevera que também os bens das empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) são considerados públicos:
“No enunciado do art. 98 do Código Civil, bens públicos são catalogados, de maneira um tanto simplista, como aqueles ‘do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno’, que, na redação do art. 41, são: a União, os Estados, o Distrito Federal, os Territórios, os Municípios, as autarquias e as demais entidades de caráter público criadas por lei. São incluídos, portanto, os bens das respectivas autarquias e fundações públicas, eliminando-se as divergências quanto à qualificação dos bens das empresas públicas e sociedades de economia mista …” (Edmir Netto de Araújo, Curso de direito administrativo, São Paulo: Saraiva, 2010, pág. 1.121)
Já Marcos Juruena Vilella Souto, citado por Celso Rodrigues Ferreira Júnior, não compactua com tal entendimento:
“os bens que integram o patrimônio de empresas públicas ou sociedades de economia mista, quer sejam prestadoras de serviços públicos, quer exploradoras de atividades econômicas, compreendidos tantos os empregados no serviço público como os patrimoniais disponíveis, são privados, que obedecem, salvo peculiaridades (de controle), ao regime jurídico de direito privado. São assim considerados porque, apesar da sua destinação ainda ser de interesse público, a sua administração é efetuada por uma entidade de direito privado, que irá utilizá-los de acordo com a lei instituidora e do estatuto regedor da instituição.” (Celso Rodrigues Ferreira Júnior, “Do regime de bens das empresas estatais: alienação, usucapião, penhora e falência” in Direito administrativo empresarial, Coordenador: Marcos Juruena Villela Souto, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, pág. 70)
Diga-se ainda que, as pessoas jurídicas de direito público interno (que, como visto acima incluem – pelo menos na visão de autores como Edmir Netto de Araújo- as figuras das empresas públicas e das sociedades de economia mista) podem, conforme preceitua o Código Civil, alienar os seus bens dominicais:
“. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei.”
Esta polêmica há pouco exposta sobre o enquadramento dos bens das empresas estatais como públicos ou privados, perde relevância, pelo menos no nosso entendimento, quando invocados o inciso XXI do artigo 37 e o inciso II do artigo 71, ambos da CF/88:
“Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:(…)
XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.(…)
Art. 71 – O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:(…)
II – julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;”
Ora, se as empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) estão sujeitas às regras das licitações públicas e devem prestar contas aos órgãos de controle externo (lembrando aqui que, neste último caso, apesar de o mandamento constitucional se referir apenas ao Tribunal de Contas da União, a regra é extensível às sociedades de economia mista e as empresas públicas estaduais, distritais e municipais no que é pertinente à sujeição de tais entes ao controle dos Tribunais de Contas locais, conforme diretriz contida no artigo 75 da Magna Carta) é mais do que óbvio que elas só devem alienar seus bens nos limites da lei e em atendimento ao interesse público, por mais que elas estejam submetidas às mesmas condições das demais empresas privadas que compõem o mercado.
Ou seja, mesmo que os bens das empresas estatais possam ser considerados como eminentemente privados, elas não podem dispor deles da mesma forma que as empresas privadas que não contam com participação patrimonial do Estado e, estando elas submetidas às regras de licitação, pouco importará, pelo menos no nosso sentir, que os bens delas sejam considerados públicos ou privados, vez que, para aliená-los, deverão ser obedecidos os ditames impostos na Lei.
Assim, pelo que até aqui foi exposto resta incontroverso que a Administração Pública (incluindo-se aí as empresas públicas e as sociedades de economia mista) pode, observadas as exigências legais, alienar os seus bens dominicais.
2.2. Linhas gerais sobre a doação de bens móveis
Dentre os bens públicos dominicais da Administração Pública existirão bens móveis e imóveis, e dentre as formas de alienação estará a doação.
Nos termos do artigo 82 do Código Civil, são móveis os bens …
“suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.”
Ou seja …
“São os bens móveis por natureza, compreendendo duas espécies: os semoventes (animais) e as coisas inanimadas. Podem ser deslocados ou deslocar-se sem que percam seus atributos, mas não readquirem a qualidade de móveis os materiais provisoriamente separados de um prédio para nele se reempregarem (art. 81, II).
Os atributos a serem preservados, quando removidos esses bens, são tanto a substância material como a utilidade para os fins a que se destinam.” (Nestor Duarte, Código civil comentado, Coordenador: Ministro Cezar Peluso, Barueri, SP: Manole, 2007, págs. 68/69)
Já a doação, é disciplinada pelo artigo 538 do Código Civil, cuja redação é a seguinte:
“Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra.”
Sobre tal excerto, o Professor da PUC-SP, Nelson Nery Junior assim preleciona:
“A doação é o contrato mediante o qual uma parte, por espírito de liberalidade, enriquece a outra dispondo de um direito em seu favor e assumindo uma obrigação.(…)
Tem a doação a natureza do contrato, porque exige para sua formação o acordo de vontades das partes: de um lado o doador, que pretende fazer a liberalidade; de outro o donatário, que aceita a liberalidade. Há que se observar, contudo, que nem todos os atos de liberalidade são considerados doação.” (Nelson Nery Junior, Código civil comentado, 7ª ed., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2009, págs. 606/607)
Tendo em vista a natureza contratual da doação, quando a mesma for celebrada pelos integrantes da Administração Pública, deverá ela ser tutelada pela Lei Federal nº 8.666/93 e não pelo Código Civil, como, aliás, assim reconhece tal diploma legal em seu artigo 101 (alhures citado).
2.3. Dispensa de licitação para doação de bens móveis da Administração: Licitação dispensada ou dispensável?
A Lei Federal nº 8.666/93 assim trata da doação de bens móveis dominicais da Administração Pública:
“Art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas:(… omissis …)
II – quando móveis, dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensada esta nos seguintes casos:
a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha de outra forma de alienação;”
Comentando o artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93, Jessé Torres Pereira Junior faz uma distinção das espécies de dispensa de licitação ali insertas, com as que estampam o artigo 24 do mesmo estatuto de licitações e contratações públicas:
“As hipóteses ao dever geral de licitar, lançadas no art. 17, diferem daquelas relacionadas no art. 24. As do art. 17 traduzem decisão do legislador, que exonerou o administrador de exercer discrição para decidir quanto à dispensabilidade, ao declarar que a licitação está ‘dispensada’ nos casos que enumera. As do art. 24 reservam ao administrador discrição para decidir se dispensa ou não a licitação, se configurada, no caso concreto, a hipótese em tese definida nos incisos; tanto que a redação do art. 24, caput, declara ser ‘dispensável’ a licitação.” (Jessé Torres Pereira Junior, Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública, 8ª edição, rev. atual. e ampl., Rio de Janeiro: Renovar, 2009, pág. 216)
Marçal Justen Filho leciona em sentido diverso, não distinguindo as hipóteses de dispensa de licitação insculpidas no artigo 17 e no artigo 24 da lei 8.666, por outro lado, ele aduz que algumas situações abrangidas no artigo 17 da lei das licitações e contratações da administração pública podem configurar casos de inexigibilidade de licitação:
“O art. 17 dispõe sobre dispensa de licitação para alienação de bens. Quanto a isso cabem três advertências.
Em primeiro lugar, os casos de dispensa de licitação do art. 17 não apresentam natureza jurídica distinta daquela contemplada no art. 24 da mesma Lei nº 8.666. Não existem duas ‘espécies’ de dispensa de licitação na Lei nº 8.666. Quanto a isso, reputa-se irrelevante a distinção terminológica na redação dos arts. 17 e 24. De fato, o art. 17 utiliza a fórmula ‘licitação dispensada’, enquanto o art. 24 contempla ‘licitação dispensável’. Ambas as soluções são juridicamente equivalentes, comportando tratamento jurídico similar.
Em segundo lugar, o art. 17 não exaure as hipóteses de dispensa de licitação relativamente à alienação de bens. Há casos previstos também no art. 24. Alude-se especificamente ao inc. VI do referido artigo, que trata da intervenção do Estado no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento.
Em terceiro lugar, as hipóteses de contratação direta previstas no art. 17 podem configurar caso de inexigibilidade de licitação, antes do que dispensa. Ainda que a distinção mais precisa entre os institutos se encontre nos comentários aos arts. 24 e 25, cabe esclarecer que há casos em que não se produz a licitação para alienação de bens porque se configura a inviabilidade de competição. Assim se passa, por exemplo, nos caso de legitimação de posse. É evidente que a atribuição do título somente pode ser realizada em favor do sujeito que vem exercitando posse ao longo do tempo.” (Marçal Justen Filho, Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 12ª edição, São Paulo: Dialética, 2008, págs. 214/215)
Lucas Rocha Furtado, por seu turno, se alia a Jessé Torres Pereira Junior na distinção entre as hipóteses de afastamento do procedimento licitatório previstas no artigo 17 e no artigo 24 da Lei das licitações e contratações da administração pública, alcunhando as primeiras de hipóteses de “licitação dispensada” e as segundas de “licitação dispensável”:
“Todas as hipóteses enquadradas pela legislação como de licitação dispensada estão relacionadas à alienação de bens.
A alienação de bens móveis ou imóveis pela Administração Pública está condicionada à existência de interesse público e deverá ser precedida de prévia avaliação, conforme dispõe a Lei nº 8.666/93, art. 17, caput.(…)
As hipóteses de licitação de imóveis estão previstas na parte final do inciso I do art. 17:(…)
A Lei de Licitações, em seu art. 17, II, igualmente exige a realização de avaliação prévia para a alienação de bens móveis, sendo dispensada a licitação nos seguintes casos:(…)
O art. 24 da Lei de Licitações prevê as hipóteses em que a licitação é dispensável. São indicadas, de forma exaustiva, situações que legitimam a contratação direta sem licitação. As hipóteses previstas neste dispositivo não podem ser aumentadas pelo administrador. Trata-se de lista fechada que não admite que, a pretexto de interpretações extensivas ou analogias, venham a ser ciradas hipóteses não autorizadas pelo legislador.” (Lucas Rocha Furtado, Curso de licitações e contratos administrativos, Belo Horizonte: Fórum, 2007, págs. 70/71)
Esta também é a opinião de Flávio Amaral Garcia, conforme podemos ver abaixo:
“A licitação dispensada é aquela aplicável nos casos de alienação dos bens públicos (dominicais).
O art. 17 da Lei dispõe que a alienação de bens da Administração Pública subordina-se à existência de interesse público devidamente justificado (matéria discricionária), aplicando-se como regra a realização de licitação para os bens imóveis (concorrência) e bens móveis.
Sucede que o próprio legislador elegeu algumas situações em que o destinatário do bem é certo, tornando sem razão a realização de licitação. As hipóteses são taxativas não podendo, como regra, serem criadas novas situações de licitação dispensada.(…)
Existem determinadas situações concretas, eleitas previamente pelo legislador, nas quais se entendeu que se deveria conferir ao administrador público margem de discricionariedade para afastar o procedimento seletivo, com vistas ao atendimento do interesse público.
São hipóteses em que a competição é perfeitamente viável e que, em tese, comportariam a realização de prévio procedimento licitatório, mas que diante das especificidades do caso concreto, confere-se ao administrador público a possibilidade de dispensar a licitação formal, sempre com vistas a atingir uma finalidade pública ou outros valores que norteiam a atividade administrativa.
O art. 24 da Lei arrola taxativamente diversas situações de dispensa de licitação, razão pela qual não se pode cogitar de outra hipótese que não esteja previamente tipificada na norma. Como exceção à regra de licitar, a interpretação deve ser precipuamente restritiva.” (Flávio Amaral Garcia, Licitações e contratos administrativos (casos e polêmicas), 2ª edição, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, págs. 36/38)
Tal qual Marçal Justen Filho, Celso Antônio Bandeira de Mello relaciona indistintamente os casos excludentes de licitação previstos no artigo 17 e no artigo 24 da lei das licitações e contratações da administração pública como se TODOS tratassem de hipóteses de licitação dispensável:
“O art. 24 da Lei 8.666 arrola os seguintes casos como de licitação dispensável (…)
A este total haver-se-ão de aditar as hipóteses de alienação previstas no art. 17 da própria Lei 8.666. Este preceptivo declara ‘dispensada’ a licitação no caso de certas alienações de bens, que arrola.” (Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de direito administrativo, 27ª edição, rev. atual., São Paulo: Malheiros, 2010, págs. 542/545)
A discussão em torno da caracterização dos casos excludentes de licitação previstos no artigo 17 e no artigo 24 da Lei 8.666 como hipóteses de licitação dispensada ou dispensável não tem apenas relevância científico-acadêmica, tendo pelo contrário repercussões de ordem prática, conforme se pode ver abaixo:
“A licitação dispensada é tratada no art. 17; a dispensável, elencada no art. 24; e a inexigível, no art. 25 da Lei nº 8.666/93.
É imperioso reconhecer que, em termos práticos, essa divisão apresenta vantagens, pois há consequências diversas para cada hipótese.
A principal distinção entre licitação dispensada, tratada no art. 17, e as dispensas de licitação, estabelecidas no art. 24, repousa no sujeito ativo que promove a alienação, figurando no primeiro caso a Administração, no interesse de ceder parte do seu patrimônio, vender bens ou prestar serviços e, nos casos do art. 24, a situação é a oposta, estando a Administração, como regra, na condição de compradora ou tomadora de serviços.
Outro aspecto distintivo entre licitação dispensada e dispensável é o fato de que, em princípio, na primeira não é necessário, observar as formalidades do art. 26 da Lei nº 8.666/93, significando, com isso, simplificação. Assim, conquanto esse artigo seja bom orientador para salvaguardar o gestor, não é obrigatório seu pontual acatamento, na licitação dispensada, exceto nas hipóteses reguladas pelos §§ 2º e 4º do art. 17. Na dispensa de licitação, ao contrário, com a ressalva dos incisos I e II do art. 24, é sempre obrigatório acatar as formalidades instituídas no art. 26 da Lei de Licitações.” (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, Contratação direta sem licitação, 7ª edição, 2ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, pág. 205)
Para finalizar, cremos que, data venia aos entendimentos em sentido diverso, as hipóteses de dispensa de licitação pública previstas no artigo 17 e no artigo 24 da Lei de licitações e contratações da Administração cuidam realmente de figuras DISTINTAS, estando assim corretas as lições de quem, como Joel de Menezes Niebuhr, defende que não há como se confundir as licitações dispensadas com as licitações dispensáveis:
“Ainda, cumpre destacar que as hipóteses enumeradas nas alíneas dos incisos I e II do artigo 17 da Lei nº 8.666/93 foram qualificadas pelo legislador como de licitação dispensada. O caput do artigo 24, por sua vez, prescreve que, no tocante aos vinte e quatro incisos que lhe seguem, a licitações é apenas dispensável.
É solar a diferença de sentido entre algo que se declara dispensado e outro que se declara dispensável. Dispensada significa que a licitação pública já foi efetivamente afastada do legislador, em virtude do que a competência do agente administrativo é vinculada, cabendo-lhe, diante de uma das figuras contratuais enunciadas, apenas reconhecer a dispensa. A discricionariedade do agente administrativo, nesses casos, resume-se na avaliação da oportunidade e conveniência de realizar uma das espécies de contrato qualificadas, efetivamente, como de licitação dispensada. Realizado esse juízo, tendo-se decidido a respeito da celebração de tais contratos, a dispensa se impõe.
Já o dispensável denota que a dispensa ainda não foi ultimada, depende da avaliação do agente administrativo, que, diante de uma das hipóteses prescritas nos incisos do artigo 24, deve analisar se a licitação pública realmente produz ou não gravame ao interesse público, retratando competência discricionária. E, reacentua-se, essa competência discricionária é orientada pela norma programática prescrita na parte inicial do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal, em razão do que o agente administrativo deve priorizar a obrigatoriedade de licitação pública, tratando de modo paritário, todos os interessados no contrato e preservando, com isso, o interesse público e moralidade administrativa. Ou seja, diante de uma das hipóteses admitidas pelo artigo 24 da Lei nº 8.666/93, o agente administrativo somente deve optar pela dispensa de licitação pública nas situações em que o interesse público concretamente sujeita-se a risco de sacrifício ou gravame de monta.” (Joel de Menezes Niebuhr, Licitação Pública e Contrato Administrativo, Curitiba: Zênite, 2008, págs. 64/65)
São, portanto, hipóteses de licitação dispensada e não de licitações dispensáveis os casos previstos no artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93.
2.4. Interesse e público e avaliação prévia como requisitos para a dispensa de licitação para a alienação de bens pela Administração
Abordando as hipóteses de alienação de bens móveis e imóveis da Administração Pública, previstas no artigo 17 da Lei de licitações e contratos administrativos, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes faz um balizamento interessante sobre o tema, adstringindo-o ao trinômio: (i) interesse público, (ii) avaliação prévia e (iii) licitação:
“O caput do art. 17 lança os requisitos gerais para a alienação dos bens da Administração Pública, quais sejam:
– existência de interesse devidamente justificado;
– avaliação prévia;
– licitação.
Interesse público
O interesse público é a finalidade única da Administração Pública, decorrendo daí que todo ato de gestão visa ao interesse público imediato ou mediato, sob pena de anulação, por via judicial ou administrativa. O interesse público encontra na Lei uma das suas principais fontes, vez que essa não deixa de ser um instrumento da vontade coletiva que alcança o patamar de normatização; se o interesse público é um objetivo da coletividade vista como um todo, vários outros princípios decorrem desse postulado, como a ‘transparência’ ou publicidade que devem estar presentes na sua elaboração e execução; impessoalidade, pois a atividade administrativa não pode estar dirigida à satisfação do interesse particular.
Ao erigir o interesse público como um dos requisitos gerais de alienação dos bens da Administração, nada mais fez do que enfatizar o alicerce fundamental de toda atividade administrativa.
Avaliação prévia
Sobre a avaliação prévia, cabe salientar que o Código de Processo Civil (CPC) fornece amplo balizamento acerca do tema. De fato, o CPC de 1973, incluiu a avaliação entre as provas periciais, ao lado do exame e da vistoria, conforme dispõe o art. 420. Sendo o meio técnico de apuração do valor quaisquer bens, inclusive direitos e obrigações, há de ser realizada, em regra, por técnico devidamente habilitado para tal, ressalvadas as exceções em que a própria lei processual admite a sua efetivação por leigo (v.g. avaliador judicial).
Acresce ainda o Código de Processo Civil, no seu art. 145, § 2º, reza, in verbis:
‘§ 2º Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre a questão que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional que estiverem inscritos.’
Esta regra, como dito, inserta no CPC, pode e deve ser aplicada no âmbito das avaliações promovidas pela Administração, face ao princípio da legalidade e, também, pelo princípio lógico de que a avaliação é uma atividade de natureza técnica, não podendo ser realizada por qualquer pessoa.” (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, Vade-mécum de licitações e contratos: legislação selecionada e organizada com jurisprudência, notas e índices, 3ª edição, rev. atual. e ampl., 4ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, págs. 290/291)
Como se pode ver, especificamente sobre a avaliação prévia, o autor sugere que a Administração lhe dê efetividade valendo-se do rito previsto no artigo 420 do Código de Processo Civil.
Contudo, anote-se aqui, que as lições de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes acima reproduzidas se referem à AVALIAÇÃO PRÉVIA inserta no caput do artigo 17 da lei 8.666, e não à AVALIAÇÃO DE OPORTUNIDADE E CONVENIÊNCIA SÓCIO-ECONÔMICA EM RELAÇÃO A OUTRA FORMA DE ALIENAÇÃO, que, por sua vez, é específica para as hipóteses contidas na aliena “a” do inciso II do artigo 17 da lei de licitações e contratos administrativos (licitação dispensada na doação de bens móveis do poder público).
Cumpre aqui também anotar, que, ao nosso sentir acertadamente, o Tribunal de Contas da União se posiciona, mutatis mutantis, de forma CONTRÁRIA à utilização do artigo 420 do Código de Processo Civil como diploma subsidiário para pautar a avaliação prévia prevista no caput do artigo 17 da lei 8.666:
“Decisão 231/96 – Plenário – Ata 17/96
Processo nº TC 700.731/92-0 – c/8 volumes anexos Apenso: TC 19.538/95-2
(Solicitação da Comissão de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização do Congresso Nacional)
Órgão: Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
Relator: Ministro Paulo Affonso Martins de Oliveira
Ementa
Inspeção Ordinária. TRT. Área de licitação. Acompanhamento dos procedimentos utilizados na aquisição de imóvel para instalação de Juntas Trabalhistas na cidade de São Paulo. Procedimentos adotados aceito preliminarmente.
– Licitação – Invocação de preceitos do Código Civil e Código de Processo Civil. Consideração.
Relatório do Ministro Relator
GRUPO II – CLASSE V – PLENÁRIO
TC 700.731/92-0 c/ 8 volumes anexos – Apenso: TC 19.538/95-2 (Solicitação da Comissão de Planos, Orç. Públ. e Fisc. do C. N.)
NATUREZA: Relatório de Inspeção Ordinária setorial na área de licitação, com ênfase especial à Concorrência nº 01/92, destinada à aquisição de imóvel pronto, em construção ou a construir, adequado à instalação de Juntas de Conciliação e Julgamento da cidade de São Paulo.
ÓRGÃO: Tribunal Regional do Trabalho-2ª Região
EMENTA: Considerar válidos os procedimentos adotados até agora pelo TRT-2ª Região, tendo em vista a fase conclusiva das obras, determinando providências urgentes ao TRT-SP no sentido de transferir as obras e o terreno para o seu nome, bem como adotar rigorosa observância às normas e preceitos da Lei nº 8.666/93 no prosseguimento das obras; e, comunicação ao Órgão de Controle Interno do TRT – 2ª Região e dos demais TRT’s que não procede a invocação de preceitos do C.C e do C.P.C. em procedimentos licitatórios por eles realizados, tendo em vista que existe lei específica sobre a matéria.(…)
115. Não procede a invocação do Código Civil, ou Código de Processo Civil em procedimentos licitatórios, visto que existe lei específica dispondo sobre a matéria. De acordo com a Súmula nº 103, do TCU: “Na falta de Normas legais regimentais específicas, aplicam-se analógica e subsidiariamente, no que couber, a juízo do Tribunal de Contas da União, as disposições do Código de Processo Civil”. Fora isso é defeso qualquer invocação de preceitos inseridos nos citados códigos.(…)
Decisão
O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE:(…)
3 – comunicar ao Órgão de Controle Interno do TRT-2ª Região, bem como aos Órgãos de Auditoria implantados em cada um dos demais Tribunais Regionais do Trabalho, que a invocação de preceitos do Código Civil e do Código de Processo Civil em procedimentos licitatórios por eles realizados não procede, tendo em vista que existe lei em vigor que trata especificamente da matéria;(…)
Publicação
Sessão 08/05/1996
Dou 27/05/1996 – Página 9166”
O intento de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes ao sugerir o uso do artigo 420 do Código de Processo Civil como diploma subsidiário para pautar a avaliação prévia prevista no caput do artigo 17 da lei de licitações e contratações da Administração Pública foi conferir uniformidade e legalidade no procedimento, instando os entes e órgãos do Poder Público a realizarem a avaliação prévia às doações por meio de profissionais legalmente habilitados.
Só que, para tanto, entendemos que ao invés de a Administração Pública ter de se submeter ao artigo 420 do Código de Processo Civil para que proceda a avaliação prévia do artigo 17 por meio de profissionais legalmente habilitados, deve ela observar o que dispõem o Decreto-Lei Nº 9.295/46 e o Decreto Federal nº 31.794/52:
“Decreto-Lei Nº 9.295, de 27 de maio de 1946 (D.O.U. de 28/05/1946) – Cria o Conselho Federal de Contabilidade, define as atribuições do Contador e do Guarda-livros, e dá outras providências
Art. 25. São considerados trabalhos técnicos de contabilidade:
a) organização e execução de serviços de contabilidade em geral;
b) escrituração dos livros de contabilidade obrigatórios, bem como de todos os necessários no conjunto da organização contábil e levantamento dos respectivos balanços e demonstrações;
c) perícias judiciais ou extra-judiciais, revisão de balanços e de contas em geral, verificação de haveres revisão permanente ou periódica de escritas, regulações judiciais ou extra-judiciais de avarias grossas ou comuns, assistência aos Conselhos Fiscais das sociedades anônimas e quaisquer outras atribuições de natureza técnica conferidas por lei aos profissionais de contabilidade.
Decreto nº 31.794, de 17 de novembro de 1952 – Dispõe sobre a regulamentação do exercício da Profissão de Economista, regida pela Lei nº 1.411 de 13 de agosto de 1951, e dá outras providências.
Art. 3º A atividade profissional privativa do economista exercita-se, liberalmente ou não por estudos, pesquisas, análises. relatórios, pareceres, perícias, arbitragens, laudos, esquemas ou certificados sobre os assuntos compreendidos no seu campo profissional, inclusive por meio de planejamento, implantação, orientação, supervisão ou assistência dos trabalhos relativos as atividades econômicas ou financeiras, em empreendimentos públicos privados ou mistos ou por quaisquer outros meios que objetivem, técnica ou cientificamente, o aumento ou a conservação do rendimento econômico.”
Assim, para proceder com a avaliação prévia exigida no caput do artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93, entendemos que a Administração Pública deverá contar com os serviços de um contador ou de um economista (sem prejuízo de que algum outro profissional a realize, desde que é claro conte com autorizativo legal para fazê-lo).
2.5. Exigências legais para a licitação dispensada nos casos de doação de bens móveis da Administração
Comentando especificamente a alínea “a” do inciso II do artigo 17 da lei de licitações e contratos administrativos, Marçal Justen Filho ressalta a importância (haja a vista a redundância) de a doação de bens móveis por parte da Administração Pública atender o interesse público (social):
“A Lei contém ressalva acerca dos casos de interesse social. Qualquer doação de bem público pressupõe a compatibilidade com o desempenho das funções estatais. Por óbvio, não se admite liberalidade à custa do patrimônio público. A regra geral impõe à Administração que verifique se a doação consiste na melhor opção, inclusive para evitar a manutenção de concepções paternalistas acerca do Estado.” (Marçal Justen Filho, Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 12ª edição, São Paulo: Dialética, 2008, págs. 214/215)
Também trazendo comentários específicos sobre a alínea “a” do inciso II do artigo 17 da Lei Federal nº 8.666/93 eis as lições de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes:
“O ato donativo deverá ter por objeto ‘fins e uso’ de interesse social. Ao estabelecer a concomitância desses dois substantivos, evidenciou o legislador ainda maior interesse restritivo. Pode ocorrer, por exemplo, que um determinado órgão decida doar móveis de escritório para uma unidade filantrópica. No caso, a finalidade da doação atenderá ao interesse social, mas a Administração deverá certificar-se de que o uso a ser dado ao bem guardará correlação com igual interesse social. É que muitas vezes a finalidade do ato não apresenta correlação com a utilização a ser dada ao móvel posteriormente, tal como ocorreria se os bens doados não fossem utilizados pela entidade exemplificada para os seus fins, mas transferidos para uso pessoal ou particular de um dos membros de sua diretoria.
Não se pretende que a Administração adote atitude investigatória para acompanhamento dos bens, sendo suficiente que, no termo de doação, fique definida a forma/circunstância em que serão empregados os móveis.(…)
Antes de proceder à doação, deverá a Administração considerar outros aspectos, para decidir se deve ou não empregar outra forma de alienação.
O primeiro deles diz respeito à oportunidade, isto é ao momento, à época de fazer a doação; o segundo, refere-se à conveniência socioeconômica de realizá-la, ou seja, além de considerar o aspecto social do ato que, como visto, deverá guiar-se pelo fim e uso de interesse social, a Administração considerará também o efeito econômico. Nesse sentido, o primeiro atributo buscado é o exterior ao agente doador, dizendo com o alcance social da medida, e o segundo, interior ao agente, que terá em consideração as despesas do órgão e os gastos decorrentes do ato.
Poderia parecer, à primeira vista, que sempre será mais vantajoso, sob o aspecto econômico, não doar bens, pois, na venda, por exemplo, há o ingresso de recursos. Não é esse o sentido do dispositivo, como também não é verdadeiro que a venda sempre resulta vantajosa para a Administração.
É o que ocorre quando o Município reúne leitos e outros utensílios inservíveis para um hospital, por intermédio de um clube de serviços como o Rotary, e equipa um asilo ou orfanato, desonerando-se da atividade e poupando estrutura de recursos humanos, de material e de manutenção para a realização dessa atividade social.
Ainda mais: o legislador não empregou o termo econômico isoladamente; fê-lo suceder, em composição, ao social, de tal modo que com ele deve ser conjugado para alcançar o adequado equacionamento pretendido. O valor social da medida deve ser sopesado com o econômico, para a Administração e para a sociedade, que, em última instância, é quem sustenta a Administração Pública. Benesses praticadas à custa do contribuinte não devem ter o condão de onerá-lo indevidamente para que suporte maiores ônus com atos impróprios de da eficiência pretendida do aparelho estatal.” (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, Vade-mécum de licitações e contratos: legislação selecionada e organizada com jurisprudência, notas e índices, 3ª edição, rev. atual. e ampl., 4ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, págs. 314/315)
Finalizando seus comentários, Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, ainda responde a seguinte questão, não sendo obedecidos os ditames que caracterizam a licitação dispensada (existência de interesse público devidamente justificado, avaliação prévia, fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica) a doação de bens móveis públicos poderá se dar através de procedimento licitatório?
“A resposta é negativa. A busca da proposta mais vantajosa no caso implicará a necessidade da obtenção de preço, concluindo-se portanto que é possível fazer proceder à licitação, mas já não mais para doação, e sim venda ou locação, conforme o caso.” (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, Vade-mécum de licitações e contratos: legislação selecionada e organizada com jurisprudência, notas e índices, 3ª edição, rev. atual. e ampl., 4ª tiragem, Belo Horizonte: Fórum, 2008, pág. 315)
Joel de Menezes Niebuhr acentua a necessidade de a doação de bens móveis por parte da Administração Pública, inevitável e obrigatoriamente, atender fins e usos de interesse social:
“Interesse social é espécie que se subsume ao espectro mais largo do interesse público. Isso significa que todo interesse social é pertinente ao interesse público, mas que nem todo interesse público pode ser qualificado como interesse social. Destarte, os bens móveis podem ser doados para serem utilizados em projetos sociais, isto é, que visem beneficiar as parcelas menos favorecidas da sociedade, como vem a ocorrer em atos de benemerência. Não é lícito doar bens móveis a serem utilizados em atividades de interesse público que não tenham fundo social. Por exemplo, não é lícito doar bem móvel a entidade como a Ordem dos Advogados Brasil, que, conquanto realize atividades relacionadas ao interesse público, normalmente não visam a atender interesses sociais.” (Joel de Menezes Niebuhr, Licitação Pública e Contrato Administrativo, Curitiba: Zênite, 2008, pág. 71)
O Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, Antônio Roque Citadini, atenta para o fato de a doação de bens móveis por parte da Administração Pública além de atender fins e usos de interesse social, também deve ser instrumentalizada com uma avaliação de oportunidade e conveniência que permita inferir ser a doação a melhor forma para se alienar o(s) bem(ns):
“Importante frisar que para a doação de um bem móvel, além de só poder ser para fim e uso de interesse social, é necessário que se faça avaliação não só econômica, mas também a de mérito, a qual analisará a oportunidade e conveniência que justifique ser, a doação, a melhor forma de alienação no caso concreto.” (Antônio Roque Citadini, Comentários e jurisprudência sobre a lei de licitações públicas, São Paulo: Max Limonad, 1996, pág. 105)
Destarte, podemos resumidamente afirmar que a doação de bens móveis da Administração Pública depende (i) da existência de interesse público devidamente justificado, (ii) avaliação prévia do(s) bem(ns) a serem doados, (iii) que o(s) bem(ns) doado(s) atenda(m) a fins e uso de interesse social e (iiii) que tal medida só se dê após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica com relação a outras formas de alienação.
2.6. Peculiaridades da doação de bens móveis da Administração Pública Federal
Ainda sobre o tema ora debatido, há de se esclarecer que, com relação à Administração pública FEDERAL, a doação de bens móveis encontra-se tutelada não só pela Lei Federal nº 8.666/93 como também pelo Decreto Federal nº 99.658/90 (com suas respectivas alterações), cujos trechos a seguir transcritos são os de maior relevância para os fins do presente estudo:
“Art. 1º O reaproveitamento, a movimentação e a alienação de material, bem assim outras formas de seu desfazimento, no âmbito da Administração Pública Federal, são regulados pelas disposições deste decreto.
Art. 2º Este decreto não modifica as normas específicas de alienação e outras formas de desfazimento de material:
I – dos Ministérios Militares e do Estado-Maior das Forças Armadas;
II – do Departamento da Receita Federal, referentes a bens legalmente apreendidos;
III – dos órgãos com finalidades agropecuárias, industriais ou comerciais, no que respeita à venda de bens móveis, por eles produzidos ou comercializados.
Art. 3º Para fins deste decreto, considera-se:
I – material – designação genérica de equipamentos, componentes, sobressalentes, acessórios, veículos em geral, matérias-primas e outros itens empregados ou passíveis de emprego nas atividades dos órgãos e entidades públicas federais, independente de qualquer fator;
II – transferência – modalidade de movimentação de material, com troca de responsabilidade, de uma unidade organizacional para outra, dentro do mesmo órgão ou entidade;
III – cessão – modalidade de movimentação de material do acervo, com transferência gratuita de posse e troca de responsabilidade, entre órgãos ou entidades da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional do Poder Executivo ou entre estes e outros, integrantes de qualquer dos demais Poderes da União;
IV – alienação – operação de transferência do direito de propriedade do material, mediante venda, permuta ou doação;
V – outras formas de desfazimento – renúncia ao direito de propriedade do material, mediante inutilização ou abandono.
Parágrafo único. O material considerado genericamente inservível, para a repartição, órgão ou entidade que detém sua posse ou propriedade, deve ser classificado como:
a) ocioso – quando, embora em perfeitas condições de uso, não estiver sendo aproveitado;
b) recuperável – quando sua recuperação for possível e orçar, no âmbito, a cinqüenta por cento de seu valor de mercado;
c) antieconômico – quando sua manutenção for onerosa, ou seu rendimento precário, em virtude de uso prolongado, desgaste prematuro ou obsoletismo;
d) irrecuperável – quando não mais puder ser utilizado para o fim a que se destina devido a perda de suas características ou em razão da inviabilidade econômica de sua recuperação.
Art. 4º O material classificado como ocioso ou recuperável será cedido a outros órgãos que dele necessitem. (…)
Art. 7º Nos casos de alienação, a avaliação do material deverá ser feita de conformidade com os preços atualizados e praticados no mercado.
Parágrafo único. Decorridos mais de sessenta dias da avaliação, o material deverá ter o seu valor automaticamente atualizado, tomando-se por base o fator de correção aplicável às demonstrações contábeis e considerando-se o período decorrido entre a avaliação e a conclusão do processo de alienação. (…)
Art. 15. A doação, presentes razões de interesse social, poderá ser efetuada pelos órgãos integrantes da Administração Pública Federal direta, pelas autarquias e fundações, após a avaliação de sua oportunidade e conveniência, relativamente à escolha de outra forma de alienação, podendo ocorrer, em favor dos órgãos e entidades a seguir indicados, quando se tratar de material: (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
I – ocioso ou recuperável, para outro órgão ou entidade da Administração Pública Federal direta, autárquica ou fundacional ou para outro órgão integrante de qualquer dos demais Poderes da União; (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
II – antieconômico, para Estados e Municípios mais carentes, Distrito Federal, empresas públicas, sociedade de economia mista, instituições filantrópicas, reconhecidas de utilidade pública pelo Governo Federal, e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público; (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
III – irrecuperável, para instituições filantrópicas, reconhecidas de utilidade pública pelo Governo Federal, e as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público; (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
IV – adquirido com recursos de convênio celebrado com Estado, Território, Distrito Federal ou Município e que, a critério do Ministro de Estado, do dirigente da autarquia ou fundação, seja necessário à continuação de programa governamental, após a extinção do convênio, para a respectiva entidade convenente; (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
V – destinado à execução descentralizada de programa federal, aos órgãos e entidades da Administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e aos consórcios intermunicipais, para exclusiva utilização pelo órgão ou entidade executora do programa, hipótese em que se poderá fazer o tombamento do bem diretamente no patrimônio do donatário, quando se tratar de material permanente, lavrando-se, em todos os casos, registro no processo administrativo competente. (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007).
Parágrafo único. Os microcomputadores de mesa, monitores de vídeo, impressoras e demais equipamentos de informática, respectivo mobiliário, peças-parte ou componentes, classificados como ociosos ou recuperáveis, poderão ser doados a instituições filantrópicas, reconhecidas de utilidade pública pelo Governo Federal, e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público que participem de projeto integrante do Programa de Inclusão Digital do Governo Federal. (Redação dada pelo Decreto nº 6.087, de 2007). (…)
Art. 19. As avaliações, classificação e formação de lotes, previstas neste decreto, bem assim os demais procedimentos que integram o processo de alienação de material, serão efetuados por comissão especial, instituída pela autoridade competente e composta de, no mínimo, três servidores integrantes do órgão ou entidade interessados.”
Ressalte-se aqui que o Tribunal de Contas da União vem exigindo o cumprimento por parte dos integrantes da Administração Pública Federal dos ditames do Decreto Federal nº 99.658/90:
“Acórdão 102/2005 – Plenário
Processo 012.212/2004-8
Acórdão
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Denúncia referente a possíveis irregularidades ocorridas no âmbito da Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, relativamente à gestão de bens patrimoniais.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em: (…)
9.2.2. proceda, por intermédio de comissão específica de servidores formada nos termos do art. 19 do Decreto nº 99.658/1990, à classificação e destinação do material acumulado no depósito da Escola de Engenharia, tendo presente que:
9.2.2.1. é possível a doação de material antieconômico, nos termos dos arts. 3o, parágrafo único, alínea “c”, e 15, inciso II, do mesmo Decreto, especialmente se considerados os custos de manutenção que a sua conservação enseja;
9.2.2.2. é obrigatória a inutilização ou abandono (conforme o caso) do material irrecuperável, sempre que sua conservação ofereça riscos físicos a instalações ou pessoas ou inconvenientes pronunciados, nos termos dos arts. 3o, parágrafo único, alínea “d”, 16, 17 e 18 do citado Decreto;”
Muito embora o Decreto Federal nº 99.658/90 não seja obrigatoriamente aplicável às Administrações direta e indireta de Estados, DF e Municípios, entendemos que, à falta de legislação local que discipline a matéria, tais entes poderão se valer, de forma subsidiária, das lições contidas no aludido diploma normativo, haja vista que o excogitado Decreto traz em seu artigo 3º conceituações interessantes e que poderão muito bem ser adaptadas às realidades locais para fins de catalogação de bens para futuras doações.
O ideal, por óbvio, é que Estados, DF e Municípios disciplinem adequadamente a questão, como por exemplo, o fez o Estado do Mato Grosso do Sul com o seu Decreto 12.207/2006 que, abaixo disponibilizamos em trechos selecionados:
“Art. 1º Os materiais que compõem o acervo patrimonial dos órgãos e entidades do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso do Sul serão administrados e controlados em conformidade com a legislação pertinente à matéria e com o disposto neste Decreto.
Art. 2º Para fins deste Decreto, considera-se:
I – adjudicação em execução de sentença: transferência dos bens penhorados que estavam em garantia de execução para pagamento de débitos constituídos ou inscritos em Dívida Ativa, oriundos de cobrança judicial;
II – alienação: procedimento de transferência da posse e propriedade de um bem, por intermédio de venda, doação ou permuta, obedecida as disposições contidas no inciso II do art. 17 da Lei Federal nº 8.666, de 21 de junho de 1993;
III – baixa: procedimento de exclusão de bens do acervo patrimonial do Estado por alienação, doação, permuta, dação em pagamento, perda ou desfazimento;
IV – bem em disponibilidade: material que esteja em desuso, seja obsoleto ou inservível para o serviço público estadual;
V – bem inservível: material que não tem mais utilidade para o serviço público estadual em decorrência de ociosidade, obsoletismo, antieconomicidade ou irrecuperabilidade;
VI – carga: efetiva responsabilidade pela guarda e uso de um bem pelo seu consignatário;
VII – cessão de uso: cessão gratuita de bem patrimonial, com troca de responsabilidade pela sua guarda, por prazo determinado, cujo fim principal seja o uso em atividades de assistência social, benemerência, amparo à educação ou outras de relevantes interesse social;
VIII – descarga: transferência da responsabilidade da carga patrimonial, determinada por ato administrativo;
IX – desfazimento: baixa de bem ocioso, obsoleto, inservível, irrecuperável ou cuja manutenção seja considerada antieconômica, por ato administrativo que autorize sua alienação, inutilização total ou parcial, ou abandono, observadas as normas técnicas e legais;
X – doação: o contrato civil pelo qual a administração pública, por liberalidade, com ou sem encargos, transfere um bem do seu patrimônio entre órgãos e entidades ou entre entidades da administração indireta para outros Poderes ou para particulares, condicionada à aceitação pelo donatário, podendo também operar em favor da administração;
XI – incorporação: ingresso físico com o respectivo registro contábil do bem ao acervo patrimonial do Estado ou entidade de direito públicos;
XII – inventário: procedimento que tem por finalidade apurar a existência física e os respectivos valores monetários de materiais permanentes ou de consumo;
XIII – leilão: modalidade de licitação para promover a alienação pela venda de bens inservíveis ou de materiais legalmente apreendidos ou recebidos em processo judicial ou extrajudicial;
XIV – material: designação genérica de equipamentos, componentes, sobressalentes, acessórios, veículos em geral, matérias-primas e outros itens empregados ou passíveis de emprego nas atividades de órgãos e entidades, independente de qualquer fator, bem como aquele oriundo de demolição ou desmontagem, aparas, acondicionamentos, embalagens e resíduos economicamente aproveitáveis;
XV – material de consumo: aquele que, em razão de seu uso corrente e da definição da Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, perde normalmente sua identidade física e/ou tem sua utilização limitada a dois anos;
XVI – material permanente: aquele que, em razão de seu uso corrente, não perde a sua identidade física, e ou tem uma durabilidade superior a dois anos;
XVII – setor ou unidade de almoxarifado: unidade ou setor responsável às operações de recebimento, guarda, armazenagem e distribuição de materiais incorporados ou não ao acervo patrimonial;
XVIII – setor ou unidade de patrimônio: unidade ou setor responsável pelas operações de registro, identificação, movimentação e inventários de materiais incorporados ao acervo patrimonial;
XIX – patrimônio: conjunto de bens, direitos e obrigações, suscetível de apreciação econômica, obtida por meio de compra, doação ou outra forma de aquisição, devidamente identificado e registrado;
XX – permuta: transferência de bens públicos, em troca de outros, públicos ou particulares, da mesma espécie ou não;
XXI – tombamento: processo de registro em sistema próprio e de identificação física do bem incorporado ao acervo patrimonial do Estado;
XXII – transferência: movimentação de material constituinte do acervo patrimonial entre órgãos do Poder Executivo ou para e entidades a ele vinculadas, com mudança gratuita de posse e troca de responsabilidade. (…)
Art. 22. As alienações efetivadas por venda de bens patrimoniais do Estado ou de entidades de direito público somente poderão ser realizadas com autorização do Secretário de Estado de Administração, mediante avaliação prévia, licitação, justificado o interesse público. (redação dada pelo Decreto nº 12.285, de 30 de março de 2007)
Art. 23. É dispensável a licitação nos casos de venda:
I – de bens móveis produzidos ou comercializados por órgão ou entidade da administração pública estadual, em virtude de suas finalidades;
II – de ações e títulos do Estado, conforme legislação pertinente;
III – de materiais e equipamentos para outros órgãos ou entidades da administração pública estadual, sem utilização previsível por quem deles dispõe.
Art. 24. O bem considerado obsoleto, ocioso, antieconômico ou inservível para órgão ou entidade a que pertença poderá entrar em processo de desfazimento.
§ 1º O bem considerado como em condições de desfazimento será classificado em virtude de:
I – ociosidade, quando, embora em condições perfeitas de uso, não estiver sendo aproveitado;
II – obsolescência, quando, embora em condições de uso, o bem não satisfaça mais as exigências técnicas do órgão ou entidade a que pertence por estar tecnologicamente ultrapassado;
III – antieconomicidade, quando sua manutenção ou recuperação for onerosa ou seu rendimento precário, em virtude de uso prolongado ou desgaste prematuro;
IV – inservibilidade, quando não mais puder ser utilizado para o fim a que se destina, em razão de inviabilidade de recuperação ou risco de perecimento. (…)
Art. 33. Transferência é a movimentação de material constituinte do acervo de patrimônio entre órgãos da administração pública estadual, ou de órgão para entidade a ele vinculada, com transferência gratuita de posse e troca de responsabilidade.
§ 1º Havendo movimentação de materiais entre órgãos e entidades ou entre entidades, será classificada e registrada nos sistemas contábil, patrimonial e de administração de materiais como doação.
§ 2º As doações mencionadas no parágrafo anterior ficam condicionadas à aceitação pelo donatário.
§ 3º A destinação de materiais servíveis ou inservíveis do Poder Executivo para outros Poderes, Tribunal de Contas, Ministério Público e Defensoria Pública observará as disposições deste Decreto e, quando houver, a legislação específica do Poder ou desses órgãos.”
Como regulações contidas no Decreto 12.207/2006 do Estado do Mato Grosso do Sul estão longe de ser a regra nos Estados e Municípios da Federação (para exemplificar, informamos que o Estado de Pernambuco não tem legislação símile), cremos que o uso do Decreto Federal nº 99.658/90 pode e deve ser fomentado pelo menos no que for pertinente à classificação dos bens para fins de posterior alienação de material pertencente ao patrimônio público.
3. A doação de bens móveis da Administração Pública à luz da jurisprudência dos órgãos do Controle Externo e do Superior Tribunal de Justiça
3.1. A visão dos Tribunais de Contas
Em consulta formulada pelo município de Chã de Alegria, o Tribunal de Contas de Pernambuco assim se manifestou sobre a possibilidade da doação de bens móveis do poder público:
“PROCESSO T.C. Nº 0900823-8
CONSULTA
INTERESSADO: Sr. JOSÉ ROBERTO DA SILVA, PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CHÃ DE ALEGRIA
RELATOR: CONSELHEIRO VALDECIR PASCOAL
ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL PLENO
DECISÃO T.C. Nº 0447/09
Decidiu o Tribunal de Contas do Estado, à unanimidade, em sessão ordinária realizada no dia 13 de maio de 2009, responder ao consulente nos seguintes termos:
I- A doação de bens móveis pela Câmara Municipal poderá ser efetuada, desde que sejam observados os seguintes requisitos previstos no artigo 17, inciso II, “a”, da Lei nº 8.666/93:
(i) interesse público devidamente justificado;
(ii) avaliação dos bens;
(iii) que a doação vise a fins e uso de interesse social, com avaliação de oportunidade e conveniência sócio-econômica em relação a outra forma de alienação.
II- Lei Municipal poderá exigir autorização legislativa prévia para a doação de bens móveis da administração pública.”
A didática resposta ofertada pela Corte de Contas Pernambucana, longe de ser insular, encontra eco em decisões ofertadas em casos práticos aferidos por outros tribunais componentes do sistema de controle externo. Para exemplificar, tragamos à baila os prejulgados 0528 e 0727 do Tribunal de Contas de Santa Catarina:
“Processo: CON-TC0058400/83
Parecer: COG-049/98
Origem: Prefeitura Municipal de Chapecó
Relator: Conselheiro Luiz Suzin Marini
Data da Sessão: 01/04/1998(…)
O repasse de materiais esportivos previsto no artigo 2° da Lei n° 3.805/93 do Município de Chapecó poderá efetuar-se na forma do artigo 17, inciso II, alínea “a”, da Lei n° 8.666/93 (Estatuto de Licitações), ou seja, por doação, com dispensa de licitação, haja vista destinar-se exclusivamente para fins e uso de interesse social.”
“Processo: CON-TC0447500/87
Parecer: 275/99
Origem: Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina S/A – EPAGRI
Relator: Auditor Altair Debona Castelan
Data da Sessão: 28/07/1999
Os bens móveis inservíveis para entidade da Administração Pública que explora a difusão de tecnologia agropecuárias, inclusive semoventes, podem ser alienados, mediante as seguintes condições, comprovadas em regular processo administrativo:
a) existência de interesse público devidamente comprovado;
b) prévia avaliação;
c) sempre que possível, pela reunião dos bens em um único local para viabilizar economicamente a realização de licitação nas modalidades de leilão ou concorrência;
d)através de licitação, nas seguintes modalidades: 1) Concorrência, seja qual for o valor da avaliação; 2) Leilão, quando, cumulativamente: 2.1) se tratar de bens moveis inservíveis; 2.2) o valor da avaliação for inferior ao limite do art. 23, inciso II, alínea “b”, da Lei Federal nº 8.666/93;
e) por doação, observados os seguintes requisitos da alínea “a” do inciso II do art. 17 da Lei Federal nº 8.666/93, devidamente justificados e comprovados em regular processo administrativo: 1) Finalidade e uso de interesse social; 2) Avaliação da oportunidade e conveniência em relação a ausência de escolha da modalidade de concorrência ou leilão, conforme o caso.”
Vislumbrem-se também as lições do Tribunal de Contas de Minas Gerais que, como não poderiam deixar de ser, não discrepam dos posicionamentos das Cortes de Contas de Pernambuco e Santa Catarina, e também sinalizam para a necessidade de a doação de bens móveis da Administração Pública atender a um interesse social e ser precedida (em caso de licitação dispensada) de uma avaliação que aponte ser tal procedimento aplicável em detrimento à outras formas de alienação como a concorrência e o leilão:
“PLENO – SESSÃO: 23/11/05
RELATOR: CONSELHEIRO WANDERLEY ÁVILA
DENÚNCIA Nº 700103
Versam os autos sobre denúncia formulada pelo Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores da Indústria Energética de Minas Gerais – SINDIELETRO-MG, envolvendo a doação de aproximadamente 400 (quatrocentos) veículos da frota da Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG ao Serviço Voluntário de Assistência Social – SERVAS e a Secretarias de Estado.(…)
Examinando a documentação constante nos autos, constato que foram doados 475 veículos da frota da CEMIG ao Serviço Voluntário de Assistência Social – SERVAS, ao Centro de Artesanato Mineiro – CEART, à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão – SEPLAG e à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Esportes – SEDESE, cujo valor de mercado, conforme avaliação de fls. 105/111, 130, 134/139 e 144, foi de R$ 4.641.531,00 (quatro milhões seiscentos e quarenta e um mil quinhentos e trinta e um reais).(…)
Nos termos da alínea “a”, inciso II, do art. 17 da Lei nº 8.666/93, a doação de bens móveis dependerá de avaliação prévia, sendo dispensada a licitação quando a finalidade e uso forem de interesse social após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica.(…)
À vista do exposto, observo que a CEMIG, por meio de suas instâncias legais, decidiu pela doação de veículos inservíveis, utilizando-se, legitimamente, de seu poder discricionário, amparada na legislação que regulamenta a matéria.
Assim, voto com a relatoria pela improcedência da denúncia e arquivamento dos autos, devolvendo-lhe o processo para continuidade do julgamento.”
Consolidando o posicionamento dos órgãos de Controle Externo sobre o tema, podemos afirmar então que a doação de bens móveis da Administração Pública necessária e obrigatoriamente deverá seguir o disposto na alínea “a”, inciso II, do art. 17 da Lei nº 8.666/93, ou seja: a) Só se dará em casos em que se comprove a existência de interesse público, b) Será precedida de avaliação prévia e c) Será dispensada a licitação quando ela vier a ocorrer para atender interesse social e for instruída com avaliação de oportunidade e conveniência sócio-econômica em relação a outra forma de alienação.
3.2. A visão do Superior Tribunal de Justiça
É árida a jurisprudência do STJ sobre o tema.
Embora parcas, as decisões que versam sobre a doação de bens móveis públicos instigam a confecção de alguns comentários:
“Processo RMS 28112 / MS RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2008/0238168-8
Relator(a) Ministra DENISE ARRUDA (1126)
Órgão Julgador T1 – PRIMEIRA TURMA
Data do Julgamento 17/12/2009
Data da Publicação/Fonte DJe 02/02/2010
Ementa PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO FUNDAMENTADO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ANULAÇÃO DE SEUS PRÓPRIOS ATOS. POSSIBILIDADE. SÚMULAS 346 E 473/STF. PRECEDENTES DO STJ. DESPROVIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO.(…)
2. No caso dos autos, a ora recorrente impetrou mandado de segurança contra ato do Governador do Estado de Mato Grosso do Sul, visando à suspensão da eficácia do Aviso de Anulação que invalidou o processo de doação de equipamentos hospitalares à impetrante, especificamente o Termo de Doação 007/2006.
3. Na hipótese examinada, não existe direito líquido e certo apto a amparar a pretensão mandamental, pois a Corte a quo, ao denegar a segurança, corretamente fundou o seu entendimento nas seguintes conclusões: a) a doação de bens públicos móveis e imóveis exige a observância obrigatória pela Administração Pública dos princípios da legalidade, motivação, finalidade e do interesse público, o que não ocorreu no caso dos autos; b) o processo administrativo de doação não atendeu aos requisitos previstos no Decreto-Lei Estadual nº 17, de 01/01/79 (art. 37, § 2º) e no Decreto Estadual nº 12.101/2006 (art. 24, § 5º, e art. 26), em razão da “não-caracterização dos bens doados como ‘inservíveis e reaproveitáveis’, condição sine qua non à alienação de bens sob aquela modalidade” e da “ausência de constatação de disponibilidade dos bens para desfazimento, o que deveria ter sido providenciada por comissão especificamente designada para tal”; c) não houve a imprescindível oitiva prévia da Procuradoria-Geral do Estado no processo de doação, prevista no Parecer PGE/PAA nº 002/2006; d) ocorreu omissão de fato relevante que viciou o ato jurídico, especificamente o pedido de desligamento da entidade do Sistema Único de Saúde logo após a conclusão do processo de doação; e) a impetrante não pode ser considerada terceiro de boa-fé, pois o ato de doação viciado foi formalizado entre parte interessada e a Administração, tampouco há falar em inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, em razão do encaminhamento de ofício para manifestação da impetrante sobre a anulação do processo de doação. (…)”
“Processo REsp 685551 / AP RECURSO ESPECIAL 2004/0119799-6
Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114)
Órgão Julgador T2 – SEGUNDA TURMA
Data do Julgamento 01/03/2005
Data da Publicação/Fonte DJ 18/04/2005 p. 277
Ementa ADMINISTRATIVO – DOAÇÃO DE VEÍCULO PÚBLICO SEM PRÉVIA LICITAÇÃO – ART. 53 DA LEI 9.784/99 – ATO NULO DE PLENO DIREITO – DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO – CANCELAMENTO DO REGISTRO DE PROPRIEDADE DO VEÍCULO EM NOME DO DONATÁRIO.
1. A Lei 8.666/93 exige, nos casos doação de bens públicos a particular, prévia licitação.
2. Ato de ex-governador do Estado que, mediante decreto autônomo, doa a amigo particular veículo público é nulo de pleno direito.
3. A Administração, com amparo no art. 53 da Lei 9.784/99, deve anular seus próprios atos, quando eivados de nulidade, sendo desnecessária a instauração de processo administrativo, oportunizando a defesa ao donatário na hipótese dos autos, porque o ato não poderia ser convalidado, à míngua de licitação.
4. Registro de propriedade do veículo em nome do donatário que deve ser cancelado.
5. Recurso especial provido.”
Na primeira decisão que colacionamos podemos ver que o Superior Tribunal de Justiça apenas trouxe à balia a questão da necessidade de as doações de bens da Administração Pública atenderem a um interesse público que, como já vimos, é apenas um dos requisitos para que se proceda com a doação nos moldes preconizados pela Lei Federal nº 8.666/93.
Como o interesse público é, em última análise, o supedâneo legal para todas as ações da Administração Pública, resta patente que, mesmo que se trate de um bem inservível apto para doação (porque ocioso, obsoleto, etc.) que já tenha sido objeto de avaliação prévia e de avaliação de oportunidade e conveniência sócio-econômica em relação a outra forma de alienação, quando se verificar que a doação não atende o interesse público, a mesma não poderá ser concretizada e, se já tiver sido, deverá ser invalidada.
Já na segunda decisão do STJ, podemos perceber que o Tribunal não acolheu a tese de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes que, como já vimos, entende que se não forem obedecidos os requisitos necessários para a licitação dispensada (existência de interesse público devidamente justificado, avaliação prévia, fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica) a doação de bens móveis públicos não poderia se dar através de procedimento licitatório.
Para o STJ a doação do bem móvel (no caso um veículo) para o particular como não atendia disposto na alínea “a” do inciso II do art. 17 da Lei nº 8.666/93, deveria se dar por meio de prévio procedimento licitatório.
Entende aquela Corte, portanto, que é possível uma licitação para doação de bens móveis públicos.
4. A questão da legislação eleitoral
Embora seja de aplicabilidade duvidosa quanto às sociedades de economia mista e empresas públicas (haja vista a possibilidade de dúvidas acerca do alcance da expressão “Administração Pública”), cabe o registro do que dispõe a lei das eleições (9.504/97):
“Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)(…)
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.”
Induvidosamente aplicável à Administração Pública Direta da União, Estados, DF e Municípios – já que quando concorre a reeleição, o gestor máximo do Poder Executivo continua a exercer suas funções administrativas – o dispositivo acima exposto, pelo menos no nosso entendimento, deve ser também, ad cautelam, respeitado pelas empresas estatais, de modo a evitar questionamentos, constrangimentos e responsabilizações.
Repita-se que tal medida deve ser tomada apenas por cautela, pois nos parece que óbvio que uma doação que atenda o interesse público não deve ser colocada no mesmo patamar de uma que se realiza com o fim de captação de votos. Aliás, a doação que caracteriza o ilícito eleitoral de “captação ilícita de sufrágio” deve possuir potencialidade para comprometer a lisura e a normalidade das eleições e ser logicamente revestida do dolo específico de auferir votos do eleitorado.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) inclusive aponta para tal norte, conforme podemos ver abaixo:
“AgR-AI – Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 11204 – terra roxa/PR
Acórdão de 19/08/2010
Relator(a) Min. CÁRMEN LÚCIA ANTUNES ROCHA
Publicação:
DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 24/09/2010, Página 21
Ementa:
Eleições 2008. Agravo regimental em agravo de instrumento. Ação de investigação judicial eleitoral julgada improcedente. Abuso de poder e condutas vedadas. Ilícito eleitoral não caracterizado. Programa social preexistente. Inviável o agravo que visa o reexame de fatos. Precedentes. Agravo regimental ao qual se nega provimento.”
“AgR-REspe – Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 36132 – viçosa do ceará/CE
Acórdão de 20/05/2010
Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA
Publicação:
DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 24/06/2010, Página 49
Ementa:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97. DESCARACTERIZAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO.
1. Os argumentos trazidos no recurso não são suficientes a ensejar a modificação da decisão agravada.
2. Não é possível concluir, diante das circunstâncias descritas no aresto impugnado, que o bem prometido teria sido condicionado ao voto dos beneficiários.
3. Para infirmar o entendimento da Corte Regional, seria necessário o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência inviável em sede de recurso especial, a teor das Súmulas nos 7/STJ e 279/STF.
4. Depreende-se do acórdão recorrido que, a despeito de o relator fazer referência ao tipo descrito no art. 73, IV, da Lei das Eleições, inexistiu a alegada desclassificação do ilícito do art. 41-A para a mencionada conduta vedada.
5. Agravo regimental desprovido.”
“ARO – AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO nº 1444 – arenápolis/MT
Acórdão de 23/06/2009
Relator(a) Min. JOAQUIM BENEDITO BARBOSA GOMES
Publicação:
DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Volume -, Tomo -, Data 17/08/2009, Página 25
Ementa:
Agravo regimental no recurso ordinário. Representação. Captação Ilícita de sufrágio e gastos ilícitos de recursos de campanha. Arts. 41-A e 23, § 5º, da Lei das Eleições. Participação do candidato, ainda que indireta. Finalidade de captação ilícita de voto. Provas cabais, robustas e sólidas inexistentes nos autos. Improcedência. Precedentes. Recurso a que se nega provimento.
Para caracterização da captação ilícita de sufrágio, há que se ter provas cabais, conclusivas, da participação do candidato na conduta ilegal, ainda que de forma indireta, bem como a finalidade de captação vedada de sufrágio, condições essas que, no caso, não estão patentes.
Agravo regimental improvido.”
“AAG – AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO nº 8033 – Curitiba/PR
Acórdão de 26/08/2008
Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA
Publicação:
DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 17/9/2008, Página 19
Ementa:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. JANTAR. RESTAURANTE. DOAÇÃO. CAMPANHA. CARACTERIZAÇÃO. COMÍCIO. LOCAL FECHADO. INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO. ART. 41-A DA LEI Nº 9.504/97. AUSÊNCIA. INVASÃO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. INOCORRÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. INVIABILIDADE. RECURSO ESPECIAL. DESPROVIDO.
1. Conforme já reiteradamente decidido por esta Corte, o exame pelo presidente de tribunal regional eleitoral de questões afetas ao mérito do recurso especial, por ocasião do juízo de admissibilidade, não implica invasão de competência do Tribunal Superior Eleitoral.
2. Para que ocorra a captação de sufrágio, conforme a redação do próprio dispositivo, é necessário que a vantagem conferida pelo candidato ao eleitor seja feita com o intuito de obter-lhe o voto, o que, no caso, não ocorreu.
3. É certo que o art. 41-A da Lei nº 9.504/97 não faz distinção entre a natureza social ou econômica dos eleitores beneficiados ou entre a qualidade ou valor da benesse oferecida. Ocorre que a conduta imputada ao recorrido é insuficiente para a caracterização do ilícito eleitoral.
4. Agravo regimento desprovido.”
“RO – RECURSO ORDINÁRIO nº 772 – boa vista/RR
Acórdão nº 772 de 29/06/2004
Relator(a) Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS
Publicação:
DJ – Diário de Justiça, Data 05/11/2004, Página 159
RJTSE – Revista de Jurisprudência do TSE, Volume 15, Tomo 3, Página 102
Ementa:
REPRESENTAÇÃO. Recurso ordinário. Cerceamento de defesa. Captação ilícita de sufrágio. Provas robustas. Ausência. Provimento.
– Embora presente o cerceamento de defesa, não se declara a nulidade quando presente a hipótese do art. 249, § 1º, CPC.
– A caracterização da conduta vedada pelo art. 41-A da Lei nº 9.504/97 requer que a promessa ou entrega da benesse seja acompanhada de expresso pedido de voto.”
E esta também é a visão dos Tribunais Regionais Eleitorais:
“TRE-CE
RECURSO ACAO IMPUGNACAO MANDATO ELETIVO nº 11073 – horizonte/CE Acórdão nº 11073 de 10/04/2007
Relator(a) TARCÍSIO BRILHANTE DE HOLANDA
Publicação:
DJ – Diário de Justiça, Volume 77, Data 25/04/2007, Página 153
Ementa:
ELEIÇÕES MUNICIPAIS 2004. RECURSO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. PRELIMINAR DE FERIMENTO AO PRINCÍPIO DISPOSITIVO. REJEIÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA: REQUISITOS. CONDUTA VEDADA: REQUISITOS. INEXISTÊNCIA. ABUSO DO PODER ECONÔMICO, POLÍTICO E DE AUTORIDADE. INOCORRÊNCIA. PROGRAMA SOCIAL E SUA REGULARIDADE. CONSTRUÇÃO DE AÇUDE. ANO ANTERIOR AO PLEITO ELEITORAL. VERBAS FEDERAIS. REGULARIDADE ADMINISTRATIVA. RECURSO NÃO PROVIDO.
1) Não fere o princípio dispositivo peça recursal que faz menção ao que fora decidido em primeiro grau e pede sua reforma, com base nos argumentos que os Recorrentes querem ver prevalecentes.
2) Nos expressos termos do REspe n.º 21.327, Rel. Min. Ellen Grace Northfleet, DJU de 31/08/2006: “O TSE entende que, para a caracterização da captação de sufrágio, é indispensável a prova de participação direta ou indireta dos representados, permitindo-se até que o seja na forma de explícita anuência da conduta objeto da investigação, não bastando, para a configuração, o proveito eleitoral que com os fatos tenham auferido, ou a presunção de que desses tivessem ciência. A ausência de prova de participação dos candidatos na conduta investigada afasta a aplicação do art. 41-A da Lei n.º 9.504/97”.
3) O Tribunal Superior Eleitoral, em julgados recentes proferidos no ano de 2006, reafirmou essa orientação, fixando que para a configuração da captação ilícita de sufrágio faz-se necessário que a entrega ou oferecimento de benesses estejam atrelados ao expresso pedido de votos, e que sobre isso exista prova cabal, demonstração irrefutável (Precedentes: Ag. n.º 6.832/SC, Rel Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 24/03/2006; REspe n.º 25.579/RO, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 1º/08/2006; AgRgAg n.º 6.734/PA, Rel Min. Caputo Bastos, DJU 1º/08/2006, e AgRgREspe n.º 25.920/PA, Rel Min. Caputo Bastos, DJU de 07/08/2006).
4) Com relação às condutas vedadas, é imprescindível que estejam provados todos os elementos descritos na hipótese de incidência do ilícito eleitoral para a imputação das severas sanções de cassação de registro ou de diploma, como também se faz necessária a efetiva e comprovada doação de bens e serviços de caráter social (AG n.º 5.817, Rel. Min. Caputo Bastos, DJU de 16/09/2005, p. 172).
5) Não constitui conduta vedada a distribuição de benesses autorizada em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior à eleição (art. 73, § 10, da Lei n.º 9.504/97).
6) In casu, não ocorreu abuso do poder econômico, político ou de autoridade.
7) A construção de açude, precedida dos regulares procedimentos administrativos e decretada em ano anterior ao pleito eleitoral, não constitui ilícito.
8) O acervo probatório dos autos não se mostrou idôneo e suficiente para a caracterização da captação ilícita de sufrágio e da prática de conduta vedada.
9) Recurso conhecido e não provido.”
“TRE-CE (citado no Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n° 36.132 (43850-86.2009.6.00.0000 julgado no TSE)
RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2008. CANDIDATA ELEITA. CAPTAÇÃO ILÍClTA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N° 9.504/97. CASSAÇÃO REGISTRO. INELEGIBILIDADE. PROGRAMA DE GOVERNO. CAPTAÇÃO DE VOTO. NÃO CONFIGURAÇÃO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. POTENCIALIDADE DE INFLUÊNCIA NO PLEITO. DESCARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO DO RECURSO.
1. Para configuração da conduta delitiva prevista nos art. 41-A da Lei nº 9.504/97 deve ficar demonstrado que houve o oferecimento de bem ou vantagem pessoal, em troca de voto;
2. A diferença entre os ilícitos da captação indevida de sufrágio, nos termos do art. 41-A da Lei n° 9.504/97 e a conduta vedada do art. 73, IV, do mesmo diploma legal, encontra-se delineada no fato de que, mediante a primeira ilicitude, o candidato doa, oferece, promete ou entrega bem ou vantagem ao eleitor com o fim de obter-lhe o voto e, na outra hipótese, ocorre o desvirtuamento dos programas sociais de governo, pois o candidato se projeta perante o eleitor por levá-lo a crer que é patrocinador do benefício;
3. Para decretação da inelegibilidade, sob a perspectiva do abuso de poder econômico, imprescindível comprovar-se que a conduta hostilizada deteve potencialidade para comprometer a lisura e a normalidade das eleições;
4. Recurso provido.”
“TRE-PA
RE – RECURSO ELEITORAL nº 2044 – curua/PA
Acórdão nº 19173 de 03/05/2005
Relator(a) RAPHAEL CELDA LUCAS FILHO
Publicação:
DOE – Diario Oficial do Estado, Volume 1, Data 11/5/2005, Página 15
Ementa:
Recurso Eleitoral Ordinário. Investigação Judicial Eleitoral. Condenação por captação ilícita de sufrágio. Alegado abuso do poder político. Distribuição de medicamentos em troca de voto não demonstrada. Ausência de prova robusta e incontroversa.
1. Para a configuração da captação ilícita de sufrágio de que trata o art. 41-A da Lei n.º 9.504/97, a doação ou a promessa da benesse deverá se efetivar, com expresso pedido de voto, pessoalmente pelo candidato.
2. Para procedência de ação de investigação judicial eleitoral por suposto abuso do poder político, exige-se que a conduta abusiva seja de tal proporção que comprometa a normalidade e a legitimidade do pleito, sendo imprescindível a demonstração da provável influência do ilícito no resultado da eleição impugnada.
3. Não se mostram suficientemente robustas à cassação de diploma as provas documentais consistentes em solicitações de medicamentos destituídas de qualquer identificação dos beneficiários, expedidas por Secretário Municipal de Saúde e rechaçadas pela juntada das receitas médicas correspondentes.
4. Inconsistentes e contraditórios se afiguram os depoimentos prestados por pessoas analfabetas, dos quais se depreende haver ressentimentos e raiva em relação ao Recorrente e o intuito de provocar-lhe dano, denotando, antes, a isenção de ânimo de tais testemunhas para funcionar no feito.”
“TRE-SP
REC – RECURSO CIVEL nº 23554 – Viradouro/SP
Acórdão nº 152549 de 22/02/2005
Relator(a) PAULO DIMAS DE BELLIS MASCARETTI
Publicação:
DOE – Diário Oficial do Estado, Data 24/02/2005, Página 170
Ementa:
CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO – INOCORRÊNCIA – NÃO CARACTERIZAÇÃO, NA ESPÉCIE, DA ILICITUDE REPRIMIDA PELOS ARTS. 41-A E 73, IV, AMBOS DA LEI N.º 9504/97 – AUSÊNCIA DE PROVA INCONCUSSA E IRREFRÁGAVEL DOS FATOS TIDOS COMO VIOLADORES DO TEXTO LEGAL – HIPÓTESE EM QUE ESTAMOS DIANTE DE SERVIÇO PERMANENTE E CONTÍNUO DE ENTIDADE ASSISTENCIAL , INEXISTINDO NOTÍCIA DE QUE O ORA RECORRENTE OU SUA ESPOSA, ENTÃO PRESIDENTE DO FUNDO SOCIAL DE SOLIDARIEDADE, TIVERAM CONTATO PESSOAL COM QUALQUER DOS BENEFICIADOS ÀS VÉSPERAS DAS ELEIÇÕES – PEDIDOS DE DOAÇÕES DE CESTAS BÁSICAS QUE ERAM FEITOS AOS FUNCIONÁRIOS DA REPARTIÇÃO E ATENDIDOS DE ACORDO COM A DISPONIBILIDADE ORÇAMENTÁRIA, INEXISTINDO DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER INTERFERÊNCIA DO REPRESENTADO – RECURSO PROVIDO PARA O FIM DE JULGAR IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO”
“TRE-PE
REC – RECURSO nº 9066 – canhotinho/PE
Acórdão de 05/10/2009
Relator(a) JOÃO HENRIQUE CARNEIRO CAMPOS
Publicação:
DOE – Diário Oficial do Estado, Tomo 7, Data 15/1/2010, Página 11
Ementa:
Recurso Eleitoral. Representação. Improcedência. Eleições Municipais (2008). Candidatos. Prefeito. reeleição. Vereador. Capacitação ilícita de sufrágio. Ausência. Cassação de Registro ou diploma. Impossibilidade. Doação. Forno. Associação de Moradores. Prefeitura. Convênio. Pedido de voto. Inocorrência.
1. A configuração da captação ilícita de sufrágio requer a comprovação da ação de doar, oferecer, prometer ou entregar ao eleitor bem ou vantagem pessoal, e de restar indubitável ser o fim da ação a obtenção do voto do eleitor;
2. Ausência de oferta individual de bens em razão da doação ter sido feita à associação de moradores, através de convênio com a Prefeitura, impossibilitando as promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, caracterizar capacitação ilícita de sufrágio, conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral.”
“TRE-RS
RAIJE – RECURSO – AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL nº 90 – são francisco de assis/RS
Acórdão de 14/04/2009
Relator(a) DR. ÍCARO CARVALHO DE BEM OSÓRIO
Relator(a) designado(a) DES. SYLVIO BAPTISTA NETO
Publicação:
DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 062, Data 23/04/2009, Página 1
Ementa:
Recurso. Investigação judicial eleitoral. Alegada doação de bens em período eleitoral.
Afastado o enquadramento da conduta nas hipóteses do artigo 41-A, porquanto o tipo exige o especial fim de agir, ou seja, a intenção da compra de votos. Igualmente refutada a hipótese do artigo 22 da Lei Complementar n. 64/90, pela falta de comprovação de efetiva potencialidade do ato irregular no resultado do pleito.
Doação de vidros a família atendida por programas sociais do município, ainda que em época de campanha, não caracteriza ilícito eleitoral, uma vez que ausente a intenção de obtenção de votos.
Provimento negado.”
“TRE-MG
RAIME – RECURSO EM AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO nº 11602005 – santa rosa da serra/MG
Acórdão nº 3447 de 13/12/2006
Relator(a) FRANCISCO DE ASSIS BETTI
Publicação:
DJMG – Diário do Judiciário-Minas Gerais, Data 06/02/2007, Página 70
Ementa:
Recurso. Ação de Impugnação de Mandato Eletivo. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Arts. 41-A e 73 da Lei 9.504/97 c/c o art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 e art. 14, §§ 10 e 11, da Constituição da República. Eleições 2004. Improcedência. Preliminares:
1- Intempestividade da ação de impugnação de mandato eletivo. Rejeitada. Contagem do prazo de 15 (quinze) dias disciplinada pelo art. 184 do Código de Processo Civil.
2- Ilegitimidade ad causam da coligação recorrente. Rejeitada. As prerrogativas e obrigações atribuídas às coligações partidárias, no que se refere ao processo eleitoral, não se encerram na data do pleito. Art. 6º, §1º, da Lei nº 9.504/97. Atuação legítima da coligação partidária.
3- Impropriedade da via eleita. Rejeitada. Possibilidade de apuração de captação ilícita de sufrágio em sede de AIME. Ilícito que se trata de espécie de abuso de poder econômico ou tipo de corrupção. Possibilidade de exame do abuso de poder político e condutas vedadas em AIME, desde que verificada a repercussão econômica do ato do agente público, mediante o uso de dinheiro público. Espécie de abuso do poder econômico.
4- Desistência da ação pela candidata recorrente. Rejeitada. Inexistência de manifestação nos autos que demonstre o intuito de desistência ou abandono da ação pela candidata. Ausência de previsão legal no sentido de excluir a parte autora pelo fato da não-participação em um único ato processual.
Mérito.
Veiculação de panfletos promocionais, contendo realizações do Prefeito. Inexistência de prova de que a publicação impugnada teria sido confeccionada com recursos públicos. Não-constatação de prática de qualquer conduta vedada pelo Prefeito. Direito de divulgação de suas realizações pelo administrador público.
Construção de casas populares para doação à população, em período eleitoral. Implementação de Programa de Subsídio à Habitação, apresentado em data remota à eleição, antes do período eleitoral. Não-ocorrência de aumento significativo ou repentino do número de pessoas beneficiadas. Fato que não detém potencialidade para influenciar no resultado do pleito eleitoral. Não-caracterização do abuso de poder político e econômico. Doação de materiais de construção. Existência de lei municipal autorizando a doação de material de construção a pessoas carentes. Pessoas agraciadas devidamente cadastradas. Impossibilidade de apuração da existência de pedido de votos. Prova testemunhal contraditória. Existência de discrepâncias que impedem a formação de um conjunto probatório harmônico e robusto. Não-configuração da prática de captação ilícita de sufrágio. Recurso a que se nega provimento.”
“TRE-TO
IJAPE – INVESTIGACAO JUDICIAL POR ABUSO DE PODER ECONOMICO nº 4593 – palmas/TO
Acórdão nº 4593 de 18/04/2006
Relator(a) MARCO ANTHONY STEVENSON VILLAS BOAS
Publicação:
DJ – Diário de Justiça, Tomo 1500, Data 11/05/2006, Página B-9
Ementa:
RECURSO ELEITORAL. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL. PROGRAMA MUNICIPAL DE HABITAÇÃO. VÉSPERAS DA ELEIÇÃO. DOAÇÃO DE LOTES A SERVIDORES MUNICIPAIS EFETIVOS. AUSÊNCIA DE CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO. BENEFÍCIO COLETIVO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE ADMINISTRATIVA.
1. Programa municipal de habitação, iniciado no segundo ano do mandato eletivo, que visa atender todos servidores efetivos indistintamente não caracteriza captação de sufrágio, a qual exige, para sua aplicação, vantagem oferecida a eleitor específico.
2. Doações de lotes ocorrida às vésperas da eleição não significa abuso de poder econômico quando é feita em cumprimento de mais uma das etapas do programa governamental, cujo começo se deu no início da gestão administrativa.
3. O chefe do Poder Executivo, em obediência ao princípio da legalidade, antes de iniciar qualquer projeto, deve obter sua inclusão na lei orçamentária e, posteriormente, executar o cronograma físico-financeiro estabelecido no projeto, sob pena de tumultuar a execução orçamentária e ocasionar o desequilíbrio da gestão.
4. A formalização de contratos para os contemplados em programa habitacional às vésperas da eleição não fere o princípio da continuidade administrativa.
5. Não caracteriza abuso de poder econômico se inexiste nos autos qualquer prova da exigência do participante do programa de habitação a promessa de voto no titular do Poder Executivo, candidato à reeleição.
6. Inexiste abuso de poder econômico quando não há prova da exigência, como condição de promessa de voto ao titular do Poder Executivo, candidato à reeleição.”
De toda a sorte, como a subjetividade tende a encampar em casos de tal natureza, se impõe como necessária a adoção de extrema cautela por parte do Gestor Administrativo quando da doação em ano eleitoral, até porque não é só o a Justiça Eleitoral quem poderá trazer-lhe embaraços, vez que ainda restam o Ministério Público e os Tribunais de Contas.
5. Conclusão
Em face das considerações acima delineadas, entendemos que é possível a doação de bens públicos obsoletos e inservíveis pela Administração Pública Direta e Indireta desde que sejam atendidos os seguintes requisitos:
a) Que haja a observância obrigatória aos princípios da legalidade, motivação, finalidade e do interesse público;
b) Que a entidade mantenedora do programa de interesse social que será beneficiária da doação prove se tratar de entidade sem fins lucrativos (apresentando cópia do estatuto social);
c) Que se promova a avaliação prévia do(s) bem(ns) a ser(em) doado(s) por técnico(s) devidamente habilitado(s) para tal (contadores e/ou economistas);
d) Que se promova avaliação de oportunidade e conveniência sócio-econômica em relação a outra forma de alienação (avaliação esta que levará em conta os benefícios sociais da doação em contraposição a uma outra destinação que a Administração poderia dar ao(s) bem(ns) a ser(em) doado(s));
e) Que, no termo de doação, fique definida a forma/circunstância em que serão empregados os bens móveis doados e que conste em tal instrumento cláusula de retrocessão que garanta o retorno dos bens à Administração Pública em caso de não utilização do objeto da doação em fins e uso de interesse social;
f) Que a doação, por cautela, não se dê em ano eleitoral, exceto em casos da continuidade de programas governamentais pré-existentes ou em casos de eventos extraordinários (como por exemplo, a doação de remédios, roupas, colchões, etc, para vítimas de calamidades naturais).
Informações Sobre o Autor
Aldem Johnston Barbosa Araújo
Advogado da UEN de Direito Administrativo do Escritório Lima e Falcão, Assessor Jurídico da Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria de Saúde do Recife e Consultor Jurídico do Departamento de Vigilância Sanitária de Olinda