Responsabilidade social da empresa em face do trabalho infantil nas famílias que trabalham para indústria fumageira

Resumo: O presente trabalho traz a visão histórica sobre a construção da categoria infância, desde o período medieval, logo no final do século XIII, onde se demonstra que a infância não é percebida pela consciência social. Através da evolução do pensamento humano e das conquistas no campo dos Direitos Humanos, a categoria infância foi criada e necessitou ser protegida através de inúmeras legislações, que garantissem o direito dos menores. A Doutrina da Proteção Integral foi adotada pela Constituição Federal de 1988, criando um sistema especial de garantias e de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes distintos do assegurado ao adulto, reconhecendo igualdade jurídica entre todas as crianças e adolescentes. O Estatuto da Infância e do Adolescente, o ECA, representa um avanço multidisciplinar no sentido de proteger e garantir os direitos infanto-juvenis. O histórico emprego de mão-de-obra de crianças e adolescentes na cadeia produtiva do tabaco no Rio Grande do Sul vem apresentando queda significativa, sendo que o grande desafio hoje é quanto ao trabalho dos adolescentes, que ainda é alto. Assim, na busca incessante de erradicar o trabalho infantil e juvenil, existe uma união de esforços do Governo federal, através de seus programas, com grande destaque ao PETI, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, e o apoio do Ministério Publico do Trabalho (MPT), que fiscaliza de forma permanente toda a cadeia produtiva do tabaco, orienta os fumicultores e, diante de irregularidades, aplica o TAC, o Termo de Ajuste de Conduta, em uma ação integrada aos representantes do setor fumageiro, AFUBRA e SINDITABACO.

Palavras-Chave: Infância – Trabalhadores – ECA – Fumageira- Trabalho Infantil.

Abstract: This work brings the historical view on the construction of the category childhood, from the medieval period right at the end of the thirteenth century, demonstrating that childhood is not perceived by social conscience. Through the evolution of human thought and achievement in the field of Human Rights, the category was created infancy and needed to be protected by numerous laws that guarantee the right of minors. The Doctrine of Integral Protection was adopted by the Federal Constitution of 1988, creating a special system of guarantees and protection of fundamental rights of children and adolescents other than the insured adult, recognizing legal equality among all children and adolescents. The Statute of Children and Adolescents, the ECA represents a breakthrough multidisciplinary in order to protect and ensure the rights of children and youth. The historic use of hand labor of children and adolescents in the supply chain of tobacco in Rio Grande do Sul has been showing significant drop, and the challenge now is to work as adolescents, which is still high. Thus, in the relentless pursuit to eradicate child labor and youth, there is a joint effort of the federal government, through its programs, most notably the PETI Program for the Eradication of Child Labor, and the support of the Ministry of Public Work (MPT), which monitors permanently the entire production chain of tobacco growers and guides, before irregularities, applying the TAC, the Conduct Adjustment Term, in an integrated action to representatives of the tobacco sector, and AFUBRA SindiTabaco.

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Keywords: Childhood – Workers – ACE – Tobacco – Child Labour.

Sumario: 1. Introdução. 2.  Construção do conceito de infância como categoria e a garantia dos seus direitos como conquista histórica. 2.1. Construção do conceito de infância como categoria. 2.2. Garantia dos direitos das crianças e adolescentes como conquista histórica. 3. Os trabalhadores rurais da indústria fumageira do estado do Rio Grande do Sul. 3.1. Histórico da cadeia produtiva do tabaco no Rio Grande do Sul. 3.2. Cadeia produtiva do tabaco – sistema integrado. 3.3. Cenário atual da cadeia produtiva brasileira e gaúcha. 4. Necessidade da inclusão infanto-juvenil na cadeia produtiva. 4.1. As repercussões na vida dos sujeitos trabalhadores infantis na cadeia produtiva do tabaco. 4.2. Consequências do trabalho infanto-juvenil. 4.3. O que está sendo feito para se obter a erradicação do trabalho infanto-juvenil. 5. Conclusão. Referencias.

1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo fazer uma reflexão sobre quais os motivos da utilização do trabalho infantil e Juvenil na cadeia produtiva do tabaco do Rio Grande do Sul se existe o  Princípio da Proteção Integral que deveria evitar que isso acontecesse. Existirá uma inefetividade da proteção Integral, que não consegue atender na plenitude essas crianças e adolescentes, que são colocados precocemente na lide do campo? Alem disso, qual a responsabilidade social que as empresas devem ter em face do trabalho infantil nas famílias que trabalham para a indústria fumageira?

Foi realizada uma ampla pesquisa bibliográfica em livros, artigos, sites que disponibilizam dados estatísticos sobre a formação da categoria infância, o trabalho infantil e juvenil, Direitos Humanos, agricultura familiar e sobre a cadeia produtiva do tabaco do Rio Grande do Sul.

Este trabalho está estruturado em três capítulos. Inicialmente, no primeiro capítulo, pretende-se explicar como se deu a construção da categoria infância, e para tanto, faz-se uma análise histórica dos comportamentos, costumes, concepções sobre a infância desde a era medieval. Nesse sentido, a obra do historiador francês Philippe Ariès trouxe importante contribuição, pela análise que ele fez de como a Sociedade representava o mundo infantil nas obras de arte desde a era medieval até a modernidade.

Veremos que o conceito de infância como categoria nem sempre existiu, pois não havia uma distinção clara entre crianças e adultos. As crianças eram “adultos em miniatura”, no tocante ao trabalho, na forma de se vestirem e não havia apego e nem atenções especiais dedicadas ao mundo infantil, sendo necessário que fosse construído um conceito de infância como categoria ao longo dos séculos, através da evolução do pensamento humano e das conquistas no campo dos Direitos Humanos.

A descoberta da categoria infância deu uma nova dimensão ao modelo de construção do indivíduo, que para se tornar adulto, deveria passar obrigatoriamente por etapas de desenvolvimento, começando pela infância. Assim, este estudo percorreu um emaranhado de legislações, doutrinas e fatos históricos que visavam garantir o direito das crianças e dos adolescentes.

Nesse quadro, surge a Doutrina da Situação Irregular, com o fim protetivo, mas com cunho assistencialista, discriminatório e assumindo papel de controle social da subcategoria “menor”. Marcam esse período as rodas dos expostos, o Tribunal de menores, a exploração da mão-de-obra infanto-juvenil pelas indústrias e no meio rural.

Assim, alguns fatos históricos foram marcantes nas conquistas das crianças e adolescentes como: Regulamentação do ensino obrigatório em 1854; o Decreto nº 1.313 de 1891, que estipulava em 12 anos a idade mínima para se trabalhar; o Primeiro Congresso Internacional de Menores de 1911; a Declaração de Gênova de Direitos da Criança pela Liga das Nações, de 1924; a criação da OIT em 1919, que editou inúmeras convenções a fim de garantir o direito de crianças e adolescentes no âmbito trabalhista; a Constituição de 1934 que trouxe avanços no campo trabalhista infantil, a criação do Serviço de Assistência ao Menor (SAM) em 1942 com direcionamento de controle e repressão; a criação das Nações Unidas; em 1948 é aprovada a “Declaração Universal dos Direitos Humanos”; criou-se a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) – Lei 4.513 de 1/12/64 e novo Código de Menores de 1979 – Lei 6697 de 10/10/79.

A partir da Convenção Internacional dos Direitos da Criança houve  influência sobre toda a América Latina, estimulando o surgimento de movimentos sociais que serviram como base para a criação de textos jurídicos na área dos direitos da infância. A Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 fundamentou a Doutrina da Proteção Integral, que foi consagrada pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança em 1989 e adotada integralmente pela Constituição federal de 1988.

Com todos esses avanços no campo da proteção infanto-juvenil, a Lei 8.069/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), representa a aglutinação de todas essas conquistas protetivas de crianças e adolescentes.

No capítulo 2 realizamos um estudo da cadeia produtiva do tabaco, especificamente do Estado do Rio Grande do Sul, desde a sua origem, com a vinda dos imigrantes alemães para as regiões de São Leopoldo e Vale do Rio Pardo. Abordamos o SIPT (Sistema Integrado de Produção de Tabaco), a inclusão da mão-de-obra infanto juvenil na cadeia produtiva do tabaco e o cenário atual da cadeia produtiva Brasileira e Gaúcha.

Já no capítulo 3, abordaremos os fatores que contribuem para a realidade do trabalho de crianças e adolescentes na cadeia produtiva do tabaco no rio Grande do Sul, as repercussões que esse trabalho tem na vida delas e o que está sendo feito no sentido de se obter a tão esperada erradicação do trabalho infanto-juvenil, como os programas do MPT (Ministério Publico do Trabalho), que através de denúncias, procura fiscalizar, conscientizar e atuar fortemente, no sentido de coibir o trabalho infanto-juvenil, de forma que as crianças estejam estudando e não trabalhando.

2 CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INFÂNCIA COMO CATEGORIA E A GARANTIA DOS SEUS DIREITOS COMO CONQUISTA HISTÓRICA

2.1 CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE INFÂNCIA COMO CATEGORIA

Por mais estranho que pareça nos dias de hoje, a Humanidade nem sempre viu a criança como um ser em particular, que necessita de cuidados e atenção especial e, por muito tempo, a tratou como um adulto em miniatura. De um ser com pouca importância, socialmente quase imperceptível, a criança, num processo secular, passou a ocupar um maior destaque na sociedade, e a Humanidade lançou-lhe um novo olhar.

Para compreender-se a problemática do trabalho infantil e Juvenil na agricultura familiar Brasileira, necessitamos fazer um apanhado histórico dos eventos que deram origem aos conceitos e valores nos quais a nossa cultura abrigou-se. Sob a perspectiva histórica, vemos que o conceito da infância como categoria nem sempre existiu tal como o conhecemos. Houve a construção da categoria infância, através de um processo de transformação socio-cultural, onde a Humanidade passou a olhar a infância sob um novo prisma que a diferenciava da vida adulta.

Nesse ponto, o historiador francês Philippe Ariès trouxe importante contribuição para o entendimento de como ocorreu a construção da categoria infância, através de um estudo interpretativo de como as crianças eram retratadas nas obras de arte produzidas desde a era medieval até a modernidade, na Europa Ocidental, especialmente na França. Assim, para ARIÈS, o conceito de infância se deu nas construções sociais de três períodos históricos: na Antiguidade, no século XIII ao século XVIII e no século XVIII a atualidade.[1]

Para o autor, na idade média não havia uma separação clara entre o que seria adequado para crianças e o que seria específico para a vida dos adultos. ARIÈS aponta em sua pesquisa que a sociedade européia medieval, até por volta do século XII, não retratava as crianças em seus quadros e, quando a fazia, elas estavam representadas com trajes semelhantes aos dos adultos da classe social a que pertenciam. As vestimentas, não sendo próprias para o mundo infantil, provavelmente impediam que as crianças se movimentassem livremente como os vemos fazer nos dias atuais.[2]

Assim, essa falta de atenção em relação à infância pode se explicar pela baixa expectativa de vida que as crianças tinham na Idade Média, fazendo com que os mais velhos não se permitissem grandes apegos. Como a taxa de natalidade era também muito alta, os filhos mortos poderiam ser substituídos por aqueles que ainda viriam.[3]

Nesse sentido, HEYWOOD descreve como era a percepção da família em relação aos tratos com as crianças, mesmo as de pouca idade:

“Pode-se apresentar um argumento contundente para demonstrar que a supostaindiferença com relação à infância nos períodos medieval e moderno resultou emuma postura insensível com relação à criação de filhos. Os bebês abaixo de 2 anos, em particular, sofriam de descaso assustador, como os pais considerando pouco aconselhável investir muito tempo ou esforço em um “pobre animal suspirante”, que tinha tantas probabilidades de morrer com pouca idade.”[4]

Já, ARIÈS, nos fala sob a construção da categoria infância, afirmando que antes e durante a idade média a infância não existia tal como a concebemos, ou seja, acrianças não eram percebidas pela consciência social como seres diferenciados do mundo dos adultos; a criança era considerada como se fosse um adulto em miniatura, e não se tinha a noção de que as crianças têm uma particularidade própria, que as difere as demais etapas do desenvolvimento humano. De fato, as crianças tinham as mesmas obrigações dos adultos e recebiam tratamento diferenciado apenas nos primeiros anos de vida, enquanto ainda dependiam diretamente dos cuidados das mães ou das amas.[5]

O ingresso para o mundo dos adultos acontecia muito precocemente, quando comparado aos nossos parâmetros atuais, visto que não existia o mundo infantil recheado de brincadeiras e o descompromisso com responsabilidades. A transmissão do conhecimento dava-se por intermédio do convívio com os mais velhos e com outras crianças, não sendo restrito aos familiares. Assim, as crianças eram afastadas muito cedo, mesmo ainda muito pequenas, dos pais e passavam a conviver com os adultos do grupo social a que pertenciam, onde aprendiam os ofícios pela observação, auxiliando, ou servindo, como aprendizes, em casas de outras famílias.

Nesse convívio, fora do lar, e enfrentando desde cedo as rudezas da vida, a etapa infantil, tal como a conhecemos hoje, era queimada, deixava de existir e, assim, a criança passava dessa fase direto para a vida adulta, pois definitivamente participavam da vida como se fossem adultos. Não havia nenhuma preocupação em relação à sua formação, enquanto um ser específico e, assim, as crianças passavam por todos os tipos de experiências mesmo com poucos anos de idade.

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Outra fonte de pesquisa, que possibilitou uma melhor compreensão de como as crianças eram vistas dos séculos XVI ao XIX, foi a exposição Nins – Retratos de Crianças dos Séculos XVI ao XIX, que o Museu de Arte Brasileira da Fundação Armando Álvares Penteado, a Faap, expôs de outubro a dezembro de 2000 em São Paulo. A exposição fornece a dimensão da imagem do que se tinha do mundo infantil.

“Foram quarenta quadros reunidos por Yannick Vu e Ben Jakober, um casal de artistas naturalizados ingleses que vivem e mantém uma fundação com seu nome na ilha de Palma de Maiorca, na Espanha.Nas telas estavam retratadas crianças de idades variadas, a maioria de famílias nobres, outras sem identificação nem do modelo nem do artista. Em comum, as crianças tinham a riqueza das roupas e dos acessórios, e a expressão de gente grande no rosto e na pose. Num dos quadros, o pequeno Luís, herdeiro da Coroa espanhola, retratado ainda como príncipe das Astúrias em tela de 1710, aos 3 anos só tem de criança a touca de renda toda enfeitada e as bochechas rosadas. No mais, da faixa ao manto, com cetro e coroa fulgurando atrás é o perfeito monarca. Na mesma linha, o arquiduque Carlos da Áustria, aos 5 anos, vestindo armadura, é a miniatura de seu pai na guerra no retrato de 1690.” [6]

Somente a partir do século XVII as crianças passaram a ser vistas pela sociedade como de fato elas são, ou seja, como crianças reais, com sua fragilidade, atitudes infantis, com sua ingenuidade, imaturidade, com a vida focada nas brincadeiras e jogos, falta de responsabilidade. Viu-se que esses comportamentos são muito diferentes daqueles do mundo dos adultos. Segundo ARIÈS, o problema dos pais não darem uma atenção diferenciada aos seus filhos tal como o conhecemos hoje não estava relacionado à falta de amor deles em relação aos seus filhos, mas da própria falta de consciência da sociedade da época de que a criança tivesse alguma particularidade especial diferente do universo adulto, que é a “particularidade infantil”.[7]

E, diante desse contexto de mudança na percepção social sobre a criança, a partir do século XVIII, a sociedade passou a valorizar a inocência e a fragilidade do mundo infantil. Nesse período, a criança começou a ocupar o lugar central da família, porque a sociedade moderna passou a adotar uma nova concepção sobre modelo do indivíduo adulto, que seria construído desde a infância. Para que esse novo modelo tivesse êxito, a escola assumiu um papel fundamental, ensinando, disciplinando e mantendo sob controle crianças e adolescentes, separando-os do mundo dos adultos.[8]

Por outro lado, as mudanças beneficiaram durante muito tempo apenas as crianças da burguesia, pois as crianças das famílias carentes continuaram a não ter acesso aos ganhos conquistados com a nova concepção de infância, como o direito à educação e a cuidados mais específicos. Como essas crianças do povo eram excluídas dessa atenção especial, elas acabavam sendo direcionadas para o trabalho.  Já, as crianças burguesas, iam para os colégios internos ao invés de conviver fora do seio familiar e trabalharem junto com os adultos. A vida  familiar ganha, a partir de agora, uma nova dimensão assumindo o papel que antes era destinado à comunidade, porém sob uma perspectiva dentro de um padrão burguês, que se transformou em universal.[9]

Diante desse contexto sociocultural do século XVIII, além da educação, a família passou a se interessar pelas questões relacionadas à higiene e à saúde da criança, o que levou a um aumento considerável da expectativa de vida com grande redução dos índices de mortalidade. Com essa mudança de paradigma, houve um aumento das relações de afeto e apego às crianças fortalecendo a instituição familiar.[10]

Nesse quadro, a  Igreja passa a se interessar que as crianças aprendessem no ensino regular, os preceitos religiosos, a disciplina e torna-se a grande defensora da escolarização. Com o desenvolvimento da imprensa, o processo de difusõ educacional foi ampliado e facilitado e a Igreja obteve êxito no processo de escolarização compulsória das crianças, usando o ensino como forma de ensinar, moralizar e disciplinar.[11]

Daí em diante, com as novas concepções a cerca da infância como categoria, criou-se o alicerce necessário para a construção social da categoria indivíduo. Agora, o indivíduo é compreendido como um ser humano que se desenvolve, desde a fase infantil, até se tornar um adulto, completo. FOUCAULT descreve em seus estudos, que na sociedade moderna a disciplina era uma forma de poder que agia através das várias instituições. A disciplina, dessa forma, estava intimamente inserida na estrutura pedagógica do sistema de ensino, nas organizações militares, nos hospitais, na fé e no sistema prisional.[12]

Portanto, se o sistema anterior não fazia distinção entre crianças e adultos, é na Modernidade que começa a aparecer um esboço para que a fase infanto-juvenil ganhe a cidadania. Assim, de acordo com a nova visão, dever-se-ia atentar para as peculiaridades das crianças e adolescentes, pois concluiu-se que o desenvolvimento saudável infanto-juvenil era essencial para o desenvolvimento da sociedade como um todo. COSTA entende, que “O aparecimento da infância, enquanto categoria gerou a necessidade de seu controle, de seu adestramento ou de sua socialização”.[13]

Como se pode observar, a Modernidade foi marcada pela centralização da escola e da família, como elementos indispensáveis para a potencial maturação do “homem médio, e ou, da mulher honesta”. Agora, crianças e adultos integram etapas distintas do desenvolvimento humano. A formação de uma criança sadia gerará um adulto pleno em suas capacidades.

2.2 A GARANTIA DOS DIREITOS DAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES COMO CONQUISTA HISTÓRICA

A afirmação da criança e do adolescente como pessoa em condição peculiar de desenvolvimento nos remete ao reconhecimento de que ambos não conhecem inteiramente seus direitos e não possuem condições de defendê-los e fazê-los valer plenamente. Assim, com a nova visão estabelecida sobre a peculiaridade infantil, diferenças socioculturais começaram a surgir dentre a grande categoria que a infância abarcou, destacando os hipossuficientes, abandonados e marginalizados para a subcategoria de “menor”. Para as crianças enquadradas nesta nova categoria foram criadas instituições específicas que deveriam exercer o papel de custódia, disciplina e adestramento.

Nesse sentido, temos duas formas distintas de atendimento às crianças – uma que oferecia serviço educacional de boa qualidade, destinado às crianças mais favorecidas e outra destinada à repressão, detenção e controle daqueles que estão em Situação Irregular. Dessa construção diferenciada das categorias “criança” e “menor”, afirma MENDES, está a justificativa de se exercer um controle social sobre ambos, porém, com métodos diferenciados.[14] Com efeito, não se aplicavam na prática as garantias de direitos e nem o conceito de cidadania em relação ao universo infantil.

Esse entendimento acabou sendo o principal foco da antiga legislação deste tema, que em realidade, tratava basicamente dos desvios desta faixa etária, ao invés de lhes prover direitos.[15] Assim, surgiu a doutrina da Situação Irregular, que se propunha a dar assistência e proteção aos menores e contemplava tanto os menores delinqüentes, como aqueles que não tinham uma situação familiar muito bem definida. As crianças pobres passaram a ser vistas como um problema público.

Um exemplo claro desse triste cenário que ocorria no Brasil, desde o início do século XIX, foi o advento das “Rodas Expostas”, onde as crianças que não eram desejadas ou por pertencerem a famílias tradicionais, eram colocadas em dispositivos onde eram recebidas por instituições religiosas que as acolhiam. A Roda era formada de um cilindro oco de madeira, no qual girava em torno do próprio eixo com uma abertura em uma das faces, que tinha um tipo de janela onde eram colocados os bebês não desejados.

Esse sistema da Roda, que existia em algumas instituições como as Santas Casas, era idêntico ao que existia na Europa no século XVIII, e privilegiava o anonimato das mães, que não podiam, pelos padrões da época, assumir publicamente a condição de mães solteiras, mulheres pobres ou nos casos de filhos nascidos fora do casamento. Estas instituições, longe de resolverem os problemas que envolviam essas crianças, apenas os encobriam uma triste realidade social.[16]

Paralelo às políticas meramente assistencialistas, que em nada resolviam da triste realidade social a que estavam submetidas às crianças desamparadas, a inserção dos jovens no mercado de trabalho trouxe como conseqüência a exploração subumana desta mão de obra, mantendo uma condição de miséria total e inviabilidade de freqüentar as atividades escolares. As crianças, na jornada de trabalho, eram tratadas de forma desumana, exerciam um trabalho cansativo, repetitivo e praticamente igual ao dos adultos. É importante registrar que diante da ausência de oportunidades viáveis e às privações que esses desfavorecidos eram submetidos, propiciou-se a criação do contexto social necessário para a busca doutras alternativas de subsistência, como a pratica de pequenos delitos.[17]

Diante desse contexto, conforme afirma DECCA, a mão-de-obra infantil era tão disponível e barata que algumas fábricas, chegavam a fazer máquinas especiais para que os menores pudessem trabalhar. Assim, esses pequenos trabalhadores, possuíam longas jornadas de trabalho, má alimentação e as poucas horas de sono, em troca de um salário bem menor do que o dos adultos. Como consequência da estafa física e mental, muitas crianças e adolescentes acabavam adormecendo sobre as máquinas, e em muitos casos, feriam-se gravemente,ficando com lesões ou mutilações.[18]

De outro lado, segundo NASCIMENTO, a Revolução Industrial ao propiciar o enriquecimento dos exploradores desta mão-de-obra barata, possibilitou a criação de mecanismos de proteção ao trabalho infantil e juvenil, através de normas protetivas que objetivavam amenizar a exploração, maus tratos e segurança no trabalho contra os constantes acidentes[19].

Na Europa, a situação estava crítica, pois havia uma concorrência direta entre a mão-de-obra infantil e juvenil com a adulta, justamente porque os salários pagos aos mais jovens era muito menor do que os pagos aos adultos, o que agravava ainda mais o desemprego e o empobrecimento.[20]

Paralelo a essas perspectivas nada promissoras, em 1854 foi regulamentado o ensino obrigatório, porém com reservas, visto que a lei não se aplicava aos escravos, àqueles que sofriam de moléstias contagiosas, aos que não tivessem sido vacinados, às crianças vindas de famílias carentes e que não tinham acesso à saúde.

De outra parte, no campo da Proteção ao trabalho infantil, em 1839, foi votada na Alemanha a lei que proibiu o trabalho de menores de 9 anos, sendo estipulada a jornada de trabalho diária de 10 horas para menores de 16 anos, e em 1869, a lei industrial proibiu o trabalho dos menores de 12 anos.[21]

Já no Brasil, após a constituição de 1891, foi editado o decreto Decreto nº 1.313 de 1891, que estipulava em 12 anos a idade mínima para se trabalhar. Infelizmente, o decreto não teve a sua aplicação prática, pois a proibição não ocorria da forma desejada, devido à grande expansão do comércio, das indústrias e da agricultura que contavam com a mão de obra infantil, extremamente barata.

Assim, os debates sobre a menoridade ganharam força no cenário mundial, tanto que, em 1911, ocorreu em Paris o “Primeiro Congresso Internacional de Menores”, com o intuito de reformar a justiça de menores, uma vez que não havia um estabelecimento especializado em atender infratores.[22] Logo em seguida, a Declaração de Gênova de Direitos da Criança, adotada em 1924 pela Liga das Nações, que reconheceu o direito das crianças. Esses eventos foram fatores determinantes para a formação da Doutrina da Situação Irregular, implantada no Brasil.

Dentre a universalidade demandada, foi debatida a real necessidade de existência de uma legislação específica, as instituições de caridade e suas responsabilidades em face do Estado, e as formas do exercício do poder de policia acerca do cumprimento das sentenças.[23]

Nesse período, mais especificamente em 1923, foi criado o Juizado de Menores, tendo Mello Mattos como o primeiro Juiz de Menores da América Latina. Logo em seguida, em 1927, foi promulgado o Código de Menores, que foi a primeira legislação sobre os menores no Brasil e que tinha como objetivo estabelecer diretrizes para o trato da infância e juventude em “situação irregular”. Regulamentava questões como trabalho infantil, tutela e pátrio poder, delinqüência e liberdade vigiada. Dava amplos poderes à figura do juiz que centralizava todas as decisões referentes ao destino dos menores infratores.[24]

“O fato é que, o termo “menor” tinha caráter discriminatório e, servia, segundo SARAIVA, para apontar aqueles que estavam em” situação irregular”[25]. Nessa mesma linha, Liberati critica o termo “menor” utilizado no código de menores:

“[…] a palavra “menor”, com sentido dado pelo antigo Código de Menores, era sinônimo de carente, abandonado, delinquente, infrator, egresso da FEBEM, trombadinha, pivete. A expressão “menor” reunia todos esses rótulos e os colocava sob o estigma da “ situação irregular”. Essa terminologia provocava traumas e marginalização naqueles pequenos seres.”[26]

O código definia, já em seu Artigo 1º, a quem a lei se aplicava:” O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinqüente, que tiver menos de 18 anos de idade, será submetido pela autoridade competente ás medidas de assistência e proteção contidas neste Código.”[27]

O Código de Menores proibiu o sistema das Rodas. Assim, os bebês deveriam ser entregues diretamente a pessoas destas entidades e o anonimato dos pais seria garantido. Além disso, o registro das crianças tornava-se obrigatório. De acordo com FROTA

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“No período de vigência da doutrina da situação irregular, as leis e instituições sãoorientadas predominantemente pela lógica da integração sistêmica, ou seja, o Estadoprevalece como poder jurídico e administrativo que racionaliza e controla o processode socialização, especialmente da criança pobre considerada menor, e exerce umcontrole social pleno sobre este segmento, excluindo a família como ator partícipe do processo.”[28]

Paralelo a esses acontecimentos, no âmbito trabalhista, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi criada pelo Tratado de Versalhes no ano de 1919. [29]

A partir de então, o trabalho infantil e juvenil passou a ser alvo de preocupação internacional. Assim, várias convenções foram editadas com o intuito de amenizar os efeitos negativos com o emprego de mão-de-obra infanto-juvenil.[30]

Vale destacar as seguintes Convenções Internacionais da OIT:

Convenção nº 05, de 1919, sobre a idade mínima para o trabalho na indústria.

Convenção nº 06, de 1919, sobre a idade mínima para o trabalho noturno na indústria.

Convenção nº 07, de 1920, sobre a idade mínima para o trabalho marítimo.

Convenção nº 10, de 1921, sobre a idade mínima para o trabalho na agricultura e proibição do trabalho durante o horário escolar.

Convenção nº 13, de 1921, sobre a idade mínima para o trabalho em atividades industriais de pintura com o uso de sais de chumbo.

Convenção nº 15, de 1921, sobre a idade mínima para o trabalho marítimo na função de paioleiro e foguista.

Convenção nº 60, de 1937, sobre a idade mínima para o trabalho nas atividades não industriais.

Convenção nº 90, de 1948, sobre a idade mínima para o trabalho noturno na indústria.

Convenção nº 138, de 1973, sobre a fixação de idade mínima para o emprego. Essa Convenção foi a principal de todas, pois trouxe em seu escopo uma atualização de todas as conquistas das convenções anteriores.

Segundo LIBERATI, a constituição de 1934 disciplinou pela primeira vez, na esfera constitucional, sobre proteção ao trabalho das crianças com idade inferior a 14 anos, proibindo-se o trabalho noturno aos adolescentes com idade inferior a 16 anos, e ainda, impondo a proibição para adolescentes com idade inferior a18 anos de trabalhar em indústrias insalubres.[31]

Já, a constituição de 1937, de acordo com JESUS, tinha o condão de chamar para si a responsabilidade de assegurar as garantias da infância e juventude, como podemos verificar no comentário que o autor faz sobre o artigo 127 da Carta Magna de 1937:

“A infância e a juventude devem ser objeto de cuidados e garantias especiais por parte do Estado que tomará todas as medidas destinadas a assegurar lhes condições físicas e morais de vida sã e de harmonioso desenvolvimento das suas faculdades. O abandono moral, e intelectual ou físico da infância e da juventude importará falta grave dos responsáveis por sua guarda e educação, e cria ao Estado o dever de provê-las do conforto e dos cuidados indispensáveis à preservação física e moral. Aos pais miseráveis assiste o direito de invocar o auxílio e proteção do Estado para a subsistência e educação da sua prole.”[32]

Por outro lado, em 1942, foi criado o Serviço de Assistência ao Menor – SAM, que, de acordo com GOMES COSTA, tinha um direcionamento correcional-repressivo e funcionava como um equivalente do sistema Penitenciário para a população menor de idade.[33] Além do SAM, algumas entidades federais de atenção à criança e ao adolescente foram criadas tendo como característica fundamental a prática assistencialista: LBA – Legião Brasileira de Assistência – agência nacional de assistência social, Casa do Pequeno Jornaleiro, Casa do Pequeno trabalhador e a Casa do Pequeno Lavrador. Em particular, a Casa do Pequeno Lavrador era um programa de assistência e aprendizagem rural para crianças e adolescentes filhos de camponeses.

E, nas palavras de LIBERATI:

“O SAM tinha como missão amparar, socialmente, os menores carentes abandonados e infratores, centralizandoaexecuçãodeumapolíticadeatendimento,decarátercorretivo-repressivo-assistencial em todo território nacional. Na verdade, o SAM foi criado, para cumprir as medidas aplicadas aos infratores pelo Juiz, tornando-se maisumaadministradoradeinstituições do que, de fato, uma política de atendimento ao infrator.”[34]

Após o fim da segunda guerra mundial, há a criação das Nações Unidas e, em 1948 é aprovada a “Declaração Universal dos Direitos Humanos” que valoriza em seu preâmbulo o direito à dignidade a todos os membros da família.  E, logo em seguida, em 1950, foi instalado o primeiro escritório do UNICEF no Brasil implementando projetos visando iniciativas de proteção à saúde da criança e da gestante.

Devido à decadência do SAM, conhecido pela opinião pública como “escola do Crime”, no período dos governos militares tivemos, para a área da infância, duas leis que representavam a visão vigente na época: Criou-se a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM) – Lei 4.513 de 1/12/64 e novo Código de Menores de 1979 – Lei 6697 de 10/10/79. No âmbito dos Estados a FUNABEM atuava com as FEBEMs (Fundações Estaduais do Bem-Estar do Menor) utilizando-se toda a estrutura do sistema SAM e objetivava a internação dos abandonados, dos carentes e infratores.[35]

Diante desse quadro, o novo Código de Menores tinha como objetivo a proteção e segurança aos menores que estivesse em “situação irregular”. Entretanto, não diferenciava infratores, abandonados ou órfãos na figura da “situação irregular”. Assim, não representou um avanço no assistencialismo, repressão e arbitrariedade a crianças e adolescentes.[36]

Segundo AMIN, “[…] a situação irregular era uma doutrina não universal, restrita, de forma quase absoluta, a um limitado público infanto-juvenil”.[37]

Paralelo a estas leis que representam o autoritarismo e repressão, no cenário internacional em 1989, aconteceu a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, e a sua influência sobre toda a América Latina, fez com que surgissem movimentos sociais que atuaram na construção de textos jurídicos na área dos direitos da infância.[38]

Hoje, a criança é vista como um sujeito de direitos e que precisa ter atendidas as suas necessidades físicas, psíquicas, emocionais e sociais de forma a que se torne um indivíduo completo. Precisa ser respeitada sob a concepção da criança como um ser particular, que tem características e necessidades bem diferentes das dos adultos.

Nesse sentido, a Doutrina da Proteção Integral surgiu com base na Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959, sendo consagrada pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança em 1989. Na mesma direção, foi adotada integralmente pela Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 227, absorveu os princípios estruturantes desta Doutrina.

Assim, a Doutrina da Proteção Integral, consolidou em nosso ordenamento jurídico diversos princípios, como o princípio da proteção especial para o desenvolvimento físico, mental, moral e espiritual, princípio da prioridade absoluta, princípio do melhor interesse, princípio da livre manifestação, princípio da condição peculiar de desenvolvimento, princípio da brevidade e excepcionalidade, princípio a educação gratuita e compulsória e o status de sujeitos de direitos.

Cabe referir que, a inovação fundamental que a Doutrina da Proteção Integral trouxe na Legislação Brasileira, é o reconhecimento da condição da criança como sendo pessoa em desenvolvimento, necessitando assim, de proteção especial, visando sempre que possível preservar o direito à convivência familiar através de garantias e deveres a fim de garantir os direitos da criança com absoluta prioridade.

Na visão de COSTA, “a Doutrina da Proteção Integral, tem significado e sentido contextualizado e deve ser entendida como proteção especial aos direitos das pessoas em desenvolvimento, e não das pessoas em si”. Assim, a Proteção Integral é endereçada ao público infanto-juvenil, devido ao reconhecimento de que existem diferenças desse grupo em relação ao contexto mais amplo da sociedade. [39]

No mesmo sentido, MACHADO entende que, crianças e adolescentes são:

“[…] seres humanos que se encontram numa situação fática peculiar, qualseja, a de pessoas em face de desenvolvimento de sua potencialidade humana adulta; e que essa peculiar condição merece respeito e para tal há de se compreender que os direitos fundamentais de crianças e adolescentes são especiais em relação ao direito dos adultos […].”[40]

Assevera-se a inclusão da “proteção integral”, com o argumento calcado na inteligência do Art. 227 da CF/88 como um grande avanço jurídico e social sobre o antigo Código de Menores (Lei 6.697/1979). Ocorre que tal alteração legislativa deu-se somente após o reconhecimento de que o antigo Código de Menores regulava apenas as sanções disciplinares de seu público e da estrutura familiar a que se estava inserido, sem garantir efetivamente em seu texto, os preceitos constitucionalmente recepcionados sobre Direitos Humanos.[41]

A partir dessa lógica, ressalta-se que à criança e ao adolescente são garantidos todos os direitos fundamentais de qualquer cidadão. Contudo, em face do próprio desenvolvimento físico e psíquico ainda estar incompleto há uma necessidade de uma proteção diferenciada, como a própria proteção no trabalho.[42]

“Embora a declaração Universal dos Direitos da Criança tenha se dado em 1959, o Brasil só efetivou a Doutrina da Proteção Integral em 1988 com o surgimento da Constituição Federal, que trouxe pela primeira vez um dispositivo que dá direitos às crianças e adolescentes. Esse sistema especial de proteção é referido expressamente no parágrafo 3º do artigo 227 da nossa Carta Magna. A partir do impulso Constitucional, em 13 de julho de 1990, foi criado o estatuto da Criança e do adolescente, que promoveu o adolescente à condição de sujeito do processo.”[43]

Na constituição de 1988 podemos notar a preocupação com o direito infanto-juvenil nos artigos 227 e 228:

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (…)

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.”

Assim, como de pode observar, a Constituição Federal de 1988 ao positivar a Doutrina da Proteção Integral, criou um sistema especial de garantias e de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes distintos daquele assegurado ao adulto, reconhecendo igualdade jurídica entre todas as crianças e adolescentes, independente da posição que ocupem na sociedade.[44]

Dois anos depois a doutrina da “Proteção Integral” ingressa no ordenamento jurídico brasileiro, por intermédio da Lei 8.069/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com o ideal de realçar as peculiaridades dos direitos especiais da criança e do adolescente, atendendo as necessidades de seu desenvolvimento psicossocial, em que o Estado tutela e presta assistência especial e integral. As crianças e os adolescentes passaram a ser considerados sujeitos de direitos de quem deve ser respeitados a condição peculiar de ser humano em desenvolvimento. [45]

Dessa forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente, que abrangia diversos campos do direito, teve como diferenciador a maior atuação na esfera municipal pela participação direta da comunidade através do Conselho Municipal de Direitos e Conselho Tutelar de acordo com o artigo 88, I do ECA: “Art. 88. São diretrizes da política de atendimento:
I — municipalização do atendimento;” (..)

O ECA foi a linha divisória em termos de infância e juventude no Brasil e representa uma completa transformação em termos de legislação quanto ao tratamento dado a crianças e adolescentes quando comparado ao sistema anterior da Doutrina da Situação Irregular. Representa, em linhas gerais, o resultado de uma conquista histórica decorrente dos inúmeros movimentos sociais em prol da criança e do adolescente e não apenas uma mera concessão estatal. Nas palavras de ROSSATO e LÉPORE:

“Não implica a proteção integral em mera proteção a todo custo, mas sim, na consideração de ser criança ou adolescente sujeito de direito, devendo as políticas públicas contemplar essa situação, proporcionando o reequilíbrio existente pela condição de serem pessoas em desenvolvimento, o que deverá ser levado em consideração na interpretação do estatuto.”[46]

Nesse sentido, COSTA afirma que a adoção da Doutrina da Proteção Integral e a evolução desta legislação infanto- juvenil está fundada no reconhecimento de atualização social, visando uma proteção efetiva, que viabilize o pleno desenvolvimento social brasileiro. Percebe-se, portanto, que o papel da criança e do adolescente na sociedade tem se modificado com o passar do tempo.[47]

Sem dúvida, a Teoria da Proteção Integral consolidou-se como verdadeiro paradigma na compreensão da infância e adolescência no Brasil. Tanto isso é verdade, que o Estatuto da criança e do adolescente apresenta-se como legislação multifacetada que procura atender aos direitos e deveres deste, em face do Estado, família, e dentre outros, o objeto “aprendizagem” como meio de preparação ao trabalho.[48]

Portanto, o art.1º do ECA[49] já explicita de forma muito clara a figura da Doutrina da Proteção Integral , tendo como base o art. 227 da Constituição Federal. Estabelece, ainda, normas que visam à proteção da criança visando o seu desenvolvimento integral e conclama que a família, o Estado e a sociedade sejam os garantidores das condições satisfatórias ao desenvolvimento de todas as crianças e adolescentes, sem qualquer tipo de distinção ou discriminação.

No mesmo sentido, o artigo 4° do ECA estabelece:

“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder Publico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, á dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.

SARAIVA entende que a constituição federal estabeleceu Direitos Fundamentais às crianças e adolescentes que se distribuem em três níveis, ou subsistemas de garantias, inter-relacionados entre si, que se constituem em políticas públicas que integram o Estado, a família e a sociedade.[50]

Assim, o primeiro nível de garantias define como direito de todas as crianças e adolescentes os Direitos Fundamentais, como vida, educação, saúde, habitação, convivência familiar, cultura, lazer, esporte, entre outros. No segundo nível inclui-se a proteção especial a crianças e adolescentes que sejam vítimas de violência, negligência e maus-tratos. E, por fim, temos o terceiro nível de garantias, destinado aos adolescentes, que estabelece a responsabilização destes que cometem atos infracionais.

E, para fazer cumprir as suas normativas o Estatuto da Criança e do Adolescente criou conselhos de direitos com o objetivo de se tornarem instrumentos de discussão, formulação e execução da política de atendimento para a criança e o adolescente. Estes conselhos objetivam a ação integrada entre o Estado e a sociedade civil, bem como elaborar planos de ação e de aplicação dos recursos do fundo para que se integrem ao orçamento do município. O ECA delineou um quadro organizacional com a criação de três órgãos específicos, os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, Conselhos Tutelares e Fundos da Infância e da Adolescência, e delegando poderes a outros órgãos já existentes.[51]

Os Conselhos são divididos em três níveis:

– O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) que trabalhava em consonância com o Departamento da Criança e do Adolescente (DCA). O CONANDA atuava nos níveis Estaduais e Municipais através dos Conselhos Estaduais de Direito da Criança e do Adolescente e os Conselhos Municipais de Direito da Criança e do Adolescente.[52]

– Os Conselhos Tutelares atuam em nível municipal e, de acordo com o art. 131 da Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, o ECA é o “órgão autônomo, não-jurisdicional, encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente”. Dessa forma, os Conselhos Tutelares atuam na defesa dos direitos das crianças e adolescentes e dispõe de poderes para aplicação de medidas de proteção e requisição de serviços públicos para o atendimento quando houver violação de direitos dos seus tutelados.

Já os Fundos da Infância e da Adolescência teriam a função de prover o financiamento das políticas públicas a serem implementadas. Os Fóruns de Direito da Criança e do Adolescente (Fóruns DCA) se constituem em espaços de discussão para integrantes da sociedade civil a fim de apontar problemas e soluções para tornar mais eficiente o sistema.[53]

Por outro lado, com o advento do estatuto da Criança e do Adolescente houve uma reorganização em todas as instituições de atendimento à infância e adolescência. A FUNABEM foi extinta e, em seu lugar tivemos a criação da Fundação Centro Brasileiro para a infância e adolescência (FCBIA), que foi vinculada ao Ministério do Bem-Estar Social, com o objetivo de garantir que os novos princípios do estatuto fossem implementados em ação integrada com as outras esferas de governo.[54]

Sendo assim, através de todas as conquistas históricas no campo da proteção infanto-juvenil, hoje é pacífico sob o ponto de vista normativo, que as crianças e adolescentes são sujeitos hipossuficientes física e intelectualmente em relação aos adultos e por isso, devem ser protegidas de todos os fatores que possam prejudicá-los em seu desenvolvimento. A proteção deve ser entendida, também, contra as formas de exploração de sua força de trabalho.

Apesar disso, os direitos infanto-juvenis ainda estão longe de ser universalmente respeitados. Por isso, há uma obstinada intenção legislativa de exaurir as peculiaridades intrínsecas ao trabalho infantil ao apontar que o aprendiz de hoje, será o profissional de amanhã, e a preservação da integridade e desenvolvimento deste é fundamental para com o futuro da nação.

Diante de tais reflexões, pode-se afirmar que a proibição imposta pela Declaração Universal dos Direitos da Criança, ao prever que “Não será permitido à criança empregar-se antes da idade mínima conveniente […].”, encontra-se tutelada pelo inciso XXXIII, do Art. 7ª da CF/88, viabilizando a previsão legal do “menor aprendiz”.[55]

Atendendo aos parâmetros estabelecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil conta com uma das mais avançadas legislações mundiais, no tocante aos direitos da criança, exemplificadas pelas ratificações brasileiras às convenções 138, e 182 da OIT. Na conceituação da OIT, trabalho infantil se caracteriza pela utilização de mão-de-obra de pessoas com menos de 15 anos de idade, que é o limite inferior internacionalmente estabelecido.[56]

E, com vistas às atualizações legislativas, em busca da equivalência com a legislação internacional houve uma adaptação dos seus procedimentos. Atualmente, as recepções de todas estas orientações de aprimoramento em direitos humanos estão previstas em instrumentos constitucionalmente consagradas, para que sua articulação atenda as demandas sociais.[57]

Já, o Decreto 6.481, de 12 de junho de 2008 regulamenta os artigos 3º, alínea “d”, e 4º da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que trata da proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 178, de 14 de dezembro de 1999, e promulgada pelo Decreto no 3.597, de 12 de setembro de 2000, e dá outras providências. Assim, a legislação brasileira estabelece as seguintes regras quanto às piores formas de trabalho: o trabalho de adolescentes é proibido dos 16 aos 18 anos de idade em situações consideradas das piores formas de trabalho. Todo o trabalho considerado perigoso, insalubre, penoso, prejudicial à moralidade, noturno, realizado em locais e horários que prejudicam a freqüência escolar, ou que tenha a possibilidade de provocar prejuízo ao desenvolvimento físico e emocional. São consideradas as piores formas: a escravidão, ou formas análogas, recrutamento para a prostituição ou atuação em atividades ligadas à pornografia; atividades ilícitas e trabalhos, que por sua natureza, ou condições em que é realizado, é suscetível de prejudicar a saúde, a segurança ou à moral das crianças.[58]

Nesse sentido, o trabalho em qualquer uma das às atividades que envolvam produção e suporte à produção na cadeia produtiva do tabaco, está entre as piores formas de trabalho e é proibido aos adolescentes até os 18 anos de idade. Os trabalhos prejudiciais à saúde e à segurança, de acordo com a lista anexa ao decreto federal 6.481/2008, entre outros estão:

Atividade: agrícola, pecuária, silvicultura e exploração florestal.

No processo produtivo do fumo, algodão, sisal, cana-de-açúcar e abacaxi.

No beneficiamento do fumo, sisal, castanha de caju e cana-de-açúcar.

Na pulverização, manuseio e aplicação de agrotóxicos, adjuvantes e produtos afins, incluindo limpeza de equipamentos, descontaminação, disposição e retorno de recipientes vazios.[59]

3 Os Trabalhadores Rurais da Indústria Fumageira do Estado do Rio Grande do Sul

3.1 – HISTÓRICO DA CADEIA PRODUTIVA DO TABACO NO RIO GRANDE DO SUL

Para entender-se a cadeia produtiva do tabaco do Rio Grande do Sul, é necessário voltar no passado até o ano de 1824, quando no Rio Grande do Sul, o fumo começou a ser cultivado na colônia de São Leopoldo, e a região do vale do Rio Pardo começou a receber os primeiros imigrantes alemães, que se instalou em pequenas propriedades rurais, com o uso intensivo de mão-de-obra familiar, principalmente nas áreas que haviam inicialmente sido desprezadas pela atividade de criação de gado. Nesse ponto cabe referir que as vindas dos imigrantes europeus para o Brasil foram financiadas pelo governo, numa postura de evolução institucional que incrementasse a trajetória de crescimento regional, pois o sistema da utilização dos escravos já não constituía grande vantagem, devido aos elevados custos e havia grandes oposições em nível mundial à escravidão. Assim, na depressão do rio Jacuí, aos pés e nos contrafortes da Serra Geral, por iniciativa do governo provincial, foram criadas, em meados do século XIX, três colônias de migrantes alemães.[60]

Havia uma relação de proximidade étnica e cultural que integrava os imigrantes alemães do Rio Grande do Sul e os consumidores de cigarro alemães da própria Alemanha. A implementação de fumos claros na região do vale do Rio Pardo deu-se, porque os compradores europeus, principalmente os alemães, desejavam o produto, principalmente o tipo Virgínia, somado ao fato de serem produzidos pelos seus compatriotas de origem alemã. Assim, o tabaco teve a sua entrada muito facilitada no mercado Alemão, no final do século XIX.[61]

Daí em diante, transcorridas algumas décadas, os descendentes de imigrantes alemães espalharam-se por uma vasta região do Rio Grande do Sul, que ia de Agudo até o vale do rio Taquari. A partir de 1850, iniciou-se o cultivo do fumo em Rio Pardo, o que tornou toda a região próspera e com o tempo, o tabaco destacou-se como principal produto agrícola da região. A legislação vigente proibia expressamente os imigrantes de utilizarem mãos de obra escrava nos lotes que lhes tinham sido concedidas e assim, sucessivas levas de imigrantes alemães vieram para Santa Cruz, o que ocasionou, juntamente com o crescimento vegetativo e a migração interna, um considerável aumento de sua população.[62]

E como consequência natural da qualidade do tabaco, pela especialização dos colonos e pela orientação que recebiam dos comerciantes locais, já em 1874, o município de Santa Cruz do Sul havia comercializado cerca de um milhão de quilos do produto. Além disso, a produção de tabaco mostrou-se estratégica para a região, já que sua distância de Porto Alegre e dos principais mercados consumidores tornava a produção de alimentos e produtos tradicionais economicamente inviáveis.[63]

Nesse quadro, ocorreu, assim, a expansão da população e de toda a atividade agrícola e comercial, o que fez com que em 1877, houvesse a emancipação do Município de Santa Cruz de Rio Pardo. Por consequência, o fumo, que inicialmente era destinado ao consumo local, teve uma valorização econômica muito grande, e passou a ser comercializado em outros mercados em nível nacional e internacional.

Um fato marcante, que ocorreu em 1917 e transformou toda a economia fumageira do Estado, principalmente, de Santa Cruz do Sul e todo o vale do Rio Pardo, foi a instalação da empresa “The Brazilian Tobacco Corporation” (B.A.T.), maior acionista da Souza Cruz. A partir desse momento, iniciou-se o sistema de produção integrado, entre agricultor e indústria, que perdura até hoje na região. A região de Santa Cruz do Sul tinha como característica a existência da pequena propriedade agrícola, a força de trabalho familiar, conhecimento técnico do processo de produção fumageiro pela parte destes fumicultores e toda uma infraestrutura com energia elétrica, telefonia, correios e estrada de ferro para o escoamento da produção.[64]

3.2 – CADEIA PRODUTIVA DO TABACO – SISTEMA INTEGRADO

Como se pode observar, o sucesso da produção fumageira da região do vale do Rio Pardo deve-se à constituição do arranjo produtivo, onde se encontram todas as condições favoráveis ao pleno desenvolvimento do cultivo do fumo. Nesse sentido, muitos municípios da região têm uma estrutura fundiária baseada em pequenas propriedades, dispõem de mão-de-obra especializada no manuseio da cultura do fumo e da infra-estrutura incipiente de produção e comercialização, estabelecida pelo núcleo de empresas nacionais no período anterior à década de 70. Com isso, sem a necessidade de investimentos na aquisição de terras e contratação de mão-de-obra, o processo produtivo fica muito facilitado para as fumageiras.[65]

“Na cadeia produtiva do fumo, especialmente aquela estabelecida no sul do Brasil, funciona o chamado Sistema Integrado de Produção de tabaco (SIPT) “que consiste em um vínculo contratual existente entre a empresa Fumageira e o produtor de fumo que deveria estabelecer uma relação de cooperação do tipo usuário-produtor que, como tal, teria benefícios e obrigações equilibradas” [66] Esse vínculo entre os agentes da cadeia acontece com a presença de contratos que vão estar presentes em todos os elos da referida cadeia. O processo começa no início da safra, onde se estabelecem contratos os quais as indústrias de beneficiamento da folha se comprometem em fornecer mudas, sementes, agrotóxicos entre outros insumos necessários à cultura do tabaco, e assistência técnica aos produtores, além de encaminharem e avalizarem financiamentos junto aos bancos e se comprometerem a adquirir toda a produção ao final da safra. Há, ainda, os contratos estabelecidos entre as usinas de beneficiamento e mercado externo. Ao enviar as folhas para o exterior, as relações contratuais com as indústrias de cigarros, que precisam da matéria-prima para a sua produção, podem ser caracterizadas como venda, caso forem empresas diferentes, ou simplesmente um repasse para outra etapa da produção, caso todo o processo for executado pela mesma empresa. Outra opção é a produção interna de cigarros para o mercado doméstico. Com isso, há acordos com o mercado varejista na venda do cigarro em território nacional.”[67]

Portanto, o sistema integrado é o principal responsável pelo sucesso, pelo bom desempenho, e crescimento do setor Fumageiro no Brasil e no mundo, e está presente no Brasil há mais de 90 anos. Nesse processo de integração, os componentes das famílias dos trabalhadores rurais, organizam-se de tal forma, que concentram os trabalhadores na mesma produção do tabaco para a empresa integradora. Em outras palavras, o sistema de integração é estruturado para que os objetivos das empresas e produtores sejam atingidos de forma satisfatória, minimizando as incertezas, tantos as de ordem econômica, como as oriundas de condicionantes naturais.[68]

Dessa forma, ocorre uma integração entre agricultura e indústria, em que ambos mantêm um constante canal de comunicação e, antes mesmo dos agricultores entregarem toda a produção de fumo, já fazem o registro do plantio da próxima safra, através do contrato de compra e venda, onde é estipulada a quantidade de pés que serão plantados, assim como a quantidade de insumos, todo o material necessário ao plantio do tabaco, além da forma de comercialização do produto. A partir do fechamento do contrato, a empresa já tem como fazer uma estimativa de quanto o produtor vai colher na próxima safra.[69]

Entretanto, faz-se necessário destacar que, apesar dos grandes benefícios que o sistema integrado proporciona às famílias dos agricultores no sentido financeiro, as metas impostas e exigências no plantio das folhas de tabaco, geram uma elevada incidência de casos de depressão e suicídio, adicionado a inúmeros problemas de saúde. Para o devido cumprimento das metas, estabelece-se um cronograma bem ajustado, que envolve o ano inteiro, o que acarreta um stress nessas famílias dos agricultores e que baixa a qualidade de suas vidas.

Atualmente, a Região Sul do Brasil é responsável por 92,5% da produção nacional de fumos claros, exclusivos para a produção de cigarros, já os fumos escuros, destinados para a produção de charutos e cigarrilhas são cultivados na Região Nordeste do país. Quanto ao cenário mundial, o Brasil, desde 1993, é o líder mundial das exportações de fumo. O município de Santa Cruz do Sul foi o local onde a produção tabaqueira começou sua evolução, onde se localizam as principais companhias do setor e onde estão localizadas as entidades representativas, tanto dos trabalhadores (AFUBRA), quanto da indústria, o Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SINDITABACO).[70]

Nesse contexto, as indústrias de tabaco do Rio Grande do Sul são representadas pelo SINDITABACO, que garante a sustentabilidade do setor e representa seus interesses. Trata-se de empresas de grande porte, representadas por multinacionais como Souza Cruz S/A, Universal Leaf Tobaccos Ltda. e Phillip Morris Brasil S/A, entre outras. Elas oferecem suporte à atividade fumageira por meio do fornecimento de insumos, da assistência técnica aos agricultores, e como avalizadores de financiamentos, junto à rede bancária.[71]

Já os produtores, são organizados e representados pela Associação dos Fumicultores do Brasil (AFUBRA), instituição representativa que dá apoio aos produtores e poder de negociação junto às indústrias beneficiadoras. As outras entidades representativas são as Federações dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (FETAG); a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (FARSUL); além do departamento rural da Central Única dos Trabalhadores (CUT). 

Por outro lado, mais de 47 mil famílias que trabalham com tabaco, não possuem terra e trabalham em regime de parceria no Rio Grande do Sul. Encontram nessa parceria um meio digno de permanecerem no meio rural. Já os fumicultores que possuem terras próprias, em sua maioria, possuem propriedades com área média de 16,4 hectares, utilizando 2,3 hectares para o cultivo do fumo. São 186.810 famílias, com uma média de 3,4 integrantes cada uma, que trabalham na lavoura[72].

Assim, a produção no meio rural gera também 46 mil empregos temporários, onde o produtor tem no tabaco sua principal fonte de renda, correspondendo a 56% do valor produzido na propriedade. O fumicultor garante emprego para 468 mil pessoas da família, além de gerar mais de 273 mil empregos sazonais na contratação de mão-de-obra, principalmente durante a colheita.[73]

Paralelamente ao cultivo do tabaco, como se pode verificar no quadro abaixo, outras culturas são desenvolvidas para subsistência, onde a comercialização dá-se, daquilo que excede o consumo familiar. Esta produção gira em torno de 40% do total que é produzido na propriedade e lhe garantem uma receita adicional em torno de 32% da obtida pelo tabaco. Assim, o fumo é a atividade principal e a mais rentável, mas as demais culturas representam um ganho adicional, o que faz com que o fumicultor tenha, em média, mais de uma residência e viva com conforto.[74]

A atividade fumageira gera um grande aumento de empregos de determinados períodos, onde se intensifica o fluxo da cadeia produtiva na seguinte ordem: fumicultores => usina de processamento => fábrica de cigarros, e ou, exportação do fumo => comércio varejista. E, nesse cenário, atualmente, a produção brasileira da região Sul é voltada para a exportação da folha de fumo.[75]

Ilustra-se o trato com os fumicultores, conforme exposto, com a salutar menção de que o Brasil alcança uma posição de destaque, como um dos maiores produtores mundiais de tabaco. O esteio nacional às grandes transnacionais, que articulam um monopólio na captação de matéria-prima da manufatura do tabaco, impõe condições e critérios de plantio, tipo, e colheita para o agricultor, que na ausência de outros interessados na aquisição de sua produção, acabam sucumbindo ao esquema proposto.[76]

O fato é que, a peculiaridade do cultivo do fumo, que diverge de outras atividades agrícolas, está na forma configurada em pequenos produtores, que optam por esta cultura devido ao alto lucro do fumo quando comparada às demais culturas exploráveis em pequenas glebas de terra. Estes pequenos produtores são cadastrados na instituição de manufatura, que pactuam acordos anuais acerca da sua produção.[77]

Dessa forma, na distribuição da mão-de-obra, ao longo do ano, a fumicultura exige maior demanda de trabalhadores rurais para auxiliar na produção, nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro, março, setembro, outubro e novembro. Do final do ano, ao mês de março, ocorre a colheita e comercialização do fumo, enquanto que a partir de setembro acontece o plantio das mudas de fumo. Durante os meses de junho, julho e agosto há o preparo do solo que servirá para o início da safra. Essa mão-de-obra nem sempre está disponível e acarreta em custo adicional ao produtor de tabaco. Assim, a utilização sazonal da mão-de-obra familiar torna-se uma alternativa.

Por outro lado, entre os períodos de menor demanda por mão-de-obra, a AFUBRA sugere aos fumicultores o emprego de outras atividades, como as de reflorestamento, que ocorre especialmente nos meses de abril e maio e em outubro e novembro, além da citricultura, nos meses de junho e julho. Somado a estas sugestões da AFUBRA, temos o tradicional plantio de milho na resteva do fumo. Essas atividades têm como finalidade gerar uma constante demanda por trabalho, ao longo de quase todo o ano, o que obriga seus produtores a uma permanente dedicação a tal atividade.[78]

Além disso, existe uma fiscalização e orientação técnica realizada pelos orientadores agrícolas das empresas, que visam que sejam respeitados os períodos de cada momento produtivo. Essa fiscalização dá-se para que a falta do cumprimento das etapas pré- estabelecidas, não afete as escalas de recebimento do produto, pelas fumageiras, bem como a qualidade do produto final gerado na agricultura, o que reduz a especificidade do ativo e gera incerteza quanto à qualidade dos próximos processos produtivos.

Assim, a fiscalização tem o papel preservador dos contratos entre os produtores, e as manufaturas por compreenderem uma expectativa da colheita em sua quantidade, e qualidade (tipos cultivados), atrelando valores pré-estabelecidos que possam descontentar os produtores.[79]

De outro lado, uma pesquisa do Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais (Deser) defende que o fumo não produz desenvolvimento, tendo com base nos dados do IDH (índice de desenvolvimento humano), os quais apontam como baixo nas regiões produtoras de fumo, o que demonstra mais um aspecto da realidade dos produtores de fumo no Sul do país. Foram entrevistadas 1.800 famílias de agricultoras das principais regiões fumicultoras e, entre estas, 1.025 produtoras de tabaco. Apesar de terem uma rentabilidade acima da média, se comparados com a de outros cultivos, 72% dos fumicultores, caso pudessem, trocariam de plantio. O principal motivo alegado pelas famílias está na baixa qualidade de vida, somado às doenças relacionadas ao plantio de tabaco.[80]

Além disso, os municípios produtores de tabaco apresentam baixo IDH, o que demonstra que a atividade não gera desenvolvimento local, pois a renda não permanece nas cidades produtoras de tabaco, mas se desloca para os grandes centros de agregação de valor pela industrialização. Em outras palavras, a produção traz renda às famílias dos fumicultores, mas não gera desenvolvimento local.[81]

Assim, de acordo com essa pesquisa, o IDH dessas regiões é baixo porque os indicadores como: expectativa de vida, taxa de alfabetização, taxa de freqüência escolar e renda per capita, confirma que as principais áreas produtoras de fumo no Rio Grande do Sul apresentam média abaixo do índice estadual. Da mesma forma, um exemplo do baixo IDH apresentado nessas regiões pode ser verificado nos períodos de maior intensidade do uso da mão-de-obra (capação, colheita, cura e classificação), momentos esses em que a mão-de-obra da família é demandada em sua plenitude, havendo inclusive o aproveitamento de crianças.[82]

3.3 – CENÁRIO ATUAL DA CADEIA PRODUTIVA BRASILEIRA E GAÚCHA

O Brasil atualmente é o segundo maior produtor mundial de tabaco e o maior exportador, sendo que a maior parte da produção se dá nos estados do Sul, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina, que correspondem a cerca de 96% da produção nacional. A cultura do fumo está presente em 704 municípios do Sul do país e envolve mais de 187 mil pequenos produtores, 870 mil pessoas no meio rural e dá origem a 30 mil empregos diretos nas indústrias de beneficiamento.[83]

Observam-se avanços a fim de erradicar a mão-de-obra infanto-juvenil, num cenário promissor, em que o trabalho infanto-juvenil vem diminuindo ao longo dos anos, graças a um conjunto de empreendimentos de ordem pública e privada. Para tanto, existe enfrentamento ao trabalho infantil por parte do Governo Federal, através de programas, como por exemplo, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), que está consolidado junto com o advento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que passou a compor os serviços socioassistenciais. Com isso, editam-se cadernos de orientações sobre a importância da erradicação do trabalho infantil, além de transferência de renda, o trabalho sociofamiliar e a oferta de atividades socioeducativas para crianças e adolescentes retirados do trabalho.[84]

Em contrapartida, os dados disponíveis mostram que houve, nos últimos anos, uma redução significativa na utilização da mão-de-obra infanto-juvenil. Mesmo assim, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, aponta que no ano de 2011, havia 3,6 milhões de crianças de 5 a 17 anos trabalhando, ou 8,6% da população nessa faixa de idade. A redução nos números de crianças se deve a inúmeras ações governamentais, da Sociedade Civil e das próprias corporações Fumageiras, que empreendem esforços a fim de desestimular a utilização infanto-juvenil na cadeira produtiva do tabaco.[85]

4 NECESSIDADE DA INCLUSÃO INFANTO-JUVENIL NA CADEIA PRODUTIVA

4.1 – FATORES QUE CONTRIBUEM PARA A REALIDADE DO TRABALHO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES NA CADEIA PRODUTIVA DO TABACO

No Rio Grande do Sul, a agricultura familiar é de extrema importância para a economia. A própria caracterização socioeconômica do estado é associada à produção rural, cuja maioria das propriedades é administrada por ambientes familiares, externando sua importância social pela geração de emprego e ocupação ou pelo perfil dos produtos.[86]

O conceito de trabalho infantil é algo extremamente complexo, visto que “infância” é algo muito subjetivo, dependendo das diversidades culturais entre as sociedades. Contudo, seguindo o preconizado pela OIT, trabalho infantil, define toda a atividade econômica desempenhada por uma pessoa com menos de 15 anos de idade, seja qual for a situação de trabalho ( assalariado, autônomo, familiar, não remunerado, etc.).[87]

Dessa forma, a problemática da utilização da mão-de-obra infantil e Juvenil na agricultura familiar da indústria fumageira do Rio Grande do Sul vem desde a chegada dos imigrantes alemães que povoaram São Leopoldo e o Vale do Rio Pardo. Eram famílias de agricultores que traziam junto da terra natal a experiência no plantio do fumo, além da tradição da utilização de toda a família na atividade fumageira.

Segundo RODELLO, essas famílias de agricultores foram empregados sem distinção entre atividade profissional infantil e adulta.[88]

Nesse mesmo sentido, MORAES defende que, a exploração da mão de obra infantil, na última década do século XIX, era uma realidade absolutamente normal, apesar de haver reivindicações trabalhistas que estavam ocorrendo no mundo inteiro.[89]

A utilização do trabalho infantil pelas próprias famílias dos agricultores da indústria fumageira era justificada, não somente pela ideologia do trabalho em si, onde se pensava o trabalho como enobrecedor e formador de valores, e que estas crianças “ajudariam” os pais no sustento da casa. Além disso, encarava-se o trabalho infantil, como uma das formas para coibir a “vagabundagem”. E, no imaginário da população que pensa dessa forma, o horário vago aparece como uma ameaça. No mesmo sentido temos a expressão popular: “mente vazia oficina do diabo”, em que, “mente vazia” implica não ter com o que se ocupar e, esse “ócio” faz com que a criança ou adolescente desemboque num mau caminho, sendo o trabalho visto como a solução para elas.[90]

Assim, as crianças pobres precisavam ingressar cedo no mercado de trabalho para não se tornarem adultos “vagabundos”. A preocupação que se tinha na época com a delinqüência oriunda da marginalidade ainda era muito grande e via-se o trabalho precoce como justificativa para combater e evitar o ócio, que era o grande “gerador da criminalidade”.

Além disso, o entendimento das famílias de que crianças e adolescentes devam trabalhar para adquirirem valores e evitarem o mal, preenchendo o tempo livre de forma sadia, descortina uma realidade profundamente desigual, em que estas famílias auferem uma pequena renda extra, oriunda do trabalho de seus filhos, desconhecendo que o trabalho precoce reproduzirá e ampliará ainda mais a pobreza no seio familiar.[91]

Nesse sentido, o Código de Menores de 1927, tinha como principal objetivo coibir a utilização de crianças como força de trabalho, mas este também não obteve êxito, pela grande pressão política e econômica das elites rurais do e urbanas, além das indústrias, que auferiam grandes lucros ao transgredir a legislação e contratar mão-de-obra infantil. Tal garantia somente se consolidaria com a Constituição de 1934.[92]

Existe historicamente uma forte ligação entre o trabalho infantil e juvenil na cadeia produtiva do tabaco e a pobreza das famílias dos agricultores, além do baixo nível educacional dos pais destes pequenos trabalhadores. As crianças trabalhadoras da indústria Fumageira do Rio Grande do Sul, geralmente recebiam algo em torno de meio salário mínimo, evidenciando a precariedade do contexto social à que estas mesmas pertencem. Outros tantos, não recebiam nenhuma remuneração pelo trabalho realizado e, trabalhavam em torno de 40 horas semanais junto com as suas famílias.[93]

E, por se constituírem em uma mão de obra extremamente barata, sempre tiveram o seu ingresso na lide fumageira facilitado de forma indireta através das famílias que historicamente têm trabalhado nesse segmento. Há conveniência sim – passam a integrar no meio rural uma grande quantidade de “pequenos trabalhadores” em famílias que possuem genitores semi, ou totalmente analfabetos.[94]

Porém, o mesmo ainda não se verificou no tocante aos adolescentes, que ainda estão em grande número, compondo um exército de trabalhadores rurais no Rio Grande do Sul. O trabalho destes adolescentes auxilia na composição da renda destas famílias de fumicultores, e também auxilia no cumprimento das metas de produção, com o cronograma bem ajustado, estipuladas pela indústria fumageira, no sistema integrado. Trata-se muito mais de uma questão cultural do que fiscalizatória.

Além da questão da pobreza, que é a realidade de muitas famílias, outras tantas, para que consigam obter um rendimento extra, a fim de ter mais conforto, ou de aumentarem o patrimônio, que já foi exposto no capítulo anterior, adotam a diversificação de culturas agrícolas, o que normalmente é alcançado com a ajuda de toda a família. Outro fator relevante é a baixa escolaridade dos pais, que favorece negativamente que crianças e adolescentes não consigam romper as barreiras socioculturais que atravessam gerações. “Em casa, a renda e sua volatilidade, as dividas, o tamanho da família, a estrutura familiar e as percepções e aspirações dos pais são os principais fatores […] A escolaridade do pai e da mãe, […] são de acordo com o estudo, as variáveis que mais afetam a probabilidade de a criança trabalhar”.[95]

Assim, de tradição em tradição, os filhos dos trabalhadores rurais da indústria Fumageira, após trabalharem por toda uma vida, tornam-se adultos e, como processo natural em suas vidas, recolocam seus filhos na mesma atividade, que vêem como normal. Segundo Rosado, para algumas destas famílias de agricultores, “trabalhar é uma forma de dignificar o ser humano e de obter respeito da sociedade”. No entendimento destas famílias, a inclusão precoce infanto-juvenil ajudará na formação do cidadão do bem, evitando a vadiagem, o ócio e a marginalidade.[96]

Outro fator que aumenta a probabilidade de crianças e adolescentes entrarem precocemente no mundo do trabalho, diz respeito ao tamanho da família. Quanto mais numerosa for a família dos fumicultores, menor tende a ser a participação educacional infanto-juvenil. Em muitos casos, quando as mães precisam trabalhar para ajudar no cultivo do tabaco, as crianças mais velhas ajudarão a cuidar dos irmãos menores e se dedicarão ao trabalho doméstico. Como a jornada de trabalho é muito extensa, muitas vezes ultrapassando às 40 horas semanais, estas crianças acabam trabalhando em casa nos afazeres domésticos em prejuízo à educação e à vida de crianças.[97]

Diante desse contexto, o Ministério Público atua fortemente na fiscalização da cadeia produtiva, em ação conjunta com as empresas fumageiras para garantir que o trabalho infanto-juvenil seja erradicado do Brasil. Como fiscalizar não resolve todos os problemas, o grande desafio é orientar as famílias dos fumicultores a fim de que elas se conscientizem da importância de aguardar que seus filhos se desenvolvam, antes de trabalhar precocemente na cadeia produtiva do tabaco. Trata-se de uma questão cultural: “A trajetória de trabalho dos pais influenciará a história dos filhos e mais de 80% das crianças trabalhadoras com residência urbana têm pais que começaram a trabalhar com 14 anos ou menos”. Como se pode observar, temos, então, toda uma problemática instaurada, pois o trabalho infantil e juvenil é ilegal por si só, mesmo que criemos justificativas para fazê-lo.[98]

4.2 – AS REPERCUSSÕES NA VIDA DOS SUJEITOS TRABALHADORES INFANTIS NA CADEIA PRODUTIVA DO TABACO

Além das perdas estatais, dos impostos e contribuições sociais, a perda mais significativa é o impacto direto e de forma perniciosa sobre o desenvolvimento infantil. O trabalho desenvolvido por crianças e adolescentes na agricultura da indústria fumageira do Rio Grande do Sul, mesmo que seja respeitado o limite de idade mínima estabelecido no ordenamento jurídico brasileiro, podem prejudicar seriamente o seu desenvolvimento físico e contribuir para a ocorrência de doenças graves quando chegar à fase adulta.

Apesar da riqueza que a produção do tabaco gera na economia, e razoáveis condições de subsistência, que propicia às famílias dos fumicultores, temos que considerar os malefícios à saúde na atividade fumageira, em face do manuseio de agrotóxicos, quanto pela liberação da nicotina nas folhas verdes de tabaco, especialmente nos períodos de colheita, sendo as maiores causas de mortes e doenças no meio rural. Estas condições laborais, altamente agressivas à saúde, culminam com quadros lesivos aos sistemas psicológico, neurológico, muscular, além de intoxicações, alergias e, inclusive, diversos tipos de câncer. Nesse aspecto, o problema relacionado à saúde é tão sério, que há inúmeros casos registrados de crianças que já tiveram experiência de intoxicação por agrotóxicos, ou de morte associados à produção do tabaco. Estudos realizados nos Estados Unidos demonstram que o contato com a folha do fumo verde produz uma série de malefícios como: tontura, tremedeira, fraqueza, ânsias de vômito. Existem ainda casos de pessoas que perdem parte da visão. Atualmente, indústrias recolhem as embalagens de agrotóxicos por exigência legal imposta aos distribuidores e vendedores de veneno agrícola.[99]

O fato é que isso ocorre, porque os trabalhos desenvolvidos no campo, muitas vezes exigem uma jornada de trabalho superior a oito horas diárias, envolvem carregamento de peso e esforços físicos que vão além da capacidade que uma criança ou adolescente possa suportar em razão do seu desenvolvimento ainda não estar completo. Assim, a atividade laboral traz conseqüências psicológicas, que muitas vezes perduram por toda uma vida, devido à jornada excessiva, ao convívio em ambiente profissional com comportamento de adultos, as responsabilidades, que acabam tomando o lugar das etapas essenciais de desenvolvimento. Esses somatórios de fatores podem gerar problemas muito graves ao universo psíquico infanto-juvenil, gerando o amadurecimento precoce, a perda da capacidade lúdica e inúmeros distúrbios comportamentais, afetivos e emocionais.[100]

Nesse sentido, além do prejuízo físico, estas crianças sofrem prejuízo inegável desde as condições de aprendizagem até o comprometimento do desenvolvimento psicossocial, e, infelizmente, estes entraves ao processo de desenvolvimento infantil podem trazer conseqüências indesejáveis como a formação de um indivíduo adulto com muitas limitações cognitivas ou até mesmo levar a casos de marginalidade infanto-juvenil. Além disso, o trabalho infantil obriga as crianças e os adolescentes a assumirem responsabilidades incompatíveis com as etapas de desenvolvimento[101]

Além de todos os prejuízos à saúde e integridade física, o trabalho na indústria fumageira realizado por crianças ou adolescentes contribui para a evasão escolar, pois as longas e rudes jornadas de trabalho fazem com que muitas aulas sejam perdidas devido ao cansaço, as crianças cochilam durante as aulas, perdem as explicações dos professores, ou ainda, não têm tempo para fazer as lições de casa, trazendo conseqüências ao desenvolvimento educacional das crianças e dos adolescentes.[102]

Nesse ritmo laboral de adulto, uma multidão de crianças e adolescentes não conseguem acompanhar o ritmo outras crianças e adolescentes que freqüentam regularmente as classes escolares, e em outras vezes, há o incentivo dos próprios pais que preferem que os filhos continuem auxiliando-os nas atividades agrícolas, o que leva a uma taxa de repetência muito alta, o que impacta diretamente no acesso às oportunidades e no desempenho escolar com qualidade. Essas crianças e adolescentes com baixo aproveitamento escolar não conseguindo se qualificar adequadamente terão dificuldades frente às grandes exigências que o mercado de trabalho estabelece na atualidade, o que gerará exclusão social.[103]

Ainda nesse contexto, temos as situações em que as crianças, fora do turno escolar, sem ter com quem ficar, acompanham os pais na atividade laborativa e acabam “ajudando-os” em pequenas tarefas, ou seja, ao invés de brincarem acabam se envolvendo com o trabalho, mesmo que num ritmo mais suave em termos de jornada de trabalho. Nessa situação em específico, temos ainda o caso das crianças que não trabalham, mas ficam brincando ao lado dos pais, o que dificulta em muito à fiscalização pelo ministério do trabalho.

A exploração familiar da mão de obra infantil ocorre, inclusive, no período de férias escolares de crianças e adolescentes. O período de férias escolares que deveria ser disponibilizado para o “descanso” das atividades estudantis, é utilizado para ampliar a jornada de trabalho o que acarreta notável déficit no rendimento escolar, muito provavelmente ligado à estafa laboral.

Ressalta-se que esses chefes de família, geralmente são pequenos empreendedores, ou empregados informalmente, às vezes, de forma invisível. Assim, pode-se dizer que: “[…] crianças trabalhado na agricultura, seja em uma estrutura familiar, seja para empresas nacionais ou até mesmo transnacionais (Unicef, 1997). […] o que torna esta forma de trabalho infantil conhecida como “invisível”.[104]

Um aspecto muito importante sob o ponto de vista da convivência familiar é que o trabalho infantil inverte a responsabilidade dos pais para os filhos, enquanto supridores das necessidades familiares, o que em alguns casos, acabam por enfraquecer os vínculos familiares. Quando a criança ou o adolescente ficam limitados ou impedidos de brincar, se divertir, de se entregar ao lúdico, há a interferência em pontos essenciais para o desenvolvimento do afeto, da afetividade, podendo gerar uma gama de distúrbios emocionais. As brincadeiras e todo o envolvimento lúdico da fase infantil são de fundamental importância na criação dos vínculos de relacionamento familiar e interpessoal, que se estendem por toda a vida do indivíduo, e a falta do cumprimento dessa etapa pode acarretar problemas na convivência social desse público infanto-juvenil com a sociedade.[105]

4.3 – O QUE ESTÁ SENDO FEITO PARA SE OBTER A ERRADICAÇÃO DO TRABALHO INFANTO-JUVENIL

O Brasil foi o primeiro país da América Latina e do Caribe a fazer parte do Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), da Organização Internacional do Trabalho. Hoje, há o consenso na sociedade brasileira de que lugar de criança é na escola, e para que isso ocorra satisfatoriamente, foram criados programas de enfrentamento e de prevenção, como o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), além de outros programas de iniciativa pública e privada.[106]

Dessa forma, estes programas resultam de uma comunhão de esforços da Organização Mundial do Trabalho (OIT), do Governo Federal através dos seus órgãos e do Ministério Público do Trabalho (MPT), das entidades que representam a indústria fumageira como o SINDITABACO E AFUBRA, além das próprias indústrias fumageiras, que têm interesse em fazer cumprir a lei, no sentido e erradicar definitivamente o Trabalho infantil no Brasil. Para tanto, compilam propostas à efetividade de diretrizes internacionalmente consagradas[107] com a realidade social brasileira em um Guia intitulado “Prevenção e eliminação do trabalho infantil: um guia para a ação governamental”, conforme exposto:

“A proposta de um guia que pudesse orientar todas as pessoas que labutam diariamente na seara da prevenção e eliminação do trabalho infantil transformou-se de uma simples idéia para uma real necessidade.Com efeito, a efetivação de tal tarefa está diretamente ligada à concretização do princípio da proteção integral, previsto no Art. 227 da Constituição da República de 1988, e perpassa inexoravelmente, pela implementação de políticas pelo Poder Púbico, em seus diferentes níveis”.[108]

O Ministério Público do Trabalho (MPT) é um dos ramos do Ministério Público da União, com autonomia funcional e administrativa, atuando como órgão independente dos poderes legislativo, executivo e judiciário, a fim de dar proteção aos direitos fundamentais e sociais do cidadão diante de ilegalidades praticadas no âmbito trabalhista. O MPT recebe denúncias, instaura procedimentos investigatórios, inquéritos civis públicos, ajuizamento de ações frente às irregularidades aplica o Termo de Ajustamento de Conduta, promove palestras, oficinas e tem projetos para a erradicação do trabalho infantil e regularização do trabalho do adolescente. Assim, o MPT possui um poder fiscalizatório e regulamentador, como forma de garantir uma eficiente medida extrajudicial de resolução de conflitos. Como exemplo desses projetos temos: Projeto Orçamento e Políticas Públicas, Projeto Aprendizagem Profissional e MPT na Escola.[109]

O Termo de Ajuste de Conduta (TAC) é um acordo firmado entre o Ministério Público e a parte interessada, de modo que esta se comprometa a agir de acordo com as leis trabalhistas, sob pena de multa, tal como dispõe o art. 5º, § 6º da Lei 7.347/1985. É, portanto, um título executivo extrajudicial, o que significa dizer que seu descumprimento enseja uma ação de execução, proposta pelo Ministério Público do Trabalho junto à Justiça do Trabalho, buscando-se a resolução de conflitos laborais entre os empregados e empregadores. Os termos de ajustamento de conduta, em regra, prevêem a possibilidade de aplicação de uma pena de multa para a empresa que descumprir as suas normas regulamentadoras estabelecidas pelo Ministério Público Laboral. Caso a empresa não cumpra o termo de ajustamento, haverá de sua execução.[110]

Ministério Público do Trabalho fiscaliza permanentemente as indústrias fumageiras e, diante de algum descumprimento de uma recomendação quanto à proibição da utilização de mão-de-obra infanto-juvenil, poderá ensejar a instauração de inquérito civil para apuração dos fatos e posterior celebração de um TAC ou ajuizamento de ação judicial. Se a empresa descumpriu um TAC já firmado com o MPT, será cobrada a multa prevista sem prejuízo do cumprimento da obrigação assumida.[111]

No Rio Grande do Sul existe uma forte integração entre o Ministério Público do Trabalho, o SINDITABACO e a AFUBRA, a fim de promover ações no sentido de fazer com que as Indústrias da cadeia produtiva do tabaco, não dêem espaço ao trabalho infanto-juvenil. Com isso, ao verificar-se irregularidades, assinam um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), em que estas fumageiras se comprometem a não comprar matéria-prima de propriedades que usem o trabalho infanto-juvenil nas lavouras no Estado. Além do compromisso de não utilizar o trabalho de menores nas lavouras, as fumageiras produzem campanhas publicitárias e material educativo alertando sobre o problema e sobre as normas de saúde e segurança no campo.[112]

Dessa forma, as empresas exigem a comprovação de matrícula de filhos de agricultores no período de assinatura do contrato de comercialização de safra e, ao longo do ano, monitoram a freqüência escolar, que deve ser de, pelo menos, 70%. Além disso, as fumageiras distribuem cartilhas e cartazes com orientações a respeito do manuseio e armazenamento de agrotóxicos. Em caso de comprovação de trabalho infantil em algum fornecedor da cadeia produtiva do tabaco, a fumageira deve notificar o Conselho Tutelar, o Centro de Referência de Saúde do Trabalhador e a AFUBRA, e a fiscalização será feita pelo Ministério Público do Trabalho. Como os contratos têm cláusulas que os fumicultores se comprometem a não utilizar a mão-de-obra infantil, o produtor que descumpre o contrato, dentre outras penalidades, poderá ter prejuízos financeiros pela perda do contrato. Conforme o procurador Veloir Fürst, 250 mil crianças e adolescentes atuam no cultivo no RS. As multas à indústria variam de R$ 20 mil a R$ 200 mil.[113]

Além dessas medidas protetivas, o Governo Federal Brasileiro articula um conjunto de ações com o objetivo de retirar as crianças e adolescentes de até 16 anos das práticas de trabalho infantil, exceto na condição de aprendiz a partir de 14 anos. Trata-se do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), que é um programa que:

“ compõe o Sistema Único de Assistência Social (Suas) e tem três eixos básicos: transferência direta de renda a famílias com crianças ou adolescentes em situação de trabalho, serviços de convivência e fortalecimento de vínculos para crianças/adolescentes até 16 anos e acompanhamento familiar através do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Ao ingressar no Peti, a família tem acesso à transferência de renda do Bolsa Família, quando atender aos critérios de elegibilidade, devido ao processo de integração dos programas. Às demais famílias também é garantida a transferência de renda através do Peti. Assim, a articulação dos dois programas fortalece o apoio às famílias, visto que pobreza e trabalho infantil estão amplamente relacionados nas regiões de maior vulnerabilidade. Após a transferência de renda, toda criança e adolescente que for encontrado em situação de trabalho, deve ser, obrigatoriamente, inserida no Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos. Esse serviço é ofertado pela Proteção Social Básica com estreita articulação com o responsável pelo Peti no município”. [114]

O PETI teve seu início em 1996, atendendo inicialmente, 1.500 crianças que trabalhavam nos fornos de carvão e na colheita de erva-mate de 14 municípios do Estado do Mato Grosso do Sul. Como os resultados do programa foram muito positivos, houve expansão no decorrer dos três anos seguintes, passando em 1999, a atender 145.564 crianças e adolescentes em 237 municípios de 14 estados brasileiros.[115]

Atualmente, são atendidas por volta de 820 mil crianças afastadas do trabalho em mais de 3.500 municípios do Brasil. Dessa forma, o PETI oportuniza o acesso à escola formal, saúde, alimentação, esporte, lazer, cultura e profissionalização, bem como a convivência familiar e comunitária. As famílias que estão no programa, assumem compromissos como a retirada de todas as crianças e adolescentes de até 16 anos de atividades de trabalho e exploração e a retirada de todas as crianças e adolescentes até 18 anos das atividades previstas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil. Comprometem-se, também, que as crianças de 6 a 15 anos possuam matrícula e freqüência escolar mínima de 85%.No caso dos adolescentes de 16 e 17 anos de idade, a matrícula e a freqüência escolar mínima devem ser de 75%. Para as crianças menores de 7 anos, é exigido o cumprimento do calendário de vacinação e o acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil. Na área da assistência social, é exigido que as crianças e adolescentes de até 15 anos em risco ou retiradas do trabalho infantil possuam a freqüência mínima de 85% da carga horária relativa aos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos da Proteção Social Básica.[116]

Além das ações governamentais, as entidades que representam a Indústria Fumageira, como o SINDITABACO e a AFUBRA realizam cursos e programas de treinamento visando a conscientização dos fumicultores quanto à importância da erradicação do trabalho infanto-juvenil da cadeia produtiva do tabaco no Rio Grande do Sul. Como exemplo desses empreendimentos ocorreu nos dias 23 e 24 de julho de 2012, no município de Santa Cruz do Sul o Treinamento Crescer Legal – Desafios para uma Consciência Sustentável, promovido pelo SINDITABACO (Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco), empresas associadas e a Escola de Negócios Positivo, de Curitiba. O treinamento reuniu 110 profissionais das empresas associadas ao Sindicato e também da AFUBRA (Associação dos Fumicultores do Brasil) e até o final do ano comporá uma série de 12 eventos com previsão de reunir 1,2 mil orientadores agrícolas, supervisores e avaliadores das empresas associadas ao SindiTabaco e da Afubra em torno do tema trabalho infantil.[117]

Devido aos avanços na redução do trabalho infanto-juvenil das famílias dos agricultores da indústria fumageira do Rio Grande do Sul, sabe-se que é questão de tempo, para que ocorra a erradicação em definitivo, da atividade laboral destes pequenos trabalhadores. Porém, para que se tenha êxito, devem-se empreender esforços em todos os sentidos para que se retirem as crianças dos galpões, onde ainda hoje algumas crianças trabalham. Desafio maior é o de conscientizar os pais de que os seus filhos adolescentes também precisam ser protegidos do trabalho da cadeia produtiva do tabaco, e assim, que se dediquem aos estudos para que tenham oportunidade de entrar no mercado de trabalho, altamente disputado atualmente, com condições de igualdade com as demais pessoas. Erradicar o trabalho infanto-juvenil é romper as barreiras da pobreza financeira e cultural.

5 CONCLUSÃO

Através desse estudo pudemos ver que o conceito de infância como categoria nem sempre existiu, foi sendo construído ao longo dos séculos, através das conquistas sociais no campo dos Direitos Humanos. Na Idade Média, não havia a consciência do sentimento de infância e a criança não era percebida pela sociedade como distinta do mundo dos adultos, vestindo-se, trabalhando e comportando-se como se adulto fosse.

Assim, as crianças, desde os seus primeiros anos de vida  aprendiam os ofícios, auxiliavam, ou serviam como aprendizes, em casas de outras pessoas que compunham o grupo social a que pertenciam. As famílias não tinham apego às crianças, nem cuidados especiais, e assim, elas enfrentavam uma vida dura, cheia de responsabilidades, tendo uma baixa expectativa de vida.

Num processo histórico, em que houve a evolução do pensamento humano, as crianças passaram a ser valorizadas, as intituições começaram a entender a infância num sentido mais amplo e o aparato educacional foi intensificado para atender o pequeno indivíduo em processo de desenvolvimento. Sim, agora a Sociedade passou a perceber a criança sob um novo prisma, recheado de imaturidade, fragilidade física, com necessidade de cuidados e atenção especial, que vive num mundo de brincadeiras como um contexto normal e necessário à experiência delas. Descobre-se, a partir desse momento, a particularidade infantil, que a distingue do universo dos adultos e encara-se a fase infantil como uma etapa do desenvolvimento humano, que é construído desde à infância.

A criação da categoria infância implica no reconhecimento de existe uma hipossuficiência em relação aos adultos e que estes pequenos indivíduos em desenvolvimento não conhecem inteiramente seus direitos e não possuem condições de defendê-los e fazê-los valer plenamente. Assim, a categoria infância passou ser protegida e amparada através de legislações que se propunham a resguardar os seus direitos.

A Doutrina da Situação Irregular, surgiu com o intuito de dar proteção e assistência aos menores que estavam em situação de fragilidade social, porém, como também tinha em seu escopo o objetivo de exercer o controle social, colocava sob o mesmo patamar as crianças pobres, as abandonadas e os menores delinquentes. Dessa forma, a Doutrina da Situação Irregular adotava políticas públicas meramente assistencialistas, sem ter efetividade na tutela infanto-juvenil quanto ao desamparo, exploração da mão-de-obra, pobreza, dificuldades no acesso à educação, abandono, falta de critérios objetivos das decisões dos juízes de menores.

 Com o advento da Revolução Industrial, em nível mundial, houve a necessidade de um aumento da utilização de mão-de-obra e os empresários, diante da pobreza da população, passaram a contratar o trabalho de crianças e adolescentes, pagando salários irrisórios, com jornadas de trabalho intensas, em prejuízo da saúde, da integridade física e mental, da educação desses pequenos trabalhadores.

No Brasil e no cenário internacional, criaram-se leis visando a proteção da nova categoria, que, diante da pobreza, miséria e abondono a que muitos desses pequenos cidadãos estavam submetidos fez surgir uma subcategoria de “menor”. Nesse sentido, as crianças enquadradas nesta nova categoria eram discriminadas socialmente, além de serem conduzidas para instituições específicas, que deveriam exercer o papel disciplinador e protetivo, fornecendo-lhes o adestramento para que se enquadrassem na vida em sociedade.

A partir da Convenção Internacional dos Direitos da Criança houve  influência sobre toda a América Latina, estimulando o surgimento de movimentos sociais que serviram como base para a criação de textos jurídicos na área dos direitos da infância. A Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959, fundamentou a Doutrina da Proteção Integral, que foi consagrada pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança em 1989.

Assim, a Doutrina da Proteção Integral foi adotada em sua plenitude pela Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 227, expressa o reconhecimento da condição da criança como sendo pessoa em desenvolvimento, necessitando de proteção especial através de um sistema de garantias e deveres, a fim de preservar os direitos da criança com absoluta prioridade. A criança, dessa forma,  é vista como um sujeito de direitos e que precisa ter  atendidas as suas necessidades físicas, psíquicas, emocionais e sociais de forma a que se torne um indivíduo completo. A Constituição Federal de 1988 cuidou da questão das crianças e dos adolescentes não só no campo trabalhista, mas também no familiar, educacional e socioeconômico promulgando o Estatuto da Criança e do Adolescente

A Proteção Integral representa um grande avanço jurídico e social sobre o antigo Código de Menores (Lei 6.697/1979), criando um sistema especial de garantias e de proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, distintos daquele assegurado ao adulto, reconhecendo igualdade jurídica entre todas as crianças e adolescentes, independente da posição que ocupem na sociedade, o que não acontecia no Código de Menores.

Em 1990, é criada a Lei 8.069/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o ECA, que abrangia diversos campos do direito, a fim de que as crianças e os adolescentes tivessem respeitada a condição peculiar de ser humano em desenvolvimento. Assim, o ECA, pelo seu art.88, trouxe como diferencial a atuação em nível municipal pela  participação direta da comunidade através do Conselho Municipal de Direitos e Conselho Tutelar.

O ECA representa, em linhas gerais, o resultado de uma conquista histórica sobre a Doutrina da Situação Irregular, decorrente dos inúmeros movimentos sociais em prol da criança e do adolescente No seu aparelhamento para fazer valer o direito infanto-juvenil, o ECA criou conselhos de direitos da Criança e do Adolescente, Conselhos Tutelares e Fundos da Infância e da Adolescência,  delegando poderes a outros órgãos já existentes.

 O Brasil conta hoje, com uma das mais avançadas legislações mundiais, no tocante aos direitos da criança, exemplificadas pelas ratificações brasileiras às convenções 138, e 182 da OIT, que estabelece que o trabalho infantil se caracteriza pela utilização de mão-de-obra de pessoas com menos de 15 anos de idade. Já, o Decreto 6.481, de 12 de junho de 2008 regulamenta os artigos 3º, alínea “d”, e 4º da Convenção 182 da OIT sobre as piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 178, de 14 de dezembro de 1999, e promulgada pelo Decreto no 3.597, de 12 de setembro de 2000.

Assim, a legislação brasileira estabelece que o trabalho de adolescentes é proibido dos 16 aos 18 anos de idade em situações consideradas das piores formas de trabalho. Todo o trabalho considerado perigoso, insalubre, penoso, prejudicial à moralidade, noturno, realizado em locais e horários que prejudicam a frequência escolar, ou que tenha a possibilidade de provocar prejuízo ao desenvolvimento físico e emocional. Nesse sentido, o trabalho em qualquer uma das etapas da cadeia produtiva do tabaco, está inserido entre as piores formas de trabalho e é proibido aos adolescentes até os 18 anos de idade.

Vimos nesse estudo o histórico da cadeia produtiva do tabaco, que no Rio Grande do Sul, deu-se em São Leopoldo e no vale do Rio Pardo através da vinda dos imigrantes alemães, que tinham experiência no plantio do fumo no sistema de agricultura familiar e em pequenas propriedades. Adotou-se o sistema integrado de produção, no qual os fumicultores celebram contratos com a indústria fumageira que prevê todas as etapas da cadeia produtiva.

Historicamente passou-se a utilizar extensivamente a mão-de-obra infanto-juvenil na produção do tacabo por vários fatores que vão desde as situações de pobreza, de baixa escolarização dos genitores e da questão cultural que atravessa gerações. O trabalho infantil e juvenil traz malefícios à saúde física e ao equilíbrio emocional, é uma das causas de evasão escolar e faz com que esses pequenos trabalhadores tenham pouca qualificação profissional, em um mundo tão competitivo.

O Governo Federal tem implementado e intensificado programas a fim de erradicar o trabalho infanto-juvenil, como o Programa de Erradicação doTrabalho Infantil, PETI, em ação conjunta do MPT, com o SINDITABACO, AFUBRA e empresas do complexo fumageiro. Realizam-se anualmente centenas de palestras, cartilhas de orientação sobre os malefícios do trabalho infanto-juvenil, no sentido de concientizar as famílias dos fumicultores.

Nesse sentido existem muitas dificuldades de origem cultural, educacional e econômica para que os genitores das famílias dos trabalhadores rurais da indústria Fumageira do Estado do Rio Grande do Sul possam criar os seus filhos respeitando os direitos e garantias fundamentais de seus filhos. Dentre o rol de dificuldades, tem-se a precariedade financeira na qual estão imersos. Assim, necessitam valer-se do labor de seus filhos para o complemento de renda que ajudará no sustento do lar.

A solução da problemática do trabalho infantil não deve ficar restrita à assinatura de pactos e cláusulas sociais ou ao simples encaminhamento das crianças nas escolas. Deve-se pensar em qualidade de ensino com a proposição de programas de ensino aos pais das famílias de agricultores da indústria Fumageira. É preciso que haja uma ação conjunta em nível governamental e da sociedade civil para que se coloque em prática o combate à exploração infantil, a fim de que os direitos infanto-juvenis sejam respeitados.

Apesar dos inegáveis avanços no sentido da erradicação do trabalho das crianças, o número de adolescentes trabalhando na cultura do tabaco ainda é grande, e há muito ainda a ser feito para que não tenhamos mais nenhuma criança ou adolescente trabalhando. O trabalho infantil e Juvenil na agricultura familiar representa uma questão de inefetividade da Proteção Integral, que ainda não consegue cobrir a vastidão de famílias dos agricultores.

A proteção ao menor trabalhador é necessária e deve ser efetiva e, para tanto devem ser aprimorados os mecanismos de proteção, da mesma forma como a sociedade também passa por inúmeras transformações ao longo dos tempos. No Rio Grande do Sul, verifica-se atualmente, o empenho das indústrias do complexo fumageiro, que assumem a sua responsabilidade Social firmando o compromisso de não empregar e nem comercializar com quem emprega mão-de-obra infanto-juvenil. Essas empresas têm feito um trabalho de base, orientando os fumicultores através de cartilhas e programas de erradicação da mão-de-obra infanto juvenil. Contratam consultores que realizam inúmeras palestras às famílias dos fumicultores na tentativa quebrar o paradigma que o trabalho infantil é aceitável, normal ou formador de indivíduos responsáveis.

Nesse sentido, as empresas do complexo fumageiro empenham-se muito nesses programas de responsabilidade social, pois esse é um componente que integra as suas marcas, valorizando a multinacional no cenário mundial. O valor de uma marca não se encontra somente no quanto ela vende ou fatura, mas nos valores que integram a marca como responsabilidade ambiental, responsabilidade social, ambiente de trabalho nas suas unidades, o sentimento que a marca cria nos seus consumidores. Dessa forma, acompanhar a legislação mundial, caminhar no mesmo sentido das tendências dos mercados e atender as expectativas de clientes, fornecedores e da Sociedade são fatores positivos às empresas fumageiras.

Somente assim, com ações efetivas de todos os lados, através da educação para todos, da melhor distribuição de renda, de programas de conscientização, de denúncias diante de irregularidades, da manutenção da constante fiscalização e orientação do MPT, atingiremos a raiz do problema, que é educacional e cultural e assim, a proteção às crianças e adolescentes será integral.

Referências
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Notas:
[1] ARIÈS, Philippe. História Social da criança e da família. Trad. Dora Flaksman. 2.ed. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1981. p. 50-69.
[2] ARIÈS, philippe. História Social da criança e da família, p. 39.
[3] ARIÈS, op. cit., p.10.
[4] HEYWOOD, Colin. Uma história da Infância. Porto Alegre: Artmed, 2004.p.87.
[5] ARIÈS, op. cit., p.156.
[6] Revista Veja On Line – edição 1671 – 18 outubro 2000. Disponível em Acesso em 20/10/2012.
[7] ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família, p.156.
[8] PINTO, Manuel; SARMENTO, Manuel Jacinto. (coord.) As crianças: contexto e identidades. Braga: Centro de Estudos da Criança – Universidade do Minho, 1997. p.55.
[9] ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família, p.165-170.
[10] ARIÈS, philippe. História Social da Criança e da Família, p. 222-267.
[11] FREIRE COSTA, Jurandir . Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Graal,1989. p.155.
[12] FOUCAULT, Michael. Vigiar e Punir – Histórias de Violência nas Prisões. p. 125- 152.
[13] COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil: como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p.48.
[14] MENDES, Emílio García. Infância e Cidadania na América Latina, p.197 – 202.
[15] COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil: como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p.49.
[16] JESUS, Maurício Neves. Adolescente em Conflito com a Lei: prevenção e proteção integral. Campinas: Sevanda, 2006. p.13 – 192.
[17] MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Barieri, SP: Manole, 2003. p.29-30.
[18] DECCA, Edegar de; MENEGUELLO, Cristina. Fábricas e Homens: A Revolução Industrial e o Cotidiano dosTrabalhadores. 3. ed. São Paulo: Atual, 1999. p. 41.
[19] NASCIMENTO, Grasiele Augusta Ferreira. A Educação e o Trabalho do Adolescente. Curitiba: Juruá, 2004.p. 15.
[20] GRUNSPUN, Haim. O Trabalho das Crianças e dos Adolescentes. São Paulo: Ltr, 2000. p. 47-48.
[21] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito do Trabalho. 19.ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 909.
[22] MENDES, Emílio García. Infância e Cidadania na América Latina, p.52.
[23] MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Barieri, SP: Manole, 2003. p.36-37.
[24] LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional – medida socioeducativa e pena? São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 29.
[25] SARAIVA, João Batista Costa. Adolescente e Ato Infracional. Compêndio de Direito Penal Infantil.4.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p.16.
[26] LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 2ª edição – São Paulo: Editora Malheiros. 1993. p.15.
[27] Decreto N. 17.943-A – Código de Menores – de 12 de outubro de 1927. (Grafia original).
[28] FROTA, Maria Guiomar da Cunha. A cidadania da infância e as novas responsabilidades do Estado e da Sociedade Civil na implementação dos direitos da criança. Revista Memex: informação, cultura e tecnologia. Belo Horizonte, março/abril de 2005, ano 4, nº 10. p.1-2.
[29] BARROS, Cássio de Mesquita. As Reformas Necessárias na Legislação Trabalhista na Respectiva das Novas Diretrizes da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Ver. TST. Brasília, v. 67, nº 4, out/dez 2001. p. 82.
[30] MINHARRO, Erotilde Ribeiro dos Santos. A criança e o adolescente no direito do trabalho. São Paulo:LTr, 2003. p. 33.
[31] LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional – medida socioeducativa e pena? São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 31.
[32] JESUS, Maurício Neves. Adolescente em Conflito com a Lei: prevenção e proteção integral. Campinas: Sevanda, 2006. p.50.
[33] GOMES COSTA, Antônio Carlos. De menor a cidadão: Notas para uma história do novo direito da infância e juventude no Brasil. Editora do Senado, 1993. p.14.
[34] LIBERATI, Wilson Donizeti. Adolescente e Ato Infracional – medida socioeducativa e pena? São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 60.
[35] COSTA, Antônio Carlos Gomes. De menor a cidadão: Notas para uma história do novo direito da infância e juventude no Brasil. Editora do Senado, 1993. p.14-20.
[36] JESUS, Maurício Neves. Adolescente em Conflito com a Lei: prevenção e proteção integral. Campinas: Sevanda, 2006. p.63.
[37] AMIN, Andréa Rodrigues,“Doutrina da Proteção Integral” e “Princípios orientadores do Direito da Criança e do Adolescente”– In.Curso de Direito da Criança e do Adolescente: aspectos teóricos e práticos.4. ed. São Paulo., Editora Lumens Júris, 2010. p. 13.
[38] COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil: como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p.58.
[39] COSTA, Ana Paula Motta. Os Adolescentes e seus Direitos Fundamentais: Da invisibilidade à indiferença. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2012. p.133.
[40] MACHADO, Martha de Toledo.  A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003, p. 50.
[41] JESUS, Maurício Neves. Adolescente em Conflito com a Lei: prevenção e proteção integral. Campinas: Sevanda, 2006. p.67.
[42] LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 3ª edição – São Paulo: Editora Malheiros. 1995. p.13-15.
[43] LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 3ª edição – São Paulo: Editora Malheiros. 1995. p.105.
[44] MACHADO, Martha de Toledo.  A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. São Paulo: Manole, 2003, p. 152.
[45] LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 3ª edição – São Paulo: Editora Malheiros. 1995. p.13-15.
[46] ROSSATO, Luciano Alves; LÈPORE, Paulo Eduardo. Comentários à Lei Nacional de Adoção – Lei 12010, de 03 de Agosto de 2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p 20.
[47] COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil: como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p.47.
[48] Organização Internacional do Trabalho, ANDI e Unicef. Crianças invisíveis: o enfoque da imprensa sobre o Trabalho Infantil Doméstico e outras formas de exploração. / coordenação Veet Vivarta. – São Paulo: Cortez. 2003. (Série mídia e mobilização social: v. 6). P. 26-27.
[49] ECA. Art. 1º. Esta lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
[50] SARAIVA, João Batista Costa. Desconstruindo o Mito da Impunidade: Um Ensaio de Direito Penal Juvenil. Brasília: Saraiva, 2002. 50-51.
[51] VIAN, Maurício. “Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente”. In Manual de perguntas e respostas para implantação e implementação dos conselhos municipais dos direitos da criança e do adolescente, conselhos tutelares e fundos municipais dos direitos da criança e do adolescente. Porto Alegre: STCAS/CEDICA, 2004. p06-09.
[52] SIMÕES, Carlos. Curso de Direito do Serviço Social. 3ª edição. Biblioteca Básica de Serviço Social.Editora Cortes, São Paulo. V.3. 2009.p.218.
[53] VIAN, Maurício. op. cit., p.18-24.
[54] BERGER, Maria Virgínia Bernardi, Acadêmica Elisa Ribas Gracino. Aspectos Históricos e Educacionais dos Abrigos de Crianças e Adolescentes: A formação do Educador e o Acompanhamento dos Abrigados. Revista Histedbr On Line. Campinas, nº 18. 2005. p.170.
[55] LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 3ª edição – São Paulo: Editora Malheiros. 1995. p.40.
[56] Organização Internacional do Trabalho, ANDI e Unicef. Crianças invisíveis: o enfoque da imprensa sobre o Trabalho Infantil Doméstico e outras formas de exploração. / coordenação Veet Vivarta. – São Paulo: Cortez. 2003. (Série mídia e mobilização social: v. 6). P. 26.
[57]  MENDEZ, Emilio Garcia. Infância e cidadania na América Latina. São Paulo: Editora Hucitec / Instituto Airton Senna, 1998. p.36.
[58] Decreto nº 6.481, de 12 de Junho de 2008 – Código Civil. Disponível em http://www.planalto.gov.br Acesso em 20/10/2012.
[59] Idem.
[60] NEVES, Nanete. Lavoura dourada: a saga dos produtores de tabaco do Sul do Brasil. São Paulo. Évora, 2010.p.57.
[61] SILVA, Leonardo Xavier da. Análise do Complexo Agroindustrial Fumageiro Sul-Brasileiro sob o Enfoque da Economia dos custos de Transação. Tese de doutorado apresentada ao Curso de pós-graduação em Economia Como quesito parcial à obtenção do Título de Doutor em Economia. Porto Alegre, 2002.p.48.
[62] MENEZES, João Bittencourt. Município de Santa Cruz. Santa Cruz: Lamberts & Riedl, (1914). p.4.
[63] VOGT, Olgário Paulo. A Produção de Fumo em Santa Cruz do Sul:  1849-1993. Santa Cruz do Sul: Edunisc. 1997. p. 63.
[64] VOGT, Olgário Paulo. A Produção de Fumo em Santa Cruz do Sul: 1849-1993. Santa Cruz do Sul: Edunisc. 1997. P 110.
[65] ALIEVI, Rejane Maria; FILHO, Nery dos Santos; VARGAS, Marco Antônio. Análise imotivada em arranjos produtivos locais no RS: Complexo agro-industrial fumageiro. Nota Técnica nº 30/99. Rio de Janeiro. IE/UFRJ. 1998.p.12.
[66] DALLAGO FILHO. Avaliação da relação produtor-empresa no sistema integrado de produção agrícola na cultura de fumo. Porto Alegre: UFRGS. 2003. (Dissertação de mestrado em administração).p.8.
[67] SILVA, Leonardo Xavier da; BORGES, Renata de Lacerda Antunes. Interpretações e análise das relações contratuais e da interdependência na cadeia agroindustrial do Tabaco sul-brasileiro. Porto Alegre: UFRGS. 2010.p3.
[68] BUAINAIN, Antônio Márcio; FILHO, Hildo Meirelles de Souza; Coordenadores. Organização e Funcionamento do Mercado de Tabaco no Sul do Brasil. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2009.p. 129-133.
[69] BUAINAIN, Antônio Márcio; FILHO, Hildo Meirelles de Souza; Coordenadores. Organização e Funcionamento do Mercado de Tabaco no Sul do Brasil. Campinas, SP. Editora da Unicamp, 2009.p. 134-137.
[70] SINDITABACO. Site; http://sinditabaco.com.br. Acesso em 26/10/2012.
[71] Idem citado acima.
[72] AFUBRA- Perfil do fumicultor.Distribuição Fundiária (2010/2011) Santa Cruz do Sul, 2012. Disponível em http://www.afubra.com .br. Acesso em 26/10/2012.
[73] AFUBRA-  Perfil do fumicultor.Distribuição Fundiária (2010/2011) Santa Cruz do Sul, 2012. Disponível em http://www.afubra.com .br. Acesso em 26/10/2012.
[74] AFUBRA- Diagnóstico Sócio Econômico. Perfil da Residência (2010/2011) Santa Cruz do Sul, 2012. Disponível em http://www.afubra.com .br. Acesso em 26/10/2012.
[75] Cadeira Produtiva – AFUBRA. Disponível em http://www.afubra.com.br/index.php/conteudo/show/id/71. Acesso em 26/10/2012.
[76] PINHEIROS, S. e Luiz, D. Ladrões de Natureza: uma reflexão sobre a biotecnologia e o futuro do planeta. Porto Alegre: Fundação Juquira-Candiru, 1998, p.155.
[77] OLIVEIRA, Edevanger Souza; ARBEGE, Alessandro Porporatti; TROST, Mark Schlosser. Custos de Transação na Cadeia Produtiva do Fumo no Rio Grande do Sul. UFSM: Santa Maria. Disponível em: Acesso em: 24/05/2011.p.4-5.
[78] AFUBRA. http://www.afubra.com.br/index.php/conteudo/show/id/71.Sobre a Afubra. Nossa História. Acesso em 26/10/2012.
[79] OLIVEIRA, Edevanger Souza; ARBEGE, Alessandro Porporatti; TROST, Mark Schlosser. Custos de Transação na Cadeia Produtiva do Fumo no Rio Grande do Sul. UFSM: Santa Maria. Disponível em: Acesso em: 24/05/2011.p.6-8.
[80] Boletim Especial Deser – ACT – Dezembro 2009 – Cadeia Produtiva do Fumo – Data de publicação: 31/01/2011. http://www.deser.org.br/pub_read.asp?id=151 – acesso em 14/10/2012.
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Informações Sobre o Autor

Paulo Ricardo Dias de Moraes

Acadêmico de Direito no Centro Universitário Metodista IPA

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