Revisão criminal pro societate: contexto histórico e possibilidade de cabimento

Resumo: O presente trabalho visa trazer todos os deslindes necessários para o estudo da Revisão Criminal no Direito Brasileiro. O enfoque especial e predominante é à possibilidade de as Sentenças Absolutórias transitadas em julgado também poderem ser reformadas ou revisadas. Nesse sentido, examinou-se a possibilidade de existência da mesma, no aspecto constitucional e infraconstitucional, além de fazer-se um enlace com os princípios que se relacionam com o tema, principalmente o da Verdade Real. Além de abordar os aspectos da Coisa Julgada, relacionando-a com a Segurança Jurídica e suscitando formas de relativização.  Portanto, um dos objetivos deste estudo é demonstrar que a Revisão das Sentenças Absolutórias, em certas situações, é inevitável, ao passo que a legislação pátria, como já ocorre ou está em processamento em civilizações mais evoluídas, deve ser reformulada. Contudo, será necessário analisar o Erro do Judiciário e a história da Revisão das Sentenças Absolutórias ao longo do tempo. E por fim procurou-se justificar e fundamentar coerentemente as hipóteses em que seria possível haver a reformatio in pejus, além de se traçar indícios de cabimento no Direito Brasileiro.

Palavras Chave: Revisão Criminal. Pro Societate. Cabimento. Verdade.

Resumen: El presente trabajo tiene la pretensión de presentar los cuidados necesarios para el estudio de la Revisión Criminal en el Derecho Brasileño. El enfoque especial y predominante es la posibilidad de las Sentencias Absolutorias transitadas en jugado, que también pueden ser revisadas. En este sentido, ha examinado la posibilidad de su existencia en el aspecto institucional e infla constitucional, además de si hacer un enlace con los principios que se relacionan con el tema, esencialmente el da Real Verdad; como también de abordar sobre los aspectos de la Cosa Jugada, haciendo su relación con la Seguridad Jurídica para promover maneras de revitalización. Por lo tanto, un de los objetivos de esa pesquisa es demostrar que la Revisión de las Sentencias Absolutorias, en algunas ocasiones, es inevitable, con cuanto que la legislación patria, como ya ocurre o está se desarrollando en civilizaciones más avanzadas, debe ser reformulada. Por eso de haz necesario que sea examinado el Error del Judiciario y la historia de la Revisión de las Sentencias Absolutorias al longo del tiempo. Y por fin, deseó también en este estudio justificar y fundamentar con coherencia las hipótesis que fueron posibles para haber la reformation in pejus,  al tiempo que se traza indicios de cabimiento del Derecho Brasileño.

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Palabras-clave: Revisión Criminal. Pro Societate. Cabimiento. Verdad.

Súmário. Introdução. 1. A Revisão Criminal frente à Constituição. 1.1. Princípios Constitucionais Processuais Penais. 1.1.1 Princípio do Devido Processo Legal. 1.1.2. Princípio da Verdade Real. 1.1.3. Princípio da Proporcionalidade. 1.1.4. Princípio da Paridade das Armas. 2. Antecedentes Históricos Da Revisão Criminal. 2.1. Direito Grego. 2.2. Direito Roman. 2.3. Direito Canônico 2.4. Direito Francês. 2.5 Direito Italiano. 2.6 Direito Brasileiro. 3. Considerações sobre o Erro do Judiciário. 4. A Revisão Criminal. 4.1. A Res Iudicata. 4.2. Hipóteses de Cabimento. 5. Revisão Pro Societate. 5.1. Hipóteses Taxativas. 5.2 Prescrição. 5.3 Coisa Julgada Soberana. 5.4 Reformatiu In Pejus. 5.5. Indícios de Cabimento no Direito Brasileiro. 5.6 No atual Direito Comparado. Conclusão. Referências

CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS

O presente trabalho tem como fim precípuo suscitar os questionamentos necessários para o estudo e aprimoramento da Revisão Criminal no Direito Brasileiro. O enfoque especial será dado à possibilidade de as Sentenças Absolutórias transitadas em julgado poderem ser reformadas ou revisadas.

É inegável invocar o meio pelo qual se delineia o processo, que se realiza através do Devido Processo Legal. O ato judicial, que não incorre mais na possibilidade de recursos, assume caráter imutável, a chamada Coisa Julgada.

Quando alguma norma é violada, o Estado, buscando a permanência do equilíbrio social, quebra a imutabilidade da coisa julgada e admite a revisão daquela sentença, como ocorre no âmbito Cível e na Revisão das Sentenças Condenatórias.

A respeito do tema, é imprescindível, inicialmente, discorrer sobre o que vem a ser a Revisão Criminal. A revisão jurisdicionalizada no âmbito penal constitui o exame de algum vício ou defeito. É ainda o meio de expurgar da sentença o que não estiver de acordo ou em harmonia com o direito e a verdade.

A Revisão Criminal pode, entretanto, ser vislumbrada para alterar uma sentença condenatória, é a chamada Revisão Pro Réu, e em algumas legislações do Direito Comparado incidir, também, para modificar sentenças absolutórias, é a Revisão Pro Societate. É esta, o escopo maior deste estudo.

Nesta linha de raciocínio, diante da grande relevância prática e teórica do trabalho posto em análise, será necessário desvendar todas as conseqüências oriundas do erro do Judiciário, que é o principal motivo ensejador das revisões, seja porque existam julgados embasados em documentos, exames ou testemunhos falsos, seja por estes julgados estarem contrários ao dispositivo legal ou ainda por surgirem provas e indícios suficientes de autoria e materialidade do delito.

O desiderato deste trabalho, portanto, é demonstrar a possibilidade, em tese, da Revisão Criminal em favor da Sociedade (Pro Societate). Faz-se mister, para tanto, examinar o tratamento no Ordenamento pátrio e estrangeiro ao longo do tempo e o erro do judiciário.

O cerne da questão é demonstrar o benefício que se pode proporcionar a toda uma sociedade em detrimento de um indivíduo. E tal escopo se alcança com forte no princípio amplamente invocado pelos detratores da tese aqui sustentada: o princípio da Verdade Real.

Vale salientar que, o legislador Constitucional jamais proibiu a Revisão em prol da Sociedade. É permissivo, ao deixar a critério do Código de Processo Penal e demais leis para abordá-lo. Entretanto, a atual legislação infraconstitucional é taxativa, permitindo a revisão apenas nos casos elencados nos artigo 621do Código de Processo Penal:

1. Quando a decisão condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou a evidência dos autos;

2. Quando a sentença condenatória se fundar em depoimento, exames ou documentos comprovadamente falsos;

3. E finalmente, quando, após a sentença, forem descobertas provas novas quanto à inocência do condenado, ou de circunstâncias que determine ou autorize a diminuição especial da pena.

Não obstante isso, é imperioso frisar que o princípio da Verdade é o pilar para proteção e aplicação do Direito, uma vez que a imutabilidade da Sentença Penal Absolutória interfere na Busca da Verdade Real. Ora, se tal princípio, que é o meio de se chegar à justiça, não for observado, também, para alterar um erro contra a sociedade, poderá ser motivo para que as penas percam sua eficácia, pois o direito só encontra seu fim supremo, a justiça, através da verdade.

 Ademais, nada adianta primar pela segurança jurídica e, a contrário senso, deixar toda a sociedade à mercê de criminosos injustamente inocentados. Fato é que as absolvições injustas aumentam a impunidade e ainda insuflam a criminalidade.

O estudo atentará para a possibilidade de revisão em casos taxativos. Como quando a fundamentação e motivação da sentença ter por objeto a utilização de provas falsas e ainda quando o réu confessar, por meios idôneos, a prática delituosa. Além de prever a hipótese de revisão quando surgir provas antes não conhecidas, que possam atentar para autoria e materialidade do fato. Na última hipótese, para ter cabimento, deverá ser intentada dentro do prazo prescricional do crime cometido.

Para tanto, respeitando o princípio da Segurança Jurídica e, buscando assegurar o status libertatis. O prazo prescricional para a propositura da ação (ou recurso) seria correspondente à prescrição do delito.

Concomitantemente, será abordada decisões fundamentadas no direito pátrio, em que já se presume uma aceitação tácita à revisão em prol da sociedade, quando se tratar da utilização de documentos falsos, como vem ocorrendo, freqüentemente, com os atestados de óbitos.

O presente estudo não tem, jamais, o objetivo de abolir a Coisa Julgada, até mesmo porque deve ser respeitada a segurança jurídica, tão necessária a paz social. Os opositores da Revisão Criminal Pro Societate podem até sustentar que o instituto em debate acarretaria uma sensação de falta de proteção, por parte do Estado-Juiz, a todos os indivíduos de bem, que se sentiriam ameaçados pela possibilidade de serem presos e condenados a qualquer tempo.

É como se estivessem com a espada de Dâmocles, o que significa que, a qualquer momento, algo de muito ruim pode acontecer com o cidadão já inocentado. Não procede, entrementes, argumentos desse jaez. Resguardara o império de justiça, pois prevaleceria a Verdade, que não se compraz com a absolvição inequivocamente culpados.

A posição defendida neste despretensioso texto pode despertar o debate no sentido de vislumbrar uma evolução no sistema jurídico nacional, dando maiores possibilidades práticas para a concretização da justiça aos dignos cidadãos da Carta Magna de 1988. Com a valorização do Princípio da Verdade Real e da Proporcionalidade na Revisão das Sentenças Absolutórias, como instrumento de defesa da sociedade, e ainda, através da desconstituição da Coisa Julgada Soberana, acredita-se poder ser construído um Sistema Processual Igualitário.

1. A REVISÃO CRIMINAL FRENTE À CONSTITUIÇÃO

Diferentemente de como ocorre no Direito Comparado, a exemplo de países como Alemanha e Suíça, o Ordenamento Jurídico Brasileiro abarca tão-somente a Revisão Criminal em favor dos condenados. Mas não foi sempre assim, ao longo da história das Constituições a vedação ou permissão fora alternada.

Vê-se, contudo, no atual plano constitucional, não há vedação expressa para a instituição da Revisão Criminal Pro Societate. Assim, inexistindo proibição constitucional da revisão das sentenças absolutórias, nada impede que o legislador ordinário possa adotá-la.

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Segundo Bortz (2006, p. 238):

“Não há nenhum impedimento de ordem constitucional para a admissibilidade da revisão pro societate, sendo que, consoante seu entendimento, o legislador ordinário está autorizado a discipliná-la. Os textos constitucionais de 1991 e 1946 vedavam expressamente a revisão pro societate.”

O texto Constitucional, portanto, não faz menção à revisão das sentenças absolutórias ou condenatórias. O único preceito constitucional que impediria seria o art. 5º XXXVI (Brasil, 2006a), o qual reza que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. No entanto, como é sabido, o instituto da coisa julgada vem sendo relativizado.

O próprio Código de Processo Civil possibilita a Ação Rescisória e o Código de Processo Penal a Revisão Criminal. Para tanto, deve conter algum vício mencionado no rol taxativo dos art. 485 e 621, respectivamente, dos Códigos em referência que autorizam a desconstituição da Coisa Julgada. Esse controle exercido na sentença não fere a ordem constitucional, uma vez que referido decisum precisa ser reformado pelos vícios que apresenta, como forma de efetivar as garantias constitucionais, preservando a legalidade.

É mister ressaltar que a doutrina da revisão pro réu, a única espécie admitida no direito brasileiro, é justificada, sobretudo, como decorrência do princípio da Ampla Defesa e Contraditório, constitucionalmente prescrito no art. 5º LV. A Ampla Defesa implica no dever de o Estado prestar e proporcionar ao acusado completa defesa pessoal e técnica, permitindo que ele utilize de todos os meios de prova lícitos permitidos no Estado Democrático de Direito. Já o contraditório é a prerrogativa que o acusado tem de se defender dos fatos que lhe estão sendo imputados. Caso os fatos descritos não ocorram, gera nulidade processual, ferindo o princípio do devido processo legal.

É notória a proteção que a Carta Política dá ao acusado. Um exemplo de fácil percepção é o princípio do "Favor Rei", em que no caso de dúvida o réu é absolvido. E ainda o princípio do "Estado de Inocência", previsto no art. 5º LVII da CF/88, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Com essas prerrogativas o direito ao Devido Processo Legal está assegurado a todo aquele que está sendo alvo de processo criminal.

Diante da invocação de princípios para justificar a instituição da revisão em prol do réu, não há a possibilidade de se esquecer o princípio da Verdade Real ou Verdade Material e o da Verdade Formal, o mais importante e formador do processo penal contemporâneo.

O que justamente diferencia o Processo Civil do Penal é que no primeiro só existe a verdade formal, ou seja, o magistrado julgará o litígio de acordo com os elementos probatórios levados, pelas partes, aos autos. Já no Processo Penal, prevalece o princípio da verdade material, porque o juiz tem a prerrogativa de investigar o fato e não se atém apenas às provas trazidas aos autos, podendo investigar também as declarações das partes, por exemplo.

Ora, então há de se considerar que a Revisão de qualquer sentença, seja ela condenatória ou absolutória, pautando-se no princípio da Busca da Verdade, poderia ensejar a Revisão. De acordo com tal princípio, o devido processo legal deve apoiar-se em provas materialmente constituídas e valoradas, despidas de qualquer artificialismo ou até mesmo falsidade.

Cumpre repisar que o fim precípuo do direito é a justiça, e só poderemos atingi-la se a Verdade for preservada e cultuada. No processo Penal, não é suficiente ter aparência de verdadeira, é necessário obedecer aos caracteres formais e materiais.

Se o principio da Ampla Defesa é argumento para justificar a revisão em favor dos acusados, o principio da Verdade Real é o principal fundamento para ser comprovada a culpa do já inocentado. Pois somente com o surgimento de provas cabais e verídicas de autoria e materialidade de determinado delito, poder-se-ia fazer uma revisão em prol da sociedade, porque o direito do Réu não pode estar acima do direito da Sociedade.

É importante trazer a lume o embate entre o “jus libertatis” e o “jus puniendi”. O Estado detém o direito de ação, é o dever-poder denominado de “jus puniendi”.  Porém esse poder-dever do Estado é restringido pela lei, uma vez que ele só pode cominar sanções às condutas prescritas em lei.

Quando é cometido um crime, o Estado tem o dever de recompor aquela ordem jurídica social que foi violada e desestruturada. Para tanto, deve-se observar os direitos previsto pela Lei Maior, que servem para evitar possíveis abusos de poder. Um exemplo é uma condenação injusta, na qual os elementos de defesa foram cerceados. O objetivo deste trabalho não é negar a existência e perseguição aos princípios em prol do réu, eles compõem forma de existência e eficácia dos atos jurídicos ao ponto que direitos e garantias individuais devem ser preservadas.

O ente estatal deve punir quem cometeu alguma infração e fora injustamente absolvido. É imprescindível destacar que, a sociedade também é digna do status libertatis. É o que se acredita.

Greco (2003, p. 05) traça breves e inestimáveis considerações a respeito:

"A Constituição exerce (…) um duplo papel. Se de um lado orienta o legislador, elegendo valores considerados indispensáveis à manutenção da sociedade, por outro, segundo a concepção garantista do Direito Penal, impede que esse mesmo legislador, com uma suposta finalidade protetiva de bens, proíba ou imponha determinados comportamentos, violando direitos fundamentais atribuídos a toda pessoa humana".  

Sendo função do Estado punir, por força do princípio da obrigatoriedade, ele não pode ficar acuado por forças principiológicas, entendidas como regra, para vedar a punição de criminosos absolvidos erroneamente. Pois o sistema penal deve ser entendido como um sistema de ponderação, em que todos os princípios devem conviver harmonicamente.

Por outra linha de raciocínio, o jus libertatis do cidadão considerado bem intangível à dignidade da pessoa humana, não é violado com a admissibilidade da reformatio in pejus, uma vez que o status libertatis não é mais garantia daquele que cometeu a prática delituosa e deve ser punido, para a preservação da segurança social.

A Constituição Republicana, no seu art. 5º inciso LVI, proíbe a aceitação de provas produzidas por meios ilícitos. Essa vedação tem o intuito de proteger a dignidade da pessoa humana como meio de evitar a produção de provas por meio de tortura ou qualquer outro tipo de pressão semelhante, e ainda, salvaguardar a verdade, não admitindo provas falsas.

Nessa linha de raciocínio, manifestou-se Alfradique (2005, p. 02):

 “A Constituição proíbe a colheita de provas realizada por meio ilícitos (…). De qualquer sorte, não se pode, por amor ao texto legal, referendar decisões injustas, carente de qualquer suporte fático ou jurídico, tendo em vista que o direito é instrumento à liberdade e não para avalizar o que aparentemente foi efetuado dentro das normas, pouco importando se justo ou injusto”. 

1.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PROCESSUAIS PENAIS

Em busca dos preceitos que norteiam a Revisão Criminal, sobretudo em favor da sociedade, é de fundamental importância pontuar as bases de conhecimento e os princípios penais basilares emanados da Constituição.

O processo penal, em que pese alguns resquícios, é garantista, uma vez que é pautado em uma série de princípios e regras que são postulados fundamentais da política processual penal do Estado. Esses pilares serão os indicadores do “dever-ser” a ser contextualizado materialmente nas legislações. Além de serem de fundamental importância no que diz respeito aos poderes a serem atribuídos aos sujeitos e as formas de intrumentalização. 

Os princípios são os nortes que devem ser seguidos para a formação legislativa dos silogismos constitucionais e infraconstitucionais. Por sua vez, são os indivíduos que os delimitaram de qual forma que serão incluídos no sistema ritualístico penal de um Estado. Eles são instituídos também de acordo com a forma de vida e concepção naturalística de cada civilização, como tendenciosos a se alterarem. Corroborando com esse entendimento, Tourinho (2006, p. 36) explicita:

“(…) os seus princípios oscilam à medida que os regimes políticos se alteram. Num estado totalitário, consideram-se as razões do Estado. Num democrático, como bem o disse valor absoluto, deve ser tida como inviolável pela Constituição”.

Nesse viés, pode atualmente ser inerente ao processo penal um princípio que, tempos à frente, caia em desuso. Cada princípio, intimamente ligado ao tema será estudado individualmente, buscando sua aplicabilidade nas Revisões que beneficiam a sociedade.

A respeito da aplicabilidade dos princípios na Revisão Criminal faz-se mister destacar a obra do mestre Ávila (2006, p.26), intitulada Teoria dos Princípios, de onde foi extraído importantes conceitos de regra e princípios que merecem ser distinguidos.

Normas ou são princípios, ou são regras. A principal distinção é que as regras não podem ser objeto de ponderação, enquanto que os princípios precisam e devem ser ponderados. As regras instituem deveres definidos e normas prescritas, enquanto que os princípios são deveres preliminares que estabelece fundamento para a consecução da interpretação e aplicação do Direito.

A diferença básica é que quando regras colidem, uma é invalida ou deve ter uma forma especifica de interpretação, como por exemplo, pela especialidade. E os princípios quando apresentam dualidade de justificativa sob um mesmo ângulo, deve o aplicador atentar-se para a Ponderação de Interesses e verificar qual deles possui maior relevância na situação fática ou normativa.

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A ampla Defesa e a Verdade Real não são regras, são princípios que devem conviver harmonicamente no Ordenamento. O primeiro não é óbice para a possibilidade de cabimento da Revisão Criminal Pro Societate.

1.1.1 Princípio do Devido Processo Legal

O art. 5°, LIV, da Constituição da República de 1988 (Brasil, 2006a), versa que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. É o pilar principal do Direito Constitucional do qual derivam os demais princípios.

Preliminarmente, é imperioso destacar a lição de Nery Júnior e Nery  (2006, p. 133) sobre tal princípio:

“Trata-se do postulado fundamental do direito constitucional (gênero), do qual derivam todos os outros princípios (espécies). Genericamente a clausula due process se manifesta pela proteção à vida-liberdade-propriedade em sentido amplo. O texto foi inspirado nas emendas 5ª e 14ª à CF americana, e não indica apenas tutela processual, mas sim geral, bipartindo-se o principio do devido processo legal substancial e processual”.

Moraes (2001, p.117), por seu turno, preleciona que:

 “O devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando tanto no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, quanto no âmbito formal, ao assegurar-lhe a paridade total de condições com o Estado-persecutor e plenitude de defesa (direito à defesa técnica, à publicidade do processo, à citação, de produção ampla de provas, de ser processado e julgado pelo juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal)".

Então, o Devido Processo Legal protege o indivíduo materialmente quando lhe assegura liberdade e ainda formalmente quando garante direito à defesa, a produção de provas, além dos recursos e Revisão Criminal.

O princípio em deslinde está ligado ao Direito à um Processo ritualístico, de acordo com todas as garantias possíveis para a parte acusada e acusadora. E é uma regra que consubstancia a possibilidade de rescisão das Sentenças Absolutórias. Ora, se esse princípio é considerado como o gênero, deve ser entendido como instrumento de perseguição da justiça, tanto pelo ius puniendi como pelo ius libertatis.

1.1.2. Princípio da Verdade Real

O ponto inicial é a existência ou não de tal princípio na Constituição Federal, uma vez que não existe previsão legal expressa. O doutrinador Barros (2002, p. 27) acentua que a doutrina sempre se valeu da existência de princípios implícitos e explícitos. Estes quando plenamente declarados em preceitos da Constituição e aqueles quando se apresentam inerentes aos sistemas e simbolizam procedência, a partir da conjugação destes.

Por sorte, levando-se em conta a supramencionada tese defendida pelo citado doutrinador, poder-se-ia falar que a busca da verdade relaciona-se, tão logo, com a busca de provas para declarar a autoria e materialidade do delito.

Conquanto, tal acontecimento circunda não só nos Códigos Penais, mas também os Civis, assumindo características específicas. É notório no Processo Civil que, basta o demandado reconhecer a procedência do pedido do demandante para o juiz dirimir o conflito de interesse, solucionando o litígio. Já no Processo Penal, a confissão é mais um meio de prova, pois a verdade real deve ser perseguida.

O princípio da verdade real, portanto, gera implicações para que no due process se busque a verdade dos fatos, pois a condenação só ocorrerá se for possível provar os fatos que foram imputados ao acusado.

É interessante perceber que no processo penal o dever-poder de punir deve estar pautado em provas e não na mera opinião do julgador. O juiz é um titular investido de jurisdição para investigar a verdade dos fatos, por isso deve ser excluída a verdade aparente.

Nos Dizeres de Mariconde (1956, p. 126):

 “o juiz aparece como titular de um poder autônomo de investigação, isto é, tem o poder de investigar de ofício a verdade dos fatos, apesar da inatividade do Promotor de Justiça e da parte contrária, não só durante a instrução”.

Mister se faz invocar os ensinamentos de Tourinho Filho (2006, p.17):

 “Essa posição ativa e proeminente do Órgão Jurisdicional Penal deriva, desde logo, da natureza pública do interesse repressivo e contrasta com a posição do Juiz cível, cujos poderes estão, geralmente, condicionados e limitados pela iniciativa das partes”.

Ademais, pela própria natureza pública do ato de punir, a sociedade não pode ficar à mercê de limitações impostas aos jus puniendi. A inadmissibilidade de Revisão Criminal das sentenças absolutórias põe em cheque a Verdade Real.

O Ilustre doutrinador Theodoro Júnior (2005, p. 417) assinala que “provar é estabelecer a existência da verdade; e as provas são os diversos meios pelos quais a inteligência leva ao descobrimento da verdade”.

Assim, a busca da Verdade deve ser considerada também como um dever-poder do Estado, já que os litigantes envolvidos, na maioria das vezes, têm o interesse em obscurecê-la para garantir a absolvição. Com isso, o Estado-juiz é ludibriado, equivocando-se. É imprescindível à investigação buscando a certeza dos fatos que envolvem a prática delituosa.

1.1.3. Princípio da Proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade é comumente chamado de princípio Geral do Direito, tanto que ele é elementar, sendo utilizado em todas as suas áreas: Penal, administrativo, consumidor e outras. Tem fundamento constitucional por representar o aspecto substancial do Devido Processo Legal, contemplado pelo art. 5º LIV da CF.

O Devido Processo Legal Substancial é o limite dado ao legislador, segundo o qual ele deve instituir regras justas para garantir a paz social. Nos ditames de Ferrajoli (2006, p. 87), não só deve seguir o procedimento legislativo como o conteúdo deve ser proporcional e razoável.

O principal efeito deste princípio no direito atual é o controle de constitucionalidade exercido nas leis. Com efeito, ele é intrínseco ao ideal do Estado Democrático de Direito, no qual a justiça aflora e garante o ideal de felicidade. Não obstante isso, deve-se registrar que é necessário a flexibilização de certos institutos jurídicos, para a manutenção do próprio Estado Democrático de Direito.

Porém, com a interpretação das normas jurídicas aplicando-se o princípio da proporcionalidade, obtém-se o encontro da verdade, para isso, permitir-se-á a utilização de provas ilícitas, desde que elas sejam realizadas na estrita medida, aplicando-se a proporcionalidade.

Para Néry Junior e Nery (2006, p.135):

 “É importante a fixação de critérios notadamente no que respeita os limites de sua incidência para não tornar absoluto os direitos e garantias fundamentais, oponíveis a tudo e a todos, pois tal irrestringibilidade não se coaduna com o Estado de Direito e tampouco atende ao interesse público”.

O que se deve perceber é que o processo e suas normas regulamentadoras materiais não se colocam a vislumbrar os interesses subjetivos, mas sim a função do que se objetiva.

O jurista Barros (2002, p. 282) institui que a adoção desse princípio gera um impasse: Defender o absolutismo da regra constitucional ou se minimizar a rigidez de institutos. Adotando-se a segunda regra, pode ocorrer o chamando princípio da Ponderação de interesses, criação da legislação alemã, em que a interpretação de dispositivos Constitucionais pode ser ponderada pelo senso comum.

O que se pretende com essas elucubrações é verificar que, mesmo que fosse acatada a vedação à Revisão Criminal das sentenças absolutórias, ferir-se-ia alguns princípios, tais como a ampla Defesa e o Contraditório. Por outro lado, o princípio da proporcionalidade instrumentalizaria o Estado, oferecendo condições de cessar a ameaça da criminalidade, da injustiça e da impunidade.

Segundo o professor Andrade (1992, p. 46), a Teoria da Ponderação de Interesse teve sua gênese na Alemanha:

“A Teoria do Interesse Predominante, segundo o qual o Estado, representando a sociedade, é chamado a tutelar dois interesses relevantes e antagônicos, como são: a defesa de um direito constitucionalmente resguardado e a necessidade de perseguir e punir o criminoso. Diante da impossibilidade de dar proteção a ambos, a solução deve consultar o “interesse que ponderar” para que assim seja preservado”.

Para a incursão deste princípio deve-se observar a adequação, necessidade e proporcionalidade, em sentido estrito da medida. Ser proporcional significa averiguar a relação custo-benefício, verificando que danos causariam e quais benefícios seriam produzidos. A revisão da Sentença Absolutória traria ao bem-comum um estímulo para conter a criminalidade e a corrupção, haja vista que os maiores erros que ensejariam a Revisão Pro Societate consistem na utilização de provas e testemunhos falsos, bem como na corrupção dos entes julgadores.

As garantias que foram narradas em linhas precedentes, muitas vezes são utilizadas pelos criminosos com o escopo de se esquivar da sanção estatal, escapando à punição cabível.

O que se objetiva, entretanto, não é desqualificar a hierarquia normativa dos direitos fundamentais, mas dar prosseguimento para o cabimento da Revisão in Pejus, pois é indispensável à proteção da ordem pública, não tida como interesse superior, no mínino equivalente. Pois existindo a prática de um erro contra a sociedade, absolvição de um culpado é plenamente necessário a reparação a fim de que as penas não percam sua eficácia.

1.1.4. Princípio da Paridade Das Armas

Embora as partes figurem em pólos opostos, elas se situam no mesmo plano: Com iguais direitos, deveres, ônus, obrigações e faculdades. A instituição de princípios como o da ampla defesa e do contraditório, funciona como instrumento para a obtenção da igualdade entre as partes ou paridade das armas.

No escólio de Tourinho Filho (2006, p. 34):

“De nada valeria as partes acusadora e acusada encontrarem-se no mesmo plano, eqüidistantes do Juiz, órgão superpartes, se o Estado não lhes proporciona equilíbrio de forças, dando-lhes os mesmos instrumentos para a pugna judiciária. Sendo a ampla defesa dogma constitucional, por obvio haveria desrespeito à Lei Maior se, por acaso, uma das partes, no Processo Penal, tivesse mais direitos que a outra”.

Sendo de direito e de fato a existência da paridade entre os sujeitos processuais, qual a justificativa de só ser admitida a Revisão criminal em face de sentenças condenatórias? É duvidoso, como será visto a seguir.

Se a justificativa para tal desequilíbrio na relação jurídico-processual entre as partes for, como muitos doutrinadores sustentam, a situação de deficiência que o réu ou indiciado se encontra, esse não é motivo forte o bastante para permitir certas injustiças.

Até mesmo porque, faz-se jus a uma série de direitos fundamentais constitucionalmente garantidos como: Ninguém será culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória; além de o preso ser informado de seus direitos, entre eles, o de permanecer calado; aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa; o protesto por novo júri, que só pode ser interposto pelo réu; ninguém será submetido ao tratamento desumano e degradante.

Como se percebe, ao elencar alguns desses direitos, o princípio da paridade das armas vem sendo mitigado. É notório que tais privilégios são essenciais para a preservação da dignidade da pessoa humana, porém a possibilidade de reforma das sentenças somente nas hipóteses em que beneficiar o réu, incentiva a criminalidade.

Os princípios protecionistas ao réu foram instituídos para garantir um devido processo legal sem arbitrariedades e a vedação à reforma das sentenças absolutórias pouco têm ligação com essas garantias.

Como se pode depreender, o Estado é o titular do direito de punir, motivo pelo qual, em face da natureza pública desse ato, deve cumprir tal postulado para conseguir a segurança social.

2. ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA REVISÃO

A preocupação com uma sentença justa sempre esteve presente. A mera hipótese de um inocente protagonizar um erro do judiciário gerou a necessidade de ir em busca de um remédio reparador. A Revisão Criminal aflora no cenário mundial como um favor ao réu ou à sociedade, como elemento de justiça e equidade.

Imperativo se faz ressaltar, que inicialmente, essa Revisão era vista como uma graça, ou melhor, um favor do soberano. Com louvor observa Tourinho Filho (2006, p. 21), “não se tratava de direito do réu, mas de indulgência”. A evolução a fez transformar-se em instrumento jurídico de defesa às sentenças injustas.

A possibilidade de existência e cabimento da Revisão Pro Societate é inegável, uma vez que o erro do Judiciário causa impressão negativa, principalmente quando tal fato incorre na absolvição de um culpado. Com isso, brota no tocante à sociedade a sensação de insegurança, pelo fato de os erros ensejarem impunidade. Essa foi a preocupação sempre existiu na maioria das civilizações, evitar injustiças.

2.1. NO DIREITO GREGO

No período histórico da Antiguidade, o julgamento dos crimes era considerado como emanação da vontade divina.

A partir da ponderação do critério de justiça de Platão e Aristóteles (CHAUI, 1994, p. 38) que a revisão criminal passou se fortalecer. Platão entendia ser a justiça constante e firme vontade de dar a cada um o que é seu. Ao mencionar o “seu” de uma pessoa, ensinava que todos tinham direito a um elogio, a um perdão, à verdade; a justiça seria o que estava adequado com o que é seu, inerente ao ser humano.

Aristóteles foi um discípulo de Platão que conseguiu superar o mestre. Segundo Bruner (1961, p. 36), a doutrina da justiça nunca foi além de Aristóteles, mas sempre em volta dele.

A busca de Verdade no Sistema Penal Grego, como se pode perceber, era incansável. Os acusados eram julgados perante Quatro Tribunais: A assembléia do povo julgava os crimes políticos; o Tribunal Areópago julgava os homicídios premeditados, incêndios, envenenamento, entre outros crimes punidos com a pena de morte; outro Tribunal era o Heliastas, competente para julgar os crimes comuns dos atenienses; e finalmente, o Efetas, julgava apenas os homicídios premeditados. Durante o curso do julgamento o acusado prestava juramento para não faltar com a verdade.

Os alicerces foram os ensinamentos filosóficos a partir da idéia de evitar injustiças, foi dado ao condenado a oportunidade de anular e questionar a sentença condenatória que contivesse algum erro. Vale salientar, por exemplo, em caso de falso testemunho ou algo sui generes.

Segundo o magistrado Arruda (2003, p. 84), uma vez apresentada a revisão, suspendia-se a execução da pena de privação da liberdade e da vida, mas o réu permanecia preso até o final deslance da súplica.

A jurisdição das causas era exercida pelo Senado. Todavia, ainda no escólio de Arruda (2003, p. 15), aos magistrados era facultado retornar à persecução, na hipótese de descoberta de novos elementos comprobatórios de culpa.

O instituto da revisão não adquiriu feição irrevogável, mesmo sendo absolutória a sentença. No entanto, a condenatória era imutável, diversamente do direito brasileiro contemporâneo.

2.2. NO DIREITO ROMANO

A busca da Verdade no Direito Romano sempre esteve intimamente ligada à participação do juiz. Estudiosos costumeiramente invocam-na de acordo com o sistema de governo e a depender do estilo de governo ela era combatida ou procurada.

O atual instituto Revisão é de feição moderna, porém, desde o início qualquer remédio era aceito contra uma sentença injusta. É notável a contribuição da civilização romana no Direito Penal, assim como gigantes no Direito Civil.

Segundo Aranha (2006, p. 231), o primeiro indício da Revisão ocorreu em Roma, pois ali existia a “indulgência principis”, um favor do soberano visando reparar injustiças, mas jamais um direito do condenado.

No estudo de Arruda (2003, p. 23), com relação ao Direito Romano:

“A legislação Romana disciplinou a revisão substancialmente. Emprestou-lhe caráter autônomo em relação à apelação”. É por tais motivos que não é errado mencionar que as raízes da revisão, bem como a doutrina, transcende em Roma. Era permitido qualquer tipo de revisão, sem especificar a matéria”.

Uma suplicação era aceita pelos condenados que entendessem que sua condenação não condizia com a verdade. Por isso, inicialmente, a revisão era considerada uma “licentia supplicandi”.

Queijo (1998, p. 16 apud AUGENTI, 1994, p. 68):

 “Em obra dedicada à revisão, assinala que alguns sustentam que os romanos não conheciam o transito em julgado da sentença. Afirma, porém, que os romanos conheciam o princípio pro veritate accipitur do julgado, ou seja, uma restitutio in integrum, nas hipóteses de violência contra o juiz ou contra a parte, falso testemunho ou falsidade de documentos, sobre os quais houvesse fundado a valoração da prova. Ressalta que a injustiça era tratada como uma espécie de nulidade de sentença. Desta forma, a qualquer tempo poderia ser obtida a declaração de ineficácia”.

Ainda, conforme Mossin (1997, p. 27):

“O ato decisório, a sentença, que era proferida pelo júri, através de regular votação, não estava sujeito a qualquer espécie de revisão, exceto à restitutio in integrum, a pronunciada por magistrado superior, em casos excepcionais e graves, como por exemplo, a incompetência da quaestio ou a inobservância de garantias fundamentais à defesa do acusado.”

A busca da verdade no direito romano estava fortemente vinculada à participação do juiz. Teóricos acreditavam que de acordo com o sistema de governo, é que a verdade era procurada.

No período denominado da Realeza, a partir da fundação de Roma, o rei exercia todo poder julgador, chamado de magistrado vitalício. Todas as investigações, a partir do conhecimento do crime, eram realizadas por ele com poderes ilimitados na pesquisa da verdade criminal, conforme cita Barros (2002, p. 53). A partir da República ocorreu a substituição dos reis pelos cônsules, que eram os juízes.

Naquele período surgiu a “Provocativo ad populum", que dava possibilidade para o juiz reexaminar o processo apresentado perante uma assembléia do povo. Diante de tal fato, era necessário, pela publicidade dada, que o juiz procurasse a verdade e julgasse fielmente de acordo com as provas apresentadas.

Para a obtenção da Revisão Criminal, no direito romano, três eram as hipóteses permissivas:

1 – Condenação com a descoberta posterior da inocência;

2 – quando o juízo condenatório se apoiasse em espúria prova de falso testemunho e/ou corrupção;

3 – quando a condenação profanasse de uma sentença iníqua;

Não se tem notícia, no tempo da República e em outras ocasiões, da Revisão Pro Societate. Já no Império, variados fatos prescindem à sua existência.

Arruda (2003, p. 17), fazendo referência ao caso envolvendo Cornelia, acusada de incesto e levada à julgamento em Roma:“Acusada de incesto, foi absolvida no primeiro julgamento (olim absolutam). Por ordem de Domiciano (Titus Flavius Domitianus), novamente foi acusada em juízo e, condenada, acabou enterrada viva, no campo dos celerados.”

É interessante acentuar a distinção entre absolvição pautada na inexistência do delito àquela proveniente de insuficiência de prova, e até mesmo decorrente de um erro, causando, neste caso, a renovação do juízo.

2.3. NO DIREITO CANÔNICO

A existência da Revisão no Direito Canônico está atrelada, essencialmente, à lei das Sete Partidas. Veja-se, no escólio de Romeiro (1964, p. 21):

“A existência da Revisão Pro Societate, na própria Lei das Sete partidas, sendo essa o embrião das posteriores teorias. Por sua vez, tinha o condão eminentemente para legislar quem fora alvo de acusação enganosa. Não expressava a verificação contra réus absolvidos.”

A Revisão Criminal naquele período poderia somente ser proposta quando não fosse admitido mais recurso (como ocorre atualmente), ou seja, após a imutabilidade da sentença. Porém a possibilidade de cabimento era se o julgado fosse injusto e oposto às leis, além de haver violação aos ensinamentos dos Cânones.

2.4. NO DIREITO FRANCÊS

Na civilização francesa a primeira idéia de revisar uma sentença ocorreu a partir de prováveis injustiças, naquele período, a revisão estava intimamente ligada aos réus, que exerciam o poder executivo e estavam totalmente fora da possibilidade de o Poder Judiciário reformar uma sentença. Era o rei quem exercia a jurisdição em todo sistema recursal de revisão criminal.

Ao fazer menção ao antigo Direito francês, assinala Vescovi (1988, p. 37): “sempre se admitiu um supremo recurso ao rei, em cujo nome se exercia o poder jurisdicional, especialmente quando o monarca adquire maior poder e a justiça feudal.”

A maior finalidade da Revisão Criminal, era não-somente corrigir o erro do Judiciário, mas também revogar qualquer sentença quando houvesse contrariedade de julgamentos. A Revisão Criminal Pro Societate era permitida.

Antes da Revisão dotada pelo soberano, a modalidade permitida era o duelo, por que a sorte das armas refletia a vontade divina; foi a partir do repúdio aos duelos que surgiu a Revisão exercida pela figura dos reis. Essa modalidade era o apelo.

Foi a partir daí que originou o recurso, ainda na Antiguidade, intitulado de “propositions d’erreus”. Andou bem Arruda (2003, p. 24) ao expor seus ensinamentos, aduzindo que:

“A ‘proposition d’erreur’ consistia num recurso susceptível de manejo em casos de erro de fato e, uma vez aceito, revestia-se do condão de infirmar a decisão hostilizada. A deliberação, em principio, tocava ao parlamento com a intervenção do réu ou de um representante do réu”.

No Direito francês, em 1789, a nomenclatura por vezes foi alterada, porém o intuito de dirimir erros e evitar as condenações e absolvições injustas, se manteve. Por ser uma forma de tornar público os julgamentos e ser um maneira de expressar a irresignação do ser humano houve períodos em que foi banida. Essa posição insuflou na população o espírito de galgar a verdade.

Com o código Três de Brumario permitia-se que a Revisão abarcasse somente crimes propriamente ditos, deixando de fora as contravenções penais.

Em 1867 foi concedida o manejo da revisão pelos herdeiros, como respeito aos que já faleceram, esse recurso era utilizado nos casos de erro de fato e uma vez aceito, revestia-se de renegar a decisão. Nesse sentido Mossin (1997, p. 29):

“Ao depois, uma lei de junho de 1867 aumentou seu campo de ação, permitindo em matéria correcional o seu emprego contra as condenações que exigem prisões ou que importem em privação parcial ou total do exercício dos direitos cívicos, civis e de família e admitia a revisão para aqueles que já faleceram”.

Contudo, com o surgimento de uma lei, em 8 de julho de 1895, instituiu o direito à indenização do inocente injustamente condenado, através do “lê droit à intemnite de I’innocent injustement condamné”. Esse instituto tinha como objeto erros de fato de qualquer espécie. Urge proferir que diante de tal disciplina, o Direito Francês era e tem servido de arcabouço legal e jurídico para tantas outras legislações adjacentes.

2.5. NO DIREITO ITALIANO

Heráclito Mossin (1997, p. 30 apud MANZINI, 1952, p. 26), sustenta que o instituto da Revisão inicia-se na Itália, sobrepujado pelo Direito Penal Francês: “Posto que não se possa negar que o instituto de revisão fosse conhecido na Itália antes da revolução francesa, é por outro indubitável que, essa, na sua forma moderna, chegou entre nos importada da França.”

Outro autor, Arruda (2003, p. 39), traz à baila o pensamento do mesmo renomado doutrinador italiano, ao versar que a notícia da primeira revisão ocorreu em 1623, no caso Foscarini, morto em 21 de abril de 1622, reconhecido como inocente e agraciado com a restituição da fama e honra, eis aqui o primeiro resquício da permissão da revisão, da legislação pátria em prol dos mortos.

O Código de Processo italiano, de 1865, nos tempos modernos, nasce com o resquício da legislação francesa; já a legislação de 1913 prescreve que a revisão poderia ser admitida nas hipóteses, abarcando inclusive a Revisão Criminal Pro Societate:

1. Descoberta de novas provas, mesmo após a condenação, desde que comprove que tal fato não existiu, que o condenado não cometeu e nem contribuiu para tanto;

2. Se a condenação foi proveniente de falsidade de provas ou de corrupção;

3.  Inconcialibilidade de fatos que fundamentam uma sentença com aqueles estabelecidos em outra sentença penal irrevogável.

Primorosamente, Mossin (1997, p. 23 apud AUGENTI, 1994, p. 167) expõe as hipóteses:

“A revisão de uma sentença de condenação por delito, prenunciada pela autoridade judiciária ordinária e tornada irrevogável, é em qualquer tempo admitida a favor do condenado nos seguintes casos: (1) se os fatos estabelecidos como fundamento da sentença de condenação não forem conciliáveis com os estabelecidos em outra sentença penal irrevogável de outra autoridade judiciária ordinária, ou de outra autoridade, excetuada a sentença de condenação, pronunciada pelo Senado e constituído em alta Corte de justiça; (2) se, depois da condenação, sobrevierem ou descobrirem-se fatos, ou novos elementos de prova, que só ou unidos aqueles examinados no procedimento, tornem evidente que o fato não subsiste, ou que o condenado não tenha cometido ou não tenha a ele concorrido; (3) se se demonstrar que julgado sobre a subsistência do fato ou sobre a prova que o condenado o havia cometido ou havia concorrido para ele foi efeito de falsidade em atos ou em juízo, ou de corrupção do juiz”.

Depois de outras reformas foi abolido, por exemplo, o sistema de absolvição por insuficiência de provas no juízo revisional e também a impossibilidade de revisão para reabilitação de condenado morto.  Com o final das Guerras Mundiais, num cenário de necessidade de paz, ordem e obediência, surgiu o atual Código Francês, prevendo as mesmas hipóteses já incluídas no art. 554 do código de 1965, já revogado.

2.6 NO DIREITO BRASILEIRO:

A Revisão Criminal é ultimo meio que pode ser agitado contra a sentença criminal, quando já não resta nenhum recurso ordinário. A Lei de 18 de setembro de 1828, em seu art. 6º, a instituiu na Carta Imperial. A competência para julgar tais ações era do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A revisão, naquele período, era permitida nos casos de manifesta nulidade ou notória injustiça. Além de não constituía empecilho ao reexame de sentenças absolutórias (Pro Societate), até mesmo pela inexistência de vedação constitucional.

Com o Código de Processo Criminal de 1832, foi vedada a revista em detrimento dos réus. Já com a reforma de 1841, Lei Nº. 261 passou-se novamente a consenti – lá.  A sentença poderia ser objeto de revisão caso contivesse: Conteúdo relativo a contrabando e reconhecimento de prescrição; as absolutórias por crime de Responsabilidade, e ainda com as quais o juiz de direito não se conformasse com o posicionamento dos jurados.

Passou a restringir a Revisão para os réus além de ter instituído em seu desfavor. A revisão, enquanto recurso era cabível nos casos previstos em lei, contra decisões absolutórias.

Com o início do período Republicano, a revisão passou a integrar o cenário jurídico com o cabimento somente contra sentenças condenatórias. Essa vedação na época fora entendida como consagração do individualismo e negligência aos direitos da sociedade, conforme escreve Arruda (2003, p. 36). A sociedade se insuflou com a possibilidade de ver-se acuada por criminosos e não estar protegida pela justiça, ao ser permissiva e maleável com os meliantes.

Com a Constituição de 1926, nova redação foi dada ao art. 58 inciso III, com o escopo de conseguir vedação constitucional a Revisão pro societate. O Código de Processo Penal (1941) não contempla a previsão de novo exame nos julgados absolutórios. É assegurado que, independentemente do julgado, a Revisão jamais pode ser em detrimento do réu.

Faria (1942, p. 214) preleciona que daí resulta que não comporta – a revisão de sentença absolutória, pela óbvia razão de ser instruída em desfavor do condenado. Seja qual for o motivo do decreto absoluto.

Com a Carta Magna de 1946, foi concretizada a revisão em favor dos condenados. Os erros, os enganos, os equívocos favoráveis ao réu, passada em julgado a sentença, beneficiam-no definitivamente.

Atualmente não existe vedação constitucional, com já mencionado, para permitir a Revisão em prol da sociedade. Ocorre que por opção do legislador infraconstitucional a Revisão Criminal só ocorrem em prol das sentenças condenatórias.

3. O ERRO DO JUDICIÁRIO

Numa visão geral e desprovida de caráter científico, erro é a falsa percepção da realidade, é o que é transviado da verdade. Segundo Aranha (2006, p. 186), “toda tarefa humana é falha, pois o erro sempre esteve presente na atividade do homem. Errare humanum est, já dizia o Cardeal de Polignac, repetindo frase maior de Cícero”. Portanto, pela falibilidade que o homem está sujeito, o ordenamento jurídico, de alguma forma, sofrerá com os reflexos de ser composto por homens.

O professor Oliveira (1967, p. 36/39) chega a mencionar as espécies de erro:

 “O erro judiciário pode ser considerado, em sentido amplo, toda falha processual, mesmo no ato decisório, que constitui erro que praticam as partes, ou as pessoas chamadas a compor os trabalhos na justiça. Em sentido restrito, o erro do judiciário consiste na verificação de que o pronunciamento da Justiça esta afastado da realidade dos fatos, conforme evidenciam outros elementos probatórios, colhidos após o encerramento da causa.”

Muitas vezes a sociedade é surpreendida com erros do Judiciário, seja no modo de proceder com a instrumentalização do Direto, seja com a própria conceituação dos juízos de valor ao julgar. A absolvição injusta é prejudicial a toda sociedade que passa a não acreditar na justiça e na eficácia do sistema penal.

Queijo (1998, p. 54 apud VANNI, 1989, p. 184), assegurou:

 “O Direito a revisão atende a uma exigência de ordem prática: a falibilidade humana é uma realidade, e reconhecê-la é um ato de inteligência. Melhor é regulamentar a forma de corrigir o erro do judiciário. Observa o mesmo autor que nos sistemas ditatoriais acoberta-se o erro do judiciário pela coisa julgada. Afasta-se a ocorrência dos erros judiciários porque o déspota não erra. Neste quadro a revisão mostra-se uma garantia da pessoa humana, presente na democracia”.

Tanto a ordem jurídica, como o clamor da ordem pública, não pode permitir que tais discordâncias com a realidade fática e com a norma fiquem sem qualquer correção. A partir da manutenção da ordem objetiva e subjetiva da eficácia das penas, da busca da verdade, e também procurando preservar princípios como ampla defesa e a segurança jurídica, que foram criados o Instituto da Revisão Criminal com o intuito de que a injustiça não sobrepuje a justiça.

Nessa mesma linha assegura Mossin (1997, p. 28) que “A correção proposta pelo legislador objetiva, sempre, fazer com que a justiça prepondere sobre a injustiça, que advém do erro do juiz em compor e solucionar o conflito intersubjetivo de interesses de natureza penal”.

A existência da Revisão está condicionada ao erro do Judiciário. É a própria justificativa juntamente com os efeitos da coisa julgada. Inúmeras causas podem dar ensejo ao erro no judiciário, porém a conseqüência não atingirá somente o juiz responsável pelo erro, mas a toda sociedade. Pelo fim do Direito não se pode corroborar com um engano e não solucioná-lo.

Nos ditames de Cícero e da sabedoria popular “errar é humano”, mas permanecer no erro é Burrice. Pode-se inferir que a admissibilidade da Revisão das Sentenças Condenatórias já é uma retificação desse quadro. Porém, não admitir a Revisão das Sentenças Absolutórias fundadas em Erro do Judiciário, seja pela utilização de provas falsas ou ainda falso testemunho, é semear a discórdia, dando insegurança a toda uma sociedade pela perda da eficácia das penas.

Como já explicitado, a falibilidade do juiz é algo susceptível de ocorrência, pelo simples fato de se tratar de um ser humano, ele não está imune à eventuais falhas.

Os erros na atividade jurisdicional podem ser classificados com “errores in procedendo” e “errores in judicando”, ou seja, erros cometidos no procedimento utilizado ou na fundamentação descabida de sua decisão, a própria sistematização de juízos de valor, permitindo, assim, futuras discussões quanto a seus atos e decisões.

Erro in procedendo ocorre quando a conduta dos litigantes processuais tramita em desacordo com o procedimento do direito material a ser aplicado, podendo ser de modo diverso daquele prescrito em lei ou ainda contra a lei.

Calamandrei (2000, p. 62) define os errores in procedendo:

 “Produz-se então uma inexecução da lei processual, enquanto alguns dos sujeitos do processo não executam o que esta lei lhes impõe (execução in omittendo), ou executa o que esta lei lhes proíbe (inexecução in faciendo), ou se comportam de um modo diverso do que a lei lhes prescreve: esta inexecução da lei processual constitui no processo uma irregularidade, que os autores modernos chamam um vício de atividade ou um defeito de construção, e que a doutrina do direito comum chamava de error improcedendo”.

Já o Erro in judicando é o próprio erro de direito e de fato, produzidos no ato de julgar. Geralmente ocorre quando uma norma é expressa incorretamente, portanto, pode-se entender que diz respeito à justiça da sentença, a qual não interfere na sua validade, sendo objeto sim, de reformulação.

Ocorre que a má apreciação da questão de direito ou de fato, impõe a reforma da decisão. O cerne da questão cinge-se no erro ao proceder, eis que este seria um vício na atividade jurisdicional, o que implicaria na invalidação (nulidade) da decisão. O que se pretende demonstrar é que a reforma da sentença tomada pelo erro, ao julgar, deve abranger também as que absorvem os culpados.

A preservação da segurança jurídica será em consonância com a segurança social, ao passo que deverá ser aplicada quando acontecerem erros, em caso de errado juízo de valor, com disposições taxativas. Poderá ser então proposta quando o juiz permitir e utilizar como motivação da sentença provas falsas e meios ardilosos que as testemunhas utilizam para convencer o titular da prestação jurisdicional.  

O professor Santos (1997, p. 42) ensina que:

"A violação de literal disposição de lei é aquela que ofende flagrantemente a lei, tanto quando a decisão é repulsiva à lei (error in judicando), como quando proferida com absoluto menosprezo ao modo e forma estabelecidos em lei para a sua prolação (error in procedendo)."

Uma subespécie do Erro in judicando é a prestação do Direito lastreado em um falso juízo de valor sobre a norma. É a própria aplicação equivocada da lei numa dita situação.

A outra bifurcação do Erro in Judicando é o de fato que ocorre quando é expresso um falso juízo em torno da prova. O erro em referência se dá quando o legislador insculpe no julgado uma falsa descrição do estado das coisas.  Este tipo de erro, como condição básica, deve versar sobre a existência do meio probatório e sobre as questões fáticas discutidas na relação processual.

Após o estudo da conceituação dos Erros do Judiciário e de suas espécies, é interessante analisar as causas prováveis que determinam o Erro in Judicando, até por ser o único erro que fundamenta a Revisão Criminal. O ponto ensejador da Revisão Criminal pro Societate não condiz com Erro ao julgar, assim como em caso de suborno ou corrupção do juiz, que determinaria um erro propositado.

A confissão vem sendo utilizada como a "Rainha das Provas", porém deverá o Juiz averiguar a sua autenticidade. O que pode ocorrer, a ponto de causar um erro, é a valorização não crítica da confissão. O próprio Código de Processo Penal exige, no art. 197, que esta deva ser confrontada com as demais provas do processo, verificando se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância. Esse motivo pode autorizar a Revisão das Sentenças Absolutórias, caso o agente confesse a prática do delito e o conjunto de circunstâncias evidencie que a confissão corresponda à realidade dos fatos.

A confissão não poderá ser por meio da coação física ou moral. Até mesmo por ser uma Garantia Constitucional ninguém ser submetido ao tratamento desumano ou degradante.

A busca da verdade deve ser pressuposto do processo. A mentira é uma das causas que faz alvorecer erros. Pessoas são arroladas para depor em juízo, com a finalidade de mentir, afirmando o que não sabe e muitas vezes negando a verdade. E não se intimidam quando o juiz esclarece que caso fale algo diverso da realidade responderá pelo crime de falso testemunho.

E esse é exatamente um dos motivos taxativos do art. 621 do CPP, mais precisamente no inciso II, que é quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos e documentos falsos. O cerne da questão é que ao ser permitido quebrar a intangibilidade da Coisa Julgada, quando comprovados erros que foram causados pela utilização de falsos testemunhos e provas desprovidas de veracidade nas sentenças condenatórias, não há motivos para não ensejar a Revisão contra as Sentenças Absolutórias. Princípios como Paridade das Partes e Verdade Real devem ser invocados, pois em prol do bem comum e sobrepujando o interesse do condenado, quando esse não é merecedor de liberdade.

Cumpre repisar, que não raramente pessoas são arroladas a depor em juízo com o intuito de afirmar o que é falso ou ainda negar o que é verdadeiro. Nos ditames de Arruda (2003, p. 55): “Novos subsídios probatórios idôneos podem descortinar, eventualmente, ser a realidade fática divergente da situação reputada como tal nas razões de decidir”.

Outro fator que pode causar erro é a valoração não crítica das Provas Periciais. Os juízes e os tribunais depositam uma fé enorme nos exames periciais, ao passo que, os titulares do exercício desses exames são seres humanos e, portanto, passíveis de erros. Esse deve ser utilizado também como mais um meio de prova.

Oliveira (1967, p. 36/39) prega que:

“Os peritos calígrafos encarregados do cotejo das letras podem ser responsabilizados pelos erros judiciários que exames podem ensejar. (…) Em nenhuma outra especialidade tem tantos pseudoperitos que fazem alarde de erudição, já que também nela é valida a regra de que a segurança e a arrogância do perito esta em relação inversa ao seu saber (…). As perícias dependem de especializações cientificas e não oferecem margem de exatidão, mormente as que se baseiam na arte grafologia.”

Conclui-se, deste modo, que havendo erro judiciário, há conflito entre o juízo de valor lançado na instrução probatória e na interpretação da norma em face da descoberta da verdade real, pois muitas vezes a autoria e materialidade no delito não coadunam com a verdade real, e este é mais um motivo que não se deixe em liberdade aquele que não é merecedor desse direito.

4. A REVISÃO CRIMINAL

A palavra Revisão vem do verbo rever, que significa examinar novamente. Na acepção jurídica significa reexame do que fora decidido anteriormente, com o fim de excluir algum erro ou vício. Seria pecaminoso privar aos interessados uma solução para tornar justo, o que foi mal sentenciado.

O que se pretende com a Revisão Criminal é tornar a decisão fidedigna com a realidade dos fatos. Mais do que um instituto, é uma medida de cunho social que visa à reparação de sentenças injustas.

Segundo Tornaghi (1981, p. 385): “É o remédio dado pela lei para o desfazimento da Coisa Julgada no caso de ser ou ficar evidente a ocorrência de um erro”.

Enquanto não transitada em julgado, a sentença é combatida por via de apelação e, posteriormente, conforme seja o caso, por recursos especial ou extraordinário. Além disso, a Revisão Criminal não suspende a execução da sentença condenatória nem mesmo em trâmite de recurso que não produz efeito suspensivo, que só pode ser encontrado através do recurso especial e extraordinário.

A Revisão Criminal não se confunde com o Recurso por ser remédio que ataca uma decisão acobertada pelo efeito da Coisa Julgada; é exatamente por esse ponto que a Natureza Jurídica da Revisão é tão discutida entre os doutrinadores, em se tratando de um Recurso ou uma Ação.

A Revisão Criminal, no Código de Processo Penal Brasileiro, está situada entre os Recursos, o que faz muitos entenderem ser ela um meio impugnativo. Entre os autores que defendem ser o instituto um recurso encontra-se Raniere (1965, p. 347) que entende ser um recurso extraordinário de impugnação: “Revisão dos julgados é um meio extraordinário de impugnação com o qual se pede à Corte de Cassação o anulamento total de uma sentença irrevogável de condenação”.

O que se objetiva demonstrar é que a Revisão Criminal é um recurso Extraordinário, ao passo que visa a reparar um vício de uma sentença já despachada e transitada. E trazendo à baila o entendimento de que não seria um Recurso Ordinário, pois estes estendem-se até as sentenças não transitadas em julgado.

Em harmonia com esses argumentos encontram-se Espínola (2006, p. 352) e Castro (1943, p. 265) que asseguram ser essa a natureza jurídica desde a instituição da Revisão no Direito. E ainda Rosa (1982, p. 735), que garante que um recurso fosse, transcenderia a idéia de ser um recurso Extraordinário, uma vez que se aplica a idéia de que a revisão será um novo exame ao processo julgado, que voltara ao estágio de decidir, com o intuito de reformá-lo parcialmente ou totalmente.

Queijo (1998, p. 93) chega a criticar o posicionamento de ser um Recurso:

“A crítica que se faz é que, não obstante opinem no sentido que a revisão tem natureza jurídica de recurso, os autores não sustentam doutrinariamente as razões do referido posicionamento, limitando-se a afirmar, peremptoriamente, que a revisão criminal é recurso.”

Recurso é a impugnação de uma sentença dentro da mesma relação jurídico-processual. É mais acertado entender a natureza da Revisão Criminal como uma Ação autônoma, pois forma outra relação jurídica. Possui o escopo de desconstituir a sentença, juízo rescindendo, e substituí-la por outra a ser emanada pelo juízo rescisório.

Nesta mesma esteira entende o Moreira (1974, p. 187), ao fundamentar que:

“O recurso é o meio de impugnação que faz prosseguir o processo que já vinha tramitando. Os recursos são utilizados antes da formação da coisa julgada, com a finalidade de impedir a sua formação ou, mesmo, de retardá-la. Já as Ações Autônomas de Impugnação somente são admitidas nas hipóteses taxativas previstas em lei e não fazem prosseguir o mesmo processo em que foi proferida a decisão atacada. Ao contrário, dão lugar à instauração de um novo processo. A diferença fundamental entre o recurso e a Ação autônoma é ser imprescindível ter-se a Coisa Julgada”.

A Revisão Criminal é, portanto, uma Ação, ao passo, que visa a desconstituição de uma sentença e tem como pressuposto básico incidir sob a coisa julgada. È notória a formação de uma nova relação jurídico-processual, além de ter características de não ser um ato exclusivo de uma parte.

Para consubstanciar o tema, ressalta Teodoro Júnior (2005, p. 613/614):

“O recurso visa evitar ou minimizar o risco de injustiça do julgamento único. Esgotada a possibilidade de impugnação recursal, a coisa Julgada entre em cena para garantir a estabilidade nas relações jurídicas, muito embora corra o risco de acobertar alguma injustiça latente no julgado. Surge, por ultimo, a ação rescisória que colima reparar a injustiça da sentença transita em julgado, quando o seu grau de imperfeição é de tal grandeza que supere a necessidade de segurança tutelada pela res iudicata.”

A controvérsia de sua natureza jurídica é tema pouco relevante diante do fim que se destina à Revisão: desconstituir uma decisão e beneficiar um condenado (somente a espécie admitida do Direito Brasileiro) ou ainda toda a sociedade.

A decisão condenatória reconhece a prática de um ilícito, impondo-lhe uma sanção. Aranha (2006, p. 233) desta mesma forma preleciona:

“Reconhecendo no todo ou em parte procedente a peça acusatória, portanto a Ação Penal declara o acusado incurso num determinado dispositivo da lei penal impondo-lhe a sanção correspondente, salvo, é obvio, os casos excepcionais como o perdão judicial.”

Uma das espécies de Revisão Criminal, Revisão Pro Societate, é alvo de constantes embates doutrinários sobre a possibilidade de cabimento. A outra espécie de Revisão Criminal é aquela em prol o réu, a única admitida no Direito brasileiro.

4.1. A RES IUDICATA

Conflito de interesses qualificado pela pretensão resistida gera uma lide, conceito clássico inserido por Carnelutti (2000, p. 211). Ela pode ser solucionada por meio da prestação jurisdicional do Estado, buscando integrar, preservar ou ainda satisfazer direitos e a justiça, ao instrumentalizar tal direito material através do processo, que é seguido por um rito específico e com a observância de certas formalidades, a ponto de garantir que a prestação jurisdicional seja feita de maneira rápida e legal, preservando a segurança jurídica e social.

A partir da solução do litígio é que se da o primeiro passo para a Coisa Julgada. É através desse instituto que a sentença adquire caráter de imutabilidade e intangibilidade, que só é possível quando dada à impossibilidade de ir ao encontro das vias recusais.

A decisão, que não cabe mais recurso, deve expressar verdade e justiça, é o que impõe a sua irrevogabilidade, adquirindo caráter de Coisa Julgada. A Res iudicta compõe o rol de direitos fundamentais da Constituição Federal (2006a, p. 35) conforme o disposto no art. 5o, XXXVI: “A lei não prejudicara o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Porém o que ocorre é que muitos doutrinadores costumam adotar posicionamentos fidedignos à expressão literal do dispositivo, ao ponto de não conceber que a Coisa Julgada possa ter seu caráter de irretratabilidade relativizado. É interessante notar que a Carta Magna, ao prescrever o inciso, quis configurar que a lei não prejudicará a Coisa Julgada. É exatamente impor limites objetivos à irresignação humana em não se conformar com decisões desfavoráveis. Ao passo que serve de orientador para o legislador ordinário em que suas elucubrações não possam afetar a Coisa Julgada.

Para a melhor compreensão do tema, mister se faz trazer à baila as lições de Liebman (1987, p. 54), quando distingue coisa julgada de eficácia da sentença:

“A autoridade da Coisa Julgada, que se pode definir, com precisão, como a imutabilidade do comando emergente de uma sentença. Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrario, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que reverte o ato também em seu conteúdo e torna assim imutáveis, além do ato em sua existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam do próprio ato.”

A Coisa Julgada pode ser vista sob duas modalidades: formal ou material. A última está ligada a imutabilidade dos efeitos materiais da sentença de mérito, podendo ser essa meramente declaratória, constitutiva, condenatória ou ainda absolutória. Os efeitos da sentença acompanham a vida dos envolvidos no processo quer implicitamente ou explicitamente¸ mesmo depois deste extinto. Enquanto que a primeira é a própria internalização do âmago processual. Esta ligada a sentença como ato processual, não podendo ser substituída por outra.

Santos (2005, p. 318/319) conceitua a coisa julgada formal como:

“Não mais suscetível de reforma por meio de recursos, a sentença transitada em julgado, tornando-se firme, isto é, imutável dentro do processo. A sentença, como ato processual, adquiriu imutabilidade. E ai se tem o que se chama coisa julgada formal, que consiste no fenômeno da imutabilidade da sentença pela preclusão dos prazos dos recursos.”

E o mestre Couture (1985, p. 55) destaca o que vem a ser Coisa Julgada Material:

“A coisa Julgada Material se apresenta quando a condição de inimpugnabilidade, mediante recursos se agrega a condição de imodificabilidade por qualquer procedimento posterior, dizendo-se assim, que há coisa julgada substancial já que nenhuma autoridade poderá modificar esse resultado”.

A legislação Processual Penal não faz menção ao que vem a ser a Coisa Julgada, porém por força da subsidiariedade da norma, aplica-se a definição do que vem a ser esse instituto por força legal do artigo 467 do Código de Processo Civil (2005, p. 22), denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário, na legislação penal.

O art. 436 do Anteprojeto de Código de Processo Penal de 1970, elaborado por Marques (1970, p. 74) prescrevia: "Coisa julgada é a qualidade que torna imutável e indiscutível o efeito da sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário".

Nesse anteprojeto, a Revisão Criminal era admitida de duas formas, portanto maneiras diferentes de retirar a imutabilidade da Coisa Julgada, ao passo que o juízo rescindendo e rescisório ganharam feições mais contornadas.

No processo penal brasileiro a revisão das Sentenças Absolutórias, fim precípuo deste estudo, não é permitido, por isso é comum chamar as decisões desta natureza de Coisa Julgada Soberana.

Quando se propõe a ingressar com a Revisão Criminal, deve-se, portanto, verificar se a Coisa Julgada realmente está presente. O mestre Tourinho (2006, p. 451) entende que:

“Pressuposto primordial da revisão é a existência de um processo criminal com sentença condenatória transita em julgado. Assim, desde que alguém tenha sido condenado, pouco importando a pena, sendo despicienda a circunstância de ter sido esta cumprida ou não, se a sentença se tornou insuscetível de reexame, seja porque ficaram preclusas as vias recursais, seja por terem sido percorridas todas as instâncias, satisfeita estará a primeira condição de admissibilidade no juízo revisional. Se da decisão condenatória for interposto recurso extraordinário, poderá ser requerida a revisão? Os nossos autores, citando Espínola Filho, respondem negativamente, uma vez que, embora o apelo excepcional não tenha efeito suspensivo. (…) O certo e recerto é que não se pode falar em processo findo, tal como exige o art. 621, se pender recurso extraordinário. A resposta, então, é esta: evidentemente não!”.

As Sentenças condenatórias, para serem apreciada pelos tribunais como matéria de Revisão Criminal, exige-se a Certidão de Trânsito em Julgado. Por ser a Revisão Criminal uma ação de natureza desconstitutiva, cujo interesse de agir, ex vi do art. 621, do Código de Processo Penal, somente nasce com o trânsito em julgado da sentença condenatória e, portanto, quando findo o processo, seu ajuizamento desacompanhado de certidão da ocorrência do mencionado fenômeno jurídico-processual autoriza o indeferimento da petição inicial e a extinção do feito sem solução do mérito, mormente quando não atendido chamado para corrigir a deficiência.

4.2 HIPÓTESES DE CABIMENTO

A Revisão Criminal vulnera a imutabilidade das sentenças que são acoimadas pela Coisa Julgada. Até aqui, foi verificado que é imprescindível as figuras do Erro do Judiciário e a Coisa Julgada para ensejar existência da Revisão Criminal. Mas critérios objetivos foram abarcados pela legislação processual penal, no sentido de garantir maior efetividade e também permanecer sobre o manto da segurança jurídica.

Para não dar margem a incertezas, o legislador foi Taxativo ao permitir a Revisão dos julgados; essas hipóteses de Cabimento estão elencadas no Art. 621 do Código de Processo Penal (Brasil, 2007), o que deve haver a maior fundamentação, numa das hipóteses do dispositivo.

Nessa linha de intelecção, assegura Mossin (1997, p. 24):

“Assim sendo, o legislador processual penal delimitou o âmbito de incidência da Revisão Criminal, fixando, de modo expresso, as hipóteses de cabimento deste remédio excepcional, só permitindo quando estiver ele ajustado aos casos taxativamente enumerados. Enfim, o numerus clausus da revisão criminal, além de ostentar maior rigor cientifico, deixa de lado aquele cunho casuísta abraçado pela legislação processual antiga”.

É um posicionamento pacífico tanto nos tribunais, quanto pelos doutrinadores penais, que as hipóteses de cabimento da Revisão Criminal são taxativas, não podendo ter esse rol ampliado para garantir que as incertezas nos julgados não sejam sentimentos presentes na legislação pátria e entre os condenados, uma nova chance de poder ter a autoria e materialidade delitiva desconstituída e negada.

A primeira hipótese: A decisão condenatória for contraria a lei ou a evidência dos autos. Ao mencionar contrariedade à lei, pretende-se atentar para que a decisão além de afronta – lá, transgrida-a também.

No entanto, o que fundamenta o inciso I para ser causa de pedir da Revisão, confunde-se com o objeto do Recurso especial, claro, que o último com suas especialidades próprias para admissibilidade. O objeto do Recuso Especial é reexaminar decisões proferidas em única ou última instância que se consubstancia com o princípio do duplo grau de jurisdição, tendo como matéria ofensa a lei infraconstitucional. As hipóteses de Cabimento desse recurso estão previstas no inciso III, art. 105 da Constituição Federal, são elas: 1. Julgar a decisão que contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; 2. Julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face de lei; 3. Der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído o tribunal.

Florêncio de Abreu (1945, p. 425) utiliza esse argumento, ao passo que observa as hipóteses de sentença condenatória contrária ao texto expresso da lei penal bem como a de sentença condenatória contrária a evidência dos autos, ambas previstas no art. 621 do diploma processual penal, como casos impróprios de revisão. A hipótese de sentença condenatória contrária ao texto expresso da lei penal é de cassação. Tanto assim, que se houver decisão em recurso especial a respeito da matéria o pedido revisional estará prejudicado.

Queijo (1998, p. 207) assegura que:

“A rigor a hipótese de revisão em razão da contrariedade a texto expresso da lei penal deveria ser suprimida. Referida hipótese coopera para que se vislumbre na revisão uma terceira ou quarta instancia, desvirtuando-a. Ademais, a matéria (contrariedade a texto expresso da lei penal) poderá ser objeto de recurso especial, instrumento adequado para tal fim”.

Porém, o legislador quis dar nova chance ao condenado, uma vez que, para intentar a Revisão é necessário que ela esteja acobertada pelo manto da Coisa Julgada. Essa nova apreciação ao judiciário é mais uma forma de se irresignar a ofensa à lei, privando a liberdade de um individuo ou ainda o prejudicando no período que passará cumprindo sua sanção penal.

Então, o motivo ensejador da Revisão pode ocorrer quando a decisão contrariar a realidade do preceito legal, ou ainda não aplicar o que a lei estabelece. A violação a lei é também ofensa à ordem pública e ao princípio da legalidade. O magistrado ao incorrer nesse erro, despreza regras de hermenêutica, não aplicando silogismos e princípios de ordem constitucional.

No escólio de Rosa (1942, p. 126) sobre a Ofensa a lei:

“É necessário que dita sentença tenha sido proferida em sentido contrario ao que vem disposto expressamente no texto legal, isto é, ao que vem disposto de maneira terminante no seu conteúdo, contrariando a sua matéria, razão de ser, o seu objetivo ou finalidade”.

Dessa forma ocorrerá o erro in iudicando uma vez que a sentença ofende e desrespeita preceitos legais. O pedido revisional terá portanto escopo quando o provimento dado afrontar o valor da norma jurídica. 

Outra distinção que merece destaque é que definição errada do fato praticado, não pode ser confundida com má interpretação. Esses primeiros são erros de fato, em que as normas não são aplicadas como o fato realmente ocorreu são aplicadas e já a má interpretação pode ocorrer quando a lei é aplicada de maneira incorreta; como um erro no cálculo da pena não dosando como no art. 59 e 68 do Código penal impõe (tudo de acordo com o que versa a norma) são, portanto, verdadeiras questões de direito.

Causa de pedir com fulcro no inciso I do art. 621, seria caso o magistrado aplicasse uma pena diversa da constante na tipificação penal, ou ainda se excedesse na aplicação de crimes quando o réu, efetivamente só foi materialmente culpado por um. Ou seja, transcende a objetividade, entrando em subjetivismo e suposições.

Um outro ponto a ser abordado é quando a jurisprudência muda de posição ou em alguns casos, aplica posição controvertida, não é motivo ensejador para revisão, e muito menos pautado na hipótese de cabimento do inciso I, do art. 621.  A súmula 343 do STF versa que: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição da lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. Diversos julgados têm se voltado a não aceitar como cabimento da ação quando a decisão tenha adotado posição não predominante na aplicação de alguns dispositivos.

Outra parte do inciso I é: A sentença condenatória for contrária à evidência dos autos, no qual a decisão que proveu a pretensão de julgar o delito esta contrária à provas dos autos, que deve mostrar-se antagônica com o que a lei preceitua.

Não se pode, portanto, confundir a prerrogativa que o juiz tem de formar sua convicção pela livre apreciação das provas e a incursão na fundamentação da decisão apenas duas modalidades de provas. Ora, o magistrado pode não valorar tanto uma prova pericial, mas se atentar com a confissão e as provas testemunhais, que ao contrário versam, que o crime foi materialmente realizado.

O que poderá existir é a oposição de provas, uma vez que a relação processual é formada pelo pólo ativo e passivo, que se consubstancia pelo direito à ampla defesa e ao contraditório. Pode-se trazer à baila o caso de existir duas versões sobre um determinado fato, e o juiz escolhendo uma delas, não há contrariedade a evidência dos autos.

O doutrinador Abreu (1945, p. 425) entende que o cabimento da revisio com esse fundamento, é a apreciação dos autos do processo pela terceira instancia, com as mesmas provas já apreciadas.

O fim precípuo do direito é a efetiva prestação jurisdicional que só pode ser realizada com a verdade. Evidência nos autos significa certeza, portanto, a finalidade desta parte do inciso, que é justamente verificar e apreciar as provas e que a decisão seja correlata com o que versa os autos do processo.

Noronha (1982, p. 22) entende que embora a sentença não acolha a versão predominante não haverá sentença contrária a evidência dos autos. Isto porque a escolha da versão a ser acolhida encontra-se no âmbito do livre convencimento do julgador. O que não significa que este não esteja isento ao controle de normas jurídicas.

Após superada a ceara de livre convencimento, é importante ressaltar, a não adequação das provas e fatos que impõem dúvidas. É notório neste caso que, a verdade não foi encontrada em toda fase probatória ou ainda não foi apreciada de maneira correta provas apresentadas.

Ora, se a má utilização das provas é fundamento para demonstrar a improcedência da ação que deu origem à pretensão ou ainda, concluir que não está provada a acusação, encontra espaço neste certame a revisão de uma sentença absolutória contrária aos autos.

O art. 621 prevê a possibilidade de revisão, no inciso II: Sentença condenatória fundada em documentos, exames ou documentos comprovadamente falsos. O legislador preferiu não adotar a expressão prova falsa, enumerando as hipóteses de falsidade.

O que se verifica com o exame das provas é que a pretensão punitiva não poderia ter sido proclamada, uma vez que, os elementos probatórios tinham a intenção de desencadear a absolvição ou ainda a improcedência da acusação.

Para conseguir alento é necessário que a incursão de provas falsas tenham alterado o conjunto probatório total. A doutrina é divergente, entre eles Oliveira (1967, p. 164), Noronha (1989, p. 383) e Marques (1970, p. 348), entendem que além do subsidio e utilização de provas falsas, a sentença deve ser contrária aos autos.

Uma outra parte da doutrina, entre eles Faria (1942, p. 311), Aranha (2006, p. 248) e Capez (2005, p. 35), pairam o posicionamento permitindo a revisão fundamentada na exclusividade de provas falsas. Esse é certamente o entendimento mais correto e a real intenção do legislador, pois ele não teria enumerado a hipótese de provas falsas, em artigo diverso da contrariedade dos autos. É interessante acentuar que os documentos, depoimentos e exames falsos devem ter servido de lastro para a condenação ou até agravamento da pena. Capez (2005, p. 59) acentua que:

“A prova de falsidade deve ser colhida em processo de justificação, sentença declaratória, processo criminal por falso testemunho ou falsa perícia etc. Nunca, porém, será admitida discussão e controvérsia sobre a validade da prova no próprio processo da revisão”.

Não basta a falsidade, é preciso, também, que tenha sido o suporte da decisão condenatória; apoio da condenação.

A primeira oportunidade do juízo rescisório ocorre quando o erro advier de depoimento falso, que é aquele que embora eivado de inverdades passa como se verdadeiro fosse. Nesse caso a Verdade Real foi alterada ou não foi buscada durante o curso do processo.

Uma segunda parte do inciso menciona que a decisão pode estar consubstanciada em exames comprovadamente falsos. Essa palavra foi utilizada para designar perícia, que significa diligência realizada ou executada por peritos, a fim de esclarecer ou evidenciar certos fatos de forma científica e técnica. É um meio para se verificar a verdade sob o ângulo de pessoas com inenarrável capacidade ou ainda, experiência na matéria. 

As perícias são utilizadas como mais um meio de convencimento do juiz, em que durante a fase probatória elementos técnicos e que necessitam de conhecimento especial são trazidos à baila, para esmiuçar toda e qualquer dúvida em torno da autoria do delito. Porém muitas vezes, ela é valorada como único e preponderante prova para embasar o fundamento da sentença.

A falsa perícia, como pressupõe o cabimento da Revisão Criminal, pode ocorrem quando pessoas não aptas atestam o laudo pericial ou este pode ser viciado com mentiras, ou ainda meios que favoreçam ou desfavoreçam o acusado. Ou seja, o laudo pericial deixando de retratar a verdade ou ainda que foi adulterado para passar como verdadeiro. Pode ocorrer também que pessoas que não possuem a aptidão técnica correta para constatar, como um laudo necroscópico por alguém que não seja formado em medicina ou ainda um exame grafotécnico por alguém que não tenha habilidade para identificar.

A última parte do inciso indica a revisão quando essa se fundamentar na utilização de documentos comprovadamente falsos, podendo ser públicos ou particulares. Para Tourinho (2006, p. 499):

“Não basta a existência de um depoimento mendaz, de um exame ou documento falso. É preciso, isto sim, que o juiz, ao proferir a decisão condenatória tenha-se arrimado no depoimento, nos exames ou documentos comprovadamente falsos. A falsidade não vai ser apurada, investigada no juízo revidendo. Cabe ao requerente encaminha-lhe a prova da falsidade a fim de que o juízo revindendo simplesmente se limite a constatar a falsidade”.

O inciso III destaca: quando forem descobertas após a sentença, novas provas de inocência ou de circunstância que determine ou autorize a redução da pena, após a sentença do condenado. Neste caso, é imprescindível entender que na época da sentença, o julgador ignorava esse novo fato provado ou nova prova das mesmas hipóteses fáticas apresentadas.

Em tese irá ocorrer um novo julgamento, como novas valorações das provas apresentadas. Na época, o juiz de primeiro grau ou o tribunal a desconheciam, não sendo causa portanto, de erro in judicando. São permitidas quaisquer provas novas, desde que produzidas por meios legalmente admitidos.

Provas Novas são aquelas que são novidade para o processo ou para a justiça, ou seja, fora dos autos. É requisito que seja novidade o conteúdo da prova. O que não é permitido aquelas já apresentadas e valoradas, mas com outra linha de argumentação sejam utilizadas para o cabimento da Revisão. Seria transformar a Revisão numa segunda Apelação.

O pedido pode ter a pretensão de provar a completa inocência do condenado, mas pode ocorrer também, pelo livre convencimento que o juiz apenas reduza a pena. Tal fato pode suceder em qualquer das espécies de revisão, a Reformatio in Mellius.

Os motivos narrados são ensejadores de tanto a Revisão das sentenças condenatórias, como fato para permitir a revisão em prol da sociedade.

5. REVISÃO PRO SOCIETATE

A revisão Pro Societate é aquela em que as Sentenças Absolutórias com transito em julgado com erros in iudicando podem ser reformadas ou ainda revisadas. A legislação brasileira não a admite. O objetivo é desvendar se os argumentos atinentes a admitir a revisão somente em prol do réu são válidos ou se deve ser admitida igualmente pro réu e pro societate.

Juristas respeitáveis, como Barbalho (2006, p. 476) possuem posturas que clamam pela revisão das Sentenças Absolutórias transitadas formalmente, pela justiça que se pretende alcançar com os litígios e ainda quando a absolvição consubstancia-se pela apresentação de falsos documentos e testemunhos.

“O erro do judiciário tanto pode verificar na condenação como na absolvição e – se no primeiro caso a reforma da sentença é um indispensável direito da inocência sacrificada e uma das mais imperiosas obrigações da justiça oficial, força será convir, quando ao segundo, que esta está no seu direito se reconhecendo que tem escapado à merecida punição um criminoso, que o magistrado absolveu por falsa prova, reformar essa injusta absolvição. Justiça é sim, mandar em paz o inocente perseguido, mas é também castigar o culpado reconhecendo como tal. E se este em dados iludiu a justiça ou se ela se enganou-se ao absolvê-lo. A punição dos criminosos é condição da segurança geral e a autoridade publica trai a sua missão e compromete os mais altos interesses e deveres da sociedade, quando tem contemplações com o crime. Num caso, proclamado inocente o injustamente condenado, a sociedade o reabilita e paga-lhe uma dívida; no outro, fazendo recair a pena legal sob o criminoso falsamente considerado inocente, a sociedade desafronta a justiça e defende outros inocentes, os demais membros da comunhão, que nela descansam, na confiança de serem protegidos contra os criminosos”.

Mossin (1997, p. 77 apud FERRI, 1933, p. 218 ), citando Ferri, importante positivista que sempre defendeu a revisão pro societate tece comentários acerca de sentimentalismos que afastam essa pretensão e impõem ao sistema penal característica brandas que tiram o caráter tanto preventivo como repressivo.

“A denegação da revisão, diz bem Ferri, em dano dos que foram julgados, é exatamente a conseqüência de um sistema que nós faremos voto para vê-lo desaparecer: o sistema de considerar os acusados, também depois de remetidos ao plenário e mesmo depois de uma condenação, antes como vitimas perseguidas, de cuja salvação precisa-se cuidar e assegurar a todo custo, do que como parte adversa à sociedade nos processos criminais. Devem ser banidos esse sentimentalismo vão e esse medo exagerado: a revisão dos julgados favoráveis aos réus, é por nos um correlativo lógico e necessário do remédio igual concedido aos julgados condenatórios. E não compreendemos nunca porque surgindo contra uma sentença favorável ao acusado às mesmas suspeitas que abrem a porta para rever as sentenças de condenação, a sociedade deve ser constrangida a sofre em paz absolvições indevidas e as indevidas mitigações de responsabilidade penal”.

Algumas legislações como a Alemanha, Rússia, Portugal e a Suíça já assentam em seu ordenamento a revisão em prol da sociedade. A revisão criminal enumera um rol taxativo que será a causa de pedir da pretensão. Para tanto, as hipóteses para permitir-se a revisão em prol da sociedade também seria taxativa e com um prazo prescricional para garantir a segurança jurídica.

A mesma lógica em se admitir a revisão em prol dos condenados deve prevalecer no processo para a revisão em beneficio da sociedade. Tendo como objetivo o princípio da igualdade e paridade de armas como elemento integrante do processo penal é lógico a admissão da revisão para beneficiar ambos os lados da relação jurídico-processual.

O que deve ser observado também é que a justiça que hoje ainda deve ser encarada como o fim do litígio deve sempre prevalecer sobre o valor da segurança. A impossibilidade da revisão pro societate, importa em desprestígio do judiciário, pois ele não tem meios para agir contra um réu absolvido que, após o trânsito em julgado confessasse publicamente sua culpa.

É importante tecer comentários sobre os argumentos frequentemente utilizados por aqueles que admitem apenas uma espécie de revisão. O argumento de que o interesse do Estado e da segurança jurídica não podem sobrepujar o status libertatis, valor supremo que deve sempre prevalecer, é uma falácia. O homem vive num Estado Democrático de Direito, em que o interesse público dever ser o fim do Estado.

O direito penal é acima de tudo um ramo do direito público, criado essencialmente para normatizar condutas inseridas como criminosas perante toda uma sociedade. Não é razoável e proporcional permitir que um criminoso que foi absolvido por não existirem provas que autorizassem sua condenação e estando dentro do prazo prescricional do crime cometido, seja mantido em liberdade para assegurar um pseudo status de liberdade, que não tem direito.

Há ainda os que defendem que possibilidade de renovação do processo traria ao absolvido uma situação de absoluta insegurança. Ora, se surgiram provas cabais para esse ser submetido a uma reavaliação da sua sentença, não há motivos para insegurança e constrangimento. Deve se sentir constrangido em ter aparecido novas provas e por ser novamente suspeito.

A idéia que é sempre preferível manter a absolvição de um provável culpado do que permitir a insegurança de provável inocente, esse sim é um argumento forte. Mas o rol a permitir a revisão pro societate é taxativo. E mais a sociedade não pode arcar com o preço de suas penas perderem sua eficácia e a criminalidade ser insuflada, para permitir que um culpado fique nas ruas correndo risco de cometer mais crimes.

5.1 HIPÓTESES TAXATIVAS

A primeira hipótese de cabimento da Revisão Criminal das sentenças absolutórias é quando o agente confessar a prática do delito e ainda o conjunto de circunstâncias evidenciarem que sua confissão corresponde à realidade dos fatos.

Defensores da revisão somente pro réu, encaram que sendo permissiva essa hipótese, acarretaria a supervalorização da confissão. Romeiro (1964, p. 24) chega a mencionar: “As legislações em que a confissão do acusado, após o transito em julgado da sentença absolutória, é fundamento da revisão pro societate há supervalorização da confissão, criando-se o risco de ser ela provocada por meios desaconselhados.”

A confissão será sempre meio de prova. Ao ser proferida longe dos olhos da justiça, será um meio indireto apenas um indício da materialidade do crime. Quando anunciada em juízo é um meio de prova direta, mas não é absoluta. O réu confessando a autoria deve o juiz ter o cuidado de lhe indagar sobre o motivo e as circunstâncias do fato e se outras pessoas concorreram na infração e quais sejam, conforme prescreve o art. 190 do CPP. É um importante meio para que a confissão não ser atribuída como a rainha das provas.

O valor da confissão será aferido pelos critérios adotados para os outros elementos de prova, e para sua apreciação o juiz devera confrontá-la com as demais prova do processo, verificando-se entre ela e estas existe compatibilidade ou concordância.

O que deve ser entendido é que o juiz é livre para apreciar todos os meios de prova. E é livre para convencer-se apreciando as demais provas do processo. A causa de pedir seria somente a confissão, mas esse não deve ser considerado como único meio de prova para decretar a culpabilidade.  No momento da apreciação da revisão o juiz pode requerer novas diligências e provas para assentar a reforma da decisão. E até mesmo durante o julgamento da Revisão, no momento da sustentação oral e dos debates, essas provas serão apreciadas.

Não é razoável e nem proporcional que após a absolvição e o trânsito em julgado o réu declare-se culpado e indícios surjam para consubstanciar o fato, e permaneça com a liberdade, que não faz jus. O que se pretende acima de tudo é a exata aplicação da lei aos fatos plenamente conhecidos. Contudo, o juiz não deve obstar-se de requerer novas provas para que a culpabilidade e materialidade sejam comprovadas por outro meio, para garantir que a confissão não seja supervalorizada.

E mais, em outros crimes cometidos para conseguir a absolvição, como utilização de documentos falsos, este será processado e julgado pela prática desse crime. Enquanto que, como principio da autodefesa, de não poder produzir provas contra si mesmo, ele tem o direito de optar entre confessar ou não, entre colaborar ou não para o descobrimento da verdade. Pode-se inferir que sairá do processo ileso e com sua falsa honra de cidadão que cumpre as regras prescritas pelo poder legislativo, restaurada.

Os interesses da sociedade não podem ser desprezados. Ao ser cometido um erro contra a sociedade, é imprescindível repará-lo, de forma que as penas não percam sua eficácia. O Poder Judiciário não pode continuar desprestigiado com as impunidades, ainda mais quando advindas da proibição de revisão de uma absolvição injusta.  Assim, deve haver a revisão pro reo e pro societate.

A segunda hipótese é quando a sentença absolutória se basear em testemunhos, documentos, perícias e demais provas comprovadamente falsas, servido de conditio sine qua no para a absolvição;

A apreciação do Poder Judiciário almejar acima de tudo é a exata aplicação da lei aos fatos plenamente conhecidos. A primeira parte deste silogismo exalta a utilização de testemunhos falsos para obter a absolvição.

Juridicamente falando, testemunha significa pessoa que atesta veracidade de um ato ou de um fato, ou ainda presta esclarecimentos. Barros (20002, p. 190) entende que é uma pessoa que afirma ou nega um fato, cuja prova se pretende estabelecer; mais ainda aquela que certifica, atesta, ou é presente à feitura de um ato jurídico, a fim de autenticá-lo ou posteriormente confirmá-lo.

Um dos sete mandamentos da Religião Católica Apostólica é não levantar falso testemunho contra o seu próximo. A partir dessa assertiva a testemunha tem a obrigação de prestar depoimento sob o compromisso de dizer a verdade a respeito do que souber e o que for perguntado, garantido sob a promessa de ter a palavra de honra.

A testemunha não cumprindo o compromisso de dizer a Verdade Real, será processada para a apuração do crime de Falso Testemunho, prescrito no art. 342 do CP, que pode ser tanto ao dizer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade. A art. 210 do CPP (Brasil, 2007) prevê que as testemunhas serão inquiridas cada uma de per si, de modo que umas não saibam nem ouçam os depoimentos das outras, devendo o juiz advertir-las das penas cominadas ao falso testemunho.

 A incursão deste crime no rol de delitos a ser imposto sanção, só facilita a busca da verdade, uma vez que, no momento em que o juiz presta-se a tomar o depoimento, deve fazer uma advertência a testemunha do compromisso de dizer a verdade e a pena que poderá ser cominada, caso prive-se de falar a verdade.

O que ocorre é que, apesar de todo esse cuidado de ter-se a verdade pairando nos depoimentos, comumente pessoas são arroladas com o fim precípuo de mentir; seja para condenar um inocente ou na maioria das vezes, absolver um culpado. Diante de tal constatação, não é ético e moral permitir que sentenças eivadas de vício, em que o depoente mentiu para absolver um culpado, estejam acobertadas pelo manto da coisa julgada.

No projeto de lei Nº 4.206 de 2001 (Brasil, 2006b), que altera a dispositivo relativo aos recursos e ações de impugnação, pretendia inserir o inciso IV, ao próprio art. 621 do CPP, em casos da absolvição fundar-se em prova comprovadamente falsa, enquanto não extinta a punibilidade.

Portanto, em consonância à aplicação da justiça, pautada pela busca da verdade necessária e incansável, em prol do interesse público e em detrimento do interesse individual do réu. Uma vez que o ultimo não é merecedor do direito à liberdade, por ter concorrido e ajudado a confundir o judiciário, utilizando depoimentos falsos para desvirtuar a realidade fática. 

Comumente documentos falsos são trazidos aos processos, como forma de absolver ou ainda extinguir a punibilidade do mesmo. Quando, após o transito em julgado da sentença absolutória, descobrirem-se provas da responsabilidade criminal do réu, ou então, que as provas produzidas em seu benefício e que fundamentaram a absolvição ou a extinção da punibilidade, revelaram-se falsas, deve ser motivo ensejador para a Revisão Pro Societate.

Segundo Steele (1973, p. 96):

“Para fundamentar a admissibilidade da Revisão Criminal também para as sentenças absolutórias. Sob o ponto de vista da lógica e da busca da verdade material, judicial ou processual (objetivo maior do processo penal em face das provas válidas produzidas), não se pode negar que a revisão deve ser cabível não só quando interessa ao acusado, mas também quando é favorável aos interesses da justiça”.

Poderá ser considerado falso o documento que já nasce viciado pela ilicitude ou ainda por ter sido alterado. Os que se beneficiam ou produzem esses documentos podem também ser indiciados pela prática de quaisquer crimes de Falsidade Documental, dispostos entre o art. 296 a 305 do Código de Processo Penal.

Atestados de óbitos falsos são utilizados com o intuito de extinguir a punibilidade do agente que cometeu o crime. Apesar de nessas hipóteses não ser julgado o mérito, emitindo uma decisão interlocutória, institui uma relação jurídica de coisa julgada. A justiça brasileira já revogou despachos que concedeu extinta a punibilidade pela utilização da certidão de óbito, além de entender que é uma Coisa Julgada Relativa.

É certo que, quando os documentos utilizados como prova são falsos, são juridicamente inexistentes, não produzindo quaisquer efeitos. Portanto, a condição de quem utiliza de meios ardilosos para conseguir uma absolvição, não é de um inocentado, mas sim de um réu.  Se a punibilidade tiver sido julgada extinta como fundamento na morte do agente, e, posteriormente, verificar que o óbito não ocorreu,deve ser cabimento da Revisão Criminal.

Imprescindível ainda pensar que o criminoso, conseguiu a absolvição pela prática de um estupro, que é um hediondo com pena de reclusão de seis a dez anos, e será processado e julgado pela prática do crime de Falsidade Material de Certidão ou atestado, com detenção de dois meses a um ano.

É notória a partir dessa elucubração prática, a impunidade e desprestígio da ordem pública. Em que, criminosos beneficiam-se com a execução de novos crimes, para burlar a própria lei.

Outra possibilidade é a utilização de Perícias e demais provas comprovadamente falsas. As perícias são utilizadas como mais um meio de convencimento do juiz, em que durante a fase probatória elementos técnicos e que necessitam de conhecimento especial são trazidos à tona, para esmiuçar toda e qualquer dúvida em torno da autoria do delito.

No brilhante escólio de Barros (2002, p. 200/2001), tem-se:

“Com o apoio da perícia é possível esmiuçar os detalhes que cercam o fato criminoso e afastar as incertezas ou meras conjecturas que nenhuma segurança propiciam ao julgador. Desse modo, sempre que houver necessidade de se esclarecerem dados ou elementos de prova que dependam de conhecimento técnico aprofundado ou especializado sobre determinado ramo cientifico, a solução que se recomenda ao esclarecimento da verdade é a realização da perícia”.

A falsa perícia pode ocorrer quando pessoas não aptas atestam o laudo pericial ou este pode ser viciado com mentiras, ou ainda meios que favoreçam o acusado, e também quando pessoas que não possuem a aptidão técnica correta para constatar algo que se busca solucionar.

Steele (1973, p. 44) ressalta que as normas ou institutos jurídicos não podem criar barreiras à atividade jurisdicional no desempenho de sua missão básica de clarificar a problemática que lhe é trazida, objetivando a aplicação da norma penal, desde que, evidentemente, sejam observados determinados princípios garantidores dos direitos individuais.

O perito que falseia, nega ou oculta a verdade em laudo pericial que emite, além de prejudicar a própria profissão, acaba com a confiança que o juízo lhe depositara, sobretudo, quando não sendo perito oficial infringe o compromisso que prestará de bem e fielmente desempenhar o encargo, conforme prescreve o parágrafo 2º do art. 159 do CPP. Além dessas conseqüências, de ordem moral e ética, existe a possibilidade de ser processado pelo crime do art. 342 do CP.

A terceira possibilidade é quando surgirem novos fatos e circunstancias que demonstrem a manifesta evidência do erro da sentença de absolvição, e que, diante delas, nenhum argumento poderá restar em favor do agente.

Houve outrora um embate doutrinário no que diz respeito à aceitação de somente provas novas ou se provas que já existiam à época do processo, mas não foram oportunamente apresentadas. Hoje esse embate já foi superado, pelo posicionamento jurisprudencial que admite a consecução de provas que já existiam.

Segundo Queijo (1998, p. 219):

“São provas novas tanto as noviter producta quando as noviter reperta, não importando a razão pela qual a prova conhecida não tenha sido apresentada oportunamente, ainda que por negligência do condenado. Observa-se que a razão da não produção da prova anteriormente é irrelevante diante do interesse publico existente na revisão”.

Ora, podem surgir tanto novas provas que autorizem a inocência, como a condenação. Acobertar um criminoso e deixar toda uma sociedade à mercê deste, pela justificativa da segurança jurídica, é atitude que fere a prevalência do interesse público. O Direito Penal é um ramo do direito público, que comina sanções para infrações da regras materialmente protegidas, visando exterminar a autotutela e deslizes contra a sociedade.

O Direito Penal é garantista e procura atentar-se para o mínimo de direitos do réu. Mas é injustificável não permitir que descobertas provas que autorizem a condenação e estando ainda em curso o prazo prescritivo deixar o mesmo impune, é imoral.

Steele (1973, p. 16), em estudo da Revisão Pro Societate, chega a proferir que:

“Não pode ser aceito a manutenção de uma sentença absolutória, apoiada no clássico princípio in dubio pro reo, que não atinge a verdade jurídica pela não verificação do modo de ser real da conduta do agente, ficando, por conseguinte, irremediavelmente impedida toda uma posterior reavaliação a respeito do surgimento de novos e inquestionáveis elementos capazes de estabelecer a absoluta certeza moral de culpabilidade.”

Vale salientar que outra possibilidade é quando a sentença absolutória tiver assento em crime de prevaricação e tráfico de influência praticado por jurados ou juízes.

E por fim Steele (1973, p. 12) salienta:

“A mesma razão que justifica o desfazimento da coisa julgada em benefício do condenado deve nortear o reexame de uma sentença absolutória, tida como injusta pelo fato de se ter descoberto, após o trânsito em julgado, a violação da ordem jurídica, reforçando, assim, a tese de que em matéria criminal inexiste coisa julgada”.

5.2 PRESCRIÇÃO

No que diz respeito ao prazo para interposição da Revisão Criminal pro Societate, os sistemas em geral a legitimam enquanto não operada a prescrição do crime que consubstanciou a sentença. Divergente ocorre em Portugal, em que é admissível ainda que não operada a prescrição do crime. A legislação Russa fixa o prazo de um ano e a Iugoslava o prazo de seis meses, a contar da descoberta de novos fatos.

Sobretudo, para assegurar a Segurança Jurídica, para que o já inocentado não permaneça com a sensação que a qualquer momento pode voltar a ser preso, deve ser o prazo para intentar a Revisão Criminal, o prazo da prescrição do próprio delito.

E ainda para apoiar no pensamento que a paz e a liberdade dos cidadãos devem ser tutelados e a preservação da coisa julgada, não pode realmente estar sujeita ao reexame a qualquer momento, ao ponto de tirar a tranqüilidade dos cidadãos.

5.3 COISA JULGADA SOBERANA

As sentenças absolutórias são divididas em próprias, quando a acusação é julgada improcedente e nenhuma sanção é imposta ao réu, e em imprópria, quando a absolvição é fundamentada com base da inimputabilidade mental, motivada pelo art. 26 do Código Penal em que uma medida de segurança é imposta, podendo invocar o parágrafo único, inc I do art. 386 do CPP e a súmula 422 do STF. O mestre Capez (2005, p. 397) consubstanciando o que foi explicitado destaca:

“Sentenças Absolutórias: quando julgam procedentes, total ou parcialmente a pretensão punitiva. Podem ser: Próprias, quando não acolhem a pretensão punitiva, não impondo qualquer sanção ao acusado e Impróprias, quando não acolhem a pretensão punitiva, mas reconhecem a pratica da infração penal e impõem uma medida de segurança.”

E ainda, esclarece Greco Filho (1991, p. 121): “A chamada absolvição imprópria possui conteúdo sancionatorio. Não deixa, contudo, de possuir natureza absolutória, já que os inimputáveis são isentos de pena (art. 26 caput do CP) e, destarte, não podem sofrer condenação”.

Diante do exposto, compreende-se ser uma exceção à regra admitir revisão das Sentenças Absolutórias Impróprias, contrariando as disposições do art. 621 do CPP, tanto no âmbito da doutrina quanto no seio da jurisprudência, permitindo que a medida de segurança imposta seja desconstituída. As sentenças, embora absolutórias, contém caráter sancionatório.

As sentenças absolutórias próprias produzem o efeito chamado Coisa Julgada Soberana, pelo fato de não poderem ser modificadas ou reformadas após o trânsito em julgado, conforme o Código de Processo Penal, que autoriza como já visto, somente as condenatórias. A coisa julgada soberana pressupõe o entendimento de verdade, embasado de concretude, eficácia e certeza. Diante de tal assertiva, é importante citar Arruda (2003, p. 55):

“Se a imutabilidade da decisão implica numa renuncia à busca ulterior da verdade, aceita pelos homens por amor a certeza, é rigor balizar até onde a presunção leva a subsistir. Induvidosamente, o plano de fundo da questão é um conflito entre a justiça e certeza da sentença.”

Ora, a coisa julgada apesar de ser soberana, pode curvar-se diante de um erro para proteger o instituto da justiça. A sociedade quando percebe que um fato ou prova que não eram conhecidos ou eram falsos passa a repelir a coisa julgada, merecendo a sua relativização para o judiciário para que as leis não pecam sua eficácia. Coisa julgada não é sinônimo de verdade.

O preâmbulo da Constituição garante o Direito à justiça, que é alcançado com a manutenção da ordem jurídica acoimada pela legalidade. É um critério bastante amplo e subjetivo, porém, a ausência de punição, por exemplo, de um crime contra a vida, por não haver provas conhecidas naquela época, e estando dentro do prazo prescricional, não pode ser objeto para revestir-se de certeza e ser imutável. O paradigma de Coisa Julgada Soberana dever ser superado.

Brilhantemente Arruda (2003, p. 44) ainda aduz:

“A ausência de punição pelo crime contra a vida não afrontaria até mesmo primário sentimento de justiça da comunhão, entendido como aquilo que se reputa certo ou errado? A tolerância com tão grave crime não traduziria a falência da justiça oficial e incutiria a crença na injustiça? A impunidade pelo crime de sangue não suscitaria o alarma social, o temor, a insegurança? Não seria a consagração do individualismo do réu absolvido e o esquecimento dos interesses dos demais integrantes do corpo social? O pseudo direito do delinqüente não estaria mais respeitado do que o verdadeiro direito dos demais membros da sociedade? Puni-o apenas por falsidade documental, delito assaz mais tênue, não seria um premio à má-fé? Isto não açularia outros propensos ao cometimento de delito similar, para, ao depois, barganhá-lo pelo delito menor ( o falso)?”

Por fim, no âmbito criminal valores de justiça social mostram-se latentes, e não é imperioso permitir que apenas sentenças que pregam pela ordem individualista sejam reformadas, como algumas condenatórias no penal e no cível.

5.4 REFORMATIO IN PEJUS

Reformatio in pejus é a proibição de sobre um mesmo julgamento, uma sentença mais desfavorável ao acusado, mediante a interposição de um recurso. É em sentido literal, as reformas para piorar a situação processual do réu. Provocado por um recurso, o juiz na condição de representante da sociedade, constatando que uma norma foi violada, deveria agravar a penalidade.

Essa espécie de reforma pode ser classificada em direta e indireta. A primeira, expressamente proibida em que havendo recurso exclusivo da defesa sofrer agravamento pelo juízo ad quem. A última, a reforma da sentença, em segundo julgamento, quando o primeiro houver sido anulado pelo juízo ad quem.

Segundo o especialista Noronha (1987, p. 187):

“Se o Ministério Público ou, como quer que seja, o acusador não apelou, a presunção é de que estejam satisfeitos os interesses sociais ou da acusação, não se compreendendo que, tendo concordado e aquiescido com a sentença, esta ainda venha ser reformada, atendendo a conveniências suas”.

A proibição da Reformatio in Pejus está prevista no art. 626 do Código de Processo Penal, em que prescreve que “De qualquer maneira, não poderá ser agravada a pena imposta, pela decisão de revista”. Desse artigo interpreta-se que qualquer decisão que acarrete prejuízo, não só a que aumente da pena.

Em contraposição, a Revisão das Sentenças Absolutórias e tal artigo em referência são incongruentes. É caduco o fato de não permitir a revisão, mesmo com a descoberta de provas e junto com todo instrumento probatório, obtendo a culpabilidade do agente. É imoral não permitir o prejuízo a aquele que já não mais merece piedade.

5.5 INDÍCIOS DE CABIMENTO NO DIREITO BRASILEIRO

Diante do objetivo de estabelecer a possibilidade de Cabimento da Reformatio in Pejus é imprescindível traçar os indícios de cabimento no Direito Brasileiro. Já é realidade nos Tribunais quando o réu vale-se de documento falso para conseguir a absolvição.

O Código Penal prevê algumas causas de extinção da punibilidade. No art. 107, por exemplo, traz um rol meramente exemplificativo dessas causas, e uma delas é exatamente a morte do agente, que são extintas todas as penas, inclusive multas.

Com a velha concepção de que com a morte tudo solve ( mors omnia solvit), é que são utilizados atestados de óbito como forma de comprovação para a extinção da punibilidade. Com isso, o criminoso livra-se do crime que estava sendo processado e julgado.

O STF vem decidindo reiteradamente, que considera inexistente a sentença declaratória de extinção da punibilidade em virtude do erro ou fraude. A partir daí o processo pode ser aberto, desde que a prescrição não tenha se processado. Entende-se que decisão com base em Certidão de Óbito Falsa, julgada extinta a punibilidade do réu pode ser revogada, a passo que não gera Coisa Julgada.       

Com base no argumento utilizado pelo Ministro Carlos Veloso, Relator do HC 84.525-8/MG:

 “É que a suprema corte já decidiu pela possibilidade de revogação de decisão que julga extinta a punibilidade do réu, a vista de certidão de óbito falsa, já que não existe, no caso, coisa julgada em sentido estrito. Caso contrário, o paciente estaria se beneficiando de conduta ilícita, qual seja, a apresentação de certidão de óbito falsa, cuja responsabilidade penal poderá ser definida em ação penal própria.

O paciente teve ação penal arquivada por decisão que reconheceu, baseada em Certidão de Óbito Falsa, a extinção da punibilidade. Desarquivado o processo, pelo reconhecimento da falsidade da certidão, postula-se o trancamento da Ação Penal por ofensa à Coisa Julgada e por falta de fundamentação do acórdão ora impugnado.

A extinção de punibilidade pela morte do agente (art. 107) em decorrência do princípio mors omnia solvit, ocorre independente da declaração. A decisão que reconhece extinta a punibilidade é meramente declaratória, não subsistindo se o seu pressuposto é falso”.

E ainda a Primeira Turma no HC 55.091/SP, em que o Relator o Ministro Cunha Peixoto opinou pela:

“Revogação de despacho que julgou extinta a punibilidade do réu, à vista de atestado de óbito baseado em registro comprovadamente falso: sua admissibilidade,vez que referido despacho, além de não fazer Coisa Julgada em sentido estrito, fundou-se exclusivamente em fato juridicamente inexistente, não produzindo quaisquer efeitos”.

E ainda no HC 60.095/ RJ: “A extinção da punibilidade pela morte do agente, art. 107 I do CP, ocorre independentemente da declaração. Essa decisão é meramente declaratória, não subsistindo se o seu pressuposto é falso atestado de óbito”.

Nesse caso específico de utilização de atestado de óbito falso, se juízos de valor e provas para comprovar a autoria e materialidade não foram produzidas, há de ser falar que o mérito foi julgado. O acusado terá a ou decisão interlocutória mista terminativa entendida como inexistente, pelo fato de ser contrária à ordem jurídica e ser plenamente repudiada pelo direito.

O HC 60.095/RJ teve como Relator o Ministro Rafael Mayer: “EMENTA: Habeas Corpus. Extinção da punibilidade. Morte do Agente. Equivoca da decisão. O desfazimento da decisão que, admitindo por equívoco a morte do agente, declarou extinta a punibilidade, não constitui ofensa a Coisa Julgada. Habeas Corpus Indeferido”.

Como se percebe, a decisão jurisprudencial é plenamente justa, uma vez que é necessário mandar para casa um inocente que estava sendo perseguido, mas é mais ainda, castigar e levar ao cárcere o culpado reconhecendo como tal. E que ainda se valeu de meios ardilosos para burlar a verdadeira Justiça.

O projeto de Lei N.º 4206/2001, proposto pelo Deputado Ibrahim Abi-Ackel, que estava em trâmite perante a Câmara dos Deputados, pretendia incluir o inciso IV ao artigo 621, já referido anteriormente. O conteúdo do inciso versava sobre a Revisão em caso de absolvição fundar-se em prova comprovadamente falsa, enquanto não extinta a punibilidade. Ao sofrer apreciação do Senado Federal foi vetado.

As atitudes que estão impregnadas no brasileiro, em ter medos de mudanças só geram incertezas tanto para a Ordem Jurídica, quanto para a Pública. Retirar do bojo do projeto, que trata exclusivamente de alteração do Código de Processo Penal, relativos aos recursos e ações de impugnação, em que a Revisão Criminal está enquadrada é difícil de entender. O objetivo das alterações é o de resguardar as prerrogativas tanto da defesa quanto da acusação. 

5.6 NO ATUAL DIREITO COMPARADO

É lustroso fazer referência às legislações modernas que capitaneiam essa espécie de revisão. A absolvição de um culpado é repudiada, ao passo que se pretende tutelar os interesses de uma sociedade.

Na legislação Alemã há muito tempo se tolera a revisão contra o réu absolvido. O Código de 1879, que ainda está em vigor autoriza a revisão com no § 402 nos casos em que a sentença é viciada: por documentos falsos, por falso testemunho, por falsa perícia, por atuação delitiva do juiz conexa ao processo ou ainda quando o réu absolvido firmasse, judicial ou extrajudicialmente, uma confissão. E admite-se ainda na hipótese de novas provas ou fatos.

A Áustria, com a Legislação Penal de 1974 permite também a reabertura do processo que desconstituía uma sentença que absolveu um réu injustamente, desde que não operada a prescrição.

De forma imperativa enumera as hipóteses no § 355, em caso de: falsidade documental, testemunhal, e por qualquer ato ilícito cometido pelo acusado ou terceiro, além de através de confissão digna de fé.

No Equador a Lei autoriza quando extinta a punibilidade baseada em atestado de óbito falso ou ainda quando o juiz se vale de documentos e testemunhos falsos para consubstanciar sua decisão. Arruda (2003, p. 53 apud CHINCHILLA, 1993 p. 124) salienta que a revisão é um remédio idôneo para reparar erros de fato, inteligência do art. 385 do Código Penal Equatoriano.

Na legislação colombiana, o Código de Processo Penal, no artigo 220 incisos IV a VI, prescreve que é permitida a Ação de Revisão contra réu absolvido quando prova falsa foi utilizada como fundamento do julgado. Além de permitir quando extinta a punibilidade e o réu encontrar-se vivo.

No direito Lusitano (ARRUDA, 2003), o Decreto-lei n. 78 de 17 de fevereiro de 1987, alterado pela Lei Nº. 58 de 25 de agosto de 1998, no art. 449, alíneas “a” e “b”, permite a Revisão dos julgados absolutórios por falsidade do acervo probatório ou de crime conexo praticado pelo emérito julgador. É vedado porem, quando a causa solicitada for baseada em nova prova, como é permitido em favor dos condenados.

A prisão de um inocente e a liberdade de um criminoso equilibram-se na balança. A revisão em prol da sociedade é tão necessária quando a favor do réu; pela justiça e moralidade ambas devem ser admitidas e conviverem em harmonia.

CONCLUSÃO

Após todo entendimento exposto em linhas precedentes, chegar-se-á a algumas conclusões relevantes em torno do tema debatido.

Primeiramente é essencial entender que a Constituição Federal de 1988 não proibiu a Revisão Criminal em torno das Sentenças Absolutórias. O legislador constitucional não explicitou a hipótese de revisão das decisões acoimadas pelo manto da Coisa Julgada e se essas seriam apenas as que favorecessem o Réu.

Como visto, apesar de a norma constitucional atentar no art. 5º XXXVI, que a lei não prejudicará a Coisa Julgada, a Revisão Criminal não ofende a tal preceito por se tratar de controle sobre os vícios – numerus clausus – que a sentença pode apresentar.

A opção de permitir, no âmbito infraconstitucional, a revisão apenas das Sentenças Condenatórias foi mera política legislativa. A visão encontrada de que o Brasil ainda está na infância da socialização, concebida num cenário fascista, e ainda presente no estigma dos legisladores e dos juristas é temerosa, mormente que a revisão da Sentença Absolutória viabilizaria a utilização do processo como represália e meios de vingança.

Entretanto, deve-se levar em conta que a verdade é preceito fundamental no Processo Penal. E apesar de todos os meios probatórios utilizados no curso do processo, se uma hipotética sentença estiver eivada de vícios, a ponto de absolver um criminoso culpado, tal decisum deve ser, sem sombra de dúvidas, revisto. É o que determina a Justiça Social.

O que deve ser entendido é que, caso o Judiciário deixe-se ludibriar pela aparência da verdade, e mais tarde sejam descobertas provas cabais ou apurada a falsidade ideológica e material de um documento essencial à investigação, deve-se sim, permitir a revisão das sentenças absolutórias.

Com efeito, os indícios de cabimento da Revisão Criminal Pro Societate no âmbito jurídico pátrio, a exemplo das decisões Interlocutórias que extinguem a punibilidade baseando-se em atestado de óbito falso, já são uma realidade, o que implica asseverar que a posição adotada pelos legisladores carece de reformulação.

Indubitavelmente, o Direito Penal contempla sanções para condutas tipificadas como antijurídicas e se no curso ritualista as provas de convencimento do juiz forem produzidas de maneira a incidi-lo no erro, a sentença deve ser revisada para que as penas não percam sua eficácia.

Noutro aspecto, também não é razoável acobertar um criminoso que cometeu um crime mais grave, processando apenas por um crime de uma pena mais branda, tal como ocorre nos casos em que o acusado utiliza-se de provas falsas, ocasião em que, no atual ordenamento, este indivíduo apenas seria demandado por cometer o crime de falsidade documental ou ideológica, ficando impune com relação ao primeiro crime cometido. 

Destarte que, se a legislação de processo penal incluir a Revisão em prol da Sociedade, ficará aperfeiçoada ao nível das civilizações mais avançadas, no particular.

Observa-se com isso, que não é obsoleto que as absolvições injustas podem provocar a reincidência, o que muitas vezes pode ocorrer, mesmo com aqueles que foram condenados e cumpriram pena. Mas, pôr em liberdade um criminoso que foi injustamente absolvido provoca alarde social e põe em desconfiança a efetividade do poder judiciário.

 

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Informações Sobre o Autor

Lorena Matos Gama

Advogada. Especialista em Direito Tributário pelo IBET – Instituto Brasileiro de Direito Tributário, com coordenação do Professor Paulo de Barros Carvalho. Especialização em andamento em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário pela PUC-Minas. Professora de Direito Individual do Trabalho, de Direito Coletivo do Trabalho, de Direito Processual do Trabalho, Direito Bancário e Processo Tributário da Faculdade Metropolitana de Camaçari – FAMEC.


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