Resumo: O presente trabalho tem como alvo analisar a figura do carona no Sistema de Registro de Preços na Administração Pública, notadamente, à luz do princípio da obrigatoriedade de licitar. As considerações finais apontaram que a Constituição Federal de 1988 ao determinar que a licitação pública é consequência do princípio da isonomia, e por tal todos os interessados em licitar com o Estado têm o direito de serem tratados com igualdade, de maneira que, o uso do Sistema de Registro de Preços e consulta aos órgãos gerenciadores, embora, racionalize os procedimentos, parece de fato lesionar os princípios constitucionais administrativos da licitação quando utilizado de forma indeterminada. No entanto, os decretos nº 7.892/13 e nº 8.250/14 vieram regulamentar esses limites e agora parece que a questão do carona foi solucionada, tendo o Governo encontrado um meio-termo que parece ter agradado ao TCU, sem olvidar das necessidades dos órgãos públicos de disporem de um instrumento mais versátil nos processos de contratação.
Palavras Chave: Carona, licitação pública e Registro de Preços.
Abstract: This study is aimed to analyze the figure of the ride in the Price Registration System in Public Administration, notably in the light of the principle of mandatory bid. The final considerations pointed out that the 1988 Federal Constitution by providing that public bidding is a consequence of the principle of equality, and for those interested in bidding with the state have the right to be treated equally, so that the use of Prices Registration System and consultation to managers organs, although, streamline procedures, it seems in fact injure the constitutional principles of administrative bidding when used in indeterminate form. However, decree nº. 7,892/13 and nº 8,250/14 came regulate these limits and now it seems that the issue of ride was resolved, and the government found a compromise that seems to have pleased the TCU, without forgetting the agencies' needs public availability of a more versatile instrument in procurement procedures.
Keywords: Carona, competitive bidding and prices record.
Sumário: Introdução. 1. Princípios constitucionais da Administração Pública. 1.1 Princípios norteadores da licitação. 2. Processo licitatório na Constituição Federal de 1998 e na Lei nº 8.666/93. 2.1 Sistema de registro de preços. 3. Inovações relevantes dos decretos nº 7.892/13 e nº 8.250/14 no que tange à figura do carona. 3.1 A figura do carona no ordenamento jurídico brasileiro. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Será analisado a figura do carona no Sistema de Registro de Preços pela Administração Pública, notadamente, à luz do princípio da obrigatoriedade de licitar, enfocando a discussão da inaplicabilidade da figura na contratação por órgãos que não participaram da licitação e contratam diretamente com a empresa detentora da Ata de Registro de Preços.
O Sistema de Registro de Preços, conhecido pela sigla SRP, tem previsão legal no art. 15, II c/c § 3º da Lei nº 8.666/93, e é atualmente regulamentado pelo Decreto nº 7.892, de 23 de janeiro 2013 (que sofreu alterações pelo decreto nº 8.250), que revogou o Decreto nº 3.931/2001, de 19 de setembro de 2001, que por sua vez, revogou o Decreto nº 2.743, de 21 de agosto de 1998.
Vale consignar, que não por isso, mas, perfeitamente possível, a adesão, comumente chamada de carona no registro de preços, é legal, já que há legislação pertinente à matéria, além de ser comum que órgãos da Administração direta e indireta de um mesmo ente juntem-se para realizar uma única licitação para registro de preços e serviços, se for de interesse comum.
Cumpre reconhecer que para os agentes administrativos a adesão à ata de registro de preços, apelidado de carona, é cômodo, tendo em vista, evitar a montagem de processo de licitação, evita ainda, questionamentos ou impugnações ao edital, a republicação, enfim.
Porquanto os desobriga de promover licitação. Em vez de lançar processo licitatório com todos os desgastes e riscos que lhe são inerentes, basta achar alguma ata de registro de preços pertinente ao objeto que se pretenda contratar, e, se as condições da referida ata forem convenientes, contratar diretamente, sem maiores burocracias e formalidades.
A Lei de Licitações, coroando as normas-princípios trazidas no seio constitucional, elencou os diversos princípios administrativos aplicáveis à Licitação, sejam os básicos, ou mesmo os correlatos, todos aqui relacionados e analisados à luz da melhor doutrina e jurisprudência nacional.
Havendo ingerência, inobservância do Estado face ao respeito e observância dos princípios licitatórios, especialmente do princípio da obrigatoriedade de licitação há responsabilidade daquele para com o princípio da isonomia e legalidade. Isto porque, a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e dos princípios que lhes são correlatos.
Ao analisar-se inicialmente a relação entre a figura do carona no sistema de registro de preços e o princípio da obrigatoriedade de licitar, é de se ter que, em princípio, deve a lei ser respeitosa aos princípios, da mesma forma que assim o deve ser com qualquer outra norma de conteúdo constitucional, em obediência a um outro princípio, qual seja, o da isonomia normativa, que coloca as disposições constitucionais no topo do sistema jurídico.
Por tudo isso, a Carta Federal de 1988, pode-se observar o agigantamento da mesma, e assim, a obrigatoriedade do procedimento licitatório nas contratações de serviços e aquisições de bens feitos pela Administração teve o seu berço na Constituição Federal, transplantada para a Lei nº 8.666/93, permitindo esta, também com base constitucional, a previsão da exceção de não licitar, abrangendo a licitação dispensada, licitação dispensável e a inexigibilidade de licitação.
De forma ampla, o princípio da obrigatoriedade de licitação, devidamente consignado no art. 37, XXI da CF/88, exprime a ideia de lei como ato supremo e preponderante sobre qualquer direito de outra natureza. Este, como dito, é algo maior que as normas, já que não necessitam, no entanto, estar descritos na letra da lei; transcendem eles o campo aleatório da vontade do legislador, para, em nome da segurança jurídica, firmarem-se como postulados de todo e qualquer ordenamento que preze pela manutenção da Democracia e do Estado de Direito.
Objetiva-se com o presente trabalho, analisar a aplicabilidade da figura do carona no Sistema de Registro de Preços na Licitação face aos princípios da Administração Pública e licitatórios. Especificamente abordar os fundamentos jurídicos legais da licitação no Brasil, no que toca especialmente o Sistema de Registro de Preços, ponderando a sua importância substancial para o Estado Democrático de Direito; interpretar a Figura do carona no sistema legal constante da Lei nº 8.666/93, considerando a sua juridicidade no Sistema como norma constitucionalizada; por fim, analisar o princípio da obrigatoriedade da licitação correlacionando a figura do carona levando em conta que princípios são normas constitucionalizadas de eficácia absoluta.
Apesar das críticas doutrinárias, é possível a figura do carona, pois além de ser uma forma de otimizar as contratações realizadas pelos entes públicos é absolutamente admitida no ordenamento jurídico brasileiro.
As considerações finais encerram a exposição da discussão acerca do tema, tratando das posições perpetradas pelo TCU ao longo dos últimos anos e mostrando que ele não foi contrário à figura do carona, apenas foi inserindo restrições. Assim, com o advento dos decretos nº 7.892/2013 e nº 8.250/14, parece que a questão do carona foi solucionada, tendo o Governo encontrado um meio-termo que parece ter agradado ao TCU, sem olvidar das necessidades dos órgãos públicos de disporem de um instrumento mais versátil nos processos de contratação.
1. Princípios constitucionais da Administração Pública
Os princípios elencados na Constituição Federal do Brasil de 1988, denominados de princípios da Administração Pública brasileira, também foram trazidos para a Lei 8.666, a qual trás em seu art. 3º os seguintes princípios:
“Art. 3o A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.” (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010)[1].
Necessário diferenciar o princípio da legalidade exposto no art. 5º da CF/88 que expõe o princípio da legalidade para os particulares de um modo em geral.
“Art. 5º. (…) II – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; (…)”. Conforme esse princípio toda conduta é permitida com exceção àquelas que são expressamente coibidas por lei”[2].
Entretanto, se estar a analisar os princípios licitatórios que fazem parte da Administração Pública do Brasil. Logo, o princípio da legalidade administrativa, determina que toda a ação da administração pública, obedecerá expressamente ao que determina a lei, sendo este muito mais restritivo que o principio da legalidade para o particular.
O dever de licitar está constitucionalmente elencado no art. 37 XXI:
“Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”[3].
Assim, a Lei de Licitação é a nº 8.666/93, que também elenca os casos excepcionais, nos seus artigos 24 e 25, que constituem as hipóteses de inexigibilidade, dispensa, licitação dispensada e vedação. O art. 37 da carta magna traz como finalidade a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração e o atendimento do princípio da isonomia. Ademais, deverá preservar a sua margem de lucro, sendo a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos uma garantia constitucional. E por fim, o instrumento convocatório não pode exigir condições desproporcionais para participação no certame, do contrário, poderão ser consideradas nulas, e conforme Mazza[4], elas poderão ser objeto de impugnação por qualquer cidadão de acordo com art. 41, parágrafo 1º da Lei de Licitação.
Para o Direito Público, o princípio da legalidade determina que a administração pública se exerça em conformidade da lei. Sendo tal atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.
No Estado Democrático de Direito, como o Brasil, o princípio da legalidade é o basilar de todo um sistema. O princípio é a garantia constitucional, isto é, que a Administração Pública adstrita ao princípio da legalidade, e somente a lei, única expressão legítima da vontade geral do povo pode criar, autoriza ou modificar algo dentro do ordenamento jurídico pátrio.
A impessoalidade em um Estado Democrático de Direito se pauta na lei e não leva em conta os interesses individuais e coletivos de todos os administrados, e não de pessoas determinadas. O princípio possui duplo conceito: a finalidade da autuação da administração e a vedação à promoção pessoal do administrador público. Tal princípio traduz a ideia de que toda atuação administrativa tem como objetivo satisfazer o interesse público.
A moralidade diz respeito à obediência às regras da boa administração, tendo em vista a missão à qual a administração pública está afeta, e associada às ideias de função e de interesse público. A moralidade jurídica é diferente da moralidade social, pois esta se refere ao senso comum enquanto aquela está ligada ao conceito do bom administrador.
Assim, o art. 37 dispõe que a Administração Pública de qualquer dos Poderes deverá obedecer, entre outros, o princípio da moralidade. O art. 37, § 4°, determina que os atos de improbidade administrativa dos servidores públicos acarretam à suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário. O conceito de moralidade deve ser estruturado do próprio conceito de moralidade vigente em uma determinada sociedade em uma determinada época.
A transparência é a regra geral e os atos administrativos devem ser motivados. O princípio da publicidade dos atos e contratos administrativos, assegura os efeitos externos, proporciona conhecimento e controle pelos interessados diretos e pelo povo em geral.
A eficiência funciona como meio de controle de atividades meio, como condição para a celebração de contratos administrativos. A eficiência está voltada para a melhor maneira pela qual as coisas devem ser feitas ou executadas (métodos), a fim de que os recursos sejam aplicados da forma mais racional possível. Tal princípio se tornou expresso com o advento da Emenda Constitucional 19/98.
1.1. Princípios norteadores da licitação
O instrumento de convocação é a regra (o edital), trazendo como exceção o convite, que a lei impõe um procedimento mais simplificado, qual seja: a carta convite.
Hely Lopes Meirelles já mencionava que “o edital é a lei da licitação” [5]. Apenas temos que tomar cuidado com essa assertiva, pois o edital não é lei, mas sim um ato administrativo, submisso à lei, devendo estar de acordo com os parâmetros legais.
O instrumento convocatório deve estabelecer de forma clara e precisa, qual critério será utilizado para a seleção da proposta vencedora. Os critérios deverão ser objetivos a ponto de não se subsumir à escolha dos julgadores. “O administrador não se deve valer de critérios que não estejam previamente delimitados no edital para definição do vencedor do certame” [6].
O princípio do sigilo das propostas não vai de encontro ao da publicidade do art. 37 da constituição da república, pois a licitação é publica, entretanto, as propostas apresentadas pelos licitantes são sigilosas até a data da abertura dos envelopes, a ser realizada em sessão pública.
O agente público deve gerenciar os recursos públicos de forma menos onerosa possível à administração. É a escolha correta do que fazer atribuindo metas, ou seja, atributos mensuráveis de objetivos, a serem efetivamente atingidos num determinado período de tempo.
Conforme art. 3º, parágrafo primeiro da lei n. 8666/93, é indispensável um tratamento igualitário entre os licitantes no bojo da licitação. Adota-se, então, a isonomia em seu aspecto material, ou seja, tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades.
2. Processo licitatório na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 8.666/93
O inciso XXI do artigo 37, a Constituição Federal prevê, no artigo 22, inciso XXVII, a competência da União para legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as Administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais das diversas esferas de governo, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do artigo 173, § 1.º, III.
A Lei 8.666, de 21.06.1993, com as alterações trazidas pela Lei 8.883, de 08.06.1994, pela Lei 9.648, de 27.05.1998, e pela Lei 9.854, de 27.10.1999, regulamenta o inciso XXI do artigo 37 da CF, instituindo normas para licitações e contratos da Administração.
O art. 118 determina que os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e entidades da Administração indireta adaptem suas normas de licitação e contratos ao disposto na mesma. A Lei 10.520, de 17.07.2002, institui a modalidade de licitação denominada pregão, âmbito da União, estados, Distrito Federal e Municípios[7].
No tocante às sociedades de economia mista, empresas e fundações públicas, entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, o artigo 119 da Constituição Federal de 1988, prevê que editarão regulamentos próprios observados as disposições da Lei 8.666/93; tais regulamentos, depois de aprovados pela autoridade de nível superior a que estiverem vinculadas àquelas entidades, deverão ser publicados na imprensa oficial.
Por seu lado, o artigo 173, § 1.º, III, da Constituição Federal, na redação dada pela Emenda 19/98, prevê que as empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias que explorem atividades econômica, na licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observarão os princípios da Administração, conforme a lei que estabelecerá seu estatuto jurídico. Note-se que o inciso III determina, para aquelas estatais, somente a observância dos princípios da Administração Pública, o que sugere que terão um regime de licitação e contratação diferente do regime das estatais prestadoras de serviços públicos.
A leitura do inciso XXVII do artigo 22 da Constituição Federal também propicia esse entendimento. Enquanto não se editar o estatuto jurídico das estatais, as licitações e contratações dessas entidades continuam a reger-se pela Lei 8.666/93. As obras, serviços, compras e alienações realizadas pelos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e dos Tribunais de Contas, regem-se pelos preceitos da Lei 8.666/93, nas três esferas conforme artigo 117.
Para as concessões e permissões de serviço público de acordo com a Lei 8.987, de 13.02.1995, em seu art. 18, caput – lei das concessões -, estabelece processo licitatório específico, aplicando-se, no que couberem, os critérios e normas gerais da Lei 8.663/93.
Neste contexto, entende-se que licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia e a selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração. Será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
2.1. Sistema de registro de preços
Na esfera administrativa federal e em termos de normas gerais aplicáveis a todas as entidades federadas, o sistema de registro de preços é disciplinado pelo art. 15 da Lei Federal n° 8.666/93. Tal artigo é um dispositivo híbrido em relação ao objeto e aos destinatários dos seus comandos. Assim, contêm normas específicas, que obrigam somente a União, ou seja, incidem apenas na área administrativa federal (caput, inciso II e 2°), e outras normas, de caráter geral, impositivas também para os estados-membros, Distrito Federal, municípios e entidades das respectivas administrações indiretas, se pretenderem adotar o sistema de registro de preços.
Nesse sistema, previsto em Lei a Administração Pública indica o objeto que pretende adquirir e informa os quantitativos estimados e máximos pretendidos. Diferentemente, porém, da licitação convencional não assume o compromisso de contratação, nem mesmo de quantitativos mínimos.
Dessa forma, a contratação apenas se consuma se o licitante se comprometer a manter, no período do prazo estipulado, a disponibilidade do produto nas quantidades pretendidas.
Outrossim, conforme decisão do Tribunal de Contas da União também pode ser utilizada para objetos que dependem de outras variáveis inibidoras do uso da licitação convencional, se o objeto já houver sido licitado pelo Sistema de Registro de Preços caberá apenas expedir a nota de empenho para consumar a contratação.
O sistema de aquisição por preços registrados viabiliza a antecipação do gestor frente às dificuldades e condução do procedimento licitatório com vários meses de antecedência, evitando as sistemáticas urgências de atendimento. Não é, portanto, por acaso que vem ocupando cada vez mais espaço como procedimento de trabalho.
É mister trazer à baila que a existência de registros de preços não vincula a Administração a firmar contratações que advinda deles, sendo facultada a utilização de outros meios, assegurado ao beneficiário do registro a preferência em igualdade de condições.
Neste diapasão, faz-se entender que, o procedimento a ser adotado pelas entidades administrativas que se pretendem utilizar do sistema de registro de preços será de livre delineamento por elas, em decretos regulamentadores ou outros instrumentos equivalentes, conforme a respectiva natureza jurídica.
Ressalta-se que, é sempre obrigatória a inclusão da realização de, pelo menos, uma ampla pesquisa de mercado antes da concorrência e da publicação periódica dos preços registrados, além da obediência às condições impostas nos incisos do § 3º do art. 15 da Lei das Licitações.
Menciona-se que a lei impõe a realização de uma ampla pesquisa de mercado antes do registro de preços, mas, em termos práticos, apenas, uma não é suficiente, já que o andamento do sistema só é viável por intermédio da efetivação reiterada dessas pesquisas em épocas economicamente convenientes. Os regulamentos disciplinadores dos procedimentos de registro de preços deverão estabelecer a sua periodicidade.
Nesse passo, de acordo com a letra da lei licitatória, serão detalhes obrigatórios nos instrumentos regulamentadores do procedimento do registro de preços:
1) a determinação de que a licitação precedente ao registro seja sempre na modalidade de concorrência, independentemente do valor do objeto;
2) a enunciação da maneira pela qual serão efetuados o controle e a atualização dos preços registrados,
3) o estabelecimento do prazo máximo de 1 (um) ano para a validade do registro. Abordaremos esses assuntos pormenorizadamente, mais adiante, bem como a possibilidade de utilização do pregão para registrar os preços[8].
Justen Filho[9] corrobora afirmando que da determinação contida no § 4º do art. 15 da Lei n.° 8.666/93 decorrem algumas das principais características do sistema de registro de preços, a saber:
1) descrição quantitativa do objeto sempre em termos estimativos e aproximados, tanto no edital da concorrência que antecede o registro dos preços quanto na ata em que este é formalizado;
2) inexistência, da fase de adjudicação e, conseguintemente, impossibilidade de a Administração licitadora se utilizar da ata existente para as suas aquisições, podendo adotar outras formas para a efetivação destas.
Assim, além do art. 15 da Lei Federal das Licitações, deverão ser consideradas integrantes da fundamentação legal do sistema de registro de preços as disposições legais que o instituírem em outras entidades administrativas e aquelas que nelas regulamentarem seu procedimento.
Esses mandamentos legais e infralegais deverão ser elaborados de acordo com a natureza jurídica da pessoa de direito público no cenário federativo e administrativo do Estado brasileiro e em atendimento às suas peculiaridades e necessidades.
Dessa forma, compreende-se que o registro de preços é um procedimento que a Administração pode adotar perante compras rotineiras de bens padronizados ou mesmo na obtenção de serviços. Neste caso, como presume que irá adquirir os bens ou recorrer a estes serviços não uma, mas múltiplas vezes abre um certame licitatório em que o vencedor, isto é, o que ofereceu a cotação mais baixa, terá seus preços registrados.
Ao revogar o Decreto anterior de 2001, o decreto nº 7892 de 2013, define os institutos do Sistema de Registro de Preços, em seu artigo 2º.
Dessa forma, pode-se iniciar a conceituação na busca da essência e consequentemente abordar a polêmica categoria inserida em tal sistemática que são os órgãos não participantes.
Como se pode observar, houve uma mudança em relação ao conceito de órgão participante que no decreto de 2013 mencionava órgão ou administração pública federal para participar dos procedimentos iniciais do Sistema de Registro de Preços e integrar a ata de registro de preços, sendo modificado pelo decreto nº 8.250 de 2014, excluindo-se o termo “federal”.
Assim corrobora Vianna:
“(…) uma vez que é permitido que órgãos ou entidades integrantes dos Estados, DF e Municípios, participem de atas de registro de preços promovidas pela esfera federal. O novo texto deixa clara tal possibilidade, de que os órgãos que integrarem as atas da Administração Pública Federal, como órgãos participantes, possam ser de qualquer esfera governamental. Vale lembrar que, consoante as normas federais, é possível tanto que órgãos participantes quanto órgãos não participantes de atas geridas pela Administração Pública Federal, sejam órgãos federais, estaduais ou municipais; o que o regulamento não autoriza são os órgãos federais a aderirem às atas geridas por municípios ou estados”[10].
3. Inovações relevantes dos decretos nº 7.892/13 e nº 8.250/14 no que tange à figura do carona
No ano de 2012, o novo Acórdão TCU nº 1233/2012 – Plenário, ratificou o posicionamento do MPOG (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão) com relação à obrigatoriedade de os órgãos estimarem os quantitativos máximos a serem contratados não apenas pelo gerenciador, mas também como pelos caronas, em função do disposto no art. 9, II do Decreto nº 3.931/2001.
Neste contexto, houve uma alteração na sistemática do Sistema de Registro de Preços, no tocante à adesão ilimitada de caronas às Atas de Registro de Preços.
Para Vivas[11], foi em 2013, que o Governo Federal, através do Decreto nº 7.892, revogou expressamente o Decreto nº 3.931/2001, que finalmente, regulamentou o Sistema de Registro de Preços, sobre a questão dos caronas.
Pelo novo Decreto, o Edital deve prever que o quantitativo decorrente das adesões por órgãos não participantes (caronas) que não poderá exceder, a totalidade, do quíntuplo do quantitativo de cada item registrado na Ata de Registro de Preços para o órgão gerenciador e órgãos participantes, independente do número de caronas que aderirem (art. 22, § 4º)[12].
Segundo Vivas[13], o Decreto nº 7.892/2013 inova ao exigir que o órgão gerenciador somente autorize a adesão à Ata após a primeira aquisição ou contratação por órgão integrante da ata, exceto quando, justificadamente, não houver previsão no edital para aquisição ou contratação pelo órgão gerenciador (art. 22, § 5º). Além disso, após a autorização do órgão gerenciador, o carona deverá efetivar a aquisição ou contratação solicitada em até noventa dias, observado o prazo de vigência da Ata (art. 22, § 6º).
No entanto, o parágrafo quinto do art. 22 foi revogado pelo decreto nº 8250 de 2014, com isso tal requisito não mais subsiste. Não é mais necessário que o item ou o lote tenham sido objeto de efetiva compra ou contratação pelo órgão gerenciador ou pelos participantes, podendo ser autorizada a adesão atendidos os demais requisitos[14].
Além da limitação dos caronas, o Decreto nº 7.892/2013 (arts. 4º e 5º, I) obrigou o órgão gerenciador promover a Intenção de Registro de Preços – IRP, que se trata de um procedimento operacionalizado para registro e divulgação dos itens a serem licitados pelo órgão gerenciador para permitir que eventuais órgãos participantes manifestem interesse em participar do registro de preços[15].
Entende-se que o fato se trata de uma forma de induzir o melhor planejamento das contratações no âmbito da Administração Pública Federal, que busca aglutinar as demandas de diversos órgãos para obtenção de um resultado mais vantajoso. E pelo art. 4º do decreto 8.250 de 2014 é possível a dispensa do IRP se houver justificativa pelo órgão gerenciador.
Como já exposto anteriormente, o art. 2º do decreto de 2013 sofreu algumas alterações pelo mais novo decreto de 2014, quais sejam: o inciso IV teve o vocábulo “federal” suprimido, isso implica dizer que é possível que órgãos ou entidades integrantes dos Estados, DF e Municípios, participem de atas de registro de preços promovidas pela esfera federal. Mas, não autoriza os órgãos federais a aderirem às atas geridas por municípios ou estados.
Outrossim, foram incluídos os incisos VI e VII que versam sobre a compra nacional e o órgão participante de compra nacional. A compra nacional são projetos nacionais desenvolvidos pelo governo federal por meio de convênios com os demais entes federados, por meio de registro de preços participarão da mesma ata de registro implantada pelo órgão gerenciador, observando a demanda de cada participante para limitar aos quantitativos máximos estimados. Com o inciso VI não mais precisa da manifestação formal, devendo, contudo, indicar previamente suas demandas.
O novo decreto altera o inciso IV do art. 5º incluiu a competência do órgão gerenciador na realização de pesquisa de mercado e na consolidação das pesquisas de mercado efetuada e enviadas pelos órgãos participantes também nos casos de compra ou contratações nacionais.
Também foram incluídos seis parágrafos ao artigo 6º, que de maneira geral que estabelecem que o órgão gerenciador deve divulgar a ação da compra nacional, a pesquisa de mercado e a consolidação da demanda dos órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta da União, Estados, DF e Municípios, ficando facultado ao órgão/entidade participante do projeto (beneficiados) a utilização da ata de registro de preços, desde que comprovada a vantajosidade em sua utilização, podendo, ainda utilizar nas compras os recursos oriundos de transferências obrigatórias ou voluntárias da União, transferidos em prol do projeto/programa de governo ou, a utilização de recursos próprios[16].
O art. 4º parágrafo primeiro também foi modificado, permitindo a dispensa do IRP se o órgão gerenciador motivar. Também a possibilidade de limitar o número de órgão participantes conforme a capacidade de gerenciamento, aceite ou recusa de quantitativos ínfimos ou novos itens e deliberar quanto à inclusão posterior de participantes que não manifestaram interesse durante o período de divulgação da IRP.
É facultado aos órgãos ou entidades do SISC, antes que seja implantada uma nova licitação de registro de preços, poder consultar as IRPs em andamento e analisar conforme a sua conveniência ou até poder criar a sua conforme o parágrafo sexto do art. 4º.
O prazo de noventa dias trazido pelo o novo inciso XI do art. 5º poderá ser prorrogado, o carona deverá solicitar ao órgão gerenciador que dilatará ou não o prazo que o carona possui para concretizar a compra ou contração após aprovada sua adesão na ata de registro de preços.
Como já mencionado, o registro de preços somente pode ser utilizado de licitação pregão ou concorrência. No que tange ao tipo, se for no pregão só é possível o menor preço, conforme art. 4º, X, da lei 10.520/02. Porém com o novo decreto, a possibilidade de adoção do tipo técnica e preço nos sistemas de registros de preços só poderá ser feito na modalidade concorrência.
Nesse rumo, foi incluso no artigo 9º parágrafo 4º a exclusividade da assessoria jurídica do órgão gerenciador a análise Exame e aprovação do edital e minuta contratual, não necessitando de passar por nenhuma outra assessoria, em nome da eficiência.
Outrossim, a nova redação do art. 13 prevê que apenas o fornecedor vencedor será convocado para assinar a ata de registro de preços tendo seu extrato publicado e início de seus efeitos. O cadastro de reserva (os demais licitantes que aceitarem fornecer ao preço do vencedor) serão incluídos na ata da sessão do pregão ou concorrência, como forma de anexo.
Por fim, o parágrafo 5º do art. 22 foi revogado, o carona não precisa mais ter feito qualquer compra ou contratação com o órgão gerenciador ou por algum órgão participante do item de interesse do carona.
Sendo assim, o decreto nº 8.250 de 23 de maio de 2014 não revoga o decreto nº 7.892, de 23 de janeiro de 2013, mas veio para alterá-lo, regulamentando o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Dando mais força a possibilidade de adesão à ata de registro de preços (a figura do carona).
3.1. A figura do carona no ordenamento jurídico brasileiro
É cediço que nos termos da Carta Magna vigente, somente à lei compete inovar ao ordenamento, criando e extinguindo direitos e obrigações, o que não pode ser feito por um diploma legal hierarquicamente inferior, como é o caso do decreto, cuja missão precípua e exclusiva é de regulamentar as regras criadas por lei[17].
O carona é segundo Reis[18] órgão/entidade da Administração que não participou da licitação para registro de preços, nem como gerenciador, tampouco como participante. O fornecedor do carona é uma empresa que assegurando ao órgão gerenciador a certeza da disponibilidade do objeto, ainda pode, se for da sua conveniência, suportar a demanda de outros órgãos, pelo mesmo preço declarado na licitação como proposta mais vantajosa.
Em determinado momento, precisando adquirir um bem ou contratar um serviço comum, a Administração, em estando obrigada a, nos termos do ordenamento jurídico vigente, realizar licitação, poderá evitar esse procedimento aderindo a uma Ata de Registro de Preços que esteja dentro do seu prazo de validade.
Nesse contexto, apresenta-se aí uma inovação trazida pelo Decreto regulamentador do Sistema de Registro de Preços, pois a Lei nº 8.666/93 sequer cogita da existência do carona. Observa-se, portanto, que após ressalvar os casos de contratação direta e impor, como regra, o princípio da licitação, a Constituição Federal define os limites licitatório, mas em nenhum momento obriga a vinculação de cada contrato a uma só licitação ou, ao revés, de uma licitação para cada contrato.
A figura do carona redundou na possibilidade de um licitante vencedor para o fornecimento de um quantitativo determinado de bens fosse contratado por um universo indefinido de órgãos e entidades públicas, durante a vigência da Ata, passando a fornecer uma quantidade muito maior daqueles bens, sem implicar diminuição de preço diante da escala contratada.
Permite-se ao carona que diante da prévia licitação do objeto semelhante por outros órgãos, com acatamento das mesmas regras que aplicaria em seu procedimento, reduzir os custos operacionais de uma ação seletiva.
Fernandes[19] utiliza como fundamento autorizatório do carona, o inciso VII, do artigo 24, da Lei de Licitações. Essa perspectiva procedimental fica ao alcance de formatações de modelos: no primeiro, é possível conceber mais de uma licitação para um só contrato, como na prática se vislumbra com o instituto da pré-qualificação em que a seleção dos licitantes segue os moldes da concorrência, para só depois licitar-se o objeto, entre os pré-qualificados; no segundo, a figura do carona para em registros de preços ou a previsão do art. 112 da Lei nº. 8.666/93.
É precisamente nesse ponto que são olvidados pressupostos fundamentais da licitação enquanto processo: a finalidade não é servir aos licitantes, mas ao interesse público; a observância da isonomia não é para distribuir demandas uniformemente entre os fornecedores, mas para ampliar a competição visando a busca de proposta mais vantajosa.
Segundo Ferreira[20], Inobstante possíveis questionamentos acerca de legitimidade de um Acórdão do TCU dispor em sentido contrário ao Decreto nº 3.931/2001 (art. 8º, § 3º), fato é que a figura do carona pelo fato de não se encontrar previsto na Lei nº 8.666/93, compete ao TCU examinar a legalidade dos atos da Administração Pública quando da celebração de seus contratos.
Desta forma, em outras palavras, nada mais fez o TCU senão dizer que as adesões ilimitadas não encontram amparo na lei, respeitando-se, portanto, o princípio da legalidade[21].
Nessa toada, a problemática criada pela figura do carona se justifica na falta de limites para adesões a atas de registro de preços, gerando situações abusivas que vão de encontro aos princípios constitucionais da Administração Pública e da própria lei nº 8.666/93.
Adverte Barroso[22] que os fornecedores não são prejudicados com isso, porque os prazos determinados no edital e na ata para a entrega do objeto são sempre suficientes para que providenciem o material, produto ou gênero pretendido, não sendo necessário que mantenham grandes quantidades estocadas. Por outro lado, os fornecedores são beneficiados pelo sistema de registro de preços, porque com ele têm oportunidade de vender muito mais do que com as licitações comuns.
Por outro lado, parafraseando Barroso[23] observam-se as reiteradas tentativas de utilização do instrumento de modo escuso e/ou irresponsável notadamente quanto ao uso do permissivo de utilização de Atas de Registro de Preços por órgãos não participantes da competição (os chamados caronas), motivou que o Tribunal de Contas da União (TCU) determinasse ao Poder Executivo a imediata revisão do diploma regulamentar nesse aspecto objetivando estabelecer limites para a adesão a registros de preços realizados por outros órgãos e entidades, preservando-se dessa forma, os princípios da competição, da igualdade de condições entre os licitantes e da busca da maior vantagem para o Poder Público.
Não é novidade, que a Carta Política de 1988 exige-se licitação para contratos de obras, serviços, compras e alienações, concessão e a permissão de serviços públicos, conforme analisado neste capítulo. Contudo, o artigo 8º e seus parágrafos do Decreto Federal de nº 3.931/01, parece aviltarem flagrantes desrespeitos a princípios administrativos e, sobretudo, licitatórios.
Depois de ressalvar os casos de contratação direta e impor, como regra, o princípio da licitação, a Constituição Federal de 1988 define os limites desse procedimento, mas em nenhum momento obriga a vinculação de cada contrato a uma só licitação ou, ao revés, de uma licitação para cada contrato.
Desse modo, é juridicamente possível estender a proposta mais vantajosa conquistada pela Administração Pública como amparo a outros contratos. O carona no processo de licitação é um órgão que antes de proceder à contratação direta sem licitação ou a licitação verifica já possuir, em outro órgão público, da mesma esfera ou de outra, o produto desejado em condições de vantagem de oferta sobre o mercado já comprovadas.
Permite-se ao carona que diante da prévia licitação do objeto semelhante por outros órgãos, com acatamento das mesmas regras que aplicaria em seu procedimento, reduzir os custos operacionais de uma ação seletiva.
CONCLUSÃO
Face ao exposto, pode-se concluir que o sistema registro de preços foge da sistemática geral, trazendo um procedimento que apresenta diversas particularidades, presentes a facilitar o gerenciamento de contratos, sobretudo nas situações em que a necessidade da Administração em relação a determinados bens é contínua, como ocorre com a aquisição de material de expediente, por exemplo. Neste contexto com o advento dos nº 7.892/2013 e nº 8.250/14, parece que a questão do carona foi solucionada, tendo o Governo encontrado um meio-termo que parece ter agradado ao TCU, sem olvidar das necessidades dos órgãos públicos de disporem de um instrumento mais versátil nos processos de contratação.
Informações Sobre o Autor
Augusto Cleriston de Castro Lustosa Angelim
Advogado. Especialista em Direito Público