Resumo: Este artigo tem como objetivo verificar se o socioambientalismo, conjugado à justiça ambiental, pode se apresentar como paradigma para o sistema jurídico-ambiental, capaz de promover um enfoque mais amplo às normas, institutos e práticas operativas jurídico-ambientais, que inclua fatores de natureza social, econômica, cultural e política e aproximá-lo das demandas socioambientais da coletividade, especialmente no que se refere à proteção da sociobiodiversidade. Tais fatores são essenciais para a adequada compreensão e tratamento dos conflitos jurídico-ambientais, marcados pela complexidade de sua construção social e jurídica e diferenciados pela peculiaridade de seu objeto: o meio ambiente como bem jurídico tutelado e a vasta gama de interesses e construções culturais incidentes sobre o mesmo. Esta abordagem mais ampla dos conflitos jurídico-ambientais e do próprio Direito Ambiental visa a trazer para o seu campo de análise e aplicação conceitos como exclusão e desigualdade socioambiental, fundamentais para o trato das questões atinentes à proteção da sociobiodiversidade. Parte-se da hipótese de que o Direito Ambiental, marcado por um forte componente técnico-regulado, pode se mostrar insuficiente, neste formato, para abarcar a complexidade e diversidade dos conflitos jurídico-ambientais, necessitando estabelecer conexões comunicativas com o seu substrato socioambiental, que permita a inserção e adequada consideração de variáveis sociais, econômicas e políticas que influenciam no tratamento dos conflitos. O componente técnico não pode ser fator de “engessamento” do Direito Ambiental, pois há também uma forte dependência do Direito Ambiental de componentes valorativos e sociais. Para a análise da hipótese, fez-se necessário conceituar as categorias socioambientalismo, direitos socioambientais e bens socioambientais, relacionando-os à justiça ambiental e verificando sua contribuição para a análise dos conflitos incidentes sobre a sociobiodiversidade. Caracterizou-se os conflitos jurídico-ambientais, a partir de seus dois momentos de construção: social e jurídico. Enfatizou-se os fatores extra-jurídicos que influenciam na conformação jurídica do conflito e no seu tratamento pelo Direito Ambiental. Tais conflitos, pelo caráter diferencial do seu objeto e de seu processo de construção, não podem ser adequadamente processados através da lógica jurídica tradicional, centrada em conflitos intersubjetivos, de caráter individualista e patrimonialista. Analisou-se o Direito Ambiental enquanto sistema jurídico-ambiental e suas possibilidades comunicativas com o seu entorno socioambiental, verificando-se que a inserção de elementos socioambientais no seu ambiente interno é capaz de promover a reorientação de todo o sistema neste sentido, a fim de manter a sua unidade e coerência. A adoção do socioambientalismo e da justiça ambiental como paradigma para o Direito Ambiental tem a pretensão de que a configuração de seus elementos internos, além da influência técnico-científica, seja permeada por outros conceitos, de natureza social, política e econômica, tais como exclusão, distribuição de poder, fragilidades socioeconômicas e informacionais, dentre outros que podem ter um peso significativo na configuração e tratamento dos conflitos jurídico-ambientais e nas possibilidades de que a coletividade promova a defesa e proteção dos seus direitos atinentes a sociobiodiversidade.
Palavras-chaves: socioambientalismo; justiça ambiental; conflitos jurídico-ambientais; sociobiodiversidade.
INTRODUÇÃO
A configuração dos conflitos jurídico-ambientais, especialmente aqueles incidentes sobre a sociobiodiversidade, gera a necessidade de revisão e adequação dos instrumentos jurídico-ambientais, por se referirem a direitos e interesses difusos, que têm como titulares, inclusive, as gerações futuras, e por sofrerem uma ampliação de seu foco, que se estende às questões sociais, econômicas, culturais e políticas. A abordagem das questões ambientais e o seu tratamento pelo Direito exigem mais do que a lógica jurídica tradicional, fazendo-se necessário analisá-las a partir do seu contexto social, econômico, político e cultural e das inter-relações entre estes fatores e destes com o meio ambiente. Esta exigência é maior quando se trata de garantir a proteção da sociobiodiversidade, aqui entendida como o conjunto de bens ambientais, culturais e étnicos e suas formas de interação ou, como define MARÉS, a continuidade da vida “em sua multifacetária expressão de cores, formas e manifestações”[1]. É nesta direção que tem se desenvolvido e consolidado, especialmente a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, um novo paradigma para o entendimento e análise das inter-relações entre ambiente e sociedade, denominado socioambientalismo.
O socioambientalismo possui forte vinculação com a Justiça Ambiental, quando, no âmbito desta, se constata que grupos fragilizados por questões socioeconômicas, étnicas, culturais e informacionais, que afetam a sua possibilidade de exercício da cidadania, arcam com uma parcela desproporcional de custos ambientais, preconizando a distribuição eqüitativa de custos e benefícios ambientais e de poder nas tomadas de decisão incidentes sobre o bem ambiental. Estas duas correntes tem em comum a fusão das agendas do movimento ambientalista e dos movimentos de defesa de direitos, ou seja, a constatação de que o tratamento da questão ambiental exige uma abordagem ampla, que considere o seu contexto social e as inter-relações com fatores socioeconômicos, culturais, étnicos e políticos.
Dentro deste contexto, o artigo tem como objetivo verificar se o socioambientalismo, conjugado à Justiça Ambiental, pode se apresentar como um novo paradigma para o Direito Ambiental, capaz de promover um enfoque mais amplo às normas, institutos e práticas operativas jurídico-ambientais, que inclua fatores de natureza social, econômica, cultural e política e aproximá-lo das demandas socioambientais da coletividade, especialmente no que se refere à proteção da sociobiodiversidade. Parte-se da hipótese de que o Direito Ambiental, marcado por um forte componente técnico-regulado, pode se mostrar insuficiente, neste formato, para abarcar a complexidade e diversidade dos conflitos jurídico-ambientais, necessitando estabelecer conexões comunicativas com o seu substrato socioambiental, que permita a inserção e adequada consideração de variáveis sociais, econômicas e políticas que influenciam no tratamento dos conflitos.
Para o alcance do objetivo proposto e análise da hipótese, aborda-se o socioambientalismo e sua relação com a Justiça Ambiental, verficando sua contribuição proteção da sociobiodiversidade. Analisa a configuração e o processo de construção dos conflitos jurídico-ambientais, destacando os desafios que o seu tratamento coloca ao Direito Ambiental. Por fim, analisa o Sistema Jurídico-Ambiental e as possibilidades de conexão comunicativa com o seu entorno, verificando-se a possibilidade de que o tratamento dos conflitos jurídico-ambientais a partir da lógica socioambiental possa renovar este sistema e aproximá-lo das demandas socioambientais oriundas do seu entorno, tornando-o mais apto a promover a proteção efetiva da sociobiodiversidade.
1.SOCIOAMBIENTALISMO, JUSTIÇA AMBIENTAL E A PROTEÇÃO DA SOCIOBIODIVERSIDADE
O Direito Ambiental possui um forte componente técnico-regulado conforme reconhecem autores como MARTÍN MATEO[2], sem contudo criticá-lo, que destaca a relação entre a norma ambiental e os conhecimentos técnico-científicos referentes às Ciências Naturais, que acabam permeando e direcionando o conteúdo da normativa ambiental. Esta vinculação a parâmetros técnico-científicos, aliada à lógica jurídica tradicional de resolução de conflitos a partir da dogmática jurídica, conforme exposto no item 2, podem fazer com que o Direito Ambiental, neste formato, apresente limitações e insuficiências para abarcar a complexidade do trato da questão ambiental na atualidade, especialmente pela sua forte vinculação a um contexto mais amplo de fatores socioeconômicos, culturais, informacionais e políticos.
É neste contexto que se desenvolve uma nova concepção na abordagem da questão ambiental, denominada de socioambientalismo, que visa à conjugação dos fatores estritamente ambientais e de caráter técnico com o seu contexto social, econômico, cultural, étnico e político. Reconhece os saberes e os fazeres populares, suas construções culturais sobre o seu ambiente, como fatores determinantes no trato jurídico dos conflitos incidentes sobre bens socioambientais e como fontes de construção e renovação do Direito Ambiental. Esta abordagem tem, ainda, uma estreita relação com a criação de condições estruturais mais favoráveis ao exercício da cidadania, através da criação e consolidação de espaços públicos decisórios, entendendo-se que as decisões em matéria ambiental devem ser construídas coletivamente, com a participação direta dos titulares do patrimônio socioambiental. Assim, propugna o desenvolvimento de uma democracia ambiental, capaz de fortalecer a cidadania ambiental e o exercício dos direitos ambientais essenciais, que integram seu núcleo: acesso à informação, participação pública nos processos decisórios e acesso à justiça.
SANTILLI reforça o entendimento do socioambientalismo como novo paradigma jurídico mais apto a promover a defesa e proteção da sociobiodiversidade do que a dogmática jurídica tradicional, apontando para a insuficiência dos esquemas jurídicos individualistas, patrimonialistas ou tecnicistas diante da complexidade das interações ambiente/sociedade:
Destacamos, finalmente, o rompimento dos novos “direitos socioambientais” com os paradgimas da dogmática jurídica tradicional, contaminada pelo excessivo apego ao formalismo, pela falsa neutralidade política e científica e pela excessiva ênfase nos direitos individuais, de conteúdo patrimonial e contratualista. Esses “novos” direitos, conquistados a partir das lutas sociopolíticas democráticas, têm natureza emancipatória, pluralista, coletiva e indivisível, e impõem novos desafios à ciência jurídica.[3]
Este novo paradigma jurídico começa a se construir e ganha reconhecimento a partir da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que reconhece e protege um conjunto de direitos e interesses de caráter coletivo (em sentido lato sensu) referentes ao meio ambiente, à cultura, ao desenvolvimento socioeconômico sustentável e ao respeito a todas as etnias e suas formas de vida. Por outro lado, o socioambientalismo propugna a análise e interpretação integrada destes direitos que não podem ser adequadamente implementados de forma isolada. É neste contexto que o Instituto Socioambiental propõe a adoção da expressão “Direito Socioambiental”, conforme segue:
(…) a Constituição estabeleceu as bases de um direito moderno – o direito socioambiental, que se caracteriza por um novo paradigma de direitos da cidadania, passando pelos direitos individuais e indo muito além. Não se trata da soma linear dos direitos sociais e ambientais previstos no ordenamento jurídico do País, mas de um outro conjunto resultante da leitura integrada desses direitos, pautada pela tolerância entre os povos e pela busca do desenvolvimento comum e sustentável.[4]
Também MARÉS apresenta o socioambientalismo como um novo paradigma jurídico, reconhecendo a existência de um Direito Socioambiental, que “transforma políticas públicas em direitos coletivos”.[5] Neste contexto, essencial definir o objeto do Direito Socioambiental, ou seja, os bens socioambientais enquanto bens jurídicos tutelados. MARÉS os define como
todos aqueles que adquirem essencialidade para a manutenção da vida de todas as espécies (biodiversidade) e de todas as culturas humanas (sociodiversidade). Assim, os bens ambientais podem ser naturais ou culturais, ou se melhor podemos dizer, a razão da preservação h[a de ser predominantemente natural ou cultural se tem como finalidade a bio ou a sociodiversidade, ou a ambos, numa interação necessária entre o ser humano e o ambiente em que vive.[6]
Verifica-se, assim, a estreita ligação entre o paradigma jurídico do socioambientalismo e sua contribuição para uma proteção mais efetiva da sociobiodiversidade. Isto porque reconhece a ligação intrínseca entre o ambiente natural ou construído e as diversas formas apropriação material e simbólica do mesmo pelas comunidades a partir de seus saberes, de sua cultura, de suas formas de vida e de relação com o seu meio. O próprio objeto de proteção jurídica deixa de ser exclusivamente o ambiente em si, mas a variedade de formas de relação entre este e o ser humano.
Deve-se considerar, ainda, que o socioambientalismo, que atinge reconhecimento jurídico com a Constituição Federal de 1988, é fruto da articulação entre o movimento ambientalista e os movimentos sociais, que promovem uma fusão de suas agendas, entendendo que suas demandas e lutas possuíam pontos comuns e poderiam se fortalecer através desta articulação. Como coloca SANTILLI, nasceu na segunda metade dos anos 80, pela articulação política destes movimentos, se consolidou na década de 90 e tem conseguido inserir este paradigma nos âmbitos político e jurídico.
Neste contexto é que se pode começar a traçar um paralelo entre o socioambientalismo e o movimento de justiça ambiental. Este movimento atua como um aglutinador de grupos e movimentos que têm em comum a luta contra formas variadas de injustiça e desigualdade. DOBSON aponta como as duas características do mvimento a sua composição e o seu efeito politizador.[7] Configura-se como a fusão de duas agendas de reivindicações: a de direitos civis e direitos humanos e a ambientalista.
A concepção de Justiça Ambiental, desenvolvida pelo movimento, tem como foco central a distribuição eqüitativa de riscos, custos e benefícios ambientais, independentemente de fatores não justificáveis racionalmente, tais como etnia, renda, posição social e poder; o igual acesso aos recursos ambientais e aos processos decisórios de caráter ambiental, traduzindo-se na democratização destes processos decisórios. Para tanto, faz-se necessário a criação de condições estruturais favoráveis à organização e empoderamento da sociedade como sujeitos ativos do processo de gestão ambiental. Parte da constatação de que grupos fragilizados em sua condição socioeconômica, étnica e informacional, que afetam a sua aptidão para o exercício da cidadania, arcam com uma parcela desproporcional de custos ambientais e enfrentam maiores dificuldades de participação nos processos decisórios ambientais. Como conceito de Justiça Ambiental destaca-se aquele firmado durante o Colóquio Internacional sobre Justiça Ambiental, Trabalho e Cidadania, realizado em Niterói, Rio de Janeiro em 2001 e consolidado na Declaração de Princípios da Rede Brasileira de Justiça Ambiental:
Por justiça ambiental, […], designamos o conjunto de princípios e práticas que:
a) asseguram que nenhum grupo social, seja ele étnico, racial ou de classe, suporte uma parcela desproporcional das conseqüências ambientais negativas de operações econômicas, de decisões de políticas e de programas federais, estaduais, locais, assim como da ausência ou omissão de tais políticas;
b) asseguram acesso justo e eqüitativo, direto e indireto, aos recursos ambientais do país;
c) asseguram amplo acesso às informações relevantes sobre o uso dos recursos ambientais e a destinação de rejeitos e localização de fontes de riscos ambientais, bem como processos democráticos e participativos na definição de políticas, planos, programas e projetos que lhes dizem respeito;
d) favorecem a constituição de sujeitos coletivos de direitos, movimentos sociais e organizações populares para serem protagonistas na construção de modelos alternativos de desenvolvimento, que assegurem a democratização do acesso aos recursos ambientais e a sustentabilidade do seu uso.[8]
Pode-se identificar uma forte relação entre degradação ambiental e injustiça social, pois justamente os grupos já fragilizados por questões socioeconômicas, raciais e informacionais, e, portanto, com maiores dificuldades de defender seus interesses ambientais, acabam sendo os principais afetados por decisões ambientais excludentes. Esta situação também se verifica na disputa pelo acesso aos recursos ambientais, nas quais acaba por prevalecer o poder econômico e a capacidade política de influenciar as tomadas de decisão quanto à alocação destes recursos. GOULD destaca a relação entre a distribuição de poder e a distribuição de custos e benefícios ambientais, demonstrando a influência do poder econômico e político na alocação dos riscos e no acesso aos recursos naturais. Assim é que a economia capitalista e sua estrutura operativa produzem uma distribuição dos custos e benefícios ambientais tendo por base a classe social e “distribui os riscos ambientais para baixo, em direção aos estratos socioeconômicos inferiores”. Por outro lado, o poder econômico cria maiores condições e habilidades para influenciar os processos decisórios, gerando uma distribuição desigual de poder que faz com que as comunidades com menos condições de opor resistência aos riscos ambientais arquem com uma parcela desproporcional dos mesmos.[9]
O escopo desta abordagem da Justiça Ambiental, portanto, está centrado na constatação da existência de uma nova concepção de exclusão mais específica do que a exclusão social, já que decorre dela, denominada exclusão ambiental. A exclusão ambiental é a impossibilidade de gozar de benefícios ambientais, de ter acesso ao poder e aos processos decisórios, decorrente de fatores não justificáveis racionalmente, como a condição socioeconômica, racial, informacional e limitada possibilidade de influência política, decorrente de um contexto político e institucional que favorece a distribuição desigual dos custos e benefícios ambientais. Neste contexto de desigualdade e exclusão ambiental, pode-se destacar que o próprio Direito Ambiental não é igualmente acessível a todos. Pode haver um relaxamento na sua aplicação em virtude do pouco poder de articulação e influência política de grupos e comunidades, ou mesmo de sua posição econômica ou composição racial.
A partir destas considerações referentes à justiça ambiental, fica mais evidente que a abordagem das questões e conflitos ambientais requerem a consideração de variáveis como a exclusão social e ambiental, as diferenças na distribuição de poder nos processos decisórios e a condição de fragilidade daqueles que arcam com parcelas desproporcionais de custos ambientais e enfrentam dificuldades de acessar eqüitativamente os recursos ambientais, afetando a sua própria condição de exercício da cidadania. É neste sentido que o paradigma do socioambientalismo se mostra mais apto para abarcar esta complexidade inerente aos conflitos jurídico-ambientais e promover uma proteção mais efetiva da sociobiodiversidade que ultrapassam a mera análise de questões técnicas de caráter científico e estritamente jurídico.
2. CARACTERIZAÇÃO DOS CONFLITOS JURÍDICO-AMBIENTAIS: desafios e diferenciais dos conflitos incidentes sobre os bens socioambientais
As disputas que têm como foco os bens socioambientais são essencialmente marcadas pela pluralidade de interesses e concepções no que se refere ao uso e apropriação destes bens, que podem conflitar entre si. Um mesmo bem pode ser objeto de interesses de ordem privada, centrados na concepção de mercado e propriedade privada; e de interesses de ordem pública[10], focados na concepção da sociobiodiversidade como bem comum insuscetível de apropriação privada, cuja disponibilidade a todos os beneficiários deve ser garantida.[11] Os conflitos ambientais travam-se em torno de problemas socioambientais e confrontos entre atores sociais que defendem diferentes lógicas para a gestão dos bens coletivos de uso comum.
ALONSO e COSTA[12] propõem uma sociologia dos Conflitos Ambientais, comportando “uma abordagem simultânea da dimensão cultural e política e dos condicionamentos estruturais dos conflitos ambientais”,[13] adotando como linha teórica a escola do processo político. Com base em suas considerações, é possível identificar alguns elementos caracterizadores dos conflitos ambientais: 1) interação conflituosa entre grupos; 2) têm como elementos estruturantes interesses e valores; 3) têm como fator determinante o tempo, ou seja, os contornos do conflito se constroem ao longo do tempo, a medida em que os atores e suas posturas vão se definindo, os discursos vão se solidificando, até alcançar a esfera pública. Assim, não é possível compreender o Conflito Ambiental a partir de uma análise pontual, quando já consolidado e institucionalizado. É interessante destacar os motivos que levam à situação de conflito que, conforme os autores, são dois: disputa pelo controle de bens ambientais e poder de construir e fazer prevalecer determinada concepção da realidade, que corresponderiam a interesses e valores.[14]
No que se refere à teoria construtivista de análise dos conflitos ambientais, deve-se destacar a contribuição de HANNIGAN[15], que visa a analisar a forma como os problemas ambientais são formulados, legitimados e contestados. Os problemas ambientais, aqui transpostos para a esfera de conflitos, são construídos socialmente, a partir de uma série de fatores contextuais que lhe dão o formato final. De especial importância é a sua constatação de que a perspectiva de construção social dos problemas ambientais deve incorporar considerações acerca das relações de poder no âmbito deste processo[16].
A forma pela qual o conflito é socialmente construído[17] e sua transformação ao longo do processo de publicização e inserção na arena pública judicial influenciam diretamente na decisão do mesmo. As visões do conflito, interesses, atores e demais elementos que não se publicizaram ao longo do desenvolvimento do conflito e, portanto, não ascenderam à arena pública judicial, não fazem parte do universo jurídico do conflito. Pode-se concluir que o conflito ambiental possui dois momentos, nos quais existem diferentes níveis e estratégias de disputa. O primeiro momento é aquele referente à construção social do conflito, a definição de seus contornos, elementos, atores, visões e interesses contrapostos que lhe caracterização quando da sua entrada na esfera jurídico institucional. O segundo momento do conflito ambiental é aquele que se passa no interior do sistema jurídico-institucional. Esta entrada se dá quando o conflito já adquiriu contornos definidos, que vão permitir o seu encaminhamento à arena pública judicial. Neste sentido, FUKS destaca que “[…] um determinado conflito só alcança expressão judicial quando já atingiu um grau de maturidade suficiente para que tanto o assunto em pauta quanto a identidade do responsabilizado estejam bem definidos”.[18] Aqui, o conflito soma à sua construção social uma construção jurídica. As “armas” da disputa passam a ser as normas jurídico-ambientais e a argumentação jurídica, tendo como mediador a figura do juiz, com poderes decisórios. De certa forma, é nesta fase que o conflito adquire sua máxima expressão pública. A entrada na esfera jurídico-institucional passa a ser vista como um meio legitimatório.
Já ACSELRAD entende que os conflitos ambientais passam por quatro dimensões constitutivas, que seriam a apropriação simbólica e a apropriação material, a durabilidade e a interatividade espacial das práticas sociais.[19] As duas primeiras, de maior relevância para esta abordagem, relacionam-se aos espaços nos quais se definem as relações de poder e os modos de apropriação da base material da sociedade, neste caso específico o meio ambiente, entendido como capital material. O primeiro espaço refere-se à distribuição de poder sobre o capital material. ACSELRAD exemplifica possíveis causas para este diferencial de poder, que “resultaria tanto da capacidade de influência dos sujeitos sobre o marco regulatório jurídico-políticos do meio ambiente, como da operação de mecanismos econômicos de competição e acumulação ou do exercício da força direta”.[20] Já o segundo espaço refere-se às formas de apropriação simbólica dos recursos.[21] Assim, os conflitos ambientais caracterizam-se pela tensão permanente entre interesses e concepções diferenciadas quanto às formas de apropriação simbólica e material do Meio Ambiente.
No âmbito jurídico, também é possível afirmar que os Conflitos Ambientais representam um grande desafio ao Direito, quebrando certos dogmas, vinculados à certeza e segurança jurídica. Diferenciam-se do padrão “normal” dos conflitos jurídicos, eminentemente marcados pelo caráter patrimonial e individualista. Em matéria ambiental, transcende-se a esfera dos conflitos intersubjetivos, já que o interesse em questão é de natureza difusa. Não há mais como individualizar as partes. Por outro lado, o bem objeto do conflito não se reveste de caráter patrimonial, em sentido econômico. Possui valor intrínseco, vincula-se aos interesses das gerações futuras, caracteriza-se como bem comum marcado por todos os desafios que esta classificação acarreta. Assim, no centro da análise do conflito jurídico-ambiental, deve estar a consideração quanto à espécie de interesse que envolve e o bem objeto da relação conflitual. É neste sentido que se manifestam LEITE e AYALA, destacando o caráter diferencial dos interesses difusos de ordem ambiental e a tensão existente entre estes e os esquemas jurídicos liberais[22]. Também MACIEL destaca a existência de limitações da racionalidade jurídica dominante no trato de questões complexas, como aquelas envolvendo o bem ambiental e, especialmente, interesses difusos, além do desafio de propiciar a participação de indivíduos e grupos nos processos decisórios.[23]
As limitações e fragilidades no que se refere ao trato dos conflitos ambientais podem ter como pano de fundo o entendimento do conflito e o processamento do mesmo, âmbito da dogmática jurídica. FERRAZ JR.[24] e MELO[25] apontam que a decidibilidade dos conflitos é o problema central e a função essencial da dogmática jurídica. A ciência dogmática do Direito apresenta-se como uma sistematização de normas, conceitos e institutos, formando um sistema fechado, centrado nos aspectos formais da decidibilidade dos conflitos, abstraindo dos aspectos axiológicos e dos fenômenos reais. Constrói uma “realidade jurídica” paralela, que define o que é jurídico e o que não é, os conflitos que devem e podem ser decididos e como devem ser decididos. Assim, ao invés de se estruturar a partir da natureza das coisas, força novas configurações da realidade, a fim de se enquadrarem em seus conceitos abstratos. Visa, desta forma, desproblematizar os conflitos, criando uma sensação de segurança ao “facilitar” a sua decidibilidade através de seus esquemas normativos e conceituais, promovendo uma espécie de “limpeza” dos aspectos polêmicos, controversos e valorativos que impossibilitam a sua completa resolução. Cria uma aparência de resolução do conflito, impondo-lhe uma decisão dentro dos limites do sistema dogmático, dada como a única possível e que deve restabelecer a paz social. Neste sentido, destaca ANDRADE que “[…] a dogmática necessita neutralizar os conflitos, isto é, abstraí-los da problemática real e global […] e torná-los conflitos abstratos, interpretáveis, definíveis e decidíveis […]”.[26]
FERRARI, ao invés de se referir à solução dos conflitos opta pela expressão “tratamento de conflitos declarados”,[27] por entender que os esquemas jurídicos não apresentam soluções definitivas para as situações conflituosas, havendo a possibilidade, inclusive, de que os procedimentos judiciais podem conduzir à reprodução dos conflitos[28]. Entende-se que esta expressão é a mais adequada para se referir ao Conflito Ambiental visto que, em certa medida, a sua juridicização pode atuar como fator de intensificação das relações conflituais. É interessante destacar que também FERRARI entende que o processo, que constitui o conflito jurídico, é o produto de um contexto mais amplo, e que a forma jurídica que adquire é dependente justamente das condições colocadas por este contexto.[29]
Pode-se entender que um conflito ambiental se torna um conflito jurídico-ambiental quando os atores nele envolvidos recorrem a argumentos jurídicos e esquemas normativos para fixar seus contornos, adotando como estratégia de ação e mobilização a sua inserção na esfera jurídico-institucional, ou seja, a publicização e a institucionalização do conflito se daria, prioritariamente, pela sua inserção e processamento na arena pública judicial. O arcabouço jurídico-institucional de caráter ambiental contribuiria na definição das partes “legítimas”, na construção de argumentos válidos na arena de decisão escolhida, na legitimação do conflito, já que reconhecido formalmente numa esfera institucional. Gera-se, ainda, a expectativa, ao menos simbólica, de uma decisão definitiva, revestida do poder necessário para garantir a vinculação dos atores envolvidos ao seu estrito cumprimento. Ou seja, o conflito se torna jurídico quando os atores escolhem como estratégia a sua inserção na esfera jurídico-institucional, com partes definidas e legitimadas, fixação de uma versão “oficial”, com método próprio de processamento, envolvendo um terceiro com poderes de emanar uma decisão vinculante.
3. O SISTEMA JURÍDICO-AMBIENTAL E SUAS CONEXÕES COMUNICATIVAS O ENTORNO SOCIOAMBIENTAL
A análise do Direito Ambiental como sistema, as possibilidades de comunicação com o seu entorno socioambiental e a sua modificabilidade a partir destas conexões comunicativas tem como base teórica Claus – Wilhelm Canaris[30], Niklas Luhmmann[31] e Gunther Teubner[32] quanto ao pensamento sistemático e o conceito de sistema, aplicados à Ciência do Direito.
A opção por entender o Direito Ambiental a partir de uma perspectiva sistêmica deu-se visando não restringi-lo a um simples aglomerado de normas (regras e princípios). Entende-se que o Direito Ambiental possui uma dinâmica própria, que decorre da especificidade do bem objeto de tutela. Neste sentido também se manifesta PRIEUR, ao mencionar que a complexidade do meio ambiente e de seus elementos componentes levou à utilização do método sistêmico para o seu estudo e compreensão, o que acaba por se estender ao Direito Ambiental.[33] Assim é que, conforme se entende, o Direito Ambiental possui um modo próprio de operar, que inclui, além das normas, uma estrutura de instituições, institutos jurídicos e concepções, que estão inter-relacionados, e compõem uma unidade dotada de coesão valorativa. Desta forma, os elementos que integram o Sistema Jurídico-Ambiental não são autônomos e isolados. Eles possuem uma unidade de sentido e são operacionalizados através de práticas operativas e de uma lógica própria que diferenciam o Direito Ambiental dos demais ramos do Direito e do seu entorno. BENTANCOR RODRÍGUEZ, ao optar pela análise sistêmica do Direito Ambiental, justifica entendendo que é necessário considerar também os elementos não normativos que exercem influência na conformação do Direito Ambiental. Neste sentido, se estabelece uma relação entre as normas e os fatores, especialmente os subjetivos, que estão em seu entorno e também lhe atribuem sentido.[34]
Pode-se entender, enfim, que o Direito Ambiental constitui um sub-sistema dentro do sistema jurídico, a partir do momento em que desenvolve uma forma própria de operar, decorrente da especificidade do seu objeto, dos seus fins e dos valores que preconiza. O Direito Ambiental não opera dentro da perspectiva de relações intersubjetivas, direitos subjetivos e interesses individuais, típicos do Direito tradicional. Transpõe o indivíduo e o individualismo, tendo como foco interesses difusos, e, portanto, tendo como sujeito toda a coletividade e, em alguns aspectos, a humanidade[35]. Transpõe também a escala temporal, ao abranger interesses e direitos das futuras gerações. Os valores que visa a salvaguardar e realizar não são de caráter patrimonial, não dizem respeito aos valores típicos do mercado ou da concepção utilitarista. Trabalha com valores imateriais, que tem como foco último a própria vida, sem esquecer aqui os valores de ordem estética e cultural.
Para a construção do conceito de sistema jurídico-ambiental, optou-se por utilizar o conceito de Direito Ambiental adotado por SERRANO[36], tendo em vista que se baseia na concepção sistêmica, além de ser suficientemente abrangente para abarcar o que se pretende expressar com a categoria sistema jurídico-ambiental: “o Direito ambiental é o sistema de normas, princípios, instituições, práticas operativas e ideologias jurídicas que regulam as relações entre os sistemas sociais e seus entornos naturais”.[37] Assim, o conceito proposto por SERRANO apresenta duas características essenciais para que se possa transpô-lo para a categoria sistema jurídico-ambiental: é abrangente, não limitando o sistema ao âmbito das normas; parte da noção de sistema e de relação sistemática entre os elementos componentes do Direito Ambiental, em contraposição à idéia de conjunto.
Assim, o traço característico do sistema jurídico-ambiental é que seus elementos constituintes não estão simplesmente agrupados por afinidade, como unidades auto-suficientes, aplicados e operacionalizados de maneira individualizada. Estes elementos estão inter-relacionados, se comunicam e se complementam no tratamento dos conflitos jurídico-ambientais, além de possuírem um núcleo valorativo comum, a partir do qual devem ser interpretados, dado pelos princípios estruturantes do Direito Ambiental. Esta é uma constatação importante para a adoção do socioambientalismo como paradigma para o sistema jurídico-ambiental, já que, como destacado, requer uma interpretação integrada do conjunto de direitos sociais e ambientais, que não podem ser adequadamente entendidos e protegidos se considerados isoladamente.
O sistema jurídico-ambiental configura-se como um sub-sistema do sistema jurídico, que tem nos outros sub-sistemas sociais seu ambiente externo. Tem caráter axiológico-teleológico cujo núcleo valortivo é dado pelos princípios estruturantes do Direito Ambiental, apresentando as características de ordenação e unidade. É marcado pela incompletude e modificabilidade, o que lhe dá um caráter dinâmico. Não é um sistema aberto, pois apresenta certas características típicas de sistemas autopoiéticos, especialmente no que se refere à relação com seu entorno e possibilidade deste exercer influência sobre seu ambiente interno. Tem como elementos normas (regras e princípios), instituições, práticas operativas e ideologias jurídicas, apresentando quatro momentos: legislativo, judicial, executivo e científico. É sensível à complexidade e às “perturbações” do entorno, tendo como uma das possíveis “entradas” destas informações no seu ambiente interno o momento judicial. Estas influências do seu meio envolvente podem promover alterações no interior do sistema, adequando-o às transformações processadas no entorno, o que pode levar à sua renovação. Apesar das informações oriundas do entorno não poderem adentrar de forma direta no ambiente interno do sistema e promover alterações, exercem influência sobre o mesmo, já que estas informações podem ser incorporadas ao sistema através de um processo de seleção e reinterpretação na linguagem do sistema. Assim o sistema se protege da complexidade de seu entorno, tendo em vista as suas limitações, e ao mesmo tempo não se fecha por completo. Apenas desenvolve mecanismos de seleção e reconstrução das informações na sua linguagem e lógica interna.
A adoção do socioambientalismo e da justiça ambiental como paradigma para o sistema jurídico-ambiental tem a pretensão de que a configuração de seus elementos internos, além da influência técnico-científica, seja permeada por outros conceitos, de natureza social, tais como exclusão, racismo, distribuição de poder, dentre outros que podem ter um peso significativo na configuração e tratamento dos conflitos jurídico-ambientais. Entende-se que, pelas possibilidades comunicativas do sistema jurídico-ambiental com o seu entorno, apesar de suas limitações, especialmente a necessidade de que as informações oriundas do seu ambiente externo passem por um processo de seleção e reconstrução na linguagem do Direito, podem promover uma renovação do Sistema, pela incorporação de novos elementos de caráter socioambiental.
A incorporação destes elementos pode se dar, especialmente, através do processamento dos conflitos jurídico-ambientais na esfera judicial, que tem a capacidade de atuar como uma “porta de entrada” das informações socioambientais ao interior do sistema. Desta forma, se os conflitos incidentes sobre a sociobiodiversidade forem tratados pelo Direito e pela esfera jurídico-institucional a partir do paradigma do socioambientalismo e da justiça ambiental, poderão produzir decisões, incorporadas ao sistema jurídico-ambiental, para além da dogmática jurídica tradicional, e permeadas das questões socioeconômicas, políticas, étnicas e culturais, que influenciam na construção do conflito. Estas decisões permeadas de valores socioambientais e de justiça ambiental poderão reorientar o sistema jurídico-ambiental neste sentido, a fim de manter sua unidade e coerência. Portanto, o sistema jurídico-ambiental poderá ser renovado, dentro da perspectiva do socioambientalismo e da justiça ambiental.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Direito Ambiental possui um forte componente técnico-regulado que destaca a relação entre a norma ambiental e os conhecimentos técnico-científicos. Esta vinculação a parâmetros técnico-científicos, aliada à lógica jurídica tradicional de resolução de conflitos a partir da dogmática jurídica, faz com que o Direito Ambiental, neste formato, apresente limitações e insuficiências para abarcar a complexidade do trato da questão ambiental, especialmente pela sua forte vinculação a um contexto mais amplo de fatores socioeconômicos, culturais, informacionais e políticos. Estas limitações se tornam mais explícitas no que se refere à proteção da sociobiodiversidade, marcada pela diversidade de formas de interação entre bens ambientais, sociais, culturais e étnicos, e na garantia de realização da justiça ambiental, o que requer a consideração das fragilidades socioeconômicas, informacionais e de poder dos grupos que enfrentam déficits de cidadania na defesa e proteção de seus direitos socioambientais.
O socioambientalismo se apresenta como uma nova concepção na abordagem da questão ambiental e como paradigma jurídico mais apto a promover a proteção da sociobiodiversidade. Promove a conjugação dos fatores estritamente ambientais e de caráter técnico com o seu contexto social, econômico, cultural, étnico e político. Reconhece os saberes e os fazeres populares, suas construções culturais sobre o seu ambiente, como fatores determinantes no trato jurídico dos conflitos jurídico-ambientais e como fontes de construção e renovação do Direito Ambiental.
A partir da justiça ambiental evidencia-se que a abordagem dos conflitos jurídico-ambientais requerem a consideração de variáveis como a exclusão social e ambiental, as diferenças na distribuição de poder nos processos decisórios e a condição de fragilidade daqueles que arcam com parcelas desproporcionais de custos ambientais e enfrentam dificuldades de acessar eqüitativamente os recursos ambientais. É neste sentido que o paradigma do socioambientalismo se mostra mais apto para abarcar esta complexidade inerente aos conflitos jurídico-ambientais e promover uma proteção mais efetiva da sociobiodiversidade que ultrapassam a mera análise de questões técnicas de caráter científico e estritamente jurídico.
Os conflitos ambientais travam-se em torno de problemas socioambientais e confrontos entre atores sociais que defendem diferentes lógicas para a gestão dos bens coletivos de uso comum.O grau de acesso à informação, o potencial de organização e desenvolvimento de estratégias, as relações de poder têm fator decisivo no processo de publicização e juridicização do conflito. Estes conflitos apresentam-se como um desafio para o Direito, pois não podem ser adequadamente processados através da lógica jurídica tradicional, centrada em conflitos intersubjetivos, de caráter individualista e patrimonialista. A consideração de fatores socioeconômicos, culturais, políticos, étnicos, informacionais e de distribuição de poder é fundamental para a adequada compreensão do processo de construção social e jurídica do conflito e para o seu adequado tratamento, apto a oferecer respostas às demandas socioambientais e de justiça ambiental colocadas pela coletividade.
O sistema jurídico-ambiental configura-se como uma concepção sistêmica do Direito Ambiental, com o intuito de enfatizar a necessária interpretação integrada de seus elementos constitutivos e a sua possibilidade de renovação, através das conexões comunicativas que pode estabelecer com o seu entorno socioambiental. A adoção do socioambientalismo e da justiça ambiental como paradigma para o sistema jurídico-ambiental visa a que a configuração de seus elementos internos, além da influência técnico-científica, seja permeada por outros valores e conceitos de natureza social, econômica, cultural, política e étnica, tais como exclusão e desigualdade ambiental, distribuição de poder, dentre outros que podem ter um peso significativo na configuração e tratamento dos conflitos jurídico-ambientais. Entende-se que as possibilidades comunicativas do sistema jurídico-ambiental com o seu entorno podem promover uma renovação do sistema, pela incorporação de novos elementos de caráter socioambiental, especialmente através do tratamento dos conflitos jurídico-ambientais na esfera jurídico-institucional, a partir do paradigma socioambiental, que pode resultar em decisões judiciais incorporadas ao sistema e que possam redirecioná-lo neste sentido e promover o reconhecimento de que a efetiva proteção da sociobiodiversidade exige uma abordagem mais ampla de fatores socioeconômicos, políticos, culturais e étnicos, capazes de abarcar toda a sua complexidade.
Mestre e doutora em Ciência Jurídica pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Doutoranda em Direito Ambiental pela Universidad de Alicante, Espanha. Docente/pesquisadora em Direito Ambiental da UNIVALI. Membro do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental.
Mestre em Direito e doutor em Ciências Humanas pela Universidade Federal de Santa Catarina. Docente/pesquisador em Direito Ambiental do Programa de Mestrado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí. Membro do Grupo de Pesquisa em Direito Ambiental
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