Sumário: Introdução. Desenvolvimento. Emenda Constitucional 45, de 2004. Lei 11.417, de 19.12.2006. Legitimação para proposição de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante. Eficácia da súmula vinculante. Processo Administrativo Federal. Observação. Edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante. Vigência. Conclusão. Bibliografia.
Introdução.
Pode-se dizer que a introdução das súmulas vinculantes no ordenamento constitucional brasileiro representou uma importante inovação.
É possível recordar que as súmulas vinculantes foram pensadas como um dos instrumentos da Reforma do Judiciário no intuito de se evitar grande número de recursos repetitivos que muitas vezes só serviam para congestionar o funcionamento dos tribunais brasileiros e tornar a prestação jurisdicional mais lenta e ineficaz.
Com o propósito de continuar os nossos estudos a respeito dos diferentes temas do direito, esta nova fórmula, ou melhor, esta nova fonte de direito não poderia deixar de ser estudada.
Desenvolvimento.
Informa Luiz Flávio Gomes, em outras palavras, que súmula é o resumo ou a breve exposição de uma verdade expressa, sem desenvolvimento nem explicação, a respeito de um entendimento da jurisprudência, ou seja, de decisões judiciais repetidas no mesmo sentido.
No Brasil, desde a Emenda Constitucional 45, de 2004 – a Reforma do Judiciário -, as súmulas podem ser vinculantes e não vinculantes. As súmulas do STF até a edição da Lei 11.417, de 2006, não são vinculantes, de acordo com Luiz Flávio Gomes.[1]
O autor esclarece que para serem vinculantes, as súmulas devem seguir o procedimento descrito na Lei de 19.12.2006, que regulamentou o art. 103-A da CF.
As principais questões a respeito das súmulas vinculantes seriam, inicialmente, as de que somente o STF pode aprová-las.
A edição, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser fruto de atividade espontânea do próprio STF ou provocada por aqueles que contam com legitimidade para tanto.
Para a edição ou revisão ou cancelamento de uma súmula vinculante exige-se quorum qualificado, dois terços, ou seja, oito Ministros do STF.
O enunciado da súmula versará a respeito da validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas (constitucionais ou infraconstitucionais), acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão.
A controvérsia gerada pela norma interpretada tem que ter atualidade, tem que ser relevante no momento em que se decide pela edição da súmula.
A controvérsia tem que envolver órgãos judiciários diversos ou um órgão judiciário e a administração pública. Divergência só entre órgãos da administração pública não permitirá a aprovação de súmula vinculante.
A controvérsia instalada em torno da interpretação de uma norma deve gerar insegurança jurídica e multiplicação de processos.
Vinculante é não somente o sentido da súmula, mas também os fundamentos invocados para a sua aprovação.
A vigência da súmula é imediata, ocorrendo imediatamente após sua publicação na imprensa oficial.
A súmula vincula os demais órgãos do Poder Judiciário, a Administração Pública, direta ou indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Vincula também o legislativo em sua atividade de administração.
As súmulas podem ser revisadas ou canceladas na forma estabelecida em lei: quorum de 2/3 do STF, legitimidade de quem faz a proposta, publicação no Diário Oficial etc.
No caso de descumprimento da súmula vinculante cabe reclamação para o STF. Procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.
As súmulas são imperativas, impondo determinado sentido normativo, devendo ser acolhidas de forma obrigatória e coercitivas, pois se não observada essa interpretação cabe reclamação ao STF.
O juiz, ao acolher a súmula vinculante, deve fundamentar a sua decisão demonstrando que os fundamentos do caso concreto que está sob seu exame coincidem com os fundamentos das decisões que autorizaram a criação da súmula vinculante.
São estas, basicamente, as informações trazidas por Luiz Flávio Gomes. [2]
Em capítulo acerca da aplicação constitucional da súmula vinculante, Luiz Henrique Boselli de Souza informa que após a promulgação da Emenda Constitucional 45, de 2004 e da publicação da Lei 11.417, em 2006, encerraram-se os debates acerca da conveniência ou não da sua criação. [3]
O mesmo autor informa que a súmula havia surgido no direito brasileiro como uma criação do próprio Supremo Tribunal Federal, a partir de emenda idealizada pelo Ministro Victor Nunes Leal que a introduziu em seu Regimento Interno e publicou em 30/08/1963. A sua vigência inaugurou-se em 1964 com a aprovação das primeiras 370 ementas.
Tradicionalmente, no Brasil, as súmulas não eram vinculantes e nem obrigatórias, restando seus efeitos como de mera persuasão. O que as mesmas faziam, na prática, era orientar aos interessados a respeito do que decidiam os Tribunais superiores e permitirem conhecimento prévio sobre como determinada matéria fora decidida, além de proporcionar uma uniformização jurisprudencial.
O próprio Código de Processo Civil (Lei 5.869, de 1973, com a redação dada pela Lei 9.756, de 17.12.1998), em seu artigo 557, §1º-A, prevê que, nos processos nos Tribunais, o relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. [4]
O §1º-A, por sua vez, explica que se a decisão recorrida estiver em confronto notório, evidente, com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.
Observa o autor, entretanto, que, mesmo assim, já àquela altura, ou, ainda naquele momento, não se podia dizer que as súmulas tinham efeito vinculante, “apesar de uma tendência de alargamento de sua aplicação”. [5]
Tudo mudou, então, a partir da Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004 que passou a permitir que o Supremo Tribunal Federal aprove súmulas vinculantes em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública direta e indireta em todas as suas esferas de governo.
A súmula vinculante versará, assim, sobre a validade, a interpretação e a eficácia de determinadas normas, exigindo que sobre estas haja controvérsia atual entre órgãos do Poder Judiciário ou entre esses e a Administração Pública que cause insegurança jurídica e multiplicação de processos sobre questão idêntica.
Emenda Constitucional 45, de 2004.
Consta do artigo 2º da EC 45 o acréscimo ao texto constitucional do artigo 103-A e seus três parágrafos.
O artigo 103-A da Constituição determina que o Supremo Tribunal Federal pode, de ofício ou por provocação, por meio de decisão de dois terços de seus membros, após repetidas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta federal, estadual e municipal, além de fazer sua revisão ou cancelamento, como determinar a lei que regulamentar este dispositivo.
O § 1º determina que a súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
Já o § 2º indica que sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. São eles, de acordo com o texto constitucional: o Presidente da República; a Mesa do Senado Federal; a Mesa da Câmara dos Deputados; a Mesa de Assembléia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal; o Governador de Estado ou do Distrito Federal; o Procurador-Geral da República; o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; partido político com representação no Congresso Nacional e confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Finalmente, segundo o §3º, do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, de acordo com o caso.
Lei 11.417, de 19.12.2006.
A Lei 11.417, de 2006, é a lei federal ordinária que regulamentou o artigo 103-A da Constituição Federal de 1988 e alterou a Lei 9.784, de 29.01.1999, disciplinando a edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal.
A Lei 9.784, de 1999, por sua vez, trata do processo administrativo no âmbito da administração pública federal.
A própria classificação de Direito da Lei 11.417 traz termos eminentemente de direito e de processo administrativos: Direito Administrativo; Atos Administrativos; Direito Processual; Organização Judiciária. Competência. Jurisdição. Atribuições. Tribunais Superiores. Supremo Tribunal Federal (STF). Direito Administrativo. Atos Administrativos; Direito Processual; Organização Judiciária. Competência. Jurisdição. Atribuições. Tribunais Superiores. Supremo Tribunal Federal (STF).
A Lei 11.417 disciplina a edição, a revisão e o cancelamento do enunciado da súmula vinculante pelo supremo Tribunal Federal.
O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, depois de repetidas decisões sobre matéria constitucional, editar enunciado de súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma prevista na Lei 11.417.
O enunciado da súmula terá por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja, entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, controvérsia atual que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre idêntica questão.
O Procurador-Geral da República, nas propostas que não houver formulado, manifestar-se-á previamente à edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante.
A edição, a revisão e o cancelamento de enunciado de súmula com efeito vinculante dependerão de decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos membros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária.
No prazo de 10 (dez) dias após a sessão em que editar, rever ou cancelar enunciado de súmula com efeito vinculante, o Supremo Tribunal Federal fará publicar, em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União, o enunciado respectivo.
Legitimação para proposição de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante.
Baseada na parte inicial da redação do §2º do artigo 103-A da Constituição Federal, a Lei 11.417, de 2006 ampliou a legitimação para proposição de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante ao incluir entre os mesmos o Defensor Público-Geral da União; os Tribunais Superiores, os Tribunais de Justiça de Estados ou do Distrito Federal e Territórios, os Tribunais Regionais Federais, os Tribunais Regionais do Trabalho, os Tribunais Regionais Eleitorais e os Tribunais Militares.
Também o Município poderá propor, incidentalmente ao curso de processo em que for parte, a edição, a revisão ou o cancelamento de enunciado de súmula vinculante, o que não autoriza a suspensão do processo.
No procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado da súmula vinculante, o relator poderá admitir, por decisão irrecorrível, a manifestação de terceiros na questão, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
O Presidente do Supremo Tribunal Federal, exercendo sua competência própria de editar resoluções – Art. 363, I do RI do STF -, criou a Resolução 388, de 5 de dezembro de 2008, que disciplina o processamento de proposta de edição, revisão e cancelamento de súmulas e dá providências correlatas.
Pelo artigo 1º da mesma Resolução, recebida proposta de edição, revisão ou cancelamento de súmula, vinculante ou não, a Secretaria Judiciária a registrará e autuará, publicando edital no sítio do Tribunal e no Diário da Justiça Eletrônico, para ciência e manifestação de interessados no prazo de 5 (cinco) dias. Em seguida, encaminhará a seguir os autos à Comissão de Jurisprudência, para apreciação dos integrantes, no prazo sucessivo de 5 (cinco) dias, quanto à adequação formal da proposta.
Devolvidos os autos com a manifestação da Comissão de Jurisprudência, a Secretaria Judiciária, encaminhará cópias desta manifestação e da proposta de edição, revisão ou cancelamento de súmula aos demais Ministros e ao Procurador-Geral da República, e fará os autos conclusos ao Ministro Presidente, que submeterá a proposta à deliberação do Tribunal Pleno, mediante inclusão em pauta.
A manifestação de eventuais interessados e do Procurador-Geral da República dar-se-á em sessão plenária, quando for o caso.
A proposta de edição, revisão ou cancelamento de súmula tramitará sob a forma eletrônica e as informações correspondentes ficarão disponíveis aos interessados no sítio do STF.
Eficácia da súmula vinculante
O artigo 4º da Lei 11.417 dispõe que a súmula vinculante tem eficácia imediata, entretanto, o STF poderá, por decisão de 2/3 dos seus membros, restringir seus efeitos vinculantes ou decidir a respeito de sua eficácia somente a partir de um momento seguinte, por motivos de segurança jurídica ou excepcional interesse público.
O artigo 5º, por sua vez, informa que se for modificada ou mesmo revogada a lei sobre a qual se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante, o Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, realizará a sua revisão ou o seu cancelamento, conforme o caso.
A proposta de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula vinculante não autoriza a suspensão dos processos em que se discuta a mesma questão.
Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante, negar-lhe vigência ou aplicá-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação.
Contra omissão ou ato da administração pública, o uso da reclamação só será admitido após esgotamento das vias administrativas.
Ao julgar procedente a reclamação, o Supremo Tribunal Federal anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial impugnada, determinando que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso.
Processo Administrativo Federal
A Lei 9.784, de 1999, disciplina o processo administrativo no âmbito federal brasileiro.
O artigo 8º da Lei 11.417 acrescentou um parágrafo 3º ao texto do artigo 56 daquela primeira lei.
O assunto tratado é o recurso administrativo e a revisão.
Desta forma, o artigo 56, §3º da Lei 9.784, de 1999 tem a seguinte redação:
“Se o recorrente alegar que a decisão administrativa contraria enunciado da súmula vinculante, caberá à autoridade prolatora da decisão impugnada, se não a reconsiderar, explicitar, antes de encaminhar o recurso à autoridade superior, as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso.”
Isto porque no artigo que recebeu o novo parágrafo é tratada a admissibilidade recursal das decisões administrativas, em face de razões de legalidade e de mérito.
Já o artigo 9º da Lei em análise acrescentou dois novos artigos à originária lei que disciplinou o processo administrativo federal brasileiro: artigos 64-A e 64-B.
O artigo 64-A:
“Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso.”
O artigo 64-B:
“Acolhida pelo Supremo Tribunal Federal a reclamação fundada em violação de enunciado da súmula vinculante, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento do recurso, que deverão adequar as futuras decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal.”
O artigo 64, na sua redação original, prevê que o órgão competente para decidir o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência.
O parágrafo único explica que se da aplicação do disposto no artigo decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão.
Observação
O fato de a Lei 11.417 ter acrescentado nova redação à Lei do Processo Administrativo Federal é bastante claro no sentido da mesma apenas adaptar o diploma processual administrativo brasileiro à realidade das súmulas vinculantes.
Edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante
O artigo 10 da Lei 11.417 observa que o procedimento de edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula com efeito vinculante obedecerá, subsidiariamente, ao disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
Vigência
Prevista para entrar vigor 3 (três) meses após a sua publicação, a Lei 11.417 foi publicada no dia 20.12.2006 e vigorou a partir do dia 20.03.2007.
Conclusão.
Todos os instrumentos legais que servirem para melhorar a efetividade e a velocidade da prestação dos serviços jurisdicionais no país devem ser elogiados.
Notas:
[1] Súmulas Vinculantes, Jus Navigandi, Teresina, ano 11, nº 1296, 18.01.2007, acesso em 13.02.2010, às 06:16 (UTC -3) disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9402;
Informações Sobre o Autor
Francisco Mafra.
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.