Tratados em espécie

Descrição: É certo que o Brasil possui inúmeros tratados internacionais não valos aqui trabalhar todos os tratados em espécie, mas apenas apontar questões importantes sobre a proteção internacional do meio ambiente e sobre o direito penal internacional.


Sumário: 1. Introdução. 2. Proteção internacional do meio ambiente. 3. Direito Penal Internacional. 3.1. Princípios fundamentais. 3.2. Composição da Corte. 3.3. Penas aplicáveis. 4.. Posição do STF acerca dos tratados internacionais.


Para instigar e fomentar a reflexão gostaria de iniciar este artigo com a seguinte citação: “O mais profundo princípio da natureza humana é a ânsia de ser apreciado” (Abraham Lincoln)


1. INTRODUÇÃO


São espécies de Tratados: Normativos (Resolução 158 da OIT); Contratuais (Tratado da Amizade URSS X países comunistas da Europa). Multilaterias e Bilaterais.


Tratados Normativos


– Estabelecem regras de interesse geral.


– Os Estados se obrigam ao cumprimento do tratado desde que esse tratado transforme-se em norma interna.


Tratados Contratuais


– Estabelecem regras particulares entre os que assinam o tratado.


– Tem eficácia entre as partes contratantes.


Segundo o Ministério das Relações Exteriores temos os seguintes tratados em vigor:[1]


Acordos, tratados e convenções multilaterais em vigor para o Brasil:


.: ALADI


.: Agricultura e Pecuária


.: Antártida


.: Aviação Civil


.: Bacia do Prata


.: Bancos Internacionais


.: Ciência & Tecnologia


.: Comércio Internacional


.: Comunicações


.: Comunidade dos Países de Língua Portuguesa – CPLP


.: Conferência Ibero-Americana


.: Cooperação Amazônica


.: Cultura e Educação


.: Defesa e Desarmamento


.: Direito Cambial


.: Direito Internacional Privado


.: Direito Internacional Público


.: Direito do Mar


.: Direito Penal


.: Direitos Humanos


.: Energia Convencional e Nuclear


.: Espaço Exterior


.: Exposições e Amostras


.: FAO


.: Guerra e Paz


.: IBAS


.: Meio Ambiente


.: Mercosul


.: Meteorologia


.: Metrologia


.: Migrações


.: ONU


.: OEA


.: Organização Marítima Internacional


.: Organizações Econômicas e Financeiras


.: Pesca


.: Política Aduaneira


.: Previdência Social


.: Privilégios e Imunidades


.: Produtos de Base


.: Propriedade Intelectual e Industrial


.: Relações Diplomáticas e Consulares


.: Saúde Pública


.: Terrorismo


.: Trabalho (OIT)


.: Transportes Marítimo e Terrestre


.: Turismo


Acordos, tratados e convenções bilaterais em vigor para o Brasil


.: Academias Diplomáticas


.: Acordos de Sede


.: Agricultura e Produtos Agrícolas


.: Arbitragem e Conciliação


.: Assistência Judiciária em Matéria Civil e Penal


.: Assuntos Tributários


.: Atividades Remuneradas por Dependentes


.: Bancos


.: Cartas Rogatórias


.: Comércio


.: Comissão Mista


.: Consultas Diplomáticas


.: Cooperação Cultural, Educacional e Desportiva


.: Cooperação Econômica e Financeira


.: Cooperação Industrial


.: Cooperação Naval


.: Cooperação Técnica, Científica e Tecnológica


.: Cooperação para Unidades da Federação


.: Defesa e Assuntos Militares


.: Direitos Humanos


.: Direitos Penal, Contrabando e Entorpecentes


.: Energia Convencional e Nuclear


.: Espaço Exterior


.: Extradição


.: Fronteiras


.: Investimento


.: Meio Ambiente


.: Meios de Comunicação


.: Migrações


.: Organismos Internacionais


.: Paz, Amizade, Comércio e Navegação


.: Pecuária


.: Pesca


.: Petróleo


.: Política Administrativa


.: Previdência e Assistência Social


.: Privilégios e Imunidades


.: Promoção e Proteção de Investimentos


.: Recursos Naturais


..: Relações Diplomáticas e Consulares


.: Sanidade Animal e Vegetal


.: Saúde


.: Transporte Aéreo


.: Transporte Ferroviário


.: Transporte Fluvial e Marítimo


.: Transporte Rodoviário


.: Transporte Terrestre


.: Turismo


.: Vistos


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É certo que o Brasil possui inúmeros tratados internacionais não valos aqui trabalhar todos os tratados em espécie, mas apenas apontar questões importantes sobre a proteção internacional do meio ambiente e sobre o direito penal internacional.


2. Proteção internacional do meio ambiente.


Na administração de seu próprio território e em qualquer atividade de uso de recurso naturais, cada vez mais o Estado subordina-se a normas internacionais, de elaboração quase sempre multilateral, Essas normas prestigiam os chamados diretios de terceira geração, dentre as quais se encontra o direito a um meio ambiente saudável.


As convenções internacionais de Estocolmo, em 1972 e do Rio de Janeiro, em 1992, foram os marcos que propiciaram a criação e disseminação de princípios que aliam a proteção ao meio ambiente com crescimento econômico, dente os quais se destacam o principio do desenvolvimento sustentável, adotado pela conferencia do Rio de Janeiro, por meio da Declaração do Rio e da Agenda 21. Segundo o principio 4 da Declaração do Rio, “para se alcançar o desenvolvimento sustentável, a proteção do maio ambiente deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento e não pode ser considerada isoladamente em relação a ele”.


Além do principio do desenvolvimento sustentável, são princípios gerais do direito internacional do meio ambiente:


– Princípio do poluidor pagador;


– Princípio da cooperação


– Princípio da precaução e prevenção;


– Princípio do fornecimento de informações e consulta.


Vejamos a seguir algumas das principiais convenções internacionais relativas À preservação do meio ambiente e temas afins.


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3. Direito Penal Internacional


O direito penal internacional é constituído por um conjunto de regras internacionais que prevêem crimes como o genocídio, crimes contra humanidades, crimes de guerra, etc. Tais crimes podem vir a ser julgados por tribunais internacionais, como o tribunal de Nurembergue, instituído pelo acordo de Londres, de 1945. Apesar de contestado pela doutrina, os crimes internacionais podem ser submetidos a tribunais internacionais ad hoc, como foram os casos do Tribunal Nurembergue, do tribunal penal internacional para a Ex-Iugoslávia e o tribunal penal para Ruanda. Além disso, em alguns casos, os indivíduos acusados de crimes de guerra são submetidos a tribunais nacionais. Há também a possibilidade de os indivíduos serem julgados pelos tribunais internos de outros Estados, em decorrência de tratado firmado nesse sentido.


Em 1998, por meio do Tratado de Roma, foi criado o Tribunal Penal Internacional, cuja competência “limita-se aos crimes mais graves que atingem o conjunto da comunidade internacional”. Esses crimes são contra a humanidade (extermínio, redução à escravatura, deportação forçada, tortura) e os crimes de guerra. Diferentemente da Corte Internacional de Justiça, cuja jurisdição é restrita a Estados. O Tribunal Penal Internacional analisa casos propostos contra indivíduos. Além disso, a jurisdição do Tribunal não está restrita a uma situação especifica, ao passo que os tribunais ad hoc foram criados para analisarem crimes cometidos durante esses conflitos. Assim, diferentemente dos foros de Nurembergue, da Iugoslávia e de Ruanda. O Tribunal Penal Internacional não tem limites geográficos ou circunstanciais.


Em outubro de 2008, os seguintes 108 países haviam ratificado ou acedido ao estatuto de países membros da CPI:


Na Europa: Albânia, Andorra, Áustria, Bélgica, Bósnia e Herzegovina, Bulgária, Croácia, Chipre, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha,, Estônia, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Hungria, Islândia, Irlanda, Itália, Geórgia, Letônia, Liechtenstein, Lituânia, Luxemburgo, Macedônia, Madagascar, Malta, Montenegro, Noruega, Países Baixos, Polônia, Portugal, Romênia, San Marino, Sérvia, Suécia, Suíça, Reino Unido


Na África: África do Sul, Benim, Botswana, Burkina Faso, Burundi, Chade, Comores, Congo, Djibouti, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Lesoto, Libéria, Malawi, Mali, Maurícia, Namíbia, Níger, Nigéria, Quênia, República Centro-Africana, República Democrática do Congo, Senegal, Serra Leoa, Tanzânia, Uganda, Zâmbia.


Nas Américas: Antígua e Barbuda, Argentina, Barbados, Belize, Bolívia, Brasil, Canadá, Colômbia, Costa Rica, Dominica, Equador, Guiana, Honduras, México, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, São Cristóvão e Nevis, São Vicente e Granadinas, Suriname, Trindade e Tobago, Uruguai, Venezuela


Na Ásia: Afeganistão, Camboja, Coréia do Sul, Japão, Jordânia, Mongólia, Tadjiquistão


Na Oceania: Austrália, Fiji, Ilhas Cook, Ilhas Marshall, Nauru, Nova Zelândia, Samoa, Timor-Leste.”


Além dos Estados acima, há 41 outros Estados que assinaram, mas ainda não ratificaram o tratado. Como assinar um tratado não tem efeito legal sem a ratificação, esses Estados não fazem parte do tratado, a menos que o ratifiquem.


Algumas pessoas afirmam que não é possível para um Estado retirar sua assinatura de tal tratado, mas como o efeito legal de um tratado segue sua ratificação, e não sua assinatura há pouca diferença entre retirar-se de um tratado e afirmar que não se tem a intenção de ratificá-lo.


O Tribunal Penal Internacional tem sua sede em Haia, Holanda, e é uma instituição judiciária permanente, criada pela vontade dos Estados fundadores, dotada de personalidade jurídica própria. Essa característica o diferencia de outras cortes internacionais, geralmente vinculadas a organizações internacionais. É regido por um Estatuto, o qual determina que o tribunal:


a) Tem caráter permanente;


b) É competente para julgar os crimes cometidos após a entrada em vigor do Estatuto (jurisdição não-retroativa)


c) Consagra o princípio de que a responsabilidade peal individual será invocada perante o Direito Internacional independentemente da lei nacional e de que a imunidade de Chefes de Estado e Ministros não os beneficiará quando envolvidos em crimes internacionais;


d) Possui jurisdição complementar, ou seja, a jurisdição nacional do Estado onde ocorreu o crime ou do Estado da nacionalidade do réu tem preferência no julgamento do crime, e


e) O exercício da jurisdição do Tribunal pressupõe o consentimento do Estado onde ocorreu o crime e do Estado patrial.


3.1. Princípios fundamentais


A atuação do Tribunal Penal Internacional assenta-se sobre alguns princípios fundamentais, sendo talvez o mais importante o da complementariedade.


De acordo com o mesmo, a Corte somente atua se o Estado que tem jurisdição sobre determinado caso não iniciou o devido processo ou, se o fez, agiu com o intuito de subtrair o acusado à justiça ou de mitigar-lhe a sanção. Este postulado, à primeira vista, parece chocar-se com os fins colimados no Tratado de Roma, mas justifica-se porque compete em primeiro lugar aos Estados o dever de reprimir os crimes capitulados no Estatuto do Tribunal, até para que a repressão se faça de modo mais eficaz. A Corte, pois, atua apenas subsidiariamente, agindo, sobretudo na hipótese em que ocorre “a falência das instituições nacionais”. [2]


Outro é o princípio da universalidade, pelo qual os Estados-partes colocam-se integralmente sob a jurisdição da Corte, não podendo subtrair de sua apreciação determinados casos ou situações. O Estatuto contempla também o princípio da responsabilidade penal individual, segundo o qual o indivíduo responde pessoalmente por seus atos, sem prejuízo da responsabilidade do Estado.


O princípio da irrelevância da função oficial, por sua vez, permite que sejam responsabilizados chefes de Estado ou de governo, ministros, parlamentares e outras autoridades, sem qualquer privilégio ou imunidade.


Já o princípio da responsabilidade de comandantes e outros superiores exigem que todos os chefes militares, mesmo que não estejam fisicamente presentes no local dos crimes, envidem todos os esforços ao seu alcance para evitá-los, sob pena de neles ficarem implicados.


Por fim, o princípio da imprescritibilidade, de acordo com o qual a ação criminosa jamais terá extinguido a punibilidade pelo decurso do tempo, embora ninguém possa ser julgado por delitos praticados antes da entrada em vigor do Tratado.


3.2. Composição da Corte


O Tribunal será integrado por 18 juízes, no mínimo, que se distribuirão por três Seções: a Seção de Questões Preliminares, incumbida de examinar a admissibilidade dos processos, a Seção de Primeira Instância, que proferirá os julgamentos, e a Seção de Apelações, responsável pela apreciação dos recursos.


A escolha dos juízes caberá à Assembléia dos Estados-partes, recaindo sobre pessoas que gozem de elevada consideração moral, imparcialidade e integridade, e que possuam as condições exigidas para o exercício das mais altas funções judiciárias de seu país, além dominarem uma das línguas oficiais da Corte (inglês, francês, espanhol, russo e árabe).


Devem ainda apresentar: (1) reconhecida competência em direito penal e processual penal, e também experiência como juiz, promotor ou advogado; ou, alternativamente, (2) reconhecida competência no campo do direito internacional humanitário e direito internacional dos direitos humanos, assim como experiência nas funções jurídicas relacionadas com o Tribunal.


Na seleção dos magistrados, a Assembléia deverá atentar para que exista equilíbrio entre candidatos que apresentem uma dessas duas qualificações. Exige-se também que estejam representados os principais sistemas jurídicos do mundo e que haja uma presença geográfica eqüitativa, assim como uma participação balanceada de homens e mulheres.


A Promotoria integra a Corte como um órgão independente do Tribunal, sendo dirigida por um promotor-chefe, coadjuvado por mais um promotor adjunto, no mínimo, escolhidos pela Assembléia dos Estados-partes para um mandato de nove anos, dentre pessoas da mais alta idoneidade, experientes na tarefa da persecução penal e que também dominem pelo menos uma das línguas oficiais do Tribunal.


3.3. Penas aplicáveis


Uma vez considerado culpado, o réu estará sujeito às seguintes penas: (1) reclusão pelo prazo não superior a trinta anos; (2) prisão perpétua, dependendo da gravidade do delito cometido e das circunstâncias pessoais do acusado; (3) multa; e (4) confisco de bens procedentes direta ou indiretamente da prática do crime. A pena será cumprida em um dos Estados-partes e poderá ser reduzida depois do cumprimento de um terço ou de 25 anos, no caso de prisão perpétua, atentando-se para a colaboração prestada pelo réu durante o julgamento.


O Tribunal poderá também fixar uma reparação às vítimas, sob a forma de reabilitação ou indenização, que será paga pelo réu ou por um Fundo Fiduciário, especialmente criado para esse fim, constituído por bens confiscados e por contribuições dos Estados-partes.


4. Posição do STF acerca dos tratados internacionais


De acordo com Direito brasileiro, as fases de elaboração dos tratados são: negociação, assinatura, aprovação, ratificação, promulgação e publicação.


Participam desse processo os Poderes Executivos e Legislativos. A Constituição determina que a competência para celebrar tratados, acordos e atos internacionais é privativa do Presidente da República (art. 84, inc. VIII). Há, todavia, a possibilidade de Ministros do Estado celebrar tratados e acordos internacionais, desde que possuam uma Carta de Plenos Poderes outorgada pelo Presidente da República. Após sua celebração, os tratados são remetidos ao referendo do Congresso Nacional, a quem cabe decidir sobre a aprovação (art. 49, inc. I). A provação se dá por meio do Decreto Legislativo e, após, o ato retorna ao Executivo para ratificação.  Por meio da ratificação, o Presidente da Republica transmite aos demais Estados-Partes o intuito de formalizar o início da exigibilidade do tratado. Esse ato se dá pelo depósito do instrumento de ratificação. Para o aperfeiçoamento do ato e início da vigência no território nacional, o Presidente da República firma um decreto de promulgação, cuja data de publicação corresponde ao início da vigência no território nacional. Sendo assim, os tratados internacionais somente passam a integrar o ordenamento jurídico brasileiro após sua promulgação pelo Poder Executivo, posição essa reiteradamente afirmada pelo Supremo Tribunal Federal.[3]


A CF de 1988 tem vários artigos que ora nos posicionam como monistas com primazia do Direito Internacional radicais (ex.: art. 7.º do ADCT e § 2.º do art. 5.º da CF de 1988), ora como moderados (ex.: art. 105, III, “a”, da CRFB/88). Por este último artigo, o tratado tem natureza de lei ordinária federal e, portanto, está abaixo da CF de 1988. Também nos posicionamos como dualistas, porque os tratados assinados pelo Brasil devem passar pelo crivo do Congresso Nacional para serem ratificados (art. 84, VIII, da CF de 1988) e depois serão transformados em uma espécie normativa interna (decreto legislativo, decreto etc.).


Além disso, o STF já afirmou que a mesma sistemática de recepção de acordos se aplica aos tratados celebrados no âmbito do Mercosul:


“EMENTA: MERCOSUL – CARTA ROGATÓRIA PASSIVA – DENEGAÇÃO DE EXEQUATUR – PROTOCOLO DE MEDIDAS CAUTELARES (OURO PRET0/MG) – INAPLICABILIDADE, POR RAZÕES DE ORDEM CIRCUNSTANCIAL – ATO INTERNACIONAL CUJO CICLO DE INCORPORAÇÃO, AO DIREITO INTERNO DO BRASIL, AINDA NÃO SE ACHAVA CONCLUÍDO À DATA DA DECISÃO DENEGATÓRIA DO EXEQUATUR, PROFERIDA PELO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – RELAÇÕES ENTRE O DIREITO INTERNACIONAL, O DIREITO COMUNITÁRIO E O DIREITO NACIONAL DO BRASIL – PRINCÍPIOS DO EFEITO DIRETO E DA APLICABILIDADE IMEDIATA – AUSÊNCIA DE SUA PREVISÃO NO SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO – INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA GERAL DE RECEPÇÃO PLENA E AUTOMÁTICA DE ATOS INTERNACIONAIS, MESMO DAQUELES FUNDADOS EM TRATADOS DE INTEGRAÇÃO – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. A RECEPÇÃO DOS TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM GERAL E DOS ACORDOS CELEBRADOS NO ÂMBITO DO MERCOSUL ESTÁ SUJEITA À DISCIPLINA FIXADA NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. – A recepção de acordos celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL está sujeita à mesma disciplina constitucional que rege o processo de incorporação, à ordem positiva interna brasileira, dos tratados ou convenções internacionais em geral. É, pois, na Constituição da República, e não em instrumentos normativos de caráter internacional, que reside a definição do iter procedimental pertinente à transposição, para o plano do direito positivo interno do Brasil, dos tratados, convenções ou acordos – inclusive daqueles celebrados no contexto regional do MERCOSUL – concluídos pelo Estado brasileiro. Precedente: ADI 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO. – Embora desejável a adoção de mecanismos constitucionais diferenciados, cuja instituição privilegie o processo de recepção dos atos, acordos, protocolos ou tratados celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL, esse é um tema que depende, essencialmente, quanto à sua solução, de reforma do texto da C onstituição brasileira, reclamando, em conseqüência, modificações de jure constituendo. Enquanto não sobrevier essa necessária reforma constitucional, a questão da vigência doméstica dos acordos celebrados sob a égide do MERCOSUL continuará sujeita ao mesmo tratamento normativo que a Constituição brasileira dispensa aos tratados internacionais em geral. PROCEDIMENTO CONSTITUCIONAL DE INCORPORAÇÃO DE CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM GERAL E DE TRATADOS DE INTEGRAÇÃO (MERCOSUL). – A recepção dos tratados internacionais em geral e dos acordos celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL depende, para efeito de sua ulterior execução no plano interno, de uma sucessão causal e ordenada de atos revestidos de caráter político-jurídico, assim definidos: (a) aprovação, pelo Congresso Nacional, mediante decreto legislativo, de tais convenções; (b) ratificação desses atos internacionais, pelo Chefe de Estado, mediante depósito do respectivo instrumento; (c) promulgação de tais acordos ou tratados, pelo Presidente da República, mediante decreto, em ordem a viabilizar a produção dos seguintes efeitos básicos, essenciais à sua vigência doméstica: (1) publicação oficial do texto do tratado e (2) executoriedade do ato de direito internacional público, que passa, então – e somente então – a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Precedentes. O SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO NÃO CONSAGRA O PRINCÍPIO DO EFEITO DIRETO E NEM O POSTULADO DA APLICABILIDADE IMEDIATA DOS TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS. – A Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais ou de tratados de integração, nem o princípio do efeito direto, nem o postulado da aplicabilidade imediata. Isso significa, de jure constituto, que, enquanto não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados internacionais e os acordos de integração, além de nã o poderem ser invocados, desde logo, pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, imediatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata). – O princípio do efeito direto (aptidão de a norma internacional repercutir, desde logo, em matéria de direitos e obrigações, na esfera jurídica dos particulares) e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência automática da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem diretrizes que não se acham consagradas e nem positivadas no texto da Constituição da República, motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar a incidência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção internacional, ainda que se cuide de tratado de integração, enquanto não se concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao sistema de direito interno do Brasil. Magistério da doutrina. – Sob a égide do modelo constitucional brasileiro, mesmo cuidando-se de tratados de integração, ainda subsistem os clássicos mecanismos institucionais de recepção das convenções internacionais em geral, não bastando, para afastá-los, a existência da norma inscrita no art. 4º, parágrafo único, da Constituição da República, que possui conteúdo meramente programático e cujo sentido não torna dispensável a atuação dos instrumentos constitucionais de transposição, para a ordem jurídica doméstica, dos acordos, protocolos e convenções celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL”.[4]


Como vimos, a Constituição de 1988 contém um sofisticado sistema para a recepção dos tratados internacionais, sendo que a Emenda Constitucional nº 45/2004, trouxe importante modificações no antigo texto. Vejamos:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:


§ 1º – As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.


§ 2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.


§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.


§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”


Da leitura do parágrafo 3º acima transcrito, percebe-se a grande inovação pela Emenda Constitucional nº 45/2004, pois o caso o tratado discipline questões de direitos humanos e passe pelo rito de aprovação de uma emenda constitucional quando de sua incorporação terá status de emenda e, portanto, será considerado hierarquicamente superior à lei ordinária. Significa dizer que os termos presentes nessas normas internacionais deverão ser obedecidos por toda a legislação infraconstitucional superveniente, sob pena de inconstitucionalidade. Caso a legislação infraconstitucional superveniente (lei complementar, lei ordinária etc.) desrespeite os direitos humanos assegurados na norma internacional, deverá ser reconhecida a sua inconstitucionalidade (não mais frente à Constituição Federal, mas sim em face da norma internacional aprovada nos termos do art. 5º, § 3º, da CF). Ademais, essas normas internacionais somente poderão ser modificadas por futuras emendas à Constituição (ou, se for o caso, por intermédio de novos tratados ou convenções internacionais celebrados pela República Federativa do Brasil, também aprovados nos termos do art. 5º, § 3º, da Constituição Federal).


Podemos sintetizar o atual entendimento do Supremo Tribunal nos seguintes enunciados: (I) os tratados internacionais incorporam-se ao ordenamento jurídico brasileiro com força de lei ordinária federal; (II) eventuais conflitos entre os dispositivos dos tratados internacionais e as leis ordinárias internas serão resolvidos pelo critério cronológico (lei posterior revoga lei anterior) ou, se for o caso, pelo critério da especialidade (lei geral não revoga lei especial); (III) disposições de tratados internacionais poderão ser revogadas por posterior legislação ordinária interna (lei ordinária, lei complementar, lei delegada, medida provisória), exceto as que possuírem caráter de Direitos Humanos, pois possuem hierarquia de norma constitucional; (IV) os tratados internacionais não poderão dispor sobre matérias constitucionalmente reservadas à lei complementar. Essa orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal, segundo as palavras de Celso Albuquerque de Mello, implica a adoção pelo Estado brasileiro da Teoria Dualista Moderada, nos termos seguintes (Informativo STF nº 109, de 4 de maio de 1998): “Sob tal perspectiva, o sistema constitucional brasileiro – que não exige a edição de lei para efeito de incorporação do ato internacional ao direito interno (visão dualista extremada) – satisfaz-se, para efeito de executoriedade doméstica dos tratados internacionais, com a adoção de item procedimental que compreende a aprovação congressional e a promulgação executiva do texto constitucional (visão dualista moderada)”.


 

Notas:


[2] REZEK, José Francisco.“Tribunal Penal Internacional: Princípio da Complementariedade e Soberania” em Revista do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, nº 11 (Brasília: agosto de 2000).

[3] E M E N T A: MANDADO DE INJUNÇÃO – AJUIZAMENTO – AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA – PRESSUPOSTO PROCESSUAL SUBJETIVO – INCOGNOSCIBILIDADE DA AÇÃO INJUNCIONAL – AGRAVO REGIMENTAL NÃO CONHECIDO. DIREITO DE PETIÇÃO E A QUESTÃO DA CAPACIDADE POSTULATÓRIA. – A posse da capacidade postulatória constitui pressuposto processual subjetivo referente à parte. Sem que esta titularize o “jus postulandi”, torna-se inviável a válida constituição da própria relação processual, o que faz incidir a norma inscrita no art. 267, IV, do CPC, gerando, em conseqüência, como necessário efeito de ordem jurídica, a extinção do processo, sem resolução de mérito. – Ninguém, ordinariamente, pode postular em juízo sem a assistência de Advogado, a quem compete, nos termos da lei, o exercício do “jus postulandi”. O Advogado constitui profissional indispensável à administração da Justiça (CF, art. 133), tornando-se necessária a sua intervenção na prática de atos que lhe são privativos (Lei nº 8.906/94, art. 1º). – São nulos de pleno direito os atos processuais, que, privativos de Advogado, venham a ser praticados por quem não dispõe de capacidade postulatória. Inaplicabilidade do art. 13 do CPC, quando o recurso já estiver em tramitação no Supremo Tribunal Federal. Precedentes. – O direito de petição qualifica-se como prerrogativa de extração constitucional assegurada à generalidade das pessoas pela Carta Política (art. 5º, XXXIV, “a”). Traduz direito público subjetivo de índole essencialmente democrática. O direito de petição, contudo, não assegura, por si só, a possibilidade de o interessado – que não dispõe de capacidade postulatória – ingressar em juízo, para, independentemente de Advogado, litigar em nome próprio ou como representante de terceiros. Precedentes. SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA SOBRE TODOS OS TRATADOS INTERNACIONAIS. – O exercício do “treaty-making power”, pelo Estado brasileiro, está sujeito à observância das limitações jurídicas emergentes do texto constitucional. Os tratados celebrados pelo Brasil estão subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Nenhum valor jurídico terá o tratado internacional, que, incorporado ao sistema de direito positivo interno, transgredir, formal ou materialmente, o texto da Carta Política. Precedentes. – A questão pertinente aos tratados internacionais de direitos humanos: Art. 5º, § 2º (que instituiu cláusula geral de recepção das convenções internacionais em matéria de direitos da pessoa humana) e § 3º, da Constituição da República. Hierarquia constitucional das cláusulas inscritas em tratados internacionais de direitos humanos (posição do Relator). STF. Tribunal Pleno. MI 772 AgR/RJ – RIO DE JANEIRO. AG.REG.NO MANDADO DE INJUNÇÃO. Rel(a):  Min. CELSO DE MELLO. Julgamento:  24/10/2007. DJe-053  DIVULG 19-03-2009  PUBLIC 20-03-2009. EMENT VOL-02353-01  PP-00057.

[4] STF. Tribunal Pleno. CR 8279 AgR/AT – ARGENTINA. AG.REG.NA CARTA ROGATÓRIA. Rel(a):  Min. CELSO DE MELLO. Julgamento:  17/06/1998. DJ 10-08-2000 PP-00006. EMENT VOL-01999-01 PP-00042.


Informações Sobre o Autor

Leonardo Gomes de Aquino

Advogado. Mestre em Direito. Especialista em Processo Civil e em Direito Empresarial todos pela Faculdade de Direito da Universidade de Cimbra Portugal. Pos graduado em Docência do Ensino Superior. Professor Universitário. Autor dos Livros: Direito Empresarial: Teoria geral e Direito Societário e Legislação aplicável à Engenharia


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