Os direitos ou interesses coletivos, apesar do enfoque individualista do Ordenamento Jurídico Brasileiro, podem ser tutelados individual ou coletivamente, sendo essa última forma a grande novidade trazida pela Constituição Federal, na busca pela justiça social. O direito do trabalho, especialmente, consiste em um dos ramos mais beneficiados pela tutela coletiva na garantia dos direitos grupais.
A temática dos direitos ou interesses coletivos está atrelada ao art. 81 da Lei n.° 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), inciso II, o qual além de conceituá-lo, pontua sua forma de tutela, como se verifica:
“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de: […]
II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; […]”
Dessa forma, são direitos coletivos as prerrogativas com objetos indivisíveis manifestados em uma coletividade, que abranja um grupo de indivíduos, a princípio não determináveis, os quais tenham em comum uma relação jurídica base.
Nota-se que tais direito podem ser buscados individual ou coletivamente pelos cidadãos, estando nessa última forma de tutela a grande discussão.
O Ordenamento Jurídico Brasileiro possui bases na tutela individual, ou seja, o cidadão, verificando desobediência de seus direitos, busca o Poder Judiciário a fim de ver obter suas garantias legais. Entretanto, a disparidade entre as pretensões legislativas e a realidade dos cidadãos, que leva a baixa efetividade da tutela jurisdicional, levou a construção de um sistema processual que permitisse a justiça social, muito embora sofra acirradas críticas e rejeições por parte dos clássicos operadores do direito.
Nessa forma de tutela uma instituição legalmente legitimada ingressa em juízo buscando a defesa dos direito violada da coletividade a qual representa. Muito comum, na esfera trabalhista, a propositura, pelos sindicatos, de ações na Justiça do Trabalho, buscando a garantia de interesses coletivos de uma categoria violados pelos empregadores.
A Constituição Federal, desvinculando-se do, até então, predominante modelo individualista, autorizou as tutelas metaindividuais. A respeito do tema, cumpre transcrever as palavras de Gregorio Assagra de Almeida e Teori Zavascki, comentadas pelo Desembargador José Roberto Freire Pimenta:
“[…]Gregório Assagra de Almeida salienta que a Constituição de 1988 estabeleceu três dispositivos essenciais para que a tutela metaindividual dos direitos assumisse estatura constitucional: a) o seu art. 1°, que, ao consagrar o Estado Democrático de Direito, passou a necessariamente exigir a predisposição, pelo ordenamento jurídico, de um conjunto sistematizado de instrumentos capazes de permitir a tutela jurisdicional dos direitos massificados; b) o seu art. 5°, XXXV, que, ao contrário do que dispunha o preceito correspondente da Carta constitucional anterior, que assegurava o direito de ação para a proteção somente contra lesões a direito individuais, consagrou o principio da inafastabilidade das decisões judiciais sem qualquer restrição, isto é, em relação a qualquer direito, seja de natureza individual, seja de natureza coletiva em sentido amplo; c) o seu art. 129, III, que consagrou o principio da não taxatividade da ação coletiva e que conferiu legitimidade ao Ministério Público para promover inquérito civil e ação civil pública destinados a tutelar qualquer espécie de direito e interesses difusos e coletivos. […] Teori Zavascki observa, com acerto e propriedade, que ao mesmo tempo que foram introduzidos e recepcionados pela nova ordem constitucional mecanismos destinados a tutelar direito transindividuais, foram também criados instrumento para a tutela coletiva dos direitos individuais. Salienta ele que a Constituição de 1988 expandiu notavelmente uma forma alternativa de tutela coletiva de tais direitos, adotando para isso a técnica da substituição processual, já que os arts. 5°, XXI e 9°, III conferiram respectivamente as entidades associativas e sindicais legitimação para defender em juízo os direito de seus filiados e dos integrantes das categorias por eles representadas” (PIMENTA, 2009. p. 12).
Para tanto, a Constituição Federal, adequando-se aos contrastes entre a norma positivada e a realidade social, permitiu que “terceiros”, não diretamente ligados a relação jurídica base, promoverem ações para garantir direitos de uma coletividade. A partir desse entendimento, foi criado o Código de Defesa do Consumidor, no ano de 1990, marco entre as leis infraconstitucionais.
Na seara do direito do trabalho, são legitimados para a defesa de direitos coletivos o Ministério Público e os sindicatos dos trabalhadores, a fim de reforçar o tema cumpre colacionar a jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 4° Região:
“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA. SINDICATO. O sindicato profissional possui ampla legitimidade para postular judicialmente em defesa da categoria profissional ou de seus integrantes, consoante artigo 8º, inciso III, da Constituição Federal. Tal legitimidade ativa se estende ao caso da ação civil pública, porquanto o art. 129, §1º do mesmo diploma constitucional estabelece a concorrência do Ministério Público com terceiros quando se trata do pólo ativo da referida ação coletiva. Recurso do autor a que se dá provimento, para reconhecer a sua legitimidade para propor ação civil pública visando à defesa de interesses individuais homogêneos de seus substituídos (TRT4. Acórdão do processo 0000129-81.2010.5.04.0401 (RO). Redator: ANA ROSA PEREIRA ZAGO SAGRILO. Participam: WILSON CARVALHO DIAS, CLEUSA REGINA HALFEN. Data: 22/07/2010. Origem: 1ª Vara do Trabalho de Caxias do Sul).
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. SINDICATO. Ilegitimidade ativa do sindicato em ação de substituição processual ajuizada objetivando o ressarcimento de direitos individuais e não coletivos dependentes de situação concreta individualmente considerada”. (TRT4.Acórdão do processo 0001420-07.2010.5.04.0017 (RO). Redator: VANIA MATTOS. Participam: RAUL ZORATTO SANVICENTE, TÂNIA MACIEL DE SOUZA. Data: 12/05/2011 Origem: 17ª Vara do Trabalho de Porto Alegre)
Dessa forma, verifica-se que a sistemática normativa brasileira e os operadores do direito, após a autorização constitucional, rompem com suas raízes na clássica tutela individual, abrindo-se para formas alternativas que priorizem a efetividade da justiça.
No direito do trabalho a tutela coletiva é muito importante já que as garantias laborais, na maioria das vezes, divorciam-se da realidade do trabalhador, em função de sua hiposuficiencia. Portanto, cabem aos legalmente legitimados a incumbência da defesa coletiva desses direitos violados.
Informações Sobre o Autor
Roseli Quaresma Bastos
Advogada, Especialista em Direito Tributário UNISUL/LFG, Especializanda em Direito e Processo do Trabalho UNIDERP/LFG.