Tutelas antecipadas do artigo 273 do CPC: conceito, modalidades e requisitos para a concessão

Resumo: O presente trabalho se destina à confecção de um estudo detalhado acerca das tutelas antecipadas descritas no art. 273 do CPC, principalmente a medida descrita no § 6º do supracitado artigo. Primeiramente, foi elaborada uma análise do surgimento da tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro. Após, consta a conceituação do que vem a ser a chamada antecipação dos efeitos da tutela e, finalmente se ressalta os requisitos gerais e essenciais das tutelas, bem como as três modalidades de tutela de urgência descritas no art. 273 do CPC.


Palavras-chave: tutela antecipada, requisitos essenciais, modalidades de tutela de urgência The present work aims at making a detailed study about the early tutelage described in Art. 273 of CPC, especially as described in § 6 of the above article. First, we developed an analysis of the rise of injunctive relief in the Brazilian legal system. Then, given the conceptualization of what is being called anticipation effects of protection, and finally points out the general requirements and the essential tutelage and guardianship of all three modalities of urgency described in Art. 273 of the CPC.


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Keywords: injunctive relief, essential requirements, procedures for emergency protection.


Sumário: Introdução. 1. O surgimento da tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro. 2. Conceito. 3, requisitos e modalidades de tutelas antecipadas. 3.1 Tutela antecipatória em caso de fundado receio de dano. 3.2. Tutela antecipatória em caso de abuso de direito ou manifesto intuito protelatório do réu. 3.3. Tutela antecipada em caso de parte incontroversa do pedido ou pedido incontroverso. Conclusão. Referências bibliográficas.


INTRODUÇÃO


O presente trabalho se destina à confecção de um estudo detalhado acerca das tutelas antecipadas descritas no art. 273 do CPC, principalmente a medida descrita no § 6º do supracitado artigo.


Primeiramente, foi elaborada uma análise do surgimento da tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro.


No segundo capítulo, consta a conceituação do que vem a ser a chamada antecipação dos efeitos da tutela.


O terceiro capítulo ressalta os requisitos gerais e essenciais das tutelas, bem como as três modalidades de tutela de urgência descritas no art. 273 do CPC: tutela concedida em caso de fundado receio de dano, tutela deferida quando houver abuso de direito de defesa ou manifesto intuito protelatório do réu e a tutela que tem por objeto a parte incontroversa do pedido ou pedido incontroverso.


1 O SURGIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO


Preliminarmente, tem-se que a possibilidade genérica de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro com o advento da Lei 8.952/94, que deu nova redação ao art. 273 do CPC.


Há de se observar que o art. 84, §3º do Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/90, que precedeu à reforma da redação do art. 273 do CPC, já havia possibilitado a antecipação da tutela nas obrigações de fazer ou não fazer.


Antes das disposições acima, havia somente a possibilidade de antecipação dos efeitos da tutela em determinadas hipóteses previstas em lei, nas ações de procedimento especial, como por exemplo, as ações possessórias de força nova (posse com menos de ano e dia) e nas ações de alimentos.


Com isso, tem-se que a estrutura do Código Processualista Civil pátrio encontrava-se superada anteriormente à introdução da tutela antecipatória, uma vez que a morosidade da prestação jurisdicional estava diretamente ligada à ineficiência do antigo procedimento ordinário.


Esta inefetividade do procedimento ordinário transformou o art. 798 do CPC em uma “saída” para a efetivação da prestação da tutela jurisdicional, ou seja, a tutela cautelar transmutou-se em um procedimento de sumarização do procedimento ordinário, permitindo a obtenção antecipada da tutela que era concedida somente ao final da demanda.


Desta forma, a nova redação do art. 273 do CPC trouxe de inovador ao ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade generalizada de concessão de tutelas antecipadas nos processos de conhecimento, tendo-se em vista que a sua aplicação não depende mais de expressa previsão legal e preenchimento de requisitos específicos, mas sim da observância dos preceitos dispostos no art. 273 do CPC.


Pode-se afirmar, portanto, que as tutelas antecipadas genéricas se inseriram em um contexto de busca de maior efetividade do processo de conhecimento.


É correta a assertiva de que a distribuição dos ônus e prejuízos advindos do decurso do tempo não é igualitária no processo. O autor da demanda, por diversas vezes, se vê prejudicado, pois a demora do processo impossibilita que ele veja sua pretensão deduzida e satisfeita em um espaço de tempo justo.


Além disso, não se pode esquecer do fato de que muitos réus utilizam-se da demora do procedimento para prejudicar as pretensões de seu ex adverso, lançando mão de medidas protelatórias.


Neste ínterim, constata-se que a antecipação dos efeitos da tutela é uma técnica que visa distribuir o ônus do tempo do processo, pois possibilita uma melhor distribuição do mesmo, a fim de que o autor melhor suporte a demora na resolução do litígio.


Nos dizeres de Luiz Guilherme Marinoni[1]:


“A tutela antecipatória pode ser concedida no curso do processo de conhecimento, constituindo verdadeira arma contra os males que podem ser acarretados pelo tempo do processo, sendo viável não apenas para evitar um dano irreparável ou de difícil reparação (art. 273, I do CPC), mas também para que o tempo do processo seja distribuído entre as partes litigantes na proporção da evidência do direito do autor e da fragilidade da defesa do réu (art. 273, II e §6º do CPC).”


2 CONCEITO


Este instrumento processual consiste na possibilidade de se antecipar ao autor da ação de conhecimento, total ou parcialmente, os efeitos da sentença que venha a ser proferida ao final da demanda.


Tem-se, portanto, a satisfação provisória da pretensão posta em juízo pela parte autora, uma vez que o juiz irá conceder em caráter antecipatório o que está sendo pedido ao final da demanda.


A concessão da tutela antecipada permite que o autor obtenha um benefício que somente receberia no futuro. Esse benefício é atribuído em caráter provisório e em cognição superficial, uma vez que o julgamento definitivo e exauriente se fará no momento processual oportuno.


Segundo Luiz Orione Neto[2]:


“As tutelas de urgência – sejam do tipo cautelar ou satisfativa – apresentam como característica comum a sumarização do procedimento. Esse recurso consiste na redução do lapso destinado ao conseguimento da providência jurisdicional emitida em forma de liminar, inaudita altera pars, ou após justificação prévia, mas em qualquer caso, sempre norteada por uma cognição sumária.”


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Ademais, as tutelas antecipadas são requisito próprio dos processos de conhecimento, portanto, não se admite sua existência no processo de execução, vez que neste o titular do direito já possui meios suficientes de torná-lo concreto.


Por conseguinte, tem-se que tais medidas podem ser aplicadas em qualquer procedimento adotado em relação ao processo de conhecimento, ou seja, cabe tutela antecipada nos procedimentos comuns (rito ordinário ou sumário), bem como no procedimento especial.


3 REQUISITOS E MODALIDADES DE TUTELAS ANTECIPADAS


As tutelas antecipadas disciplinadas no art. 273 do CPC, são dividas em três grupos: tutelas de urgência concedidas em caso de fundado receio de dano; tutelas deferidas quando houver abuso de direito de defesa ou manifesto intuito protelatório do réu e as tutelas que tenham por objeto a parte incontroversa do pedido ou pedido incontroverso.


Segundo Marcus Vinicius Rios Gonçalves[3], “em todas elas há requisitos comuns indispensáveis: a existência de requerimento do autor e a prova inequívoca da verossimilhança do direito alegado”.


3.1 Tutela antecipatória em caso de fundado receio de dano


Esta modalidade de tutela antecipatória requer dois requisitos básicos para a sua concessão que são: alegação verossímil e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.


O art. 273 do CPC afirma que o juiz poderá antecipar a tutela desde que exista prova inequívoca e se convença da verossimilhança das alegações. Tem-se que o artigo não determina que o juiz faça uma análise da certeza do direito, mas sim da plausibilidade de sua existência, decorrente dos elementos que constam dos autos.


Logo, observa-se que a prova inequívoca não se refere ao direito, pois se assim o fosse, seria o caso de julgamento antecipado da lide e não de concessão de tutela antecipada. Afirma Marcus Vinícius Gonçalves[4] que esse requisito assemelha-se ao fumus boni juris, necessário para a concessão das tutelas cautelares, em que também a cognição do juiz é feita com base em mera probabilidade.


Contudo, a verossimilhança a ser exigida pelo juiz deve observar o valor do bem jurídico ameaçado, a dificuldade de o autor provar sua alegação, a credibilidade da alegação e a própria urgência descrita para a obtenção da demanda.


Também, há de ser observado o princípio da proporcionalidade, uma vez que a medida é concedida em caráter provisório e a decisão pode ser alterada a qualquer momento ou ao final da demanda, quando da prolação de sentença pelo magistrado.


Por fim, também há o requisito da não concessão da medida quando haja o perigo da irreversibilidade do provimento antecipado. O artigo 273 se refere à irreversibilidade do provimento e não das eventuais conseqüências fáticas ou econômicas que possam advir do mesmo. Essa irreversibilidade pode ser facilmente observada nas ações de estado ou de investigação de paternidade, daí, a impossibilidade de concessão dos efeitos da antecipação da tutela para estas ações.


3.2 Tutela antecipatória em caso de abuso de direito de defesa ou manifesto intuito protelatório do réu


Primeiramente, há de se ressaltar que os três requisitos acima destacados, em razão da possibilidade de concessão da tutela antecipatória em caso de fundado receio de dano também são aplicáveis a esta modalidade de tutela antecipada.


Conforme dito anteriormente, tem-se que a técnica antecipatória é uma forma de distribuição do ônus do tempo no processo, e, quando o juiz concede a medida, o réu também passa a ter interesse em que o processo termine logo. Desta forma, toda vez que o magistrado perceber que os argumentos utilizados pelo réu são inconsistentes, poderá conceder a antecipação.


Por fim, tem-se que o magistrado também deverá conceder a antecipação dos efeitos da tutela quando constatar que o réu vem se utilizando de expedientes protelatórios com o único fim de retardar o desenvolvimento regular do processo, impossibilitando que o autor obtenha a tutela pretendida em prazo razoável.


3.3 Tutela antecipada em caso de parte incontroversa do pedido ou pedido incontroverso.


Tal modalidade de tutela antecipada viabiliza a concessão da medida independentemente da alegação do perigo de dano, ou seja, nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni[5], ela “tem por único fim permitir a correta distribuição do tempo do processo entre as partes”.


O §6º do art. 273 foi introduzido pela Lei 10.444/02 e estabelece que a tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.


Quanto ao tema, elucida Rios Gonçalves[6]:


“A redação não é das mais felizes, por trazer a falsa impressão de que a antecipação só cabe na hipótese de pedidos cumulados, em que um ou mais deles tenham ficado incontroversos. Mas não é assim: ainda que haja um único pedido, a medida poderá ser concedida se parte dele ficar incontroversa.”


Destarte, o entendimento atual da doutrina é o de que embora esteja a presente medida prevista como parágrafo do art. 273 do CPC, não se trata de antecipação de tutela, mas sim de uma permissão para que o juiz prolate decisão definitiva sobre parcela do mérito da causa que restou incontroversa[7].


Por incontrovérsia, entende-se que esta pode se dar tanto no plano direto quanto no plano dos fatos. A incontrovérsia é quanto ao objeto do processo, ou seja, quanto às conseqüências jurídicas almejadas pelo autor, as partes entendem que ao menos parcela daquilo que se pretende tem fundamento e, por isso, deve ser acolhido.


Alega Fredie Didier[8] que a presente medida avança em relação à antecipação de tutela, pois, embora seja uma decisão anterior à sentença, não é tutela fundada em cognição sumária ou em razão da verossimilhança da alegação.


No presente instrumento, existe a cognição exauriente e juízo de certeza, portanto, não há receio de que se possa ocorrer a irreversibilidade do procedimento antecipado. Ademais, mesmo que o seja, o juiz concederá, porque o pedido é incontroverso e não há possibilidade de reversão na sentença final.


Segundo o autor supracitado[9], a presente medida se trata de uma decisão interlocutória apta à coisa julgada material e que, por isso, pode ser executada definitivamente e não provisoriamente, porquanto não seja urgente nem fundada em cognição sumária.


Conseguintemente, afirma-se que a natureza jurídica da presente medida não se trata de tutela antecipada, mas sim de resolução parcial da lide. Neste sentido, tem-se que a mesma é definitiva, o que a torna uma decisão absolutamente autônoma da parte do pedido que ainda não foi apreciado; e sua principal finalidade é fracionar a resolução do mérito.


Diante desta natureza jurídica de resolução parcial da lide, a este instituto não se aplicam os pressupostos das tutelas antecipadas estudadas anteriormente, quais sejam: prova inequívoca, verossimilhança das alegações, fundado receio de dano, abuso de direito de defesa, manifesto propósito protelatório do réu, perigo da irreversibilidade e necessidade de requerimento da parte.


Seus requisitos necessários são: a incontrovérsia de um pedido formulado ou parte dele e a desnecessidade de realização de prova em audiência para determinado pedido ou parte dele[10].


Desta forma, o magistrado decide parte do objeto da lide definitivamente, encerrando quanto a esta parcela qualquer discussão que possa vir a ser aventada na demanda, ou seja, cessa a atividade jurisdicional cognitiva quanto a parcela do pedido que é incontroversa, restando a mesma apta a ser imunizada pelo manto da coisa julgada material.


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Por fim, afirma Didier[11], que tal medida não se trata de antecipação dos efeitos da tutela, mas, sim, de uma modalidade de julgamento conforme o estado do processo.


CONCLUSÃO


O presente trabalho se destinou à análise e estudos do conceito, modalidades e requisitos das medidas de antecipação de tutela existentes no ordenamento jurídico brasileiro.


Inicialmente, foi elaborada uma pesquisa acerca da introdução da generalização da tutela antecipada no ordenamento jurídico brasileiro, com a reformulação dada ao art. 273 do CPC pela Lei 8.952/94. Também foi analisada a necessidade de implementação dessas medidas, a fim de que o ônus processual fosse melhor dividido entre as partes processuais.


Após, analisamos o conceito do instituto das tutelas antecipadas, apto a conceder antecipadamente total ou parcialmente os efeitos da sentença que venha a ser proferida quando da resolução da demanda.


Por fim, descriminamos as três modalidades de tutela antecipada descritas no art. 273 do CPC, quais sejam: tutela concedida em caso de fundado receio de dano, tutela deferida quando houver abuso de direito de defesa ou manifesto intuito protelatório do réu e, dando maior ênfase, à tutela que tem por objeto a parte incontroversa do pedido ou pedido incontroverso, apta a fazer coisa julgada material em face da cognição exauriente sobre a qual foi concedida.


 


Referências bibliográficas

DIDIER JR, Fredie.

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1.

MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora RT, 2006.

ORIONE NETO, Luiz. Tratado das medidas cautelares: teoria geral do processo cautelar. São Paulo: Lejus, 2000. v. 3.

 

Notas:

[1]  MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora RT, 2006. pp. 200/230.

[2] ORIONE NETO, Luiz. Tratado das medidas cautelares, vol. III, tomo I: teoria geral do processo cautelar. São Paulo: Lejus, 2000. 198/200.

[3] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de direito processual civil, volume I: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 5. ed. rev. e atual.. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 299 a 300.

[4] Op. cit. p. 301 a 302

[5] MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do processo de conhecimento. 5. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Editora RT, 2006. p. 234 a 238.

[6] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo Curso de direito processual civil, volume I: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 5. ed. rev. e atual.. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 303.

[7] DIDIER JR, Fredie. p. 523

[8] Op. cit. p. 524

[9] Op. cit. p. 524

[10] DIDIER JR, Fredie. p. 528/529

[11] Op. cit. p. 530


Informações Sobre o Autor

Julian Gonçalves da Silva

Advogado em Juiz de Fora-MG; Especialista em direito processual pela UFJF


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