Ultrapassar veículo parado em faixas de pedestre é infração gravíssima que custa R$ 1 467,35 (cinco vezes o valor-base da multa), soma sete pontos na Carteira Nacional de Habilitação e coloca em risco a vida do pedestre, parte vulnerável no trânsito. O Código de Trânsito Brasileiro, ao punir essa conduta no artigo 202, inciso I, busca preservar o direito fundamental de travessia segura e promover cultura de respeito à prioridade absoluta das pessoas que caminham. Nas próximas páginas você encontrará um estudo completo, com visão jurídica e prática, sobre todas as nuances dessa infração: fundamentos legais, requisitos de autuação, consequências administrativas, civis e penais, estratégias de defesa, estatísticas de sinistros, reflexos em seguros, boas práticas de direção e respostas às dúvidas mais frequentes.
Contexto legal e importância da norma
O artigo 202 define cinco situações de ultrapassagem proibida; a primeira refere-se justamente à ultrapassagem de veículo parado em passagem de pedestres. A norma materializa os princípios da proteção à vida, dignidade da pessoa humana e prioridade do usuário mais vulnerável — todos consagrados, de forma indireta, na Constituição Federal e explicitados nas diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Enquanto o capítulo IV do CTB traça regras gerais de circulação, o artigo 214 reforça a preferência do pedestre; o artigo 202 complementa ao vedar manobra que comprometa essa preferência.
Conceito de ultrapassagem em faixa de pedestre
Ultrapassar é deslocar-se lateralmente, ocupando faixa adjacente ou contramão, para ganhar posição à frente de outro veículo que segue ou está parado no mesmo sentido de circulação, retornando posteriormente à faixa original. Quando o veículo ultrapassado encontra-se parado sobre ou imediatamente antes da faixa de pedestre para permitir a travessia, qualquer tentativa de superar esse veículo pela esquerda ou pela direita constitui a infração. Não importa se há faixas múltiplas; a prioridade do pedestre prevalece.
Diferença entre ultrapassagem e desvio
Desviar de obstáculo fixo — um cone, um buraco, um carro estacionado irregularmente — não é ultrapassagem segundo o Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito. Já ultrapassar veículo parado em função de pedestres é ato voluntário para ganhar precedência, ainda que dure poucos metros. A distinção é crucial na defesa administrativa: se o veículo parado apresentava pane e não havia pedestres em travessia, a conduta pode ser enquadrada como simples mudança de faixa, não no artigo 202.
Elementos materiais da infração
Para lavrar o auto, o agente deve descrever:
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Existência de passagem de pedestre demarcada no piso ou indicada por sinal vertical.
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Veículo à frente parado total ou parcialmente sobre a faixa.
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Ultrapassagem realizada pelo infrator, especificando lado utilizado e ausência de permissão legal.
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Condições de visibilidade, horário e eventual presença de pedestres.
Vídeo ou fotografia não são exigidos, mas fortalecem a prova; a ausência de relato detalhado pode anular a autuação por falta de tipicidade.
Penalidades e agravantes
A ultrapassagem em faixa de pedestre é infração gravíssima com multiplicador cinco: R$ 293,47 × 5 = R$ 1 467,35. Acresce sete pontos ao prontuário. Diferentemente do artigo 203, inciso V (contramão com linha contínua, pontes etc.), não há suspensão direta, mas a pontuação contribui para atingir o limite de vinte, trinta ou quarenta pontos anuais, dependendo da reincidência em gravíssimas. Em caso de reincidência específica em doze meses, o valor da multa dobra.
Risco objetivo e estatísticas de sinistros
Estudos do Departamento Nacional de Trânsito indicam que 14 % dos atropelamentos fatais em zonas urbanas ocorrem quando o pedestre emerge entre veículos parados. Dados de seguradoras mostram aumento médio de 18 % no valor do prêmio para condutores autuados pelo artigo 202, evidenciando correlação entre infração e sinistros graves. Crianças e idosos representam dois terços das vítimas porque têm dificuldade de perceber veículos que surgem em movimento após a barreira que o carro parado oferece.
Responsabilidade civil em atropelamento
Se a ultrapassagem causar lesão ou morte, a responsabilidade do motorista é objetiva, bastando demonstrar a conduta ilícita, o dano e o nexo. A indenização abrange dano material (despesas médicas, lucros cessantes), dano moral e, em óbito, pensão por morte. A culpa concorrente do pedestre não afasta o dever de reparar quando o condutor viola regra expressa de proteção.
Repercussões penais
O ato ilícito pode configurar homicídio culposo de trânsito (artigo 302) ou lesão corporal culposa (artigo 303), com penas de dois a quatro anos e seis meses a dois anos, respectivamente, mais suspensão ou proibição de obter habilitação. Se o motorista estava embriagado ou participando de corrida, a pena aumenta em um terço a metade. O Ministério Público costuma denunciar com base em dolo eventual quando a conduta revela desprezo consciente pelo perigo.
Procedimento administrativo de autuação
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Lavratura do auto no momento do flagrante ou por análise de videomonitoramento.
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Notificação de autuação emitida ao proprietário em até trinta dias.
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Defesa prévia: motorista pode alegar ausência de faixa, pane do veículo parado ou falta de sinalização.
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Julgamento: deferimento arquiva o processo; indeferimento gera notificação de penalidade.
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Recurso à Jari: permite nova análise de mérito.
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Recurso ao Cetran: última instância administrativa.
A interposição de recursos não suspende o prazo para pagamento com desconto de vinte por cento, mas quita-se sem reconhecimento de culpa.
Possibilidades de defesa
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Inexistência de faixa demarcada ou sinalização vertical mencionada no auto.
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Veículo ultrapassado estava estacionado em local proibido, não aguardando pedestres.
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Impossibilidade de visibilidade da faixa devido a chuva extrema ou desgaste da pintura.
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Inconsistência de horário, placa ou características do veículo na descrição.
Provas úteis incluem fotos do local, laudos de engenharia de tráfego, testemunhas e relatórios climáticos.
Jurisprudência sobre nulidade de autos
Tribunais de Justiça anulam multas quando o agente descreve genericamente “ultrapassou veículo parado” sem citar a faixa de pedestre. Também se reconhece nulidade se a sinalização horizontal estiver apagada e não houver placa complementar. Em 2024, o Tribunal de Justiça de São Paulo cassou auto lavrado em rodovia duplicada onde a “faixa de pedestre” era apenas projetada para futura implantação, mas não existia fisicamente.
Programas de educação e políticas públicas
Campanhas como “Olhe e Sinalize” incentivam motoristas a manter distância segura de faixas. Algumas prefeituras adotam recuo da linha de parada em cinco metros para ampliar o campo visual; outras instalam ilhas de refúgio. Psicólogos do trânsito defendem reforço escolar na disciplina de mobilidade urbana, destacando empatia e percepção de risco.
Reflexos em seguros e perfil de risco
Apólices de responsabilidade civil facultativa de veículos consideram histórico de infrações gravíssimas. Motorista autuado pelo artigo 202 enfrenta majoração de até 25 % na renovação. Em casos de atropelamento, a seguradora pode exercer direito de regresso — cobrar judicialmente do segurado o valor pago à vítima — se provar que a conduta foi dolosa ou configurou culpa grave.
Impacto para motoristas profissionais
Taxistas, motoristas de aplicativo e condutores de transporte escolar dependem de reputação e pontuação. Empresas parceiras monitoram o Renainf; reincidência em gravíssimas leva à desativação da plataforma ou à rescisão contratual. Motoristas de ônibus submetem-se a auditorias de segurança interna; multa por ultrapassagem em faixa pode resultar em suspensão disciplinar.
Dicas práticas de condução defensiva
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Observe antecipadamente a faixa; reduza a velocidade a cinquenta metros.
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Mantenha distância mínima de três metros do veículo parado.
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Use a luz de freio de forma progressiva para alertar condutores atrás.
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Não acelere logo após o carro à frente retomar movimento; pedestres podem ainda cruzar a segunda metade da via.
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Em travessias semaforizadas, espere o semáforo para pedestre apagar antes de arrancar.
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Reforce a atenção em horários de entrada e saída de escolas.
Exemplos de situações concretas
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Veículo A para antes da faixa para idoso atravessar; motociclista B ultrapassa pela direita e atropela. B incorre em multa, pontos, responde civil e criminalmente.
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Caminhonete para para desembarque de passageiro sobre a faixa; carro C contorna pela esquerda sem pedestres presentes. Se não havia sinalização vertical, defesa pode alegar inexistência de passagem.
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Trânsito lento em avenida; ônibus abre corredor lateral improvisado e passa ao lado de carros parados sobre faixa. Infração configurada mesmo sem atropelamento.
Perguntas e respostas
Ultrapassar bicicleta parada em faixa também é infração?
Sim. O tipo infracional protege qualquer usuário parado, inclusive ciclistas.
A infração vale em faixa sem linhas pintadas, mas apenas placa?
Vale. A presença de sinal vertical suficiente caracteriza a passagem.
Se não havia pedestres no momento, ainda assim sou multado?
Sim. A infração independe da presença efetiva de pedestres; basta a potencial existência.
Posso ultrapassar pela faixa de ônibus?
Não. A manobra continua proibida e ainda pode adicionar multa por uso indevido da faixa exclusiva.
O auto sem foto pode ser anulado?
Pode, se a descrição não for minuciosa o bastante para comprovar a tipicidade.
Qual é o prazo para recorrer?
Trinta dias da notificação de autuação para defesa prévia, igual prazo após notificação de penalidade para recurso à Jari.
Reincidência dobra o valor da multa?
Dobra quando ocorre dentro de doze meses para a mesma infração gravíssima.
É possível converter a multa em advertência?
Não. Advertência só se aplica a infrações leves ou médias.
Conclusão
Ultrapassar veículo parado em faixas de pedestre é infração que agride diretamente o princípio de proteção aos mais vulneráveis no trânsito. Além da penalidade financeira e dos pontos na CNH, a conduta pode gerar responsabilidade civil e criminal quando resulta em atropelamento. Para evitar riscos e multas, o motorista deve adotar postura preventiva: reduzir a velocidade, respeitar a sinalização, aguardar a travessia completa e jamais tentar ganhar segundos à custa da segurança alheia. A educação contínua, aliada à fiscalização e a melhorias de infraestrutura viária, forma o tripé indispensável para reduzir atropelamentos e elevar o padrão de convivência pacífica entre motoristas e pedestres. Quem compreende o valor de uma vida jamais vê a faixa de pedestre como obstáculo, mas sim como símbolo maior de respeito à coletividade.