Uma análise crítica acerca da perícia médica no INSS

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Resumo: O presente trabalho tem por objetivo a apresentação de uma análise crítica acerca da forma com que são feitas as perícias médicas no INSS, onde, para concessão de benefícios, o segurado passa por perícia médica realizada por profissional que, muitas vezes, não possuem a especialização necessária para emitir parecer quanto a capacidade laborativa do assegurado. Busca também, ampliar a discussão acerca do entendimento jurisprudencial que considera a perícia médica realizada por médico não especialista válida para efeitos legais.

Palavras Chave: Análise Crítica. Entendimento Jurisprudencial. Função do Médico Perito. Perícia Médica no INSS.

Résumé: Cette étude vise à présenter une analyse critique de la façon dont l'expertise médicale sont faites dans le INSS, qui, pour l'octroi des prestations, l'assuré subit un examen médical effectué par un professionnel qui, souvent, ne possède pas l'expertise nécessaire pour donner un avis sur la capacité de travail de l'assuré. Recherche élargir également la discussion sur la compréhension jurisprudentielle qui tient compte de l'examen médical effectué par un spécialiste non valide aux fins juridiques.

​Mosts-clés: Analyse critique. compréhension jurisprudentiel. Fonction expert médical. L'expertise médicale dans le INSS.

Sumário: Introdução. 1. Breve resumo histórico. 2. A função do médico perito. 3. Análise crítica sobre a perícia médica. 4. O entendimento do judiciário acerca da função do médico perito. 5. Nota crítica ao entendimento jurisprudencial. 6. Análise final. Referências.

INTRODUÇÃO

A atuação do perito médico do INSS, a longa data, é motivo de discussão nas mais diversas esferas jurisdicionais do Estado brasileiro, vez que os pareceres emitidos por tais profissionais são fundamentais para concessão dos benefícios pleiteados pelos assegurados da Previdência Social.

A grande crítica existente ao modelo de perícia realizada no Brasil, reside na ideia de que, atualmente, o Conselho Federal de Medicina reconhece, aproximadamente, 53 especialidades médicas distintas, sendo assim, seria o médico perito qualificado para emitir pareceres sobre as 53 especialidades?

A jurisprudência entende que o médico perito é competente para emitir tais pareceres, baseando-se, em entendimento do CFM, que entende que todo médico, devidamente registrado no seu Conselho Profissional, está habilitado ao exercício da medicina, em qualquer de seus ramos ou especialidades.

No entanto, surge uma nova indagação, se, qualquer médico devidamente registrado no Conselho Federal de Medicina, estaria apto ao exercício da medicina e suas prerrogativas, por qual razão se dividiria essa mesma medicina em 53 especialidades?

Este é o cerne da discussão aqui proposta, e será base fundamental da análise crítica que se segue.                 

1 RESUMO HISTÓRICO

Em decorrência dos efeitos gerados pela industrialização do Brasil em meados do século XIX o Estado brasileiro tomou para si a responsabilidade de garantir os direitos básicos de seus cidadãos que, de alguma forma, contribuíam de forma produtiva para o crescimento do país.

Em virtude deste fato, foram criados mecanismos que, a princípio, vinculavam os empresários à responsabilidade pelas possíveis intempéries que por ventura ocorressem com seus funcionários no decorrer de seus afazeres ou em virtude deles.

Com o decorrer dos anos a interferência estatal foi se intensificando, a própria forma adotada para concessão de benefícios foi aprimorada, onde, na década de 30, durante o Governo de Getúlio Vargas, tem início a montagem de um sistema Público de Previdência Social no Brasil, pautada em recolhimento de contribuições que se destinariam a garantir os recursos básicos necessários a subsistência de seus assegurados.

No entanto, foi apenas em 1960 que surgiu a Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), uniformizando as contribuições e os planos de previdência com extensão da cobertura previdenciária aos empregados e autônomos em geral. O que se concretizou em 1966 com a criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).

A década de 70 foi marcada pela ampliação da reparação previdenciária, que passou a abranger novas categorias de trabalhadores e, em virtude deste fato, aliado ao envelhecimento da população e ao aumento dos trabalhadores assegurados, foi criado o Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), a criação deste órgão resultou em uma intervenção, cada vez mais determinante do Estado, nas relações previdenciárias (TEIXEIRA, 2011, apud PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2006).

Surge aí a necessidade de se elaborar um sistema para concessão de algumas espécies de benefícios, de forma que fosse constatada a incapacidade ou não dos assegurados, porém, tal constatação, somente poderia ser verificada por intermédio de perícia realizada por profissional qualificado.

Chegamos então ao ano de 1988, marcado por uma nova Constituição Federal e a ampliação do conceito de Seguridade Social que, segundo Edriene Barros Teixeira (2011, apud CORDEIRO, 2006), “foi saudada como uma das maiores conquistas do direito social brasileiro.”

 O capítulo da seguridade social da Constituição de 1988, introduz uma concepção mais abrangente de seguridade social, definida como um conjunto integrado de ações destinadas a assegurar os direitos relativos a saúde, à previdência e assistência social, que deriva ser organizada pelo Poder Público. O sistema passou a acolher o conceito de que a sociedade (incluindo os empregadores) se solidariza com o indivíduo trabalhador, cuja situação, quando em dificuldades, deixa de ser problema individual para constituir-se em responsabilidade social pública (TEIXEIRA, 2011, apud BERTUSSI, 2003).

Para Teixeira (2011, p. 23): “A Constituição Federal de 1988 trouxe, ainda, grandes avanços na área do direito social ao trabalho, assegurando aos trabalhadores o direito a saúde, à higiene e à segurança, o direito à cidadania, à dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.”

O tempo passou, mudanças fundamentais foram implementadas, o órgão responsável pela administração e concessão dos benefícios foi renomeado, passando a se chamar, no ano de 1990, Instituo Nacional do Seguro Social – NSS, a perícia médica ganhou mais autonomia com o advento do Fator Acidentário Previdenciário e o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário, porém, uma pergunta ainda não havia sido respondida, estaria o médico perito qualificado para emitir pareceres acerca das mais diversas enfermidades que poderiam afligir os segurados? Esta mesma pergunta é feita até os dias atuais.

2 A FUNÇÃO DO MÉDICO PERITO[1]

Segundo a Previdência a perícia médica é o setor do INSS que avalia segurados ou dependentes para fins de constatação de incapacidade para o trabalho, que é um dos requisitos para reconhecer o direito aos seguintes benefícios: auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (tendo ou não relação com o trabalho) e auxílio-acidente (quando há sequelas que reduzem permanentemente a capacidade de trabalho), avaliando ainda, a invalidez dos dependentes para fins de concessão de salário-família (filho inválido maior de 14 anos de idade) ou pensão por morte (filho invalido maior de 21 anos de idade).

O perito médico do INSS é o responsável pela avaliação da incapacidade para o trabalho, que pode basear-se também em pareceres especializados e exames complementares aos quais o segurado já tenha se submetido. Por isso, sempre que comparecer à perícia, o segurado deve apresentar os exames e outros documentos médicos.

O perito médico se baseia na legislação vigente para analisar os exames e apresentar a conclusão da avaliação, cujas decisões possíveis são:

– O segurado é considerado incapaz para o trabalho e tem decisão pericial favorável para receber o auxílio-doença (incapacidade temporária para o trabalho) ou aposentadoria por invalidez (incapacidade permanente) nos casos mais graves, se atendidos os demais requisitos para concessão do benefício.

– O segurado é considerado capaz de realizar outro tipo de trabalho diferente do seu e será encaminhado para a reabilitação profissional.

– O segurado é considerado capaz de realizar a atividade que vem desenvolvendo e o parecer é contrário à concessão do benefício.

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O perito médico avalia cada caso individualmente. Muitas vezes, o problema de saúde que incapacita uma pessoa para uma atividade de trabalho não incapacita outa. Cabe ao perito médico avaliar tais situações, levando sempre em consideração o tipo de enfermidade e a natureza do trabalho exercido pelo segurado.

E é neste ponto que surgem as divergências que acabam por inundar o judiciário.

3 ANÁLISE CRÍTICA SOBRE A PERÍCIA MÉDICA

De acordo com números da Previdência Social, neste ano, os peritos negaram um total de 181.661 pedidos de auxílio, entre janeiro e maio deste ano, somente no estado de São Paulo.

Em matéria desenvolvida pelo Instituto de estudos Previdenciários, o próprio ministro da Previdência, Luiz Marinho, reconheceu que o INSS está muito rigoroso e erra na concessão dos benefícios previdenciários, já que é elevado o número de segurados que, após terem o pedido de concessão negado nos postos, procura a Justiça Federal.[2]

Segundo Juca Guimarães, autor da matéria, somente no ano passado foram feitos 6,5 milhões de pedidos em todo o país. Destes, 3,3 milhões, mais da metade, foram recusados, e os demais 3,2 milhões foram considerados válidos pelo instituto e concedidos.

“Se, na Justiça, o segurado que teve o pedido negado no posto conseguiu o benefício, é um indício de o pedido não foi analisado corretamente e que o INSS está negando muito” (MARINHO, 2013).

Da forma com que é feita hoje, as perícias médicas, bem como, os critérios que são adotados pela Previdência, não demonstram qualquer segurança ao segurado, muitas vezes, seja por falta de conhecimento acerca das especificidades da doença ou de seu tratamento, inúmeros benefícios são negados.

Menciona-se nesse momento o caso da Senhora Sueli Maria Alves Cordeiro (53 anos), que no ano de 2009 foi acometida por Câncer na mama direita, cujo tratamento acarretou no esvaziamento total das glândulas da axila direita e extração parcial da mama direita, com posterior tratamento quimioterápico e radioterápico.

Cessado o auxílio-doença no ano de 2011, iniciou-se, a partir daí verdadeira batalha para que o benefício fosse estendido, batalha perdida pela, até então, segurada. Ressalta-se aqui que, no período, havia parecer do oncologista responsável, que apontava a incapacidade laborativa, bem como, a existência de desgaste considerável na coluna cervical, em decorrência do enfraquecimento ósseo gerado pela quimioterapia.

No entanto, mesmo com o parecer emitido pelo médico do Hospital do Câncer de Londrina, o perito negou o benefício, alegando, para tanto, que a paciente poderia exercer atividade laborativa.

Em que pese à decisão do médico perito não ser vinculada ao parecer médico especializado, imperioso se faz salientar que, na prática, para concessão de determinados benefícios, se faz necessário à apresentação de laudo médico que ateste a existência da doença, bem como, o tratamento ao qual o paciente foi submetido e os exames que comprovam a gravidade da doença a fim de que se comprove a incapacidade conforme preceitua o art. 59 da Lei n. 8.213 de 1991. Sendo assim, seria justificável que o médico perito que concede o benefício não seja especialista, no caso em tela, na área de oncologia, mas seja exigido do segurado que apresente laudo médico de especialista para a concessão deste mesmo benefício?

A resposta é simples, se para efeitos previdenciários a declaração de clínico geral não serve como documento comprobatório da existência de doença que se elenca dentre aquelas estudadas em áreas específicas da medicina, também não seria justificável que um médico não especializado em oncologia avaliasse o caso acima descrito.

A lógica é simples, segundo a Resolução 1.973 de 2011 do Conselho Federal de Medicina, seguindo entendimento internacional, atualmente, existem 53 espécies, reconhecidas, de especialidades médicas, o que não poderia ser diferente, dada a proporção dos campos abrangidos pela medicina moderna.

A divisão em especialidades é necessária para um melhor estudo técnico acerca dos métodos de tratamento, bem como, a busca científica de informações acerca dos efeitos da doença e os reflexos, de seu respectivo tratamento, na vida dos pacientes acometidos por determinada enfermidade.

A própria complexidade dos mais diversos sistemas que compreendem o corpo humano, bem como, suas peculiaridades, apontam pela necessidade de se dividir a medicina contemporânea de acordo com suas especificidades.

Aplicando-se ao exemplo, caso o médico perito que negou o benefício à segurada fosse especialista na área de oncologia, saberia ele que, o tratamento ao qual a paciente foi submetida acarretou, no caso dela, sérios efeitos colaterais cuja volta ao trabalho somente serviria para agravar um quadro médico complicado.

A irracionalidade de tal sistema fica mais latente quando analisado o próprio SUS, onde, a princípio, no atendimento aos pacientes, a doença é identificada por um Clinico Geral (figura que se assemelha muito à figura do médico perito), que encaminha o paciente acometido pela enfermidade a um médico especialista. Cumpre destacar que é vedado ao Clínico Geral, inclusive, pedir exames que, normalmente, seriam pedidos pelo médico especialista. 

Existem aqueles que defendem a ideia de que os médicos são competentes, desde que devidamente registrados no CRM, para atuar nas mais diversas áreas da medicina. No entanto, em que pese legalmente não existirem óbices ao aludido, deve-se levar em conta a função que exerce o médico perito que, como vimos, é quem de fato decide sobre a concessão dos benefícios. Assim, um perito que não esteja preparado para avaliar determinado caso, pode gerar sério dano ao periciado, que se verá diante de uma situação de veras complicada, doente, impossibilitado, clinicamente, de voltar ao mercado de trabalho e desamparado pela Previdência.

4 O ENTENDIMENTO DO PODER JUDICIÁRIO ACERCA DA FUNÇÃO DO MÉDICO PERITO

Em virtude da discussão que envolve este tema a questão foi parar, por inúmeras vezes, no Poder Judiciário.

A Advocacia Geral da União (AGU) defendia a ideia de que não existia qualquer razão jurídica ou justificativa técnica para a nomeação de especialistas para efetuar perícia em requerimentos de benefícios previdenciários por incapacidade, bem como, que os peritos médicos têm competência exclusiva para emissão de parecer conclusivo quanto à incapacidade laboral, destacando que a Lei nº 10.876/2004, que regula as carreiras do INSS, não exige qualquer conclusão de residência médica ou especialização em determinada área médica para a posse e o exercício do aludido cargo.[3]

Os advogados contrários alegavam que os peritos não possuíam competência para versar sobre assuntos inerentes a especialidades médicas distintas daquelas que eram capacitados, sendo, por óbvio, seus lados eivados de vício insanável, logo, nulos.

Alguns órgãos do judiciário entenderam que as perícias realizadas pelos peritos do INSS gozavam de presunção de veracidade e que, assim, não poderiam ser contestados no judiciário, salvo quando comprovado a ilegalidade no exame.

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. RESTABELECIMENTO. PERÍCIA MÉDICA DO INSS. CAPACIDADE LABORAL ATESTADA. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE. RECURSO PROVIDO. O auxílio-doença é devido aos segurados incapacitados temporariamente para o trabalho em decorrência de lesão ou doença e que preencham o requisito da carência (arts. 59 a 63 da Lei nº 8.213/91). As perícias do INSS gozam de presunção de legitimidade, não podendo, assim, ser questionadas perante o Judiciário, a menos que fique comprovada qualquer ilegalidade na realização do referido exame, o que não ocorreu nos autos. Há que se dar provimento ao presente agravo e cassar a decisão do MM. Juízo a quo que determinou o restabelecimento do pagamento de auxílio-doença ao Agravado, vez que após perícia médica realizada pelo ora Agravante, o Recorrido foi considerado apto a retornar as suas atividades laborativas. RECURSO PROVIDO”. (TJ-BA – AI: 00150803820138050000 BA 0015080-38.2013.8.05.0000, Data de Julgamento: 28/01/2014, Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 30/01/2014)

Na esfera federal, o entendimento é de que a função do médico perito é aferir se o segurado recolhe ou não condições para exercer atividade laborativa, sendo assim, não há que se falar na necessidade de a perícia ser feita por médico especialista.

“PREVIDENCIARIO – IMPLANTAÇÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO DOENÇA – IMPOSSIBILIDADE – CAPACIDADE LABORATIVA COMPROVADA PELO PERITO DO JUÍZO – ESPECIALISTA EM PSIQUIATRIA – CERCEAMENTO DE DEFESA – INEXISTÊNCIA – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I – O segurado da Previdência Social tem direito ao benefício de aposentadoria por invalidez (art. 42 da LBPS), quando for considerado incapaz para o trabalho que lhe garanta a subsistência e insusceptível de reabilitação, haja vista que, em dado momento, com o devido parecer de um expert, verificou-se que eram incompatíveis com suas limitações físicas e/ou psicológicas. II – O laudo pericial está devidamente fundamentado e demonstra que o perito examinou a autora com o fito de análise do seu quadro de saúde. O fato de ser especialista em outra área não abala as conclusões do laudo, na medida em que a perícia tem como objetivo a aferição da capacidade da paciente em relação ao trabalho e para tal, o referido médico está devidamente habilitado, […]  IV – Recurso a que se nega provimento”. (TRF-2 – AC: 201302010032668, Relator: Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO, Data de Julgamento: 26/06/2013, SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: 08/07/2013)

 A mesma ideia é verificada em outros julgados.

“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557 DO CPC. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42 A 47 E 59 A 62 DA LEI Nº 8.213, DE 24.07.1991. POSSIBILIDADE DE JULGAMENTO DO RECURSO COM BASE NO ART. 557 DO CPC. NOVA PERÍCIA REALIZADA POR MÉDICO ESPECIALISTA. NÃO CABIMENTO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. QUALIDADE DE SEGURADO. INEXISTÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 2. O laudo pericial atendeu às necessidades do caso concreto, não havendo que se falar em realização de mais um exame pericial […]. 3. A perícia médica não precisa ser, necessariamente, realizada por "médico especialista", já que, para o diagnóstico de doenças ou realização de perícias médicas não é exigível, em regra, a especialização do profissional da medicina. […]” (TRF-3 – AC: 50141 SP 0050141-57.2012.4.03.9999, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, Data de Julgamento: 11/11/2013, SÉTIMA TURMA)

O judiciário, em linhas gerais, entende que não é necessário que o exame pericial seja realizado por médico especialista na área médica da patologia que acomete o segurado, uma vez que a função do médico perito é avaliar se o segurado recolhe condições para voltar ao trabalho.

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5 NOTA CRÍTICA AO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL

O entendimento do judiciário também merece críticas. Caso a única função da perícia fosse identificar se o segurado recolhe condições para voltar ao trabalho, esta, não necessitaria ser feita por médicos, vez que um fisioterapeuta ou outro profissional da área teria competência para tanto.

A questão é que a necessidade da existência de um médico realizando as perícias, reside no fato de que os benefícios concedidos em perícia médica, derivam de patologias cujas análises, necessariamente, devem ser feitas por profissional capacitado, sendo assim, a especialização deste profissional tem relevância importância neste processo.

Existiram Magistrados que defenderam a ideia de que, assim como os advogados podem atuar nas mais diversas áreas do direito, os médicos, também são competentes para atuar nas mais diversas esferas da medicina.

Contudo, o judiciário deveria se espelhar no próprio judiciário para julgar esta questão. A estruturação do judiciário não possui outro sentido que não seja o de dar o tratamento devido à matéria de acordo com o tema por ela tratado, de acordo com as especificidades de cada uma delas, a fim de que, ao julgar, o magistrado recolha o conhecimento necessário acerca da matéria e possa sentenciar de forma correta. Na medicina ocorre o mesmo.

A divisão das especialidades decorre da importância de abordá-las de forma direcionada, um perito que não conhece as particularidades de determinada doença ou tratamento, não está apto a emitir pareceres sobre o paciente, tampouco, desconsiderar um laudo médico especializado.

A própria Previdência Social reconhece a importância desta divisão, uma vez que em seu Manual de Perícias Médicas[4], prevê em seu item 5 a possibilidade de credenciamento de médicos especialistas para a realização de pericias médicas, tais médicos são divididos entre as 21 especialidades previstas no item 5.6, e farão as pericias de acordo com sua especialidade.

Por obvio, tem-se que, se existe no Manual de perícia a possibilidade de se valer de especialistas para emissão de pareceres médicos, isso decorre da necessidade de uma análise qualificada do caso direcionado a este médico.

6 ANÁLISE FINAL

Por todo exposto, conclui-se, por tanto, que os pareceres emitidos por peritos que não possuem conhecimento específico sobre patologias distintas daquelas do ramo de sua especialidade, acarretam sérios danos aos segurados que têm seus pedidos negados, seja por agravar sua condição física com a volta ao trabalho, seja por deixar de prover os recursos necessários para a subsistência deste segurado.

A visão do judiciário acerca da competência do médico perito é simplista e perigosa, carecendo de uma análise social antes de uma análise jurídica. A função do médico perito não restringe-se a mera análise de capacidade laborativa, vez que tal análise, na ceara previdenciária, assume caráter social de suma importância, cujos reflexos podem acarretar sérios danos aqueles que contribuem para com a previdência, e seus dependentes.

A solução para este problema é simples e administrativa, vez que o agrupamento dos casos, assim como ocorre com pacientes psiquiátricos, pode ser direcionado para perito cuja especialização seja compatível com a patologia apresentada pelo segurado, tornando assim, os pareceres mais seguros e confiáveis, reduzindo, inclusive, o número de demandas no judiciário.

 

Referências
TEIXEIRA, Edriene Barros, Nexo Técnico Epidemiológico e Benefícios Previdenciários Por Acidentes de Trabalho. Salvador. Universidade Federal da Bahia, 2011. Disponível em: <http://www.sat.ufba.br/site/db/dissertacoes/172011102745.pdf> Acessado em: 18 ago. 2014.
KAWABATA, Lucimara Rosa Santiago. Perícia médica. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVIII, n. 133, fev 2015. Disponível em: <http://ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=15712 Acessado em: 22 de ago. 2014 as 11h23
Número de BENEFÍCIOS NEGADOS pela  Previdência Social. Disponível em: <http://www.agora.uol.com.br/grana/2014/07/1483703-cai-o-numero-de-auxilios- negados-pela-pericia-do-inss.shtml> Acessado em 22 de ago. 2014.
Definição de Pericia Médica do INSS. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/ arquivos/office/3_100701-165317-517.pdf>  Acessado em: 22 de ago. 2014.
FUNÇÕES DO PERITO. Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br/ arquivos/office/3_100701-165316-811.pdf>  Acessado em 22 de ago. 2014
GUIMARÃES, J. INSS admite erro em benefícios negados. In: Instituto de Estudos Previdenciários-IEPREV, [S/I], 16 mai. 2008. Disponível em: <http://www.ieprev.com.br/conteudo/id/5555/t/inss-admite-erro-em-beneficios-negados> Acessado em: 22 de ago. de 2014
MENDANHA, M. H. Médicos do INSS podem dar parecer sobre incapacidade laboral para qualquer área. In: Saúde Ocupacional.Org. [S/I]. Disponível em:<http://www.saudeocupacional.org/2014/07/peritos-do-inss-precisam-ser.html> Acessado em: 22 de ago. de 2014.
MÉDICOS do INSS podem dar parecer sobre incapacidade por qualquer doença. In: Revista Consultor Jurídico, 11 de agosto de 2014, 6h59. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-ago-11/medicos-inss-podem-dar-parecer-quaisquer-incapacidades> Acessado em: 22 de ago. de 204.
JURISPRUDÊNCIAS. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/ busca?q=Perito+especialista+da+Previd%C3%AAncia+Social&idtopico=T10000002>Acessado em: 22 de ago. de 2014.
 
Notas:
[1] Definições disponíveis em <http://www.previdencia.gov.br/arquivos/office/3_100701-165317-517.pdf> Acessado em: 22 de ago. 2014 às 12h28.

[2] Disponível em: <http://www.ieprev.com.br/conteudo/id/5555/t/inss-admite-erro-em-beneficios-negados> Acessado em: 22 de ago. 2014 as 13h32

[3] Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2014-ago-11/medicos-inss-podem-dar-parecer-quaisquer-incapacidades> Acessado em: 22 de ago. 2014 as 15h22

[4] Disponível em:  <http://www.cpsol.com.br/upload/arquivo_download/1872/Manual%20Pericia%20Medica%20da%20Previdencia%20Social.pdf> Acessado em: 22 de ago. de 2014 as 16h37.


Informações Sobre o Autor

Rodrigo Alves Cordeiro

Bacharel em Direito formado pelo Centro Universitário Filadélfia, sócio proprietário do escritório Cordeiro Molin Advogados Associados


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