Tamiris Regina Nascimento Lolli – Assessora Judiciária no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduada em Ciências Penais pela PUC Minas. Pós-Graduada em Direito Penal e Processual Penal Militar pelo CPP da PMMG. E-mail: tamiris.nascimentololli@gmail.com.
Resumo: O presente trabalho visa analisar o arcabouço jurídico (nacional e internacional) que trata da regulação do uso da força na atividade de polícia ostensiva de preservação da ordem pública. Busca-se identificar aspectos teóricos e principiológicos que orientam a prática policial. Pretende-se verificar se os princípios essenciais do uso da força são devidamente observados pela Polícia Militar do Estado de Minas Gerais em suas resoluções, instruções normativas e cadernos doutrinários que orientam a formação policial militar, de forma a assegurar o respeito e proteção aos direitos humanos. Para tanto foi realizada pesquisa documental e bibliográfica.
Palavras-chaves: Uso de força. Preservação da ordem pública. Polícia Militar.
Resumen: El presente trabajo tiene como objetivo analizar el marco legal (internacional y nacional) que se ocupa de la regulación del uso de la fuerza en la actividad policial ostensiva de preservación del orden público. Se busca identificar los aspectos teóricos y principiológicos que guían la práctica policial Se pretende responder si los principios esenciales del uso de la fuerza son debidamente observados por la Policía Militar del Estado de Minas Gerais en sus resoluciones, instrucciones normativas y cuadernos doctrinales que guían la capacitación de la policía militar, a fin de garantizar el respeto y la protección de los derechos humanos. Para esso se realizó una investigación documental y bibliográfica.
Palabras clave: Uso de la fuerza. Preservación del orden público. Policía militar.
Sumário: Introdução. 1. Legitimidade do uso da força policial. 2. Uso da força policial versus violência policial. 2.1. Princípios norteadores do uso da força. 3. Regulamentação do uso da força policial. 3.1. Padrões Internacionais sobre o uso da força policial. 3.2. Legislação Brasileira. 4. Instruções sobre o uso diferenciado da força na Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. 4.1. Níveis de Força. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.
Introdução
A Polícia Militar é um dos órgãos constitucionalmente responsáveis pela segurança pública, cabendo-lhe, conforme previsto no artigo 144, §5º, da Carta Magna, a preservação da ordem púbica e a atividade de policiamento ostensivo.
Para o cumprimento dessa importante missão, o Estado confere às instituições policiais o poder de polícia administrativa e o monopólio do uso legítimo da força, a fim de viabilizar o controle e a adequação dos interesses, direitos e deveres individuais em benefício da coletividade ou do próprio Estado, visando sempre a preservação da ordem e incolumidade públicas.
Os militares, no exercício de suas funções, se deparam, cotidianamente, com situações que apresentam os mais diferentes níveis de risco e complexidade. Cada momento exigirá que o policial planeje suas ações de maneira rápida e eficaz, agindo de modo a neutralizar uma crise e mitigar eventuais consequências. Para tanto, os policiais, mesmo nas circunstâncias mais adversas, devem estar preparados para tomarem decisões, principalmente quanto ao uso da força, que estejam dentro dos padrões técnicos, legais e éticos exigidos.
Eventualmente, a verbalização com o cidadão ou a utilização de instrumentos de menor potencial ofensivo não serão suficientes para solucionar uma ocorrência, sendo que, por vezes, o policial, em sua atividade, terá que fazer o uso de força potencialmente letal para fazer cessar uma ameaça a si próprio, a outrem ou à incolumidade pública.
Atualmente, existem diversos diplomas legais que norteiam e direcionam o uso da força por parte dos órgãos encarregados pela segurança pública. Há que se observar que esses instrumentos regulam desde os níveis iniciais de força, ou seja, aqueles empregados pelo militar quando este se encontra em suas atividades normais de patrulhamento, até os estágios mais avançados de crise em que se legitima, conforme acima mencionado, o uso da força letal.
Assim, é de suma importância estabelecer os fundamentos técnicos e teóricos quem orientam as condutas dos policiais militares, que são os agentes responsáveis pela preservação da ordem, de modo a assegurar que a autoridade policial seja legitimamente exercida.
Dessa forma, o presente artigo pretende estudar o arcabouço jurídico e técnico-profissional da Polícia Militar de Minas Gerais que regula o uso da força na atividade de polícia ostensiva de preservação da ordem pública, buscando entender aspectos teóricos e principiológicos que orientam o agir do policial.
Para tanto foi realizada pesquisa documental e bibliográfica, analisando o arcabouço legal internacional e nacional que tratam do uso da força na atividade policial, bem como as diretrizes da Polícia Militar de Minas Gerais que tratam do assunto.
As análises e os dados coletados estão organizados em subtemas, que serão tratados a seguir. O primeiro trata da legitimidade do uso da força policial, abordando o conceito de Estado, poder de polícia e a atuação da Polícia Militar. Em seguida será analisado o uso da força policial versus violência policial. Na sequência busca-se compreender a regulação do uso da força policial por meio das legislações internacional e nacional. Por fim serão analisados os níveis do uso da força abarcados pela doutrina da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais.
1 Legitimidade do uso da força policial
Para uma melhor compreensão dos papeis exercidos pelas Polícias Militares, órgãos responsáveis pela segurança pública interna, torna-se de fundamental importância compreender, ainda que brevemente, a estruturação e função do Estado e do poder de polícia.
Segundo Ribeiro Junior (2001), a figura do Estado surge a partir do momento em que a sociedade se organiza de forma política. O Estado foi criado e legitimado a partir de uma sociedade política organizada, com o objetivo principal de promover uma convivência pacífica entre povos determinados, visando o bem comum e, utilizando-se, para tanto, de meios coercitivos (SANTOS, 2016).
Os elementos essenciais para existência do Estado são o povo, território, governo e soberania. O Estado existe para prestar serviços à coletividade e é a soberania que possibilita a edição de normas e regras de convivência social, bem como a adoção de medidas que coíbam as práticas de atos que vão de encontro ao bem-estar comum (OLIVEIRA, 2010).
Portanto, cabe ao Estado o monopólio da violência legítima, elemento fundamental para o controle social. Isso não significa brutalidade ou excessos, o uso da força é um meio extremo que o Estado possui a sua disposição para fazer com que a ordem pública seja preservada.
O poder de polícia, por sua vez, é um desdobramento do monopólio da força pelo Estado e visa condicionar o exercício dos direitos e garantias fundamentais ao interesse coletivo. Todas as ações e operações realizadas pelas polícias militares se originam e se fundamentam no poder de polícia do Estado. Por esta razão, inclusive, para Lazzarini (1999), a ideia de polícia é inseparável da ideia de Estado, que jamais poderá abrir mão da sua força de segurança pública.
O conceito legal de poder de polícia está contido no artigo 78, do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/66), que dispõe, in verbis:
“Art. 78 – Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.” (BRASIL, 1966).
O poder de polícia não é ilimitado. Ele está intrinsecamente relacionado ao interesse público, ou seja, ele deve ser exercido apenas nos limites exigidos para se alcançar o bem comum. Segundo Di Pietro (2003), o poder de polícia somente pode ser exercido quando não for possível o emprego de outro meio eficaz para se alcançar o objetivo pretendido, não sendo válido quando desproporcional ou excessivo.
Além de ter como parâmetro os princípios elencados no artigo 37, da Constituição Federal, o poder de polícia administrativa se caracteriza, conforme apontado por Di Pietro (2003) e Meirelles (2003), por três elementos: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibilidade.
A discricionariedade é a livre escolha de agir por parte do agente administrativo, com base nos princípios da oportunidade e conveniência. É uma margem de escolha ampla, mas que encontra limites na própria lei. Não se pode confundir discricionariedade com arbitrariedade. Isto porque, enquanto a discricionariedade significa agir dentro da lei, esta última está relacionada à uma atuação fora dos limites impostos pela legislação vigente.
A autoexecutoriedade, por sua vez, é o atributo que permite que à Administração Pública, por seus próprios meios, executar suas decisões, sem precisar de nenhuma interferência ou autorização judicial.
Por fim, a coercibilidade é a possibilidade de imposição das decisões administrativas, é a imperatividade dos atos da Administração Pública e a possibilidade do uso da força para se fazer cumprir tais medidas.
Feitas essas considerações, destaca-se que o artigo 144, da Constituição Federal de 1988 disciplinou a atividade de segurança pública, estabelecendo atribuições e repartindo competências. Referido artigo, em seu parágrafo quinto, determina de forma expressa que cabe às Polícias Militares a atividade de polícia ostensiva e a preservação da ordem pública. Em consonância com a Carta Magna, a Constituição do Estado de Minas Gerais também dispõe sobre a atividade policial:
“Art. 136 – A segurança pública, dever do Estado e direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(…)
II – Polícia Militar.”
“Art. 142 – A Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar, forças públicas estaduais, são órgãos permanentes, organizados com base na hierarquia e na disciplina militares e comandados, preferencialmente, por oficial da ativa do último posto, competindo:
I – à Polícia Militar, a polícia ostensiva de prevenção criminal, de segurança, de trânsito urbano e rodoviário, de florestas e de mananciais e as atividades relacionadas com a preservação e restauração da ordem pública, além da garantia do exercício do poder de polícia dos órgãos e entidades públicos, especialmente das áreas fazendária, sanitária, de proteção ambiental, de uso e ocupação do solo e de patrimônio cultural.” (MINAS GERAIS,1989).
No mesmo sentido é o Código de Ética e Disciplina dos Policiais Militares do Estado de Minas Gerais (Lei Estadual nº. 14.310/02) que, em seu artigo 14, define que a atividade policial, exercida por oficiais e praças, tem a finalidade de preservar, manter e estabelecer a ordem pública e a segurança interna em todo o território do Estado (MINAS GERAIS, 2002).
Destarte, vê-se que tanto a Constituição Federal quanto a Constituição do Estado de Minas Gerais estabelecem, de forma comum, a competência da Polícia Militar para o exercício da polícia ostensiva e para a preservação da ordem pública.
Neste ponto, tendo em vista as funções exercidas pela Polícia Militar, torna-se importante destacar, ainda que suscintamente, os conceitos de ordem pública e de polícia ostensiva.
Para Lazzarini (1999), a ordem pública é “a ausência de desordens, de atos de violência contra as pessoas, os bens ou o próprio Estado”. Na atividade de preservação da ordem pública, a Polícia Militar poderá atuar de forma preventiva ou repressiva, por meio do policiamento ostensivo, a depender do caso concreto (ROLIM, 2015).
O policiamento ostensivo por sua vez, se caracteriza por ser a atividade de polícia desenvolvida de forma a ser facilmente identificada pela população em geral, seja pelo uso da farda, pelas viaturas, armamento ou demais equipamentos típicos.
2 Uso da Força Policial versus Violência Policial
Inicialmente, temos que uma distinção essencial a ser feita é entre o uso da força e a violência policial. O uso da força se caracteriza por ser um ato discricionário, legal e legítimo. É uma das características e pressupostos da atividade policial, sendo exercido em consonância com os ditames legais e em observância aos princípios da legalidade, necessidade e proporcionalidade.
O uso da força é derivado do poder de polícia e constitui monopólio do Estado. Assim, o policial militar, no cumprimento de suas atividades, poderá utilizar da força para repelir uma ameaça à sua pessoa ou à sociedade como um todo.
Conforme disposto no Manual Técnico-Profissional 01 da Polícia Militar de Minas Gerais:
“(…) a força, no âmbito policial, é definida como sendo o meio pelo qual a Polícia Militar controla uma situação que ameaça a ordem pública, o cumprimento da lei, a integridade ou a vida das pessoas. Sua utilização deve estar condicionada à observância dos limites do ordenamento jurídico e ao exame constante das questões de natureza ética.” (MINAS GERAIS, 2013).
Por outro lado, a violência policial é uma prática abusiva, um ato arbitrário, ilegal e ilegítimo, sendo conceituada como o:
“(…) uso intencional da força física ou do poder real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha qualquer possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação.” (KRUG et al., 2002, p. 5).
Enquanto o uso da força é legitimado pela própria essência do Estado e socialmente aceito como medida necessária para garantir o interesse público e a paz social em detrimento dos direitos e vontades individuais, a violência policial é ato que, além de abusivo e não condizente com os fins das Instituições Militares e do Estado, configura crime ou infração disciplinar, a depender do caso que se enfrente.
É em razão dessa distinção que se mostra tão importante estabelecer e fundamentar os limites do uso da força na atuação diuturna do policial militar, evitando a ocorrência de condutas sem técnica e sem responsabilidade, que possam comprometer a imagem da instituição a qual o profissional integra.
O policial deve sempre ter em mente que, independentemente da situação, a Polícia Militar tem o dever funcional de servir e proteger a sociedade, preservar a ordem pública e a incolumidade das pessoas e do patrimônio, garantindo o cumprimento da lei (MINAS GERAIS, 2013).
2.1 Princípios norteadores do uso da força
O uso da força pelos policiais militares, além de ser regulado pelo ordenamento jurídico, deve ser estritamente fundamentado na missão de preservação da lei e da ordem, da segurança, da vida e da integridade física das pessoas e, ainda, em alguns princípios essenciais. Nesse sentido, a legalidade, necessidade e proporcionalidade constituem os pilares principiológicos essenciais sobre o qual devem ser pautadas todas as decisões de ações policiais.
O princípio da legalidade se vislumbra quando se utiliza a força para alcançar um objetivo legal, atuando o policial militar nos estritos limites permitidos pelo nosso ordenamento jurídico.
Segundo o Manual Técnico-Profissional 01 da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais (MINAS GERAIS, 2013), o princípio da legalidade deve ser estudado em suas duas vertentes: resultado e processo. No resultado, considera-se que a ação policial deve sempre ser dirigida a alcançar um objetivo/resultado legal. No que tange ao processo, deve-se observar se os meios utilizados pelo policial militar estão em conformidade com as normas e regulamentos vigentes. Neste sentido, destaca que:
“(…) o princípio da legalidade não está presente se o policial militar usa de violência para extrair a confissão de uma pessoa. A tortura é vedada em qualquer situação e não justifica o objetivo a ser alcançado (…).
(…) o policial militar não cumpre o princípio da legalidade se, durante o seu serviço, usar arma e munições ao autorizadas pela Instituição, tais como armas sem registro, com numeração raspada, calibre proibido, munições particulares, dentre outras.” (MINAS GERAIS, 2013, p. 77).
O princípio da necessidade informa a força deve ser empregado somente se for o recurso adequado para se atingir os objetivos legais (princípio da legalidade) pretendidos em uma situação concreta.
Por fim, o princípio da proporcionalidade determina que a força utilizada pelo policial deve ser compatível com a gravidade da ameaça oferecida pelo infrator. Assim, se em determinada situação, for possível o emprego de instrumentos de menor potencial ofensivo para neutralizar uma ameaça, não se justifica, por ausência de proporcionalidade, o uso de força potencialmente letal.
O policial não precisa percorrer todos os níveis de força para neutralizar uma situação crítica, pois não se trata de uso progressivo da força e sim do seu uso de forma diferenciada, selecionada. Assim, se uma ocorrência simples evoluir rapidamente para uma complexa com reféns, por exemplo, nada impede que o militar saia da verbalização e faça uso de força potencialmente letal, pois esta medida se mostrará necessária e proporcional à ameaça vivenciada, além de encontrar respaldo legal.
Em suma, quanto aos princípios do uso da força, temos que:
“Os encarregados de Aplicação da Lei somente recorrerão ao uso da força quando todos os outros meios para atingir um objetivo legítimo tenham falhado, e o uso da força pode ser justificado quando comparado com o objetivo legítimo. O(s) Encarregado(s) de Aplicação da Lei são exortados a serem moderados no uso da força e armas de fogo e a agirem em proporção à gravidade do delito cometido e o objetivo legítimo a ser alcançado. Somente será permitido aos encarregados empregarem a quantidade de força necessária para se alcançar um objetivo legítimo.” (ROVER, 2005, p. 298).
Ainda sobre os princípios norteadores do uso da força, tem-se a Portaria nº. 4.226, expedida pelo Governo Federal em 31 de dezembro de 2010, que estabelece diretrizes a serem seguidas pelos agentes de segurança pública e, além de determinar a observância dos princípios essenciais acima mencionados (legalidade, necessidade e proporcionalidade), acrescenta ainda os princípios da conveniência e moderação:
“O uso da força por agentes de segurança pública deverá obedecer aos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade, moderação e conveniência.
(…)
Princípio da Conveniência: A força não poderá ser empregada quando, em função do contexto, possa ocasionar danos de maior relevância do que os objetivos legais pretendidos.
Princípio da Legalidade: Os agentes de segurança pública só poderão utilizar a força para a consecução de um objetivo legal e nos estritos limites da lei.
Princípio da Moderação: O emprego da força pelos agentes de segurança pública deve sempre que possível, além de proporcional, ser moderado, visando sempre reduzir o emprego da força.
Princípio da Necessidade: Determinado nível de força só pode ser empregado quando níveis de menor intensidade não forem suficientes para atingir os objetivos legais pretendidos.
Princípio da Proporcionalidade: O nível da força utilizado deve sempre ser compatível com a gravidade da ameaça representada pela ação do opositor e com os objetivos pretendidos pelo agente de segurança pública.” (BRASIL, 2010).
Assim, os princípios essenciais são instrumentos limitadores do uso da força pelos policiais, bem como pelos outros agentes responsáveis pela segurança pública.
Além dos princípios essenciais, existem os Princípios Básicos sobre Utilização da Força e Armas de Fogo (PBUFAF), adotados pela Organização das Nações Unidas (ONU) e que também devem ser observados pelos policiais em sua atuação profissional.
Esses Princípios Básicos passaram a ser regra, devendo ser observados pelos agentes de segurança pública, conforme previsto na Portaria nº. 4.226/10:
“O uso da força pelos agentes de segurança pública deverá se pautar nos documentos internacionais de proteção aos direitos humanos e deverá considerar, primordialmente:
(…) c. os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotados pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes, realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de setembro de 1999.” (BRASIL, 2010).
No âmbito da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, esses princípios também são tidos como regra:
“Os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (PBUFAF) foram adotados no “Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre a Preservação do Crime e o Tratamento de Infratores”, realizado em Havana, Cuba, de 27 de agosto a 7 de setembro de 1990, e constituem 26 comandos que descrevem as diretrizes referentes às disposições gerais e específicas sobre o uso de força, o policiamento de reuniões ilegais e de indivíduos sob custódia, a habilitação, formação e orientação de funcionários com funções policiais e os procedimentos de comunicação e revisão de incidentes. Essas normas genéricas foram desdobradas pela PMMG, em consonância com os oito artigos do Código de Conduta para os Encarregados pela Aplicação da Lei (CCEAL), em atenção à recomendação da ONU de transformá-las em normas procedimentais aplicáveis à função policial, tomando-se em conta as peculiaridades regionais referentes a fatores sociais, econômicos e culturais. Essas regras devem ser respeitadas em todas as circunstancias de intervenção operacional da PMMG, não sendo justificativa para descumpri-las, situações excepcionais ou de emergência pública.” (MINAS GERAIS, 2013).
O documento dos Princípios Básicos sobre Utilização da Força e Armas de Fogo (PBUFAF) também ressalta a importância da atividade policial e determina que os governos garantam melhores condições materiais para que os policiais possam executar bem e fielmente sua missão. Determina, ainda, que o uso diferenciado da força seja possibilitado ao policial por meio da disponibilização dos instrumentos necessários (variedade de instrumentos de menor potencial ofensivo e armas de calibres variados).
3 Regulamentação do uso da força policial
3.1 Padrões Internacionais sobre o uso da força policial
Conforme demonstrado ao longo deste artigo, é reconhecidamente legítimo o uso de força pelas polícias em sua atividade de preservação da ordem pública. Entretanto, é necessário reconhecer que há casos em que ocorre abuso do uso da força. O abuso do poder de polícia vai de encontro à dignidade da pessoa humana, princípio fundamental que norteia os Direitos Humanos.
Assim, torna-se necessária a existência de mecanismos que limitem e orientem o uso da força, a fim de evitar a ocorrência de situações de truculência e violência arbitrária. Essas normas também se mostram importantes para melhorarem as condições de atuação dos agentes responsáveis pela segurança pública.
Neste contexto, existem vários documentos internacionais que instituem padrões para o uso da força. Dentre eles podemos citar o Código de Conduta para Encarregados da Aplicação da Lei (CCEAL) e os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei (PBUFAF).
O Código de Conduta para Encarregados da Aplicação da Lei (CCEAL) foi adotado por meio da Resolução nº. 34/169 da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 17 de dezembro de 1979 e tem como objetivo orientar a atuação dos agentes da segurança pública, bem como criar padrões para a aplicação da lei em conformidade com os direitos e liberdades humanas. Este documento possui sete artigos, dentre os quais se destaca:
“Artigo 2º No cumprimento do dever, os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os direitos humanos de todas as pessoas.
Artigo 3º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei só podem empregar a força quando estritamente necessária e na medida exigida para o cumprimento do seu dever.
Comentário O emprego da força por parte dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei deve ser excepcional. Embora se admita que estes funcionários, de acordo com as circunstâncias, possam empregar uma força razoável, de nenhuma maneira ela poderá ser utilizada de forma desproporcional ao legítimo objetivo a ser atingido. O emprego de armas de fogo é considerado uma medida extrema; devem-se fazer todos os esforços no sentido de restringir seu uso, especialmente contra crianças. Em geral, armas de fogo só deveriam ser utilizadas quando um suspeito oferece resistência armada ou, de algum outro modo, põe em risco vidas alheias e medidas menos drásticas são insuficientes para dominá-lo. Toda vez que uma arma de fogo for disparada, deve-se fazer imediatamente um relatório às autoridades competentes.” (ONU, 1979).
Outro importante documento internacional é o PBUFAF, tratado brevemente no capítulo anterior. Esses princípios básicos foram adotados no 8º Congresso das Nações Unidas sobre a “Prevenção do Crime e o Tratamento de Infratores”, realizado em Havana, Cuba, de 27 de agosto a 7 de setembro de 1990.
O referido documento é composto por vinte e seis princípios que visam estabelecer parâmetros que orientem os Estados membros a assegurar e promover a atuação adequada dos agentes de segurança pública quanto ao uso da força.
Conforme já destacado neste artigo, o documento dos Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo (PBUFAF) reconhece a importância do trabalho realizado pelos agentes policiais, bem como enfatiza a necessidade de qualificação, treinamento e de condições adequadas para o desenvolvimento de atividades de preservação da segurança e vida dos indivíduos.
3.2 Legislação Brasileira
No âmbito nacional, o Código de Processo Penal, instituído no nosso ordenamento jurídico por meio do Decreto-Lei nº. 3.689, de 3 de outubro de 1941, prevê duas possibilidades de empego da força no exercício da atividade policial: nos casos de resistência ou tentativa de fuga do preso e para o cumprimento de mandado de prisão. Vejamos:
“Art. 284. Não será permitido o emprego de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso.” (BRASIL, 1941).
“Art. 293. Se o executor do mandado verificar, com segurança, que o réu entrou ou se encontra em alguma casa, o morador será intimado a entregá-lo, à vista da ordem de prisão. Se não for obedecido imediatamente, o executor convocará duas testemunhas e, sendo dia, entrará à força na casa, arrombando as portas, se preciso; sendo noite, o executor, depois da intimação ao morador, se não for atendido, fará guardar todas as saídas, tornando a casa incomunicável, e, logo que amanheça, arrombará as portas e efetuará a prisão.” (BRASIL, 1941).
Disposição muito semelhante é encontra no Código de Processo Penal Militar, instituído pelo Decreto-Lei nº. 1.002, de 21 de outubro de 1969, a saber:
“Art. 231. Se o executor verificar que o capturando se encontra em alguma casa, ordenará ao dono dela que o entregue, exibindo-lhe o mandado de prisão.
Parágrafo único. Se o executor não tiver certeza da presença do capturando na casa, poderá proceder à busca, para a qual, entretanto, será necessária a expedição do respectivo mandado, a menos que o executor seja a própria autoridade competente para expedi-lo.
Art. 232. Se não fôr atendido, o executor convocará duas testemunhas e procederá da seguinte forma:
(…)
Art. 234. O emprego de fôrça só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga. Se houver resistência da parte de terceiros, poderão ser usados os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliares seus, inclusive a prisão do ofensor. De tudo se lavrará auto subscrito pelo executor e por duas testemunhas” (BRASIL, 1969).
Outro diploma legal que, em certa medida, também dispõe sobre o uso da força é o Código Penal, instituído pelo Decreto-Lei nº. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 que, em seu artigo 23, prevê a existência de causas de exclusão da ilicitude:
“Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Parágrafo único – O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.” (BRASIL, 1940).
No mesmo sentido, o Código Penal Militar, instituído pelo Decreto-Lei nº. 1001, de 21 de outubro de 1969:
“Art. 42. Não há crime quando o agente pratica o fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento do dever legal;
IV – em exercício regular de direito.” (BRASIL, 1969).
As excludentes de ilicitude acima mencionadas, são aplicáveis às mais diversas situações vivenciadas no cotidiano dos agentes de segurança pública, dando a eles uma margem de atuação definida e limitada pela lei, de forma que, a depender da situação concreta e estando presente os requisitos legais, o policial que fizer uso de força contra um cidadão infrator não incorrerá na prática de nenhum ilícito penal.
Pois bem. Quanto ao aspecto, Andreucci (2007) nos ensina que o estado de necessidade é uma situação de perigo atual de interesses legítimos e protegidos pelo direito, sendo que o agente policial, para salvaguardar um bem próprio ou de terceiros, não tem outro meio senão o de lesar o interesse de outrem, igualmente legítimo. Tal instituto encontra guarita no art. 24, do Código Penal.
A legítima defesa, por sua vez, prevista no art. 25, do Codex Penal, constitui a repulsa à injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem, utilizando para tanto, moderadamente dos meios necessários. Pode ocorrer em face do direito do agente policial ou para a defesa de direitos de terceiros.
Importante destacar que a recente Lei nº. 13.964 de 2019, notoriamente conhecida como “Pacote Anticrime”, alterou o art. 25, do Código Penal e inseriu um parágrafo único que passou a dispor o seguinte:
“Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.” (BRASIL, 1969).
A alteração mencionada, que passou a prever a chamada legítima defesa policial, foi comemorada pelos órgãos responsáveis pela segurança pública e pela comunidade em geral. Apesar de não trazer alterações práticas efetivas, eis que a referida excludente de ilicitude somente tem cabimento quando se fizerem presentes os requisitos previstos no caput do art. 25, a nova redação reforça a legalidade da atuação policial em situações de ameaças de agressão ou de agressão atual e iminente, constituindo verdadeiro respaldo para a atividade dos agentes públicos de segurança.
Seguindo na análise das justificantes, temos o estrito cumprimento de dever legal que se verifica nos casos em que a lei impõe ao agente um determinado comportamento e, ainda, o exercício regular de direito, que se relaciona com a existência de uma norma que regule e molde a conduta do agente (SANTOS, 2016).
Por fim, destaca-se que, no âmbito da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), em 1984 foi editada pelo Estado Maior, a Nota de Instrução nº. 001/84 – EMPM, que regulou a legitimidade do “Uso da força no Exercício do poder de Polícia”, bem como as consequências do seu emprego de forma abusiva:
“O policial militar pode e deve fazer uso da força, no desempenho de sua missão, de forma tal que esse uso não vá além do nec9essário e chegue a configurar o excesso ou uma ação policial violenta.” (MINAS GERAIS, 1984).
Historicamente, a doutrina da PMMG foi construída por orientações técnicas tais como as Diretrizes Auxiliares de Operações nº. 1, de 1994 (DIAO 01/94), que apresentou orientações específicas referentes ao uso da força. O mesmo documento determinou os princípios gerais a serem observados na atividade policial militar, nos quais se encontram, dentre outros, o respeito à pessoa humana, a punição de excessos policiais e a necessidade de preparação do policial militar.
Além disso, a Polícia Militar mineira conta com Cadernos Doutrinários que orientam o cotidiano operacional e estabelecem parâmetros a serem seguidos para o uso da força, sendo tais parâmetros objeto de estudo a seguir.
4 Instruções sobre o uso diferenciado da força na Polícia Militar do Estado De Minas Gerais
Conforme ensina o Manual Técnico-Profissional 01 (MINAS GERAIS, 2013), importante Caderno Doutrinário que regula e orienta os profissionais da Polícia Militar de Minas Gerais, o uso diferenciado da força consiste na sua aplicação de maneira seletiva.
O uso da força configura um processo complexo e dinâmico, podendo variar sua aplicação (aumentar ou diminuir seu potencial lesivo) a medida em que a ocorrência policial for se desenvolvendo.
Nesse ponto, ressalta-se que não se mostra correto falar em uso progressivo da força. O termo “progressivo” remete a ideia de uma escala de elevação a ser percorrida. E, como já dito, de acordo com o caso concreto, o policial militar poderá evoluir de um dos níveis mais brandos de força, diretamente para a força potencialmente letal, bem como poderá regredir e abrandar o nível de força utilizado, conforme se verificar a cessação do perigo.
Toda ação policial e decisão de emprego de força deve ser precedida de uma avaliação de riscos, possibilitando a escolha do uso de técnicas e dos níveis de força adequados às peculiaridades de cada caso in concreto.
4.1 Níveis de Força
De acordo com Manual Técnico-Profissional 01 da PMMG (MINAS GERAIS, 2013), o policial militar, em sua atuação operacional, deverá observar a seguinte classificação dos níveis de força: primário; secundário e terciário.
O nível primário é o mais básico de aplicação de força. Caracteriza-se pela própria presença policial militar nas ruas e pelo processo de verbalização.
A presença ostensiva da Polícia Militar nas ruas, além de configurar uma demonstração da sua própria autoridade, na maioria das vezes inibe o infrator de praticar algum delito naquele local. A verbalização, por sua vez, é a comunicação estabelecida entre o policial e o cidadão, fazendo-se presente inclusive em todos os níveis de uso de força. O tom de voz e postura do policial vão variar de acordo com a pessoa a ser abordada e conforme a tensão da situação exigir (MINAS GERAIS, 2013).
O ideal é que toda ocorrência policial seja resolvida com o uso da verbalização, porém, nem sempre isso é possível, sendo necessário a utilização dos outros níveis de força, conforme veremos a seguir.
No nível secundário temos o controle de contato, o contato físico, o controle com instrumentos de menor potencial ofensivo e o uso dissuasivo de armas de fogo.
O controle de contato é uma técnica de abordagem em que não há a necessidade de se recorrer a nenhum armamento, instrumento ou equipamento. Neste caso, o policial militar utiliza apenas da postura e da distância adequada em relação ao abordado, ou seja, neste caso prevalece a sua linguagem corporal (MINAS GERAIS, 2013).
O controle físico consiste no emprego de técnicas de defesa pessoal, sem a utilização de armamento ou instrumentos, enquanto o controle por meio de instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO) se dá com a utilização de bastão, tonfa, gás, agentes químicos, algemas, elastômeros, armas de impulso elétrico, cães, etc. Ambas as técnicas são empregadas em caso de resistência ativa e visam a imobilização e condução do abordado, evitando, sempre que possível, lesões decorrentes do seu uso (MINAS GERAIS, 2013).
O uso dissuasivo de armas de fogo, por sua vez, constitui as opções de posicionamento da arma, inibindo qualquer intenção de reação do abordado e permitindo que o policial esteja em condições de utilizá-la de forma rápida, caso seja necessário. São exemplos do uso dissuasivo da arma de fogo: localizar a arma no coldre; empunhar a arma em guarda baixa ou em guarda alta e empunhar a arma em posição de pronta-resposta (MINAS GERAIS, 2013).
Finalmente, no que tange ao nível terciário, temos a utilização de força potencialmente letal, que consiste na aplicação de técnicas de defesa pessoal, com ou sem o uso de equipamentos, direcionados a regiões vitais do corpo do agressor (MINAS GERAIS, 2013). Esse nível de força constitui ultima ratio, devendo ser utilizado apenas em situações excepcionais que envolvam risco iminente à vida do policial ou de terceiros.
O disparo de arma de fogo constitui expressão máxima da força policial, devido ao seu efeito potencialmente letal. Sempre que possível e desde que não haja risco pessoal para o policial ou para terceiros, ele poderá efetuar o disparo em regiões não letais do corpo do infrator visando cessar a agressão e reduzir as possibilidades de lesões graves.
Registra-se aqui que a intenção do policial militar nunca é exterminar uma vida. A Polícia Militar, no âmbito de sua atuação, não aceita, nem busca o resultado morte, sendo que sua ação é voltada apenas para fazer cessar uma ação que atente contra a vida ou ameace gravemente uma pessoa ou a sociedade como um todo.
Assim, o policial militar age, independentemente do nível de força empregado, visando repelir uma agressão à sua pessoa ou de outrem, encontrando-se, nestes casos, em situação de legítima defesa própria ou de terceiros.
Além disso, o policial militar, durante a condução da ocorrência, deverá observar se as consequências decorrentes de um disparo de arma de fogo são mais graves do que as ameaças sofridas, como ocorrem nos casos de controle de multidões ou de pessoas em fuga. O agente policial sempre deverá levar em conta diversas variáveis que podem interferir na sua atuação, de modo a garantir que seu disparo seja efetivo, causando o menor dano possível.
Por fim, conforme já mencionado anteriormente neste trabalho, reforça-se que nem sempre será necessário o emprego de todos os níveis de força em uma mesma ocorrência policial. Na maioria das vezes a verbalização é suficiente para que o policial militar controle a situação. Entretanto, há casos em que a gravidade da ameaça pode aumentar repentinamente, sendo necessário o uso imediato de força potencialmente letal. Portanto, é fundamental que o policial esteja atento quanto às mudanças no comportamento do abordado, para que selecione corretamente o nível de força a ser empregado (MINAS GERAIS, 2013).
Cada intervenção policial é singular, exigindo que o militar seja versátil e capaz de se adaptar rapidamente às peculiaridades do cotidiano operacional. Nesse contexto o preparo mental do policial militar é tão importante quanto seu conhecimento sobre os limites e técnicas do emprego de força. A falta de preparo mental pode gerar graves prejuízos ao desempenho do policial militar em uma determinada operação, aumentando seu tempo de reação a uma agressão ou resultando em um uso inadequado da força – excessivo ou aquém do necessário para neutralizar a ameaça sofrida.
Considerações Finais
Buscou-se com esse artigo demonstrar que o Estado outorga à determinados órgãos, dentre eles às Polícias Militares, o poder de intervir em situações de conflito social, ainda que para tanto seja necessário o uso da força, com vistas a garantir a restauração e preservação da ordem pública.
Ainda que a polícia tenha legitimidade para fazer uso da força, nem sempre os seus níveis mais avançados serão utilizados nas abordagens. Ainda que exista previsão legal, a Polícia Militar pode – e deve – fazer uso de meios potencialmente menos lesivos a fim de resolver uma ocorrência.
Mostrou-se, ainda, que a legislação brasileira trata sucintamente dos limites do uso da força na atividade profissional da polícia e dispõe sobre situações que serão abarcadas pelo manto das excludentes de ilicitude. Entretanto, há documentos internacionais que regulam o uso de força pelos agentes responsáveis pela segurança pública, sendo tais instrumentos observados pela Polícia Militar de Minas Gerais em seus regulamentos internos, principalmente no aspecto do uso diferenciado da força.
Conforme verificado na pesquisa, em sua atuação profissional, o policial deverá considerar as peculiaridades da situação concreta, a fim de decidir, da maneira mais rápida possível, qual nível de força deve ser empregado, de forma proporcional e necessária para a neutralização da agressão ou ameaça enfrentada.
Os princípios essenciais do uso da força são devidamente observados pela Polícia Militar de Minas Gerais em suas resoluções, instruções normativas e cadernos doutrinários que orientam a formação policial militar, de forma a assegurar o respeito e proteção aos direitos humanos inerentes a qualquer cidadão.
Diante de todo o exposto neste artigo, é possível concluir que os policiais militares devem ser qualificados e treinados de forma a conseguirem resolver conflitos, dos mais diversos graus de complexidade, com inteligência e lógica. Portanto, é fundamental o conhecimento das técnicas e legislações aplicáveis à espécie, para que a atividade policial esteja sempre baseada na legitimidade, necessidade e proporcionalidade. Da mesma forma, é necessário continuar a investir na formação teórica e jurídica do policial militar, disponibilizando também os instrumentos e armamentos adequados para o uso da força de acordo com as especificidades de cada caso concreto.
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