Vedação ao fracionamento de precatórios para fins de enquadramento ao regime das requisições de pequeno valor: as exceções consagradas pela jurisprudência atual dos Tribunais Superiores

Resumo: Este artigo visa a abordagem da vedação constitucional ao fracionamento de precatórios, apresentando a evolução da jurisprudência através da criação de exceções à regra prevista no art. 100, §8º da Constituição Federal. Serão apresentados alguns casos emblemáticos que já foram solucionados pelos Tribunais Superiores, no sentido de se permitir que um precatório seja fracionado com a finalidade de ser pago por meio de Requisição de Pequeno Valor. Serão abordados casos relativos ao fracionamento para fins de pagamento de verbas incontroversas, honorários sucumbenciais ao advogado, ações plúrimas e ações coletivas que buscam a defesa de direitos individuais homogêneos.

Palavras-chave: Precatório – Fracionamento – Requisição de Pequeno Valor

Sumário: Introdução. 1. Vedação constitucional. 2. As exceções previstas na jurisprudência atual dos Tribunais Superiores. Conclusão. Referências.

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Introdução

A Constituição Federal estabelece, em seu artigo 100, §3º, que as condenações das Fazendas Públicas a pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor, decorrentes de sentenças judiciais transitadas em julgado, não exigem a expedição de precatórios.

Trata-se de um mecanismo que permite que condenações de pequeno valor não se subordinem ao demorado trâmite dos precatórios, de sorte que não necessitem ser incluídas no orçamento do exercício financeiro subsequente, garantindo-se o seu pronto pagamento, logo após o trânsito em julgado da decisão.

Para tanto, cada Ente Federado poderá definir em lei própria o quantum das obrigações de pequeno valor, segundo suas diferentes capacidades econômicas (§4º do artigo 100 da Constituição Federal), ou, na literalidade da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, “de acordo com sua capacidade orçamentária”[1], sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral da previdência social.

Contudo, enquanto cada Ente Federado não instituir sua lei própria, o art. 87 do ADCT determina que para os Estados e Distrito Federal, o valor é de 40 (quarenta) salários- mínimos e para os Municípios é de 30 salários- mínimos. Já para a União, o patamar autorizativo da requisição de pequeno valor é de 60 salários- mínimos, nos termos da Lei nº10.259 de 12 de julho de 2001, a qual instituiu os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, no âmbito da Justiça Federal e regulamentou em âmbito federal o valor da requisição de pequeno valor em seu artigo 17, §1º, prevendo como pequeno valor o mesmo limite para fins de determinação de competência dos Juizados Especiais Federais, qual seja: 60 salários- mínimos (art. 3º do mesmo diploma legal).

1. Vedação constitucional

Antes da Emenda Constitucional 62 de 2009, que introduziu diversas alterações no regime constitucional de pagamento de precatórios, era permitida a expedição de precatórios complementares ou suplementares, sob o auspício de que a quitação dos precatórios era por demais demorada e a inflação, muito elevada.

Destarte, o credor poderia receber uma parte da totalidade devida, através de requisição de pequeno valor, logo após o trânsito em julgado, e o restante, por meio de precatório, segundo sua ordem cronológica, havendo maior rapidez no pagamento de parte do valor total.

No entanto, esta prática se tornou vedada pela nova redação do art. 100, §8º da Constituição Federal, in verbis:

“Art. 100.(…)

§ 8º É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

Sendo assim, a partir deste novo regramento, o valor da condenação determinaria a adoção de um dos dois regimes possíveis para pagamento de débitos da Fazenda Pública, decorrentes de decisões judiciais: precatório ou requisição de pequeno valor (RPV). Não seria mais possível se valer do pagamento fracionado de um valor de precatório, por meio de requisição de pequeno valor para adiantar parte do pagamento.

A única variação ocorreria no caso de o valor da execução ultrapassar o limite autorizativo da requisição de pequeno valor, e mesmo assim, o pagamento ser processado segundo este regime, mediante a renúncia ao excedente feita pelo credor, conforme prevê o artigo 87, parágrafo único do ADCT.

Afora esta situação particular, o valor previsto na condenação fixaria de forma estanque a utilização do regime a ser seguido na execução contra a Fazenda Pública.

No entanto, a própria Emenda Constitucional 62/2009, estipulou uma exceção a essa regra proibitiva. Cuida-se da hipótese de precatório de natureza alimentar cujos titulares tenham 60 anos de idade ou mais ou sejam portadores de doença grave, definida em lei, os quais possuem a prerrogativa de receber parcela de até o triplo do valor correspondente à requisição de pequeno valor com preferência sobre todos os demais débitos, sendo permitido o fracionamento do precatório para este fim, devendo o restante ser pago na ordem cronológica de apresentação dos precatórios alimentares (artigo 100, §2º, Constituição Federal).

Deste modo, o credor de precatório de natureza alimentícia de mais de 60 anos ou portador de doença grave pode receber o seu crédito de forma fracionada: até o triplo do valor da requisição de pequeno valor recebe imediatamente, com preferência absoluta, e o restante recebe na ordem cronológica dos precatórios alimentares.

No entanto, é forçoso observar que a limitação de valor para o direito de recebimento com prioridade, ou seja, o patamar de até o triplo do valor da requisição de pequeno valor, é aplicado a cada precatório individualmente, e não em conjunto com outros precatórios pertencentes a um mesmo credor. Portanto, o que será considerado para fins de recebimento com absoluta prioridade é o valor individual de cada precatório, ainda que a totalidade de precatórios atribuídos a um mesmo credor supere o limite constitucionalmente previsto. [2]

2. As exceções previstas na jurisprudência atual dos Tribunais Superiores

Como forma de ponderar o rigorismo da regra estampada na Constituição Federal, a jurisprudência dos Tribunais Superiores veio, com o passar do tempo, estabelecendo diversas exceções à vedação constitucional. Sem a intenção de esgotar todas as hipóteses construídas pela jurisprudência, passaremos a explorar alguns dos casos solucionados pelos Tribunais Superiores.

A primeira exceção versa sobre a requisição de pequeno valor em ações plúrimas, também chamado de litisconsórcio ativo, ou litisconsórcio de credores. Este tema gerou bastante controvérsia jurisprudencial e doutrinária. O questionamento girava em torno do parâmetro a ser utilizado na fixação da requisição de pequeno valor, em outros termos, se o valor a ser observado seria o do somatório de todos os litisconsortes ou o individual de cada credor. Conforme a crítica de Regis Fernandes de Oliveira:

O dispositivo constitui-se em limitação ao direito individual. Ora, cada credor tem um montante de seu crédito. O litisconsórcio foi admitido apenas pelo princípio da economia processual. Como o direito é igual e pertencente a diversas pessoas, a lei processual admite que possa haver a união deles em apenas um processo, para obtenção de apenas uma decisão. No entanto, o direito continua sendo individual.

Ora, como aplicar uma proibição, que, de fato, se constitui em sanção, para que não possa ele separar-se do litisconsórcio e exercer sozinho seu direito, ainda que se constitua em crédito de pequeno valor?” (OLIVEIRA, 2013, p. 720)

E assim, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça foram instados a se manifestar a fim de se colocar uma pedra sobre a divergência. A jurisprudência irretoquível do STJ  se sedimentou no sentido de que há de ser considerado o valor pleiteado individualmente, e não o valor total da ação, tanto para fins de pagamento por meio de RPV, como para se aferir a competência pelo valor da causa nos Juizados Especiais Federais, e portanto, se o valor individual a receber for inferior ao valor previsto para requisição de pequeno valor naquela esfera, a execução se processará como requisição de pequeno valor, e não como precatório, muito embora o valor total seja superior ao limite autorizativo do RPV[3]. O STF se manifestou no mesmo sentido, para quem, o contrário poderia servir de desestímulo ao ajuizamento de ações plúrimas, que valorizam os ditames da economia processual[4].

Impende concluir que os julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça se encontram alinhados com o espírito do texto constitucional e com os princípios processuais.

A segunda hipótese a ser explorada é a do fracionamento de precatório quando há incontrovérsia em relação à parcela não embargada. Na execução contra a Fazenda Pública, o Ente Público devedor é citado para opor embargos, podendo alegar algumas matérias, a exemplo de: falta ou nulidade de citação, ilegitimidade de partes, cumulação indevida de execuções, excesso de execução, causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, dentre outras hipóteses.

No que concerne ao excesso de execução ou às causas impeditivas, modificativas ou extintivas da obrigação, é possível que a alegação se limite a uma parcela da obrigação, tornando incontroversa a outra parte.

Havendo parcela incontroversa, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é permitida a expedição de precatório e início da execução[5]. E assim, em sendo incontroversa, haverá a execução imediata da parcela, podendo ser expedida a Requisição de Pequeno Valor, caso essa parte do montante esteja enquadrada no quantum legal do RPV, sendo que o restante (a fração sobre a qual ainda há controvérsia) será executado por meio de precatório após o encerramento do processo e na ordem cronológica, configurando-se, como se nota, mais uma hipótese de fracionamento de precatórios permitida pela jurisprudência, conforme se abstrai do que se segue:

Ementa: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM DO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. EXPEDIÇÃO DE PRECATÓRIO OU REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR (RPV) QUANTO À PARTE INCONTROVERSA DA DÍVIDA. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, PROVIDO. 1. Revela-se improcedente argüição de ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil na hipótese em que o Tribunal de origem tenha adotado fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia, atentando-se aos pontos relevantes e necessários ao deslinde do litígio. 2. Este Superior Tribunal de Justiça entende que, em execução contra a Fazenda Pública, é possível a expedição de Requisitório de Pequeno Valor – RPV e precatório da parte incontroversa, existente na espécie, prosseguindo-se a execução, quanto à parte não embargada, compatibilizando-se, assim, o processo de execução contra a Fazenda previsto no CPC (arts. 730 e ss.) e as determinações do art. 100 da Lei maior. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (grifo nosso) [6]

Execução. Precatório. Duplicidade. Longe fica de conflitar com o art. 100, §4º, da CF enfoque no sentido de ter-se a expedição imediata de precatório relativamente à parte incontroversa do título judicial, dando-se sequência ao processo quanto àquela impugnada por meio de recurso.”[7]

A terceira exceção é o fracionamento para pagamento de honorários advocatícios. Ab initio, convém ressaltar que os honorários advocatícios possuem natureza alimentar. Trata-se de jurisprudência já há muito consagrada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal:

CRÉDITO DE NATUREZA ALIMENTÍCIA – ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A definição contida no § 1-A do artigo 100 da Constituição Federal, de crédito de natureza alimentícia, não é exaustiva. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – NATUREZA – EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. Conforme o disposto nos artigos 22 e 23 da Lei nº 8.906/94, os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem ao advogado, consubstanciando prestação alimentícia cuja satisfação pela Fazenda ocorre via precatório, observada ordem especial restrita aos créditos de natureza alimentícia, ficando afastado o parcelamento previsto no artigo 78 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, presente a Emenda Constitucional nº 30, de 2000. Precedentes: Recurso Extraordinário nº 146.318-0/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 4 de abril de 1997, e Recurso Extraordinário nº 170.220-6/SP, Segunda Turma, por mim relatado, com acórdão publicado no Diário da Justiça de 7 de agosto de 1998.” [8]

Recentemente, tal entendimento fora transformado em súmula vinculante:

"SÚMULA VINCULANTE 47: Os honorários advocatícios incluídos na condenação ou destacados do montante principal devido ao credor consubstanciam verba de natureza alimentar cuja satisfação ocorrerá com a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, observada ordem especial restrita aos créditos dessa natureza”.

Diante do fato de possuírem natureza alimentar, em caso de condenação da Fazenda Pública, o pagamento por meio de precatórios não se submeterá à ordem geral dos precatórios, estando submetida a uma ordem preferencial de débitos de origem judicial, todos de jaez alimentícia, nos termos do art. 100, §1º da Constituição Federal.

Não obstante o pagamento possa se dar por meio de precatório na ordem preferencial, os honorários podem ser pagos por meio de Requisição de Pequeno Valor por fracionamento de precatório antes mesmo de ser pago o valor principal à parte. Trata-se de entendimento compartilhado tanto pelo no Supremo Tribunal Federal[9], como pelo Superior Tribunal de Justiça[10].

No entanto, nem sempre se entendeu dessa forma. Já era pacífico em jurisprudência que os valores acessórios não poderiam ser destacados da condenação principal para o fim de expedição de Requisição de Pequeno Valor. Tal entendimento já foi reiteradamente utilizado pelo STF, como no caso das custas judiciais, ao que se percebe da jurisprudência que segue:

“ (…) é pacífico o entendimento desta Corte, segundo o qual é impossível o fracionamento da execução para requisição de pequeno valor. (…) No presente caso, o acórdão recorrido, ao autorizar o fracionamento da execução para o pagamento de custas mediante RPV, divergiu da orientação firmada por esta Corte, uma vez que a execução das verbas acessórias não é autônoma, devendo ser considerada em conjunto com a condenação principal. (…) Dessarte, a execução das custas processuais não pode ser feita de modo independente, devendo ocorrer em conjunto com a do precatório que diz respeito ao total do crédito. Isso porque o art. 100, §8º, da Constituição, com a redação dada pela EC 62/2009, veda o fracionamento, a repartição ou a quebra do valor da execução, não podendo a liquidação das custas ser feita de forma apartada.” [11]

A Corte Suprema entendia da mesma forma no que tange aos honorários advocatícios, considerando-os como verba acessória, do mesmo modo que as custas processuais, como se pode perceber pelo julgado colacionado abaixo:

“Honorários advocatícios. Expedição de novo precatório. Acessório segue a sorte do principal. Deve-se afastar o fracionamento de precatório para pagamento dos honorários advocatícios de sucumbência quando a execução não for específica de honorários, seguindo, como acessório, a sorte do principal.”[12]

Contudo, este vetusto entendimento fora abandonado tanto pelo Supremo Tribunal Federal, como pelo Superior Tribunal de Justiça, restando totalmente superada a jurisprudência que entendia que a verba honorária não poderia ser executada por meio de RPV, em detrimento da verba principal, quando esta exigisse precatório.

Segundo o Supremo Tribunal Federal, os honorários do advogado podem ser pagos por meio de Requisição de Pequeno Valor, ainda que o valor principal deva ser adimplido por meio de precatório, pelo fato de que a verba honorária é autônoma e insubordinável ao valor principal. A Lei nº 8.906 de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), em seu artigo 23, determina que o advogado tem o direito autônomo de executar os honorários advocatícios previstos na sentença, podendo requerer que o precatório seja expedido em seu favor. Portanto, a legislação deixa clara a autonomia da verba honorária. Para a Corte Suprema, não há que se aplicar obrigatoriamente o mesmo regime à verba honorária e ao valor principal tendo em vista que os valores pertencem a credores distintos e a vedação constitucional ao fracionamento de precatórios para o fim de burlar os ditames constitucionais somente se aplica nas situações em que o crédito pertence a um único titular.

Para o Superior Tribunal de Justiça, o advogado pode executar seus honorários nos próprios autos ou em ação distinta, pois os honorários são um capítulo de mérito, ainda que constante de uma sentença terminativa, portanto, não se trata de acessório. O fracionamento que é vedado é apenas quando pertinente ao mesmo titular, mas nada impede que dois ou mais credores do polo ativo da mesma execução possam receber seus créditos por sistemas distintos, RPV ou precatório, de acordo com o quantum de cada.

Outrossim, cabe o fracionamento de precatório na execução individual decorrente de ação coletiva contra a Fazenda Pública na tutela de direitos individuais homogêneos. Trata-se de mudança de entendimento, pois o Supremo Tribunal já chegou a afirmar que “é possível o fracionamento de execução de sentença para expedição de requisição de pequeno valor, apenas quando se tratar de litisconsórcio facultativo ativo e não de ação coletiva intentada por legitimado extraordinário ou substituto processual”[13]. Todavia, esta jurisprudência fora abandonada, passando-se a entender que caberia o fracionamento neste caso. E recentemente, em recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida[14], o Supremo Tribunal Federal reafirmou este entendimento. Caso o valor correspondente a cada execução individual esteja dentro do limite da Requisição de Pequeno Valor, o crédito poderá ser pago por meio desta modalidade, muito embora o valor total da condenação na ação coletiva contra a Fazenda Pública exija expedição de precatório, porquanto os créditos de cada exequente devem ser considerados individualmente. Segundo o Ministro Relator, Teori Zavascki, nas ações coletivas em que se discuta direitos individuais homogêneos, a sentença de mérito somente analisa “o núcleo de homogeneidade dos direitos controvertidos”, ou seja, os aspectos coincidentes do direito debatido, já a liquidação e respectiva execução poderão ser individuais, de modo a delimitar os créditos de cada um. De acordo com o Ministro, as relações jurídicas entre os credores e a Fazenda Pública são autônomas, do mesmo modo que ocorre no litisconsórcio facultativo.

E por derradeiro, vislumbra-se a hipótese de fracionamento de precatórios para fins de execução de honorários sucumbenciais de forma proporcional à fração de cada um dos substituídos processuais em ação coletiva ajuizada em face da Fazenda Pública. Trata-se de recentíssimo julgado do Supremo Tribunal Federal[15], o qual justificou seu entendimento sob o argumento de que seria contraproducente vincular a execução dos honorários advocatícios ao todo, e não permitir a execução individualizada segundo as frações de cada substituído da ação coletiva, já que isso desmotivaria os advogados a adotarem demandas coletivas, gerando-se o risco de multiplicação de processos, com a redução da eficiência da jurisdição.

Nesta senda, em uma ação coletiva será admitido que os honorários do advogado sejam executados tomando-se por base o valor de cada fração atribuída aos seus clientes. Assim, o advogado poderá fracionar o precatório referente aos seus honorários a fim de que execute por meio de Requisição de Pequeno Valor cada uma das parcelas que compõem sua verba honorária, relativamente às frações devidas a cada um de seus clientes.

Mais uma vez, reforça-se que os honorários advocatícios são um direito autônomo do advogado, e não acessório do valor principal, por isso, permite-se que sejam pagos por meio de Requisição de Pequeno Valor, independentemente da forma de pagamento do valor principal. Ademais, sendo uma ação coletiva em que se busca a defesa de direitos individuais homogêneos, não se pode olvidar que a liquidação e a execução do valor principal também poderão ser individualizadas, garantindo-se aos honorários advocatícios a mesma lógica.

Outras situações peculiares poderão gerar novos debates jurisprudenciais sobre o fracionamento de precatórios, segundo o juízo da razoabilidade, porquanto a vedação constitucional apenas visa evitar a burla ao regime de precatórios e deve ser interpretada em conjunto com outros princípios igualmente importantes, como a economia processual e a celeridade.

Conclusão

Diante de todo o exposto, constata-se que os Tribunais Superiores têm apresentado uma visão menos ortodoxa da vedação constitucional ao fracionamento de precatórios, adotando uma posição mais consentânea com os princípios constitucionais. Motivados pela necessidade de se garantir o pagamento com maior rapidez em algumas circunstâncias que se justificam, passaram, com o tempo, a rever antigos posicionamentos para garantir o pagamento por meio de Requisição de Pequeno Valor, mediante o fracionamento de um precatório.

As Cortes Superiores se afastaram daquele rigorismo injustificável que permeava o tema do fracionamento de precatórios, sendo, então, uma evolução bastante elogiável e adequada ao ditame constitucional da eficiência da jurisdição.

Referências:
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 7 ed. rev e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2014.
LEITE, Harrison Ferreira. Manual de Direito Financeiro. 2 ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2013.
OLIVEIRA, Regis Fernandes. Curso de Direito Financeiro. 5 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
Informações sobre o autor:
Cíntia Laís Corrêa Brosso
Advogada. Graduada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.
Notas
[1] ADI 2868/PI, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, j. 02.06.2004, DJ:12.11.2004.
[2] STJ. RMS 46.155-RO, 1ª Turma. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 22.09.2015.
[3] REsp 1.257.935/PB, 2ª Turma. Rel. Min. Eliana Calmon, j. 18.10.2012, DJe: 29.10.2012.
[4] AgRg no RE 509.814/RS, 1ª Turma. Rel. Min. Marco Aurélio, j. 28.08.2012, DJe: 18.09.2012.
[5] EREsp 638.620/SC, Corte Especial. Rel. Min. Luiz Fux, DJ: 02.10.2006; EREsp 658.542/SC, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ: 26.02.2007.
[6] REsp 1.208.706/RJ, 2ª Turma. Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 17.11.2011, DJ: 28.11.2011.
[7] RE 458.110, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 13.06.2006, DJ: 29.09.2006.
[8] RE 470.407/DF, 1ª Turma. Rel. Min. Marco Aurélio, j. 09.05.2006, DJ:13.10.2006.
[9] RE 564.132/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 30.10.2014, DJe: 09.02.2015.
[10] REsp 1.347.736/RS, 1 ª Seção. Rel. Min. Castro Meira, j. 09.10.2013, DJe: 15.04.2014.
[11] RE 592.619/RS, Pleno. Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 08.09.2010, DJe: 12.11.2010.
[12] RE 527.971- AgR – ED, 2ª Turma. Rel. Min. Cezar Peluso, j. 25.09.2007, DJ: 19.10.2007.
[13] RE 459.506- AgR, 2ª Turma. Rel. Min. Eros Grau, j. 12.06.2007, DJ: 17.08.2007.
[14] ARE 925.754/PR, Rel. Min. Teori Zavascki, repercussão geral reconhecida em 18.12.2015.
[15] RE 919269 AgR/RS, RE 913544 AgR/RS, RE 913568 AgR/RS, 1ª Turma. Rel. Min. Edson Fachin, j. 15.12.2015, Dje: 03.02.2016.

Informações Sobre o Autor

Cíntia Laís Corrêa Brosso

Advogada. Graduada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo


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Equipe Âmbito Jurídico

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