Lei n.º 11.107/05: marco regulatório dos consórcios públicos brasileiros

Sumário: 1. Introdução. 2. Do exame do marco regulatório dos consórcios públicos. 3. Da pessoa jurídica suporte do consórcio público. 4. Do uso do direito comparado na conceituação das associações públicas. 5. Da limitação constitucional dos objetos do consórcio público. 6. Das ações do consórcio público 7. Da natureza contratual do consórcio público. 8. Das principais definições do regime consorcial. 8.1. Do protocolo de intenções. 8.1.1. Da gestão associada de serviços públicos. 8.1.2. Dos trabalhos preparatórios à celebração do protocolo de intenções. 8.2. Do contrato de programa. 8.3. Da assembléia geral. 8.4. Do contrato de rateio. 9. Da unicidade de controle externo dos consórcios públicos. 10. Da presença da União em consórcio público e convênio. 11. Da licitação nos consórcios públicos. 12. Conclusões.

Introdução

A Lei Federal n.º 11.107/05, sancionada em 06/04/05, encerrou uma longa espera, de quase sete anos, protagonizada pelos Poderes Executivos dos três níveis da Federação, que até então se ressentiam pela ausência de regras gerais regulamentadoras do instituto do consórcio público, positivado entre nós, como já se afirmou[1], pela Emenda Constitucional n.º 19/98, de 04/06/1998.

Portanto, a partir de 06/04/05, o ordenamento jurídico brasileiro passou a contar com um marco legal regulatório da gestão associada de entes federativos. Tal inserção normativa bem ilustra a relevância do atual momento histórico de nosso direito administrativo, caracterizado por sua inegável transformação, como a que hodiernamente ocorre no âmbito dos direitos administrativos de vários países europeus, conforme noticiado pelo jurista italiano Sabino Casesse[2].

Tanto lá como aqui, percebe-se nítida tendência de evolução do direito administrativo, que diante da necessidade de se adaptar às novas demandas sociais, que reclamam novas posturas da Administração Pública, busca se atualizar, aparelhando-se com institutos jurídicos modernos e já consagrados pelas nações mais desenvolvidas do planeta, como as parcerias público-privadas e os consórcios públicos, visando à prestação de serviços públicos cada vez mais efetivos, eficazes e eficientes.

Ao final do século XX, na França, começou-se a falar em crise do direito administrativo, motivada, dentre outros fatores, pela “crise da noção de serviço público”[3]. Na Alemanha, desenvolveu-se a idéia de um novo direito administrativo. Entre nós, verifica-se inegável tendência de flexibilização do aludido direito levada a cabo, principalmente, a partir da EC n.º 19/98, instituidora da Reforma do Aparelho Administrativo do Estado. Quer-se com isso evidenciar que nosso direito administrativo está acompanhando as transformações mundiais, trazendo para nosso território e realidade, ferramentas jurídicas mais eficazes à implementação de nossas prementes demandas em termos de prestação de serviços públicos. Nesse sentido, leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro que existe tendência no direito administrativo brasileiro atual de “instauração da chamada Administração Pública Gerencial, que envolve: maior discricionariedade para as autoridades administrativas, substituição do controle formal pelo controle de resultados, autonomia administrativa, financeira e orçamentária…”[4].

Dessa forma, festeja-se o marco regulatório dos consórcios públicos porque vislumbra-se que ele facilitará sobremaneira a implementação de inúmeras políticas públicas nos mais de cinco mil municípios brasileiros, notadamente, nas comunas de pequeno porte e de poucos recursos financeiros. Assim, pensa-se que seja oportuno trazer ao debate sobre a regulação dos consórcios públicos minucioso estudo da norma legal em comento, traçando, quando possível, comparativo com o projeto de lei que a antecedeu, com o fito de melhor entender o espírito da norma recentemente publicada.

Também é importante referir que a aplicação da Lei Federal n.º 11.107/05 ao caso concreto deverá se fundar em consistente hermenêutica jurídica, lastreada na interpretação sistemática do direito, sempre atenta aos “princípios fundamentais do ordenamento”[5] como assevera Juarez Freitas. É que resta definitivamente ultrapassado o tempo em que se via o direito administrativo “como mero conjunto de normas voltadas a regular o exercício da função administrativa”[6]. Hoje, entende-se que este direito é ciência muito mais ampla, contemplando, além das regras de relação da administração, também os valores e princípios fundamentais que servem como segura orientação à atuação administrativa do gestor público.

Por isso, a interpretação sistemática da lei dos consórcios é fundamental ao sucesso dos empreendimentos que serão levados a efeito nessa importante seara. Sem essa espécie de interpretação, acredita-se que pouco se viabilizará em termos de resultados práticos positivos, pois a tendência reducionista dos intérpretes menos atentos poderá transformá-la em um inútil conjunto de vinte e um artigos de lei, levando-a ao descrédito e conseqüente ineficácia.

2. Do regime jurídico consorcial

A primeira impressão que se tem ao se confrontar com o texto da Lei Federal n.º 11.107/05 é de que ela é enxuta, concisa, econômica nas definições, se comparada com o Projeto de Lei n.º 3.884/04 que lhe deu inspiração teleológica.

Com efeito, enquanto o projeto possuía quarenta e cinco (45) artigos, a presente norma regulatória apresenta apenas vinte e um (21). E esse enxugamento normativo ocorreu basicamente pela retirada das conceituações técnicas e de demasiados detalhamentos de procedimentos do regime consorcial.

Por um lado, a preocupação do legislador, em retirar definições do texto legal em exame, reflete a saudável concepção doutrinária de que não cabe à lei conceituar. De fato, esta é uma tarefa precípua da doutrina. Contudo, pensa-se, que em certas circunstâncias, a fim de evitar controvérsias, seja de bom alvitre que o legislador traga ao texto de lei as principais definições e procedimentos acerca de um instituto, objetivando clarear sua aplicação por parte dos operadores do direito.

Muito embora a Lei Consorcial tenha silenciado a respeito de diversas definições que utiliza ao longo de seu texto normativo, entende-se que tal intuito clarificador não foi esquecido pelo legislador, haja vista que o projeto de lei apresenta todas as conceituações tratadas na lei reguladora dos consórcios públicos.

Dessa forma, efetivamente, apresentar-se-ia despicienda qualquer alusão, no texto normativo em comento, das definições que foram realizadas, ainda, no Projeto de Lei. Disso resulta que o intérprete, no caso de dúvidas sobre conceitos e procedimentos atinentes ao regime consorcial, poderá socorrer-se das definições constantes no PL nº 3.884/04.

Exemplificando, o artigo 3º da Lei Federal n.º 11.107/05 determina que “o consórcio público será constituído por contrato cuja celebração dependerá da prévia subscrição de protocolo de intenções”. Contudo, a Lei Consorcial deixou de definir tal protocolo, ainda que tenha expressamente previsto suas cláusulas necessárias[7]. Assim, poder-se-á buscar o referido conceito no art. 2º, inc. III, do Capítulo II – Das Definições –, do PL n.º 3.884/04[8].

Entretanto, imperioso ressaltar que houve supressão de alguns conceitos, em razão de antinomia estabelecida entre os conteúdos do texto legal aprovado e do texto do projeto de lei. Por exemplo, o projeto definia contrato de consórcio público como sendo “ato constitutivo do consórcio público, conferindo-lhe personalidade jurídica de direito público”[9]. Todavia, o novel marco legal regulatório estabelece que o consórcio público constituirá associação pública ou pessoa jurídica de direito privado[10]. Assim, exige-se atenção do intérprete para avaliar a efetiva existência da possibilidade de se socorrer ao PL n.º 3.884/04, pois existem conceitos que devem ser desprezados porque discrepam do texto legal aprovado. Certamente, tal tarefa exigirá acurado exercício de hermenêutica, a fim de se alcançar a perfeita harmonização entre a Lei n.º 11.107/05 e o PL n.º 3.884/04, que carrega em seu bojo importantes definições utilizadas por aquela lei. Em suma, trata-se de possibilidade que o regime consorcial facultou ao intérprete da Lei dos Consórcios.

3. Da pessoa jurídica suporte do consórcio público

Quanto à pessoa jurídica suporte do consórcio público, como já se afirmou acima, a lei em comento estabeleceu duas possibilidades: a primeira, voltada ao direito público, faculta a constituição de consórcio através de associação pública, integrante da administração indireta de todos os entes consorciados; a segunda, remetendo o instituto para o regime privatístico, possibilita constituir um consórcio público através de pessoa jurídica de direito privado[11].

A propósito da segunda possibilidade (pessoa jurídica de direito privado), a Lei n.º 11.107/05 faz expressa previsão, no sentido de submeter tal espécie de consórcio às normas de direito público, quanto às seguintes situações: realização de licitação, celebração de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal, esta última devendo obedecer ao regime celetista[12]. Portanto, criou-se figura híbrida, que atenderá aos preceitos de direito privado para alguns atos da vida civil e preceitos do direito público para as questões acima elencadas.

Nesse passo, pensa-se que o PL n.º 3.884/04 oferecia solução mais efetiva e consentânea ao sistema jurídico posto, na medida em que considerava que todos os consórcios constituiriam pessoa jurídica de direito público[13], pondo fim as atuais divergências doutrinárias e evitando as confusões que poderão advir dessa dupla sujeição de regimes jurídicos. Ademais, cumpre consignar que se o consórcio público é instituído para a realização de serviço público por que, então, se lhe atribuiria personalidade jurídica de direito privado? E pior, sujeita ao regime de direito público para algumas situações definidas legalmente?

Talvez o legislador tenha intencionado conferir maior grau de liberdade às ações do consórcio que não estiverem afetas às normas de direito público.

De toda sorte, se os entes interessados em se consorciar optarem por criar uma pessoa jurídica de direito privado, verifica-se, à luz do Código Civil (CC) que o consórcio pode, em tese, ser constituído sob a espécie de associação civil ou fundação, consoante dispõem os artigos 15[14] e 4º, inc. IV[15], da Lei N.º 11.107/05.

É que o CC estabelece as espécies de pessoas jurídicas de direito privado do ordenamento pátrio que, nos termos de seu artigo 44, poderão ser: fundações, sociedades e associações. As primeiras deverão observar finalidades religiosas, morais, culturais ou de assistência (art. 62, Parágrafo único, do CC)[16]. Assim, por força do conceito de serviço público adotado neste trabalho[17], como se verá em item próprio, entende-se que a constituição de consórcio público, sob a forma de fundação, restringir-se-ia às finalidades culturais e de assistência.

Por seu turno, as sociedades têm por finalidade última a realização de atividade econômica com conseqüente partilha dos resultados, ou seja, vislumbram fins econômicos (art. 981 do CC)[18], o que as exclui da possibilidade de albergarem um consórcio, uma vez que a este é expressamente vedado o fim econômico[19].

Por fim, existem as associações civis (art. 53 do CC)[20], cuja finalidade precípua é justamente a realização de atividades sem fins econômicos, amoldando-se perfeitamente à condicionante estabelecida na Lei Consorcial[21].

Contudo, a Lei Federal n.º 11.107/05 estipula que “no que não contrariar esta Lei, a organização e funcionamento dos consórcios públicos serão disciplinados pela legislação que rege as associações civis”[22], parecendo, assim, excluir a possibilidade de se instituir consórcios públicos através de fundações.

Diante disso, conclui-se que o consórcio público se respaldará, em termos de existência no mundo jurídico, ou sob a forma de uma associação pública, constituindo pessoa de direito público interno e sujeitando-se integralmente às normas de direito público ou será associação civil, integrando o rol das pessoas de direito privado e, neste caso, ressalta-se, sujeita à observância dos dois regimes (público e privado).

A toda evidência, o hibridismo adotado pela lei não se harmoniza com a sistematização jurídica vigente, pois a tarefa precípua do legislador é a de criar e disciplinar novos institutos, de forma harmonizada ao sistema jurídico posto, pena de criar indissolúveis problemas de hermenêutica, inviabilizando, em certos casos, a aplicação efetiva da novel legislação.

Ademais, ainda que se possa argumentar que as transformações do direito administrativo, ocorridas nas últimas décadas em nosso país, indiquem crescente interpenetração entre os direitos público e privado, mitigando, cada vez mais, a clássica dicotomia direito público-direito privado na doutrina pátria, entende-se, que na situação em exame, a criação de figura híbrida, distoante do sistema normativo vigente, não se mostra suficientemente relevante a ponto de justificar a excepcionalidade da medida. Um ordenamento jurídico eficaz pressupõe elevado nível de sistematização.

Portanto, nesse tocante, a Lei dos Consórcios deixou de resolver um dos cruciais problemas verificados no período em que inexistia regramento sobre o assunto (04 de junho de 1998[23] a 06 de abril de 2005), no qual, por absoluta falta de orientação normativa, foram criados milhares de consórcios em todo o território nacional que albergaram, de forma absolutamente desordenada, uma das seguintes situações: consórcio sem personalidade jurídica, com personalidade jurídica de direito privado ou com personalidade jurídica de direito público[24].

Por fim, considerando que praticamente todas as atividades relevantes do consórcio, constituído sob a personalidade de direito privado, serão disciplinadas por normas de direito público (contratação para aquisição de produtos, serviços, obras de engenharia, pessoal e prestação de contas) não se verifica vantagem em instituí-la como pessoa jurídica de direito privado. Pelo contrário, criam-se outros problemas, como por exemplo, o fato de a norma em comento definir uma figura jurídica através da criação de outra (associação pública) até então inexistente em nosso ordenamento jurídico, como demonstra a nova redação do inciso IV do art. 41 da Lei n.º 10.406/02 (Código Civil) procedida pelo disposto no art. 16 da Lei n.º 11.107/05. Assim, pergunta-se, o que são associações públicas?

4. Do uso do Direito Comparado na conceituação das Associações Públicas.

Buscando resposta a tal indagação, tendo-se em vista inexistência de doutrina a respeito do recém positivado instituto, encontrou-se uma opção de resposta no direito comparado, através de interessante parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República de Portugal, de n.º PGRP00002340[25], que as define, naquele ordenamento jurídico, como sendo “pessoas colectivas de direito público, de natureza associativa, criadas como tal por acto do poder público, integradas na Administração Autónoma e, em princípio, sujeitas a tutela estadual”.

Muito embora o conceito acima descrito nos possibilite delinear uma idéia acerca do que seja uma associação pública, percebe-se na aludida definição a existência de elementos jurídicos alienígenas ao nosso ordenamento pátrio, o que indica necessidade da doutrina brasileira desenvolver estudos urgentes a fim de conceituar o que seja, entre nós, uma associação pública, definindo-lhe as características, visando à plena compreensão e conseqüente aplicação da nova figura entre nós.

Ademais, nesse propósito, espera-se que não se repita o erro cometido no debate acerca da personalidade jurídica das fundações privadas instituídas e mantidas pelo Poder Público[26], em que, diante da insuficiência doutrinária sobre o assunto, a jurisprudência acabou por consagrar o equivocado entendimento de que dita forma fundacional era considerada uma espécie do gênero autarquia, o que mereceu brilhante crítica de Hely Lopes Meirelles, no sentido de o renomado jurista não conseguir entender “como uma entidade (fundação) possa ser espécie de outra (autarquia), sem se confundirem nos seus conceitos”[27].

Faz-se esta consideração porque a figura da associação pública foi posicionada geograficamente no Código Civil no inciso IV do art. 41[28], que trata da autarquia, o que poderá ensejar entendimentos de que as espécies se equivalem juridicamente, o que se apresentaria, a toda evidência, como outro inaceitável equívoco hermenêutico, a exemplo do que aconteceu com as fundações privadas mantidas e instituídas pelo Poder Público, como acima colocado.

5. Da limitação constitucional dos objetos do consórcio público.

A lei reguladora é clara: dispõe sobre normas gerais para contratação de consórcios públicos visando à realização de “objetivos de interesse comum”[29], acentuando que ditos objetivos serão “determinados pelos entes de Federação que se consorciarem, observados os limites constitucionais”[30]. De se perceber que o legislador optou por abandonar o rol exaustivo dos treze objetivos elencados no art. 3º do PL n.º 3.884/04[31], para se fixar em conceito aberto, limitado apenas pelos preceitos constitucionais pertinentes à matéria.

Assim, importa fazer remissão ao art. 241 da Constituição Federal a fim de se conhecer os limites balizadores dentro dos quais poderão ser implementadas ações através de consórcio público.

O referido artigo constitucional[32] traz em seu núcleo a idéia de atribuir aos consórcios públicos a “gestão associada de serviços públicos”. Portanto, depreende-se que a Carta Política foi expressa ao restringir a utilização do consórcio público à esfera dos serviços públicos. Vale dizer, toda atividade que puder ser enquadrada dentro do conceito de serviço público, será suscetível de ser viabilizada de forma consorciada.

Mas o que é serviço público? A doutrina oferece diversas conceituações sobre o que seja dita expressão. Assim, passa-se ao exame de algumas delas, com o fito de apresentar breve evolução a respeito do assunto entre nós.

Inicia-se com o ensino de Hely Lopes Meirelles, que faz alusão ao conceito de serviço público como sendo “todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado”[33].

Por sua vez, Celso Antônio Bandeira de Mello, define serviço público como sendo “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material, destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo”[34].

Na lição de Odete Medauar, serviço público “diz respeito a atividade realizada no âmbito das atribuições da Administração, inserida no Executivo. E refere-se à atividade prestacional, em que o poder público propicia algo necessário à vida coletiva, como por exemplo: água, energia elétrica, transporte urbano. As atividades-meio, por exemplo: arrecadação de tributos, serviços de arquivo, limpeza de repartições, não se incluem na acepção técnica de serviço público”[35].

Na lúcida visão de José Cretella Júnior, serviço público é “toda atividade que o Estado exerce para cumprir seus fins”[36], acentuando a característica de prestação estatal.

Por sua vez, Maria Sylvia Zanella Di Pietro considera serviço público “toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”[37].

Atento à evolução dos conceitos, que passam a contemplar, também, os princípios fundamentais, Juarez Freitas define serviço público como sendo o “conjunto de atividades essenciais, assim consideradas pelo ordenamento jurídico, prestadas diretamente pelo Poder Público ou mediante delegação executória “lato sensu”, tendo em vista atender ao interesse geral e sob regência dos princípios constitucionais de Direito Administrativo”[38].

Não obstante as variações existentes, note-se que dos conceitos acima mencionados, pode-se destacar uma idéia nuclear comum a todos: prestação estatal que vise à satisfação de necessidades coletivas. Esta idéia parece ser, portanto, o pressuposto a ser observado na instituição de serviços públicos através de consórcios. Existente no caso concreto uma prestação estatal que vise à satisfação de quaisquer necessidades coletivas, estar-se-á diante de um típico serviço público, podendo, portanto, ser gerido de forma associada.

Esta conclusão permite inferir uma série de possibilidades práticas como, por exemplo, a criação de consórcios públicos para prestação de serviços nas áreas da saúde (hospitais intermunicipais)[39], educação pré-escolar e de ensino fundamental (escolas intermunicipais)[40], saneamento (usinas intermunicipais de tratamento e reciclagem de resíduos urbanos, estações intermunicipais de tratamento de água e esgoto etc), transportes coletivos (concessão de serviços de transportes coletivos prestados em nível intermunicipal)[41], fornecimento de energia elétrica (intermunicipalização da concessão do serviço de fornecimento de energia elétrica), iluminação pública (intermunicipalização do serviço de iluminação pública)[42], entre outros tantos possíveis.

E pensa-se que estas possibilidades bem ilustram a grande força realizadora desse novel instituto, desde que sejam elaboradas de forma séria, planejada (em conformidade com as normas positivadas em nosso sistema jurídico) e, sobretudo, comprometida com os legítimos anseios das comunidades beneficiárias. Nesse aspecto, portanto, é de extrema relevância que os gestores públicos, interessados na implantação de consórcio em seu município, sejam motivados por razões de Estado e não só de governo. Ações de Estado trazem efetivos e perenes benefícios à sociedade brasileira, o que já não ocorre necessariamente com as ações de governo, limitadas temporalmente pelo decurso do mandato eletivo dos agentes políticos e muitas vezes, conduzidas com propósitos meramente eleitoreiros, dissonantes das legítimas finalidades da Administração Pública.

A título de exemplo do montante do prejuízo que ações de governo mal conduzidas podem resultar, cita-se levantamento feito recentemente pelo Tribunal de Contas da União, cujos resultados, impressionantes pelas cifras envolvidas, foram veiculados pela imprensa escrita. O estudo foi encomendado pela Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara Federal, visando a subsidiar estudos relativos a alterações na elaboração do orçamento. De acordo com o trabalho realizado, existem, na atualidade, no Brasil, três mil (3.000) obras paradas, em razão de “descaso, falta de compromisso das bancadas, irregularidades e escassez de investimentos públicos”[43], gerando prejuízo de R$ 15 bilhões aos cofres públicos, valor correspondente ao dobro do que o governo investe em infra-estrutura por ano.

Uma das causas levantadas, a escassez de investimentos, pode ser atacada eficazmente através do consorciamento de entes federativos, que propiciará o somatório dos recursos de cada ente consorciado, destinados à realização de determinada prestação de serviços comum a todos. Assim, se os municípios A e B não dispunham, individualmente, de recursos para a construção de um hospital local em cada município, juntos, os recursos somados poderão propiciar a construção da aludida obra, viabilizando o incremento da prestação do serviço de saúde em ambos os municípios consorciados.

6. Das ações do consórcio público

Para o atingimento de seus objetivos, o consórcio público poderá: I – firmar convênios, contratos, acordos de qualquer natureza, receber auxílios, contribuições e subvenções sociais ou econômicas de outras entidades e órgãos do governo; II – promover desapropriações e instituir servidões, nos termos de declaração de utilidade ou necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo Poder Público, desde que criado sob a forma de associação pública; III – ser contratado pela administração direta ou indireta dos entes federativos consorciados, dispensada a licitação[44].

E aqui, no campo das ações do consórcio, quer-se destacar a possibilidade de a figura consorcial poder ser contratada pelos entes federativos consorciados, visando à prestação de determinado serviço público, sem a necessidade de sujeição a certame licitatório. E nesse aspecto, ressalta-se que a lei não fez diferença entre o consórcio pessoa jurídica de direito privado (associação civil) e o constituído sob pessoa jurídica de direito público (associação pública).

Aspecto relevante surge dessa faculdade de dispensa licitatória. Se por um lado, agiliza a contratação de serviços por parte dos entes consorciados, por outro, redunda na inobservância do princípio da seleção da proposta mais vantajosa para a administração[45], estabelecido pelo Diploma das Licitações. Daí, torna-se concreta a possibilidade de se criar serviços públicos consorciados que desrespeitem padrões mínimos aceitáveis e, ainda assim, sejam contratados em razão do permissivo legal em comento.

Portanto, trata-se de uma previsão legal que poderá propiciar o desserviço público. Exemplificando: municípios poderiam se consorciar para criar um hospital intermunicipal para atender aos munícipes dos entes consorciados. Contudo, sabedores da desnecessidade de submissão a certame licitatório para contratação de seus serviços, descuidam (culposa ou dolosamente) dos requisitos de qualidade indispensáveis à aludida prestação de serviços, vindo a oferecer qualidade pífia de atendimento dos usuários do referido nosocômio.

Pensa-se que a solução para o problema aventado esteja no controle dos atos administrativos de criação do consórcio público. Além de os entes federativos interessados preverem, no protocolo de intenções, mecanismos de controle social[46], através da previsão de audiências públicas periódicas (na fase de planejamento do consórcio) e ouvidorias (na fase de execução dos serviços de gestão associada), ofertando a todo interessado oportunidade para conhecer e debater sobre a forma como se dará a prestação de serviço, bem como para avaliar a qualidade dos serviços prestados, também será imprescindível que as demais formas de controle (interno, externo e judicial), alarguem seu procedimentos fiscalizatórios para além da verificação da estrita legalidade, passando a considerar, de forma contundente, os demais princípios norteadores das atividades da Administração Pública, com atenção especial ao princípio da eficiência. Assim, se os serviços prestados, muito embora, de acordo com os aspectos formais da lei, não estiverem de acordo com os índices mínimos estabelecidos para aferição da qualidade ofertada aos seus usuários, o gestor do consórcio será penalizado por inobservância dos referidos princípios constitucionais.

7. Da natureza contratual do consórcio público

Nesse momento, vale tecer algumas considerações relevantes sobre a natureza jurídica do consórcio público. O artigo 3º da Lei Consorcial define expressamente que “o consórcio será constituído por contrato”. Assim, indubitável a sua natureza contratual. Significa dizer que o instituto é um negócio jurídico. Portanto, quando se fala de consórcio, na verdade, estar-se-á comentando acerca de um instrumento contratual celebrado entre entes federativos.

Esta assertiva se confirma quando se estuda a semelhança do consórcio público com o consórcio de empresas existentes no direito privado, nos termos do art. 278[47] da Lei Federal n.º 6.404/74 – Lei das Sociedades Anônimas –. De se perceber que no âmbito privado, o consórcio nada mais é do que um acordo estabelecido entre empresas, visando ao atingimento de um objetivo comum que, individualmente, nenhuma das consorciadas teria condição de realizar. Por isso, por se tratar de um negócio jurídico, o consórcio não possui personalidade jurídica, que é própria dos sujeitos de direito e obrigações e não dos negócios jurídicos.

Assim, tomando em conta as características do consórcio privado, percebe-se que o legislador manteve-se fiel às características do instituto ao adaptá-lo às exigências do direito administrativo, o que, além de facilitar a compreensão da Lei Consorcial, em seus fundamentos e diretrizes axiológicas, reflete, também, sua preocupação, que merece elogios, em criar um novo instituto no ordenamento jurídico pátrio sem se descuidar da necessária observância da sistematização existente.

Ademais, importa destacar que a opção pela criação de contratos de consórcios públicos demonstra, como já mencionado por ocasião do exame do projeto de lei que antecedeu a lei em apreciação[48], importante transformação de nosso direito administrativo, que flexibilizando-se, busca formas privatísticas para solucionar as novas demandas sociais que lhe incumbe atender de forma eficaz.

8. Das principais definições do Regime Consorcial

A norma em comento aborda várias definições importantes para o entendimento e consolidação do regime consorcial brasileiro. Assim, considerando a importância de se estabelecer um acordo semântico acerca das expressões trazidas pela Lei Federal n.º 11.107/05, passa-se a estudar as principais conceituações, sem as quais não se pode entender o fenômeno consorcial público em toda a sua real dimensão.

8.1. Do protocolo de intenções

O art. 4º da Lei n.º 11.107/05 estabelece as cláusulas necessárias do protocolo de intenções, cuja definição poderá ser encontrada através de remissão ao Projeto de Lei n.º 3.884/04, face ao silêncio da norma reguladora nesse tocante.

Assim, antes de se abordar as aludidas cláusulas, convém relembrar que o PL n.º 3.884/04 define a figura do protocolo de intenções, como sendo o “contrato preliminar que, ratificado mediante lei pelos entes da Federação interessados, converte-se em contrato de consórcio público”[49]. Portanto, como já referido por ocasião do estudo do aludido projeto de lei, a celebração de protocolo de intenções “é o primeiro passo a ser dado aos entes interessados em criar um consórcio público, que deverá ser publicado na imprensa oficial dos signatários[50][51].

Vale dizer: os entes interessados em estabelecer um consórcio deverão, antes de mais nada, celebrar um protocolo de intenções com todos os entes interessados no consorciamento e publicá-lo em sua imprensa oficial. Trata-se, portanto, de ato administrativo complexo, cuja eficácia apenas se dará depois de sua publicação na imprensa oficial do signatário.

As referidas cláusulas necessárias deverão contemplar as matérias elencadas nos incisos do artigo 4º do Diploma Consorcial, valendo destacá-las:

a) denominação, a finalidade , o prazo de duração, bem como a sede do consórcio;

b) identificação dos entes federativos consorciados;

c) indicação da área de atuação do consórcio;

d) previsão de que o consórcio será associação pública ou pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos;

e) os critérios para o consórcio poder representar os interesses comuns dos entes consorciados perante outras esferas de governo;

f) as normas de convocação e funcionamento da assembléia geral, inclusive para elaboração, aprovação e modificação dos estatutos do consórcio público;

g) a previsão de que a assembléia geral é a instância máxima do consórcio público e o número de votos para as suas deliberações;

h) a forma de eleição e a duração do mandato do representante legal do consórcio público que obrigatoriamente deverá ser chefe do poder executivo de ente da federação consorciado;

i) o número, as formas de provimento e a remuneração dos empregados públicos, bem como os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;

j) as condições para que o consórcio público celebre contrato de gestão ou termo de parceria;

k) autorização para a gestão associada de serviços públicos; e

l) o direito de qualquer dos contratantes, quando adimplente com suas obrigações, de exigir o pleno cumprimento das cláusulas do contrato de consórcio público.

8.1.1. Da gestão associada de serviços públicos

Em se tratando de consórcio público, pode-se afirmar que a gestão associada de serviços públicos é a idéia nuclear do instituto, sem a qual não seria possível instituir ditos consorciamentos. Assim, andou bem a legislação ao estabelecer os requisitos essenciais de uma gestão associada de serviços públicos, pois dessa forma, regulamentou a criação dos consórcios, amarrando os seus requisitos essenciais. E o fez de forma simples e eficaz, como se verá a seguir.

Assim, a eficácia de um protocolo de intenções dependerá da inclusão de cláusulas que esclareçam os cinco requisitos seguintes:

a) as competências cujo exercício se transferiu ao consórcio público;

b) os serviços públicos objeto da gestão associada e a área em que serão prestados;

c) a autorização para licitar ou outorgar concessão, permissão ou autorização da prestação dos serviços;

d) as condições a que deve obedecer o contrato de programa, no caso de a gestão associada envolver também a prestação de serviços por órgão ou entidade de um dos entes da Federação consorciados;

e) os critérios técnicos para cálculo do valor das tarifas e de outros preços públicos, bem como para seu reajuste ou revisão.

Verifica-se que o legislador foi pontual, exigindo que o protocolo contenha definições essenciais, que possam caracterizar, de forma clara e objetiva, um consórcio público.

Sem dúvida, há necessidade de se enunciar no protocolo quais as competências que os entes federados transferirão ao consórcio, as quais, uma vez postuladas no acordo protocolar, delimitarão legalmente a atuação consorciada. Nenhuma ação consorcial poderá ser implementada se não estiver enquadrada dentro das competências outorgadas no referido protocolo.

Retomando o exemplo dos municípios A e B que resolvem instituir consórcio público para prestação de serviços nas áreas da saúde. Constituem uma comissão de estudos, utilizando servidores de ambos os municípios envolvidos, que realizando sumário e superficial estudo da situação da saúde nos municípios envolvidos, concluem pela necessidade de se criar um hospital intermunicipal que possa atender aos munícipes de ambas as comunas.

Assim, o protocolo de intenções é redigido e ratificado por lei, em cada município, prevendo a outorga, tão-somente, do exercício da competência dos entes envolvidos para a construção e administração do aludido hospital.

Todavia, uma vez instituído o consórcio público, já na fase de construção do hospital, se identifica outra necessidade que passou despercebida pela comissão de estudos: a criação de 15 postos de saúde espalhados pelos dois municípios consorciandos. Contudo, nada poderá ser feito, nesse sentido, pelo consórcio público criado porque o mesmo não terá competência para a criação dos ditos postos de saúde. Assim, a gestão associada em comento já nascerá defeituosa, por absoluta falta de adequado planejamento. Quer-se mostrar que a fase de planejamento é fundamental ao sucesso de uma gestão associada, demandando muita atenção dos gestores públicos.

Isso demonstra que a instituição de um consórcio deverá, necessariamente, ser precedida de aprofundados estudos e projetos detalhados que contemplem, de modo efetivo, todas as necessidades dos futuros entes consorciados que serão atendidas pelo consórcio a ser criado, pois são as necessidades de gestão associada de cada ente federativo que ditarão as competências a serem outorgadas aos consórcios. Assim, a falta de preocupação em delimitar as competências, ainda no protocolo de intenções, poderá redundar em sérios prejuízos aos entes consorciados e na ineficácia do consórcio estabelecido.

E nesse ponto, importa repetir, por relevante, que os consórcios públicos são contratos que devem decorrer de uma conjugação de ações de Estado (perenes) e não de ações de governo (transitórias). Os interesses pessoais dos chefe dos Poderes Executivos, de cunho meramente político, dissonantes da vontade real de implementar políticas públicas, não encontram guarida neste novel instituto porque o seu planejamento, instituição e operacionalização demandarão considerável parcela de tempo, não sendo absurdo considerar que em certos casos, as atividades – de planejamento, criação e operacionalização de consórcio – iniciem em um mandato e terminem no seguinte.

8.1.2. Dos trabalhos preparatórios à celebração do protocolo de intenções

De se ver, por exemplo, que todos os trabalhos preparatórios serão realizados mediante consenso de uma equipe formada pelos chefes dos entes federativos e seus respectivos assessoramentos. E é sabido que o trabalho em conjunto requer a conciliação de agendas, de seleção de locais para as reuniões, bem como a alocação prévia de recursos humanos e materiais de toda ordem, que viabilizem encontros preparatórios efetivamente produtivos. Portanto, as palavras de ordem, nesta importante fase, serão planejamento e coordenação. Indiscutivelmente, será necessário que os trabalhos sejam conduzidos de forma a que se chegue a um consenso, ao final de determinado período, que possa ser o ponto de partida para a elaboração de um eficaz protocolo de intenções.

Na falta de pessoal efetivamente especializado, no âmbito dos servidores dos municípios envolvidos, sugere-se a contratação de empresas de consultoria em gestão, que utilizando adequados e modernos processos de gerenciamento de projetos, poderão identificar eficazmente as necessidades dos entes consorciandos, conduzindo as reuniões de forma planejada e objetiva com o fito de delimitar, com precisão, mediante aplicação de metodologia especializada, todas as competências, cujos exercícios deverão ser outorgados ao futuro consórcio público por ocasião da celebração do protocolo de intenções.

Outro aspecto que bem ilustra o alto nível de planejamento exigido na implementação de gestão associada de serviços públicos está na exigência legal[52] da necessária previsão orçamentária para fazer frente aos gastos com um consórcio público, cuja inobservância constitui motivo de suspensão e, até mesmo, de exclusão do ente consorciado da aludida gestão associada.

Aliás, nesse sentido, cumpre ressaltar que a partir da publicação da lei em comento, passou a configurar ato de improbidade administrativa, previsto no inciso XV do art. 10 da Lei 8.429/92, “celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei”, cuja pena a ser imposta ao agente público responsável, independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, consistirá em “ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito) anos, pagamento de multa civil de até 2 (duas) vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos”[53]. Então, cabe aos chefes de Poder Executivo interessados agir com toda cautela ao implementar um consórcio público, exigindo de seu assessoramento a realização de estudos e pareceres detalhados, a fim de evitar o cometimento de indesejáveis falhas que possam configurar atos de improbidade administrativa em sua gestão.

Outro requisito indispensável do protocolo de intenções, referente à gestão associada de serviços públicos, a merecer referência neste trabalho, é a descrição das condições do contrato de programa, quando a gestão associada envolver a prestação de serviços por órgão ou entidade de um dos entes da Federação consorciados.

8.2. Do contrato de programa

Outra figura importante do regime jurídico consorcial é o contrato de programa. A finalidade desse instrumento é extraída do caput do artigo 13 da Lei dos Consórcios, cujo teor estabelece que “as obrigações que um ente da Federação constituir para com outro ente da Federação ou para com consórcio público no âmbito de gestão associada em que haja a prestação de serviços públicos ou a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade dos serviços transferidos” deverão ser constituídas e reguladas através do aludido acordo. Nesse tocante, percebe-se que a Lei Federal n.º 11.107/05 também manteve-se fiel às diretrizes delineadas no PL n.º 3.884/04[54].

Note-se que as obrigações reguladas pelo contrato de programa são obrigações de cunho operacional, ligadas a encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à implementação dos objetivos do consórcio firmado, diferentemente das obrigações financeiras que são estabelecidas por meio do contrato de rateio a ser abordado no tópico seguinte.

O contrato de programa deverá atender à legislação de concessões e permissões de serviços públicos, em especial, a que normatiza o cálculo de tarifas e de outros preços públicos, bem como a regulação dos serviços a serem prestados. Além disso, dito instrumento deverá “prever procedimentos que garantam a transparência da gestão econômica e financeira de cada serviço em relação a cada um de seus titulares” [55].

Ainda, a norma em comento determina que, no caso de a gestão associada originar a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos, o contrato de programa deverá conter cláusulas necessárias, sob pena de nulidade, que estabeleçam:

“I – os encargos transferidos e a responsabilidade subsidiária da entidade que os transferiu;

II – as penalidades no caso de inadimplência em relação aos encargos transferidos;

III – o momento de transferência dos serviços e os deveres relativos a sua continuidade;

IV – a indicação de quem arcará com o ônus e os passivos do pessoal transferido;

V – a identificação dos bens que terão apenas a sua gestão e administração transferidas e o preço dos que sejam efetivamente alienados ao contratado;

VI – o procedimento para o levantamento, cadastro e avaliação dos bens reversíveis que vierem a ser amortizados mediante receitas de tarifas ou outras emergentes da prestação dos serviços.”[56]

Se houver previsão no “contrato de consórcio público, ou de convênio de cooperação, o contrato de programa poderá ser celebrado por entidades de direito público ou privado que integrem a administração indireta de qualquer dos entes da Federação consorciados ou conveniados”[57], devendo-se atentar para a sua automática extinção no caso de o contratado deixar de integrar a administração indireta do ente da Federação que autorizou a gestão associada de serviços públicos[58]. Vale dizer: um consórcio firmado entre os municípios A e B pode celebrar contrato de programa com uma autarquia de um dos municípios a fim de que tal entidade tenha participação parcial ou total na prestação de serviços da gestão associada.

Outro detalhe importante sobre o contrato de programa é que ele “continuará vigente mesmo quando extinto o consórcio público ou o convênio de cooperação que autorizou a gestão associada de serviços públicos”[59]. Esta previsão legal revela preocupação do legislador em sanar lacuna observada no exame do PL. nº 3.884/04[60], no que tange aos efeitos do caráter acessório do contrato de programa em relação ao contrato principal de consórcio público, pois agora, ainda que o contrato de consórcio seja extinto, o contrato de programa celebrado continuará surtindo efeitos no plano jurídico. A despeito da louvável intenção de corrigir insuficência normativa do projeto de lei, importa registrar que a solução adotada viola o princípio basilar da teoria geral das obrigações que estabelece que as obrigações acessórias seguem o destino da principal.

Ademais, a Lei Federal n.º 11.107/05 disciplinou a nulidade da cláusula que atribuir ao contratado o exercício dos poderes de planejamento, regulação e fiscalização dos serviços por ele próprio prestados[61], evidenciando a indelegabilidade de ditas atribuições consorciais.

8.3. Da assembléia geral

A Lei dos Consórcios explicita que a assembléia geral será sua “instância máxima”[62]. Contudo, é o PL n.º 3.884/04 que estabeleceu que sua composição será exclusivamente constituída pelos Chefes do Poder Executivo dos entes consorciados[63], que deverá, dentre outras tarefas, elaborar, aprovar e modificar o estatuto que disciplinará as atividades do consórcio[64]. Outra atribuição sugerida pelo projeto de lei seria a apreciação e aprovação das propostas orçamentárias[65], que muito embora não tenha sido incorporada ao ordenamento jurídico, portanto, não sendo obrigatória, apresenta-se como adequada orientação de conduta aos entes consorciados.

Vale ressaltar que “a alteração ou a extinção de consórcio público dependerá de instrumento aprovado em assembléia geral” [66], o qual deverá ser ratificado mediante lei por todos os entes consorciados.

No caso de extinção do consórcio, até que haja decisão indicando os entes responsáveis por cada obrigação remanescente, todos os consorciados serão solidariamente responsáveis pelas mesmas, garantido, evidentemente, o superveniente direito de regresso em face de quem se beneficiou ou deu causa à obrigação[67].

Da mesma forma, sendo instância máxima, a retirada de ente consorciado da gestão associada de serviços públicos dependerá de formalização de tal intenção, por parte do representante legal do ente retirante, em assembléia geral, respeitados os requisitos previamente estabelecidos em lei[68].

8.4. Do contrato de rateio

Pelo que se depreende da leitura da Lei Federal n.º 11.107/05, esta espécie contratual também não sofreu qualquer alteração quanto à definição estabelecida no projeto de lei. Assim, dito instrumento pode continuar sendo definido como “contrato por meio do qual os entes da Federação consorciados comprometem-se a fornecer recursos para a realização de despesas do consórcio público”[69]. E existe expressa previsão de que esta modalidade de financiamento se constitui na única forma possível de repasse de recursos dos entes federativos ao consórcio público[70] que integram.

O legislador também houve por bem referir explicitamente a vedação da aplicação dos recursos transferidos ao consórcio no atendimento de despesas genéricas, aí incluídas as transferências e operações de crédito[71]. Pretendeu, certamente com tal medida, impedir que o instituto consorcial se transforme em forma indevida de desvio de verbas públicas, merecendo elogio pela prudência verificada. Assim, os recursos advindos dos entes consorciados deverão, por força de lei, ser efetivamente empregados nas atividades que guardem relação com a finalidade do consórcio criado, discriminadas especificamente nos controles financeiro e contábil do consórcio.

Contudo, houve algumas modificações quanto às suas características concebidas no PL n.º 3.884/04, valendo destacar que a lei editada não ratificou o entendimento expresso no projeto de lei de que tal contrato seria regido pelas normas do direito privado. E pensa-se que novamente andou bem o legislador nesse aspecto, pois além de o próprio objeto do contrato ser prestação de serviço público, os sujeitos envolvidos são pessoas de direito público interno, portanto, não existindo razão para que o dito contrato obedecesse aos princípios e normas do direito privado.

Portanto, o ente federativo que desejar firmar contrato de rateio, deverá obedecer aos princípios regentes da Administração Pública, em especial o da legalidade. Quer-se com isso concluir que a firmatura de contrato de rateio por parte de um ente federativo deverá ser precedida da indispensável autorização legislativa, consubstanciada na necessária previsão de dotação na lei orçamentária respectiva (para a celebração do contrato de rateio no exercício seguinte) ou de lei que abra créditos especiais (para a celebração de contrato de rateio dentro do mesmo exercício)[72].

Com relação aos requisitos formais atinentes à sua celebração, a Lei Consorcial silenciou a respeito, diferentemente do projeto que a antecedeu, que previa que dito instrumento seria formalizado a partir da aprovação e publicação da proposta ou reformulação orçamentária[73] do consórcio público. Portanto, agora, no plano legal, inexiste requisito temporal determinado para a celebração do contrato de rateio. Contudo, o momento indicado pelo PL n.º 3.884/04, a toda evidência, apresenta-se de todo adequado, tendo-se em vista que somente após a publicação da proposta orçamentária do consórcio é que se terá um parâmetro quantitativo do custeio da instituição e/ou manutenção do consórcio público a ser rateado entre os entes consorciados.

Além disso, confirmando a concepção idealizada no projeto de lei, a Lei Consorcial explicitou que “o contrato de rateio será formalizado em cada exercício financeiro e seu prazo de vigência não será superior ao das dotações que o suportam”[74], ressalvados os contratos que tenham por objeto exclusivo programa ou ação contemplada em plano plurianual ou gestão associada de serviços públicos custeados por tarifas ou preços públicos. XXX

Outra diferença em relação ao PL n.º 3.884/04 é que o Marco Regulatório dos Consórcios Públicos não ratificou a faculdade legal prevista inicialmente[75], que garantia ao ente contratante, na superveniência de dificuldades financeiras, o direito a diminuir o valor dos pagamentos previstos no contrato de rateio. E também se elogia esta supressão porque dita faculdade, que aparecia no texto do projeto como uma exceção, provavelmente, se transformaria em regra, se fosse convalidada pela norma regulatória, tendo-se em vista a cultura da falta de planejamento que ainda grassa entre nós. Como conseqüência, os consórcios acabariam por se tornarem inviáveis, sob o ponto de vista financeiro, pela falta de comprometimento por parte dos consorciados. Assim, diante da inexistência de previsão legal autorizadora de diminuição do valor da cota de rateio, o ente federativo efetivamente se empenhará em cumprir o acordado, mesmo porque a inexistência de “dotações suficientes para suportar as despesas assumidas por meio de contrato de rateio” passa a constituir motivo de exclusão do consórcio público[76], além de configurar ato de improbidade administrativa do gestor responsável[77].

Portanto, o contrato de rateio é o instrumento legitimador das obrigações financeiras dos entes participantes do consórcio, que deverá ser minudentemente observado pelos gestores dos entes consorciados, pena de responderem pessoalmente pelos danos que vierem a causar ao erário.

9. Da unicidade de controle externo dos consórcios públicos

Relativamente ao controle financeiro do consórcio público, fica expressamente consignado que “a execução das receitas e das despesas do consórcio deverá obedecer às normas de direito financeiro aplicáveis às entidades públicas”[78]. Esta norma é dirigida, a toda evidência, aos consórcios públicos constituídos sob a forma de pessoa jurídica de direito privado, pois aqueles criados sob a denominação de associação pública, por serem pessoas jurídicas de direito público, já estariam submetidos às aludidas regras de direito financeiro.

Em seguida, a Lei dos Consórcios Públicos adentra na importante questão do controle externo dos consórcios públicos, aprimorando a idéia trazida no projeto de lei, que apenas atribuía a responsabilidade das contas do consórcio ao seu representante legal, mas não determinava qual tribunal de contas ficaria com o encargo de fiscalização do consórcio, no caso de a gestão associada ser composta por mais de uma espécie de ente federativo.

Da forma como estava disciplinada esta situação no aludido projeto, surgia a peculiar possibilidade de um consórcio público ser fiscalizado simultaneamente por mais de um tribunal de contas, como referido no ensaio sobre o PL n.º 3.884/04[79], significando violação ao princípio da economicidade.

Sanando esta insuficiência normativa, o legislador instituiu, através da Lei dos Consórcios, o que se poderia denominar de unicidade de controle externo dos consórcios públicos, ao disciplinar que “o consórcio público está sujeito à fiscalização contábil, operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do Chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio”[80].

Portanto, atendendo ao princípio da economicidade e, também, a uma desejável visão racional e sistêmica de controle externo, estabeleceu a norma em comento, com todo acerto, que as contas de um consórcio público, relativas a um determinado exercício, serão fiscalizadas por apenas um tribunal de contas, qual seja, aquele competente para apreciar as contas de seu representante legal no âmbito do ente consorciado.

Dessa forma, trazendo novamente o exemplo hipotético retratado no estudo do PL n.º 3.884/04, um consórcio formado pela União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro será fiscalizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) quando o seu representante legal for o Presidente da República; pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE/RJ), quando o responsável for o Governador daquele Estado; e pelo Tribunal de Contas do Município do Rio de janeiro (TCM/RJ), quando o gestor for o Prefeito daquela cidade.

Essa ação coordenada dos tribunais de contas envolvidos na fiscalização de consórcio público reforça o entendimento já referido de que urge “a criação de um sistema de controle externo nacional”[81] em que haja compartilhamento de dados, ações fiscalizatórias conjuntas e, sobretudo, padronização processual pelas 34 cortes de contas brasileiras a fim de que o rodízio da atribuição do controle externo, que incidirá em alguns consórcios públicos a partir de agora, signifique efetiva fiscalização, controle e conseqüente aprimoramento contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial da entidade controlada. E isso somente se dará se os procedimentos de auditoria utilizados pelos órgãos fiscalizatórios envolvidos foram unívocos, utilizando a mesma metodologia e perseguindo metas idênticas de controle externo.

Sem o implemento dessa sistematização, pensa-se que o controle externo dos consórcios públicos, que alberguem entes federativos que estejam sujeitos à fiscalização de tribunais de contas diversos, será ineficaz, redundando em simulacros fiscalizatórios que em nada ou muito pouco contribuirão no combate à corrupção, à fraude e ao uso indevido do dinheiro público no âmbito dos consórcios públicos.

Por sua vez, a Norma Reguladora dos Consórcios Públicos também dedicou regra para o controle dos contratos de rateio, disciplinando que a fiscalização desses instrumentos ficará ao encargo dos controles externos respectivos[82]. Assim, retomando o exemplo hipotético, que considera um consórcio público estabelecido entre a União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro, a fiscalização do contrato de rateio celebrado por cada um dos entes consorciados será realizada simultaneamente, nas respectivas esferas de competência, pelo TCU, TCE/RJ e TCM/RJ, por ocasião do exame das contas daqueles entes jurisdicionados.

No que tange aos agentes públicos incumbidos da gestão de consórcio, a Lei Federal n.º 11.107/05 estabelece que os mesmos não responderão pessoalmente pelas obrigações contraídas pelo consórcio. Dessa forma, não se poderá exigir a responsabilização civil ou administrativa de um representante legal de consórcio, se a obrigação contraída pela gestão associada defluiu de ato praticado em conformidade com a lei ou com o seu estatuto. Contudo, responderá o aludido agente público pelos atos praticados pelo consórcio que violarem normas legais ou estatutárias.

Este regramento impede, por exemplo, que eventuais divergências surgidas na relação consorcial possam resultar em demandas administrativas e judiciais, que visem à responsabilização de quem, dirigindo o consórcio dentro dos ditames normativos, contraiu obrigação que tenha conflitado com interesses de algum ente integrante, cujo voto tenha sido vencido na deliberação assemblear de determinada questão, pois o gestor consorcial, em tais circunstâncias, sempre poderá invocar em sua defesa o Parágrafo único do art. 10 da Lei Federal n.º 11.107/05[83].

Trata-se de uma prerrogativa legal proporcionada ao representante de consórcio, visando a estabelecer as condições imprescindíveis de resguardo de seu patrimônio particular, a fim de que ele possa conduzir com destemor os negócios consorciais, pois de outra forma, seus bens pessoais estariam constantemente ameaçados pela irresignação dos demais componentes da assembléia geral ou, ainda, de terceiros, o que inviabilizaria a função diretiva de um consórcio público. Assim, as obrigações de um consórcio serão satisfeitas apenas com o patrimônio da entidade constituída para tal fim.

Ainda dentro do escopo fiscalizatório, o legislador, em consonância com as diretrizes da Lei de Responsabilidade Fiscal, estipulou a obrigação de o consórcio público fornecer as informações necessárias a fim de que os entes consorciados possam consolidar em suas respectivas contas “todas as despesas realizadas com os recursos entregues em virtude de contrato de rateio”[84], conferindo a necessária transparência de gestão às ações consorciais.

10. A presença da União em consórcio público e convênio

A Lei Federal n.º 11.107/05 estabeleceu que a União somente poderá participar de consórcio público em que haja municípios, se os Estados que compreenderem os territórios das municipalidades consorciadas também fizerem parte da gestão associada[85], confirmando a concepção proposta no projeto de lei. Vale ressaltar que a norma em comento também ratifica a idéia, posta no PL n.º 3.884/04, de possibilitar que a União celebre convênio diretamente com municípios, sem a necessidade de participação dos Estados respectivos[86], a fim de viabilizar a descentralização e a prestação de políticas públicas em escalas adequadas, o que anula, de certa forma, a condicionante de sua participação em consórcio público explicitada no § 2º do artigo 1º da Lei Consorcial[87], constituindo-se em arguta manobra legislativa da União com o fito de, sempre que for do seu interesse, atuar de forma associada com os municípios, independentemente da participação dos Estados-membros envolvidos.

11. Da licitação no consórcio público

Cabe ainda mencionar que os consórcios públicos foram contemplados com vantagens licitatórias consubstanciadas na alteração de quatro (23, 24, 26 e 112) dos cinco artigos (23, 24, 26, 89 e 112) da Lei Federal n.º 8.666/93, anteriormente mencionados pelo PL n.º 3.884/05.

Assim, vale destacar que o artigo 23 do Diploma Licitatório – que trata da determinação das modalidades de licitação a serem adotadas, em razão dos valores dos contratos a serem celebrados – foi agraciado com o § 8º que estabelece aumento dos limites de valores – sendo “o dobro dos valores mencionados no caput deste artigo quando formado por até 3 entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número”[88] – para determinação da modalidade licitatória (concorrência , tomada de preços ou convite) a ser implementada na contratação de compras, serviços e obras de engenharia por parte dos consórcios públicos.

A despeito de parecer ter havido equívoco do legislador ao redigir o acréscimo do artigo supracitado, pois, na verdade, os limites estão estabelecidos nas alíneas dos incisos I e II do referido artigo e não no seu caput como mencionou a Lei Consorcial, é realmente inequívoca a intenção legislativa de criar incentivos ao instituto consorcial.

Por exemplo, enquanto a Administração Pública em geral terá de observar o limite de R$ 80.000,00 para abertura de procedimento licitatório, na modalidade convite, visando à compra de determinado material, um consórcio público formado por quatro entes federativos terá esta margem alargada para R$ 240.000,00, representando significativa vantagem em relação aos demais entidades e órgãos subordinados ao regime licitatório.

Também é pertinente destacar que a Norma Consorcial alterou o artigo 24 da Lei Federal n.º 8.666/93 – que versa sobre os casos de dispensa de licitação –, criando o inciso XXVI ao aludido artigo. Referido inciso estabelece dispensa de procedimento licitatório “na celebração de contrato de programa com ente da Federação ou com entidade de sua administração indireta, para a prestação de serviços públicos de forma associada nos termos do autorizado em contrato de consórcio público ou em convênio de cooperação”[89].

Ainda nesse escopo, o Diploma Consorcial também criou incentivo licitatório consubstanciado na inclusão do instituto do consórcio público no parágrafo único do artigo 24 da Lei das Licitações, que fixa percentual de dispensa licitatória de 20%, para as aquisições feitas pelos consórcios públicos, contra os 10% estabelecidos[90], em regra, para a Administração Pública. Dessa forma, o limite teto para dispensa licitatória na contratação de compra de bens e serviços (que não sejam de engenharia) por consórcio público, passa de oito para dezesseis mil reais.

Demais disso, em termos licitatórios, a Lei Federal n.º 11.107/05 adicionou o § 1º ao artigo 112 do Diploma Licitatório, estabelecendo competência para os consórcios públicos realizarem licitação da qual “decorram contratos administrativos celebrados por órgãos ou entidades dos entes da Federação consorciados”[91].

Finalizando o texto normativo em exame, o legislador fez constar duas considerações relevantes. A primeira estabeleceu que a Norma Consorcial não se aplicará aos “convênios de cooperação, contratos de programa para gestão associada de serviços públicos ou instrumentos congêneres que tenham sido celebrados anteriormente a sua vigência”[92]. Dessa forma, os consórcios públicos criados até 06/04/2005 estão dispensados de se adequarem aos regramentos da Lei Federal n.º 11.107/05, conforme previa a concepção original do PL n.º 3.884/04.

Por sua vez, a segunda consideração noticiou que o Poder Executivo da União regulamentará o disposto na Lei Consorcial, disciplinando, inclusive, “as normas gerais de contabilidade pública que serão observadas pelos consórcios públicos para que sua gestão financeira e orçamentária se realize na conformidade dos pressupostos da responsabilidade fiscal”[93]. Em outras palavras, o Governo Federal deverá editar decreto que, regulamentando em minúcias o instituto do consórcio público, consolidará definitivamente o regime jurídico dos consórcios públicos brasileiros.

12. Conclusões

Pelo exposto, constata-se que a Lei Federal n.º 11.107/05 trouxe em seu bojo normativo grande parte das concepções normativas idealizadas pelo Projeto de Lei n.º 3.884/04. A comparação realizada entre os textos de ambas as normas permite concluir que a legislação posta pela Norma Consorcial é mais concisa. Ao dispensar conceituações e detalhamentos demasiados do procedimento consorcial que existiam no projeto de lei, fixou apenas os conceitos indispensáveis ao entendimento do texto legal como, por exemplo, as definições de assembléia geral e contrato de programa. Tal constatação revela que o legislador atuou em conformidade com a doutrina e com a correta técnica legislativa, ao deixar de fora do texto normativo as definições não-essenciais ao regime consorcial, estabelecendo, dessa forma, de fato, regras gerais dos consórcios públicos.

Da mesma forma, a Lei Consorcial acertadamente deixou de abordar aspectos ligados ao detalhamento pormenorizado de procedimentos para instituição de consórcios públicos porque tal matéria, como referido no texto legal em comento, será objeto de norma superveniente a ser editada pelo Poder Executivo da União.

Por fim, ainda quanto ao exame da técnica legislativa empregada, verifica-se que se optou por delimitar os objetos do consórcio público através de conceito aberto constante no artigo 241 da Constituição Federal – gestão associada de serviços públicos – o que se mostrou mais adequado do que a proposta do projeto de lei, que elencava rol exaustivo de treze situações apenas, vez que restringia a atuação dos consórcios públicos a situações definidas legalmente, que com o decurso do tempo teriam de ser atualizadas. Portanto, este é outro aspecto elogiável da norma estudada, evidenciando o grau de requinte técnico do legislador.

Um aspecto, que mereceu crítica negativa no presente ensaio, foi o fato de a Lei Consorcial facultar a criação de consórcio público através de duas formas: ou através de pessoa jurídica de direito público (associação pública) ou por pessoa jurídica de direito privado (associação civil), criando, na segunda hipótese, indesejável dupla sujeição do consórcio público em termos de regime jurídico, pois, deverá obedecer tanto ao regime jurídico do direito privado quanto ao do direito público, sem que, efetivamente, haja razão plausível, de ordem prática, a justificar a excepcionalidade adotada. Nesse sentido, pensa-se que o PL n.º 3.884/04 havia concebido solução mais efetiva e consentânea ao sistema jurídico posto, na medida em que considerava que todos os consórcios seriam implementados através de pessoa jurídica de direito público.

Pensa-se que o legislador perdeu grande oportunidade para por fim ao hibridismo hoje existente que, a toda evidência, não acrescenta nada de positivo ao regime consorcial, ao contrário, lança-lhe mais dúvidas, como, por exemplo, o que venha a ser, como é estruturada e regulamentada uma associação pública – a mais nova pessoa jurídica de direito público interno – em nosso país. Esta, talvez, seja a falha mais grave da norma em comento: definir o instituto consorcial através da criação de outra figura nova, que também carece da imprescindível conceituação para ser plenamente compreendida e utilizada entre nós.

De outro lado, merece aplausos a Norma Consorcial por definir o instituto do consórcio público, dando-lhe a mesma natureza contratual que o pré-existente contrato de consórcio existente no direito privado, definido pela Lei das Sociedades Anônimas. Constata-se que o legislador atentou-se para a manutenção da sistematização de nosso ordenamento jurídico, restringindo-se a importar e adaptar para o direito público, conceito de consórcio que já existia no âmbito do direito privado. Neste tocante, a Norma Consorcial ofereceu solução mais efetiva que a originalmente proposta pelo PL n.º 3.884/04 que, sem dúvidas, falhou neste aspecto, ao conferir personalidade de direito público a uma modalidade de negócio jurídico – contrato de consórcio público –, destoando de formulações consagradas pela teoria geral do direito, confundindo conceitos de sujeito e relação jurídica.

Por fim, vale, ainda, destacar que a Lei dos Consórcios pacificou a questão relativa ao controle externo dos consórcios públicos, atribuindo-lhes unicidade de controle externo, ao definir que um consórcio público sujeita-se à fiscalização contábil, operacional e patrimonial do tribunal de contas competente para fiscalizar as contas de seu representante legal. Solução simples e inteligente, cuja eficácia, todavia, dependerá da criação de um sistema de controle externo nacional, a fim de que o rodízio da competência fiscalizatória dos tribunais de contas, que acontecerá em alguns casos, a partir do advento da lei em exame, represente o emprego de procedimentos de auditoria unívocos que utilizem a mesma metodologia e persigam as mesmas metas, independemente de qual seja a corte de contas fiscalizadora, assegurando resultados  efetivos do controle externo, sobretudo, no combate à corrupção, à fraude e ao uso indevido do dinheiro público no âmbito dos consórcios públicos.

Como se percebe do estudo realizado, os acertos da Norma Consorcial em muito superam suas insuficiências. Assim, mais uma vez, festejando sua publicação, acredita-se que seu texto tenha condições efetivas de responder aos anseios dos entes federativos interessados na instituição de consórcios públicos. Agora, pode-se falar em segurança jurídica na implementação da gestão associada de serviços públicos. Igualmente, pode-se afirmar que existe um conjunto positivado de regras essenciais aos consórcios que, ainda que não esteja completamente aperfeiçoado, pode ser denominado de regime consorcial.

Assim, estima-se que a Lei Federal n.º 11.107/05 ensejará, a curto e médio prazo, a proliferação de consórcios públicos em todos os cantos do Brasil. A norma em comento, sem descuidar da imposição da necessária transparência fiscal aos atos consorciais, criou ambiente jurídico favorável ao estabelecimento, de agora em diante, de gestões associadas organizadas de tal forma a satisfazer, com eficiência e eficácia, às necessidades coletivas, através da prestação de serviços públicos com padrões de qualidade dignos, possibilitando a efetivação de políticas públicas fundamentais – como educação, saúde e saneamento – que ainda são teoria em muitos municípios brasileiros. Trata-se de ferramenta poderosa e indispensável à qual poderão lançar mão todos os municípios pequenos e de poucos recursos que em 1999 somavam 74,8% das municipalidades brasileiras. Portanto, tem-se que a União cumpriu seu papel regulamentador na questão dos consórcios públicos. Agora é a vez dos Estados, Distrito Federal e Municípios utilizarem a gestão associada na busca da efetivação de suas políticas públicas afetas à prestação de serviços públicos.

 

Referências
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação – referência – elaboração. Rio de Janeiro, 1999.
__________________________________________. NBR 10520: apresentação de citações em documentos: procedimento. Rio de Janeiro, 1988.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BREMAEKER, François E. J. de. Os consórcios na administração municipal. Rio de Janeiro: IBAM/APCM/NAPI/IBAMCO, 2001.
CASSESE, Sabino. As transformações do direito administrativo do século XIX ao XXI. Interesse Público. Ano 5. nº 24, março/abril de 2004. Porto Alegre: Notadez, 2004.
FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do direito. 4.ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004.
______________. O controle dos atos administrativos. 3.ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004.
JÚNIOR, José Cretella. Curso de direito administrativo. 16.ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1999.
_______________. O controle dos atos administrativos. 3.ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004.
MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28ªed. atual. São Paulo: malheiros, 2003.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 13.ed. atual. São Paulo: malheiros, 2003.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15.ed. ref. ampl. e atual.. São Paulo: Malheiros, 2003.
MILESKI, Helio Saul. O controle das licitações e o papel dos tribunais de contas, judiciário e ministério público. Interesse Público. Ano 5. nº 27, setembro/outubro de 2004. Porto Alegre: Notadez, 2004.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Inovações no direito administrativo brasileiro. Interesse Público. Ano 6. nº 30, março/abril de 2005. Porto Alegre: Notadez, 2005.
________________________. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. 99.
________________________. Contratos de gestão. contratualização do controle administrativo sobre a administração indireta e sobre as organizações sociais. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo. Disponível em: < http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/revistaspge/revista2/artigo9.htm
PINTO, José Emilio Nunes. A percepção de risco nas Parcerias Público-Privadas e a Lei nº 11.079/2004 e seus mitigantes . Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 549, 7 jan. 2005. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6156>. Acesso em: 11 jan. 2005.
SALLES, José Carlos de Moraes. A desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 4.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000.
SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. A regulamentação dos consórcios públicos à luz do projeto de lei nº 3.884/2004. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 654, 22 abr. 2005. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6614>. Acesso em: 02 mai. 2005.
________________________________. Lei orgânica nacional dos tribunais de contas: instrumento de aprimoramento das instituições brasileiras de controle externo. Fórum Administrativo – Direito Público – FA. ano 5, n. 47, jan. 2005. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 4962-4970.
Notas:
[1] SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. A regulamentação dos consórcios públicos à luz do Projeto de Lei nº 3.884/2004. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 654, 22 abr. 2005. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6614>. Acesso em: 02 mai. 2005. Também disponível no site da Associação Nacional do Ministério Público de Contas, www.ampcon.org.br/doutrina.htm .
[2] CASSESE, Sabino. As transformações dos direito administrativo do séc. XIX ao XXI. Interesse Público. Ano 5. nº 24, março/abril de 2004. Porto Alegre: Notadez, 2004, p 13-38.
[3] CASSESE, Sabino. Op. cit. p. 15-16.
[4] PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Inovações no direito administrativo brasileiro. Interesse Público. Ano 6. nº 30, março/abril de 2005. Porto Alegre: Notadez, 2005, p. 55.
[5] FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do direito. 4.ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 63-64.
[6] FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos. 3.ed. rev. e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 87.
[7] Art. 4º da Lei 11.107/05.
[8] Dispõe o mencionado dispositivo do PL n.º 3.884/04: “protocolo de intenções: contrato preliminar que, ratificado mediante lei pelos entes da Federação interessados, converte-se em contrato de consórcio público”.
[9] Art. 2º, inc. I do PL n.º 3.884/04.
[10] Art. 1º, § 1º, da Lei n.º 11.107/05.
[11] Arts. 1º, § 1º e 6º, inc. I e II, § 1,ºda Lei n.º 11.107/05.
[12] Art. 6º, § 2º da Lei n.º 11.107/05.
[13] Art. 2º inc. IV, do PL n.º 3.884/04.
[14] “Art. 15. No que não contrariar esta Lei, a organização e funcionamento dos consórcios públicos serão disciplinados pela legislação que rege as associações civis.”
[15] “Art. 4º. São cláusulas necessárias do protocolo de intenções as que estabeleçam:…IV – a previsão de que o consórcio público é associação pública ou pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos.”
[16] Nesse sentido, acerca do instituto das fundações, sugere-se leitura do artigo “Fiscalização das fundações: tribunal de contas ou ministério público”, de nossa autoria, publicado na Revista Interesse Público n.º 27, setembro/outubro de 2004, p. 232-248.
[17] Note-se, a fim de esclarecer desde já o leitor, que o pressuposto fático estabelecido neste ensaio, visando a caracterizar a noção de serviço público para fins de instituição de consórcio público é a existência de “prestação estatal que vise à satisfação de necessidades coletivas”. Assim, tendo em conta que o Estado não se imiscui em assuntos religiosos (Estado laico) nem naqueles com conotação moral, a um consórcio estabelecido sob a modalidade fundacional restar-lhe-á apenas as possibilidades de prestação de serviços na área da cultura e da assistência.
[18] “Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados.”
[19] “Art. 4º. São cláusulas necessárias do protocolo de intenções as que estabeleçam:…IV – a previsão de que o consórcio público é associação pública ou pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos;”
[20] “Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.
Parágrafo único. Não há entre os associados, direitos e obrigações recíprocos.”
[21] Art. 4º, inc. IV, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[22] Art. 15 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[23] Data da edição da EC n.º 19/98.
[24] Nesse sentido, acerca da evolução histórica dos consórcios públicos no Brasil, sugere-se leitura do artigo “A regulamentação dos consórcios públicos à luz do Projeto de Lei nº 3.884/2004”, de nossa autoria, disponível no endereço eletrônico http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6614.
[25] http://www.dgsi.pt/pgrp.nsf/0/4de667ebdb7754c580256dd00042fb60?OpenDocument.
[26] Nesse tocante, vide artigo, de nossa autoria, “Fiscalização das contas das fundações: Ministério Público ou Tribunal de Contas?” em Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 518, 7 dez. 2004. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6002>. Acesso em: 03 mai. 2005.
[27] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 13.ed. atual. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2003. p.360.
[28] O Art. 16 da Lei Consorcial define que: “O inciso IV do Art. 41 da Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 41. …IV – as autarquias, inclusive as associações públicas;”
[29] Art. 1º da Lei n.º 11.107/05.
[30] Art. 2º da Lei n.º 11.107/05.
[31] Segundo o art. 3º do PL. n.º 3.884/04, os consórcios públicos deveriam se circunscrever a: I – gestão associada de serviços públicos; II – prestação de serviços, inclusive de assistência técnica, a execução de obras e ao fornecimento de bens à administração direta ou indireta dos entes consorciados; III – compartilhamento ou uso comum de instrumentos e equipamentos de gestão, manutenção, informática, de pessoal técnico e de procedimentos de licitação e de admissão de pessoal; IV – produção de informações ou de estudos técnicos; V – instituição e funcionamento de escolas de governo ou de estabelecimentos congêneres; VI – promoção do uso racional dos recursos naturais e à proteção do meio-ambiente; VII – exercício de funções no sistema de gerenciamento de recursos hídricos que tenham sido delegadas ou autorizadas; VIII – apoio e fomento do intercâmbio de experiências e de informações entre os entes consorciados, inclusive no que se refere à segurança pública e ao sistema penitenciário; IX – gestão e proteção do patrimônio paisagístico ou turístico comum; X – planejamento, gestão e administração dos serviços e recursos da previdência social dos servidores de qualquer dos entes da Federação que integram o consórcio; XI – fornecimento de assistência técnica, extensão, treinamento, pesquisa e desenvolvimento urbano, rural e agrário; XII – ações e políticas de desenvolvimento sócio-econômico local e regional; e XIII – exercício de competências pertencentes aos entes federados nos termos de autorização e delegação.
[32] “Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.”
[33] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28. ed. atual., Malheiros: São Paulo, 2003, p. 319.
[34] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15.ed. ref. ampl. e atual.. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 612.
[35] MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 4.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 368.
[36] JÚNIOR, José Cretella. Curso de direito administrativo. 16.ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1999, p. 402.
[37] PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 99.
[38] FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos. 3.ed. rev., e ampl.. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 85.
[39] De se perceber a consonância com os preceitos constitucionais estabelecidos nos artigos 196 e 197 de nossa Carta Política, que instituem a prestação de serviços de saúde como “dever do Estado”.
[40] Art. 30, inc. VI, da Constituição Federal.
[41] Art. 30, inc. V da Constituição Federal.
[42] Art. 149-A da Constituição Federal.
[43] Dados colhidos do periódico Correio do Povo, que circula no Rio Grande do Sul, de 1º/05/2005. Referida edição, de n.º 213, publicou reportagem “Desperdício de R$ 15 bilhões em obras paradas”, noticiando a existência de três mil empreendimentos parados atualmente no Brasil, por falta, dentre outras causas, de escassez de investimentos públicos.
[44] Art. 2º, § 1º da Lei n.º 11.107/05.
[45] MILESKI, Helio Saul. O controle das licitações e o papel dos tribunais de contas, judiciário e ministério público. Interesse Público. Ano 5. nº 27, março/abril de 2004. Porto Alegre: Notadez, 2004, p. 222.
[46] Neste aspecto, Maria Sylvia Zanella Di Pietro no artigo “Inovações no Direito Administrativo Brasileiro” (Revista Interesse Público n.º 30, março/abril de 2005, p. 47-48), refere que é inerente ao Estado Democrático a “idéia de participação do cidadão na gestão e no controle da Administração Pública…”.
[47] “Art. 278. As companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento, observado o disposto neste Capítulo.
§ 1º. O consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade.
§ 2º. A falência de uma consorciada não se estende às demais, subsistindo o consórcio com as outras contratantes; os créditos que porventura tiver a falida serão apurados e pagos na forma prevista no contrato de consórcio.”
[48] SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. A regulamentação dos consórcios públicos à luz do Projeto de Lei nº 3.884/2004. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 654, 22 abr. 2005. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6614>. Acesso em: 02 mai. 2005.
[49] Art. 2º, inc. III do PL n.º 3.884/04.
[50] Art. 4º, § 5º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[51] SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. Op. cit.
[52] Art. 8º, § 5º da Lei n.º 11.107/05.
[53] Art. 12, inc. II da Lei n.º 8.429/92.
[54] Art. 2º, inc. XVI do PL n.º 3.884/04.
[55] Art. 13, § 1º, incisos I e II, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[56] Art. 13, § 2º, incisos I a VI da Lei Federal n.º 11.107/05.
[57] Art. 13, § 5º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[58] Art. 15, § 6º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[59] Art. 13, § 4º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[60] No artigo “A regulamentação dos consórcios públicos à luz do projeto de lei n.º 3.884/2004”, salientamos que “na superveniência de uma entidade da administração indireta de um dos entes consorciados celebrar contrato de programa com o consórcio público, tratar-se-á de contrato acessório, dependendo sua eficácia, da vigência do contrato principal – consórcio público –. Isso irá implicar atenção redobrada dos gestores envolvidos, pois a retirada ou exclusão de um ente, que tenha entidade de sua administração indireta pactuado também com o consórcio, repercutirá na ineficácia deste contrato acessório, situação jurídica que poderá ensejar problemas fáticos de toda ordem na execução do consórcio”.
[61] Art. 13, § 3º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[62] Art. 4º, inc. VII, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[63] Art. 5º, inc. IX do PL n.º 3.884/04.
[64] Art. 4º, inc. VI, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[65] Art. 11 do PL n.º 3.884/04.
[66] Art. 12 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[67] Art. 12, § 2º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[68] Art. 11 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[69] Art. 2º, inc. VII do PL n.º 3.884/04.
[70] Art. 8º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[71] Art. 8º, § 2º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[72] Art. 42 da Lei Federal n.º 4.320/64, que trata das normas gerais de direito financeiro.
[73] Art. 12 do PL n.º 3.884/04.
[74] Art. 8º, § 1º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[75] Art. 12 do PL n.º 3.884/04.
[76] Art. 8º, § 5º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[77] O art. 18 da Lei Federal n.º 11.107/05 alterou o art. 10 da Lei Federal n.º 8.429/92, criando incisos XIV (celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei) e XV (celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei).
[78] Art. 9º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[79] No artigo “A regulamentação dos consórcios públicos à luz do projeto de lei n.º 3.884/2004”, disponível no endereço eletrônico http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6614, colocamos a seguinte situação hipotética que vale reproduzir para facilitar a idéia aqui retratada: “Diante dessa previsão legal, surge aspecto de singular peculiaridade: um consórcio poderá estar submetido à competência fiscalizatória de mais de um tribunal de contas. Por exemplo, em um consórcio celebrado entre a União, Estado do Rio de Janeiro e Município do Rio de Janeiro, serão competentes à fiscalização do controle externo, concorrentemente, os Tribunais de Contas da União, do Estado do Rio de Janeiro e do Município do Rio de Janeiro, cada um, apreciando as contas do consórcio relativas aos recursos repassados por seu ente jurisdicionado, pois o consórcio integrará a administração indireta de todos os entes participantes do contrato de gestão associada. Pensa-se que seja oportuno, visando à economia de recursos humanos e materiais das três esferas federativas, estabelecer-se convênio de cooperação entre as cortes de contas visando a disciplinar o assunto através do estabelecimento de conjunto de procedimentos que, atendendo ao princípio constitucional da economicidade, torne a tarefa fiscalizatória das contas consorciais o menos onerosa possível aos erários envolvidos. Como se vê, este novel instituto trará aos órgãos do controle externo desafios relativos ao estabelecimento de novos procedimentos, que deverão ser racionais na utilização dos recursos disponíveis e eficazes em seus resultados”.
[80] Art. 9º, Parágrafo único, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[81] SILVA, Cleber Demetrio Oliveira da. Lei orgânica nacional dos tribunais de contas: instrumento de aprimoramento das instituições brasileiras de controle externo. Fórum Administrativo – Direito Público – FA. ano 5, n. 47, jan. 2005. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 4969. Este artigo também está disponível na Internet, no endereço eletrônico da Associação Nacional do Ministério Público de Contas – AMPCON (www.ampcon.org.br/doutrina.htm).
[82] Art. 9º, Parágrafo único, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[83] “Parágrafo único. Os agentes públicos incumbidos da gestão de consórcio não responderão pessoalmente pelas obrigações contraídas pelo consórcio público, mas responderão pelos atos praticados em desconformidade com a lei ou com as disposições dos respectivos estatutos.”
[84] Art. 8º, § 4º da Lei Federal n.º 11.107/05.
[85] Art. 1º, § 2º, da Lei Federal n.º 11.107/05.
[86] Art. 14 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[87] Nesse aspecto, vale reproduzir comentário, elaborado no ensaio sobre o PL n.º 3.884/04, sobre a manobra legislativa efetuada pela União que, de certa forma, anula a limitação imposta no § 2º do artigo 1º da Lei Consorcial, verbis: “Nessa parte do Projeto, o legislador faz considerações, autorizando a participação da União apenas naqueles consórcios públicos em que “também façam parte todos os Estados em cujos territórios estejam situados os Municípios consorciados”[87]. Vale dizer, a União somente integrará consórcio em que haja efetiva participação de Estado-membro. Certamente, tal medida objetiva preservar a autonomia dos entes da Federação, impedindo que eventuais acordos de ordem política entre Municípios e União, deixem o Estado-membro de fora, anulando-o politicamente. Apresenta-se pois, como medida salutar ao fortalecimento dos ideais do pacto federativo brasileiro. Todavia, por outro lado, existe previsão que faculta à União a celebração de convênios com os consórcios públicos, objetivando “a descentralização e a prestação de políticas públicas em escalas adequadas”[87]. Dessa forma, a União avoca a si, o direito de, em razão de não poder celebrar contratos de consórcio sem a participação dos Estados-membros, relacionar-se diretamente com consórcios públicos formados por Municípios, através da celebração de convênios. Esta prerrogativa é, na verdade, inteligente manobra legislativa visando a anular eventuais indisposições de governos estaduais à celebração de consórcios. Assim, se o Estado-membro não tiver interesse em participar de consórcio que vai ao encontro dos objetivos definidos pela União, esta poderá, mediante convênio, tratar diretamente com os municípios consorciados, descentralizando e implementando suas políticas públicas em escalas adequadas”.
[88] Art. 17 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[89] Art. 17 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[90] Art. 24, incisos I e II da Lei 8.666/93.
[91] Art. 17da Lei Federal n.º 11.107/05.
[92] Art. 19 da Lei Federal n.º 11.107/05.
[93] Art. 20 da Lei Federal n.º 11.107/05.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Cleber Demetrio Oliveira da Silva

 

Advogado em Porto Alegre-RS
Assessor de Gabinete de Conselheiro do
Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul
Pós-graduando em Direito Empresarial pela PUCRS
Mestrando em Direito do Estado pela PUCRS

 


 

logo Âmbito Jurídico