Breve
intróito: se a violência ”aceitável” da
guerra, mal “necessário” enquanto o homem ainda guarda em si resquícios do ser selvagem que já foi, já preocupa os
profissionais da própria guerra, ou seja, aqueles que são preparados para matar
e morrer, é sinal que é chegada a hora da civilização humana dar um
significativo salto na evolução do uso do dom maior de que é dotada: a inteligência. Se isso é fato para os militares,
com muito mais razão dever ser para os policiais. Ambas as instituições têm
finalidades diametralmente opostas. Enquanto o uso da violência bélica para os
militares sempre foi meio de êxito
profissional e institucional, para a polícia, no entanto, isso jamais foi
tolerado. Ora, o lema histórico da polícia
(que vem até na raiz da palavra, do conceito polícia): “proteger e para servir”
exige nova mentalidade e nova tecnologia policial para ser mantido vivo num
ambiente cada vez mais hostil e desfavorável, como temos hoje. As moderníssimas tecnologias das armas, munições e
equipamentos não-letais, ou menos letais garantem essa preservação da força
moral e prestígio da polícia, desde que seu uso se dê a partir de nova
concepção de formação policial. È dessa urgente necessidade – de
acertar o passo com o mundo atual – que vamos nos ocupar neste ensaio.
Entendendo
o conceito de armas não-letais:
tecnologia de armas não-letais começa a partir do conceito de guerra não-letal.
Isso tem início com fim da guerra fria e mais precisamente com a queda do muro
de Berlim. A guerra pesada entre as forças do Pacto de Varsóvia e da OTAN,
enfim não correu. A política de guerra norte-americana, conhecida por MAD[1],
da relativa segurança nacional baseada na ameaça velada de que o mundo pode
acabar se nos atacarem, tal o poder destrutivo do nosso arsenal atômico, parece
ter dado certo e mantido o delicado equilíbrio
bipolar do mundo. Com fim da lógica da guerra fria, também a lógica da
guerra quente e pesada estava em seu ocaso. Melhor para o nosso sofrido
planeta! O fiasco norte-americano no Vietnã fez ruir de vez aquele conceito de
guerra total e pesada, uma vez que o maior arsenal de guerra do mundo não
logrou dobrar o pobre e pequeno exercito local. Os fogos pesados da artilharia,
o aéreo e o naval garantiam de dia posições que a noite eram perdidas. As forças
pesadas americanas se atolavam nos arrozais, aqueles soldados bem treinados
numa outra concepção de guerra, tornavam-se, ali na selva, frágeis. Isso rendeu
um impacto psicológico e geral muito grande na elite militar norte-americana.
Assim, os grandes blindados, os enormes bombardeios, os mísseis
intercontinentais começaram a ser postos de lado – não
abandonados – e outras armas e novas concepções de guerra
(diríamos mais “lights”) mais
inteligentes e menos pesadas, foram sendo pensadas.
A alta e fina tecnologia dos
cientistas/universidades (das agencias militares de ciência e tecnologia)
aliada à experiência de campo de lideres militares, geraram nova concepção de
armas inteligentes e de altíssima precisão. Nessa nova concepção tudo que
pudesse ser visto poderia ser atingido e logo destruído. E com os equipamentos
censores de visão noturna “comprou-se a noite” (como dizem os militares
americanos seguindo os israelenses[2]).
Já na invasão do Iraque, em 1991, na denominada operação “Tempestade no
Deserto” foi o grande campo de teste dessas novas tecnologias. Ali os
iraquianos apreenderam que seguro já não era mais o interior dos tanques, eis
fonte sensível de calor aos “olhos” das armas inteligentes. Para essa guerra
ultima no Iraque, essas tecnologias bélicas foram depuradas das falhas e
detectadas em 1991. Na Somália (1993/94), no Haiti (1994) e na Bósnia os
militares norte-americanos atuando como polícia do mundo ou em Operações de
Apoio de Paz situações essas que exigiam armas e munições não-letais ou menos
letais que as convencionais até porque os chamado danos colaterais (mortes de
não-combatentes e destruição de bens, etc.) são proporcionalmente inadequados
ao caso. Todas essas moderníssimas tecnologias ainda carecem de mais precisão,
todavia indiscutivelmente já demonstraram sua ampla eficiência e o que é mais importante, com a impressionante redução das baixas
humanas sobretudo nas fileiras norte-americanas. Com efeito, o verdadeiro objetivo da guerra – já perdido nas dobras do
tempo e das muitas guerras – é a imposição da vontade, compelir o
adversário a fazer o que se lhe determina, jamais a destruição, a eliminação
física. Isso tem sido usual porque irresistível meio de se lograr aquele resultado buscado. Mas dia haverá (e
parece que em breve) em que a sociedade humana já não queira mais pagar esse
preço (a devastação e o morticínio). A morte, sobretudo do homem, é um fantasma
que, a cada dia, mais assombra um numero maior de seres pensante. E assim como
podemos conceber que a industria armamentista paulatinamente vá se ajustando
àquele ideal de armas não-letais ou menos destrutivas. Nos salvamos da guerra
aniquiladora do planeta (MAD) e já estamos, enquanto fato ainda inevitável, nos
albores da guerra menos mortífera, a guerra do futuro.
As
armas não-letais podem ser classificadas segundo os alvos, em dois grandes
grupos: armas antipessoal e armas antimaterial.Quanto à
tecnologia: armas físicas (balas de borracha/plástico, redes/veicular e
pessoal, ar-comprimido…); químicas (irritantes, spray de pimenta, corante/identificadores espumas aderentes,
alucinógenos, calmantes, agentes olfativos e obscurantes…); de energia
dirigida (eletromagnéticas: luzes estonteantes, granadas de luz e som, laser
não-cegante e acústicas: ruidosas e infra-sons; antimaterial: pulsos de
energia, microonda de alta-energia, interferidores, feixes de partículas).
Diferenças
entre militar e policial e pontos de contato: As
necessidades policiais são diferentes das militares. Todavia nos últimos anos
nos EUA ambas instituições têm cooperado no desenvolvimento de conjunto de
armas não-letais. É que para a polícia, ao contrario dos militares, a
tolerância para com acidentes fatais e erros de execução, falhas profissionais
mortais ou de grave lesividade quer do próprio policial, quer do perseguido, do
bandido, sempre foi praticamente inexistente se comparada com as falhas
admitidas nas operações militares de apoio de paz (muito semelhante ao trabalho
da polícia). A simetria entre o militar e o policial, que sempre critiquei como
deturpação e desvio[3]
profissionais entre nós, aqui é benfazeja. Muitas dessas sofisticadas
tecnologias militares não-letais têm sido adaptadas para uso da polícia que por
sua vez ainda vem de fomentar novas adequações
a partir da experiência diária nas ruas. Agora que o paradigma militar, que
tanto encanta os policias, é outro
diametralmente oposto ao anterior, ou seja, antes era destruição total e
absoluta do inimigo, mas hoje se trata somente de sua imobilização, afastada
assim, a letalidade e a grave lesividade tanto quanto possível, a polícia já
pode incorporar, mais útil e adequadamente, as técnicas
militares. Pelo menos nesse âmbito ainda novel da não-letalidade não há mais ou
reduziram-se as incompatibilidades profissionais entre as duas instituições
(guerra é para matar/eliminar ou morrer e polícia é para prender/limitar). A evolução da concepção militar do
não-letal vem de matrizes extremamente letais (do mais letal para o não-letal);
já na polícia essa evolução não igual. A polícia sempre esteve, mais ou menos,
adstrita e limitada ao uso da força mínima necessária, proporcional. Com efeito, a guerra ainda “é a
continuidade da diplomacia (do Direito) por outros meios”[4],
como insuperavelmente ensinou o gênio militar
prussiano Karl Von Clausewitz e parece que tende para uma ainda longe mas já
perceptível luta menos mortífera, isso é um marco feliz na evolução da
humanidade. Ora se até na guerra a morte e destruição do homem já vem cedendo
lugar a outras técnicas menos lesivas e não-letais, por que a polícia haveria
de continuar uma guerra suja e tão mortífera. Vale registrar que para os
militares essa guerra tão mortal sempre foi seu mister profissional essencial;
já com o policial ocorre exatamente o oposto: só por exceção ele esteve e está
autorizado a matar e sua própria morte caracteriza acidente/falha profissional.
Os cenários mundial, regional e local mostram
indícios desfavoráveis aos agentes do Estado: num ambiente crescentemente desfavorável ao trabalho da
polícia de proteger a sociedade e o indivíduo, já porque um certo vácuo de
poder (por inaptidão gerencial de governantes e/ou debilidade para o exercício
visível do poder estatal) tem gerado e fortalecido o poder paralelo de bandidos
e de corporações (e seus nefastos interesses corporativistas), já porque o
crime integrou-se, organizou-se, enriqueceu e usa tal performance (até aqui,
bem melhor que Estado). O crime organizado[5]
considerado o “negócio” que cresce mais rapidamente no mundo, cujo lucro anual
é estimado em cerca de um trilhão de dólares (equivalente a 3/5 do orçamento
federal dos EUA), já se teme a virtual (se já não for real) associação das
organizações criminosas (máfia russa, nigeriana, já afinadas, segundo alguns
especialistas com cartéis colombianos) com as organizações terroristas[6].
A máfia russa emprega ex-agentes da KGB, dispõe de armas militares modernas
potentes (e até nucleares) tudo graças ao contrabando que surgiu na ex-União
Soviética. Ali cerca de 5.700 quadrilhas criminosas se infiltraram em toda a
vida pública (politica, econômica e social) das antigas soviéticas. Muitas
dessas organizações coligadas ou isoladamente já atuam em mais três dezenas de
países, inclusive nos EUA. A força geral dos traficantes de drogas pode bem ser
avaliada pelo tamanho de seus lucros, estimados entre 200 e 500 bilhões de
dólares, maior que o PIB da maioria das 170 nações do nosso planeta. E pouco se
tem feito para sensibilizar (isso não trabalho da polícia) o usuário de que ele
é o principal motor gerador, o principal responsável por tanto danos oriundos
dessa desgraça social que são as drogas.
Essa atividades criminosas atuam em ambiente que não permitem o uso de
armas tradicionais e pesadas (antes mais para
imposição de respeito) porque geram incontáveis danos colaterais (mortes
e destruição de pessoas e bens alheio). O que se constitui em forte fator de
descredito e má fama da polícia e pior: isso tem sido bem explorado pelo
“inteligência” do crime (daí porque os habitantes das favelas quase sempre
estão desgraçadamente mais ao lado dos traficantes que da polícia). Esses
bandidos usam muito bem a mídia, micro poder politico do lugar onde atuam, a
Internet, as melhores maquinas de telecomunicações, mas sobretudo o poder
corruptivo do dinheiro para seduzir toda gama de autoridade, tanto para fazer
uso de sua influencia facilitadora, como também para a esperta exploração
(poder psicossocial) da imagem de fraqueza e submissão dos agentes do Estado. O
crime organizado atualmente já é problema cuja solução, o enfrentamento
ultrapassa as forças e os limites operacionais da polícia, já não é tão-só uma
questão de segurança pública senão também e sobretudo de segurança nacional,
agora sim a simbiose militar-policial é conveniente (trocas de informes e
experiências, desenvolvimento de tecnologias de dupla utilização,
inteligência/serviços secretos, infiltrações de agentes informantes…).
Invariavelmente o crime organizado usa a população simples circundante
como escudo e/ou despiste. E nas operações policiais invariavelmente para se
deter meia dúzia de “soldados rasos” ou mesmo um “sargento” do tráfico,
destroem e matam muitos inocentes (e se matam muito também), o que é sempre bem
aproveitado pela “inteligência” da organização criminosa em detrimento do
perigoso descrédito da polícia. Todavia esse fenômeno parece ainda não
percebido pelas inteligências da segurança pública entre nós que continua
fazendo o jogo da inteligência dos bandidos. Contra esse tipo de criminoso só
mesmo, é claro, armamento inteligente e adequado (munição de baixo impacto, espumas,
redes, granadas de luz, som e de gás….). Tais recursos e meios tecnológicos
reduzem o estresse que provém do risco natural da profissão policial, porque
esse sente-se preparado para todas possíveis necessidades sem riscos adicionais
(de danos colaterais a inocentes, de responsabilizações e sindicâncias
disciplinares internas). A polícia brasileira precisa entender, tal como os
militares norte-americanos pós-Vietnã, que há guerra e guerras, que há
cenários/ambientes e circunstancias operacionais para as quais determinadas
armas e equipamentos são inadequados e até contraproducentes. Numa invasão de
favela, por exemplo, a metralhadora e armas análogas que atiram
indiscriminadamente são inaceitáveis para o bem da própria Corporação policial,
salvo se não fizer diferença troca de vidas inocentes
por presos miúdos (e ainda que fosse o dono do cartel da droga, “marechal”,
essa troca não seria justa e profissional). Diga-se o
mesmo quanto às situações de distúrbios de massa ou de muita aglomeração,
aquelas armas são tão danosas aos alvos, quanto à polícia enquanto instituição
(vide exemplos patéticos do Carandiru, Eldorado do Carajás…) nessas operações
o escudo elétrico (derruba um homem grande e o mantém, como geléia, no chão por
algum tempo). A imobilização de prisioneiro, sempre um risco para o policial e
para a imagem da polícia (vide exemplo do assaltante do ônibus/175, no RJ)
carece de melhores meios de execução. O policial precisa poder e saber escolher
quais dos recursos, dos vários de que dispõe, deve usar em cada situação
especifica, porque cada uma deve ter um tipo de enfrentamento hábil.
Ora, se a violência é o mal ser sempre evitado
e/ou debelado a polícia, instituição social que é, não pode usá-la como regra,
senão como última opção segundo o principio da necessidade e da proporção desse
mal. Nos filmes policiais de alta violência (do tipo rambo) deixam-se as
seqüelas desse mal escondidas, mas na vida real a essa “solução” gera um ciclo
de violência (represálias de todos os lados, ressentimentos) que se banaliza e
espalha pelo tecido social que assim adoece. Isso não pode ser tolerado pelo
Estado, que deve ter outra lógica que não a dos bandidos. Há de se distinguir
muito bem os agentes do Estado e os agentes do crime. O crescimento da violência
criminal – que certamente tende a se agravar no mundo
inteiro e por muito tempo ainda – não pode redundar num Estado violento, numa
polícia truculenta ainda que só contra os bandidos, rigor (o maior possível)
contra esses, sempre será da função mas controlada a situação e dominada a
resistência cessa a razão de ser da força legitimada pelas circunstancias.
Tanto maior o grau de profissionalismo, tanto menor o grau de paixão, porque é
muito comum na adrenalina das operações perde-se o controle emocional (vide
chamada síndroma da perseguição policial em alta velocidade).Vale, registrar,
por fim, que o uso da força não pode resolver problemas sociais, como miséria,
desemprego, sem tetos, sem terras, camelôs, bestas/transportes paralelos… A
atuação da polícia nesses casos só tem trazido muita violência, de parte a
parte, e grande desdoiro para tão
fundamental instituição social, e pior, nada tem resolvido: tudo vem piorando
em termos de violência (e de criminalidade) generalizada. É hora, então, de uma virada evolutiva, a
sociedade precisa e a polícia carece e merece melhor status no seio de nossa comunidade.
Urgente
necessidade de recuperação psicossocial do conceito de polícia: sobretudo em nosso país o conceito psicossocial de
polícia em geral precisa urgentemente ser recuperado, poucas instituições
sociais têm tanta importância na vida de cada um e de todos como a polícia,
tenho insistido nisso por penso ser questão essencial e basilar no
desenvolvimento de qualquer grupo social. Uma polícia violenta, com alto índice
baixas humanas – quer da própria polícia, prova inconteste do
despreparo; quer do bandido, que não precisa morrer para a polícia obter êxito
e reconhecimento social – é uma polícia que pede para desaparecer, tal
o despropósito na atuação e a frustração
dos objetivos institucionais. Nossa
polícia precisa – e já estamos muito atrasado –
deixar de ser braço armado de governos (segmentos/grupos políticos
transitórios) senão do Estado (ente permanente e total). A polícia brasileira (Federais,
estaduais e também as ditas guardas municipais) carece de urgente
profissionalização, ou seja, carreira
técnica, regida e estruturada por lei organiza nacional e estaduais e
lastreada em corpo de normas ético-profissionais, cuja ascensão funcional,
desde a base até a mais altas cúpulas, esteja livre do jogo político-eleitoral
geral e sindical. Eis aqui, outra salutar parelha entre militar e polícia, a
gerência administrativa da carreira
profissional.
É provável que muitos policiais experimentem a
sensação de que estamos sugerindo a eles que enfrente os perigosos bandidos
fortemente armados com armas não-letais ou menos letais. Não é isso que se
almeja. Mas sim garantir ao profissional digno desse titulo que possa ele estar
apto a eleger qual dos recursos deve usar para garantir sua própria segurança e
de inocentes e também a do bandido que dever ser preso e não eliminado ou
castigado pelo policial. Diria até mesmo que em certas ocasiões diante de
perigosos bandidos, fortemente armados a melhor opção pode não ser a letal
senão a paralisante. Tudo dependerá da
avaliação situacional feita pelo policial (preparo técnico e emocional); o
certo que ele deverá dispor dos recursos letais e não tais para uso a contento.
As armas
não-letais, sobretudo as de precisão reduzem ao mínimo as baixas humanas e
materiais, o que é, por qualquer angulo de analise, um fator positivo: a função
eterna da polícia – mesmo nos poucos países que admitem a pena de
morte –
não é matar ninguém. Outro ponto de interesse na questão aqui em foco é
quanto à legalidade operacional da polícia que, segundo normas internacionais,
precisa buscar sempre que possível (e os elementos probatórios da situação
concreta hão de bem aferir essa possibilidade) os meios menos lesivos dentro da
necessidade e proporcionalidade do ato policial. É um mito
policial o tal tiro de advertência, mas ele será sempre bem avaliado, enquanto
demonstrativo da escala das forças gradual e proporcional na situação, se lago
der errado nos resultados operacionais da polícia. Com efeito, as armas não
letais expressam bem esse manejo daquela escala da força policial: usa-se
primeiro tais armas e no insucesso delas e que se passa às armas letais.
Contudo, será sempre a situação concreta e o juízo
de avaliação (dos riscos e da escolha dos meios) do profissional-policial o
critério primordial, que há de ser quase
instantâneo e ainda razoável, daí os preparos emocionais, técnicos e jurídicos.
O policial é quem dever avaliar se usa armas não-letais ou as letais na situação
concreta em que se encontra. E como todos, há de responder pelos excessos e
pelo desvio da regra profissional, com a diferença crítica de que sendo ele o
Estado em pessoa estará sempre mais exposta à mídia e à opinião pública.
Conclusão: nos países onde a segurança
pública não está tão vulnerável, como a nossa, já está bem avançado o empenhado
em adequar a polícia e os policiais para uma atuação mais eficiente e menos
lesiva. A polícia dessa era pós-moderna, menos e/ou não-letal nada tem a ver
com movimentos pacifistas ou algo do gênero. È, pois, a aplicação da força de
modo pragmático, adequado às situações concretas do dia a dia policial. È a
força policial livre (bem mais livre) dos riscos (mesmo diante de um facínora,
o dever do policial – ou seja, do Estado que ele incorpora – é
prendê-lo e lavá-lo às outras autoridades (ainda que ideologicamente tenha
outra “solução” para o caso). Muitas desses equipamentos não-letais (porém
muito eficiente) já estão há algum tempo em uso diuturno em muitas polícias no
exterior. O crime nos dias atuais exige um bom reequilíbrio entre direitos
humanos e reforço legal e material do trabalho policial. Leis, penitenciarias
(muitas e pequenas), viaturas apropriadas (e não adaptadas ao sabor do
interesse da vendedora) armas de novas concepções, tudo isso deve ser
repensado, reformado… Contudo, nada terá bom êxito se não houver forte
alteração nos rumos da formação
policial, em todos os níveis e segmentos da
polícia (Civil, PM, federais). Por fim, é certo que essa concepção pós-moderna
de polícia (instituição/corporação) e policial
(indivíduo/profissional) terá, é claro, muitas resistência dada a cultura já
bem arraigada nas organizações
policiais – os militares também reagiram negativamente,
mas ao depois entenderam o avanço profissional. Até no Texas, onde “o Colt é um prolongamento do braço”, onde
“o homem desarmado está nu”, já se vem assumindo o conceito de polícia
não-letal. A polícia que precisamos carece ao lado do preparo profissional
(técnico, emocional e jurídico) de opções de meios operativos adequados
tecnologicamente ao clima atual de crescente prepotência e organização da
bandidagem que se aproveita do vácuo de poder, da sombra deixada pela confusão
de discursos e pela perda de finalidades/objetivos. Disputar com o “crime
organizado” em termos de armamentos é economicamente complicado e racionalmente
inadequado: para eles a baixa de inocentes é bem aproveitada, mas já para a
polícia ocorre bem o inverso, é claro. (Bsb, 12/03/03)
Notas:
[1] MAD: Mutually assured destruction (=destruição mútua assegurada).
[2] È
que já na Guerra dos Seis Dias de 1967, os israelenses demonstram que tudo que
pudesse ser visto poderia ser atingido e destruído. E, assim, tratou-se de
“comprar a noite”, ou seja, de desenvolver-se a visão noturna.
[3] Vide
nosso ensaio: Violência e Crime,
Sociedade e Estado, publicado na Revista Informação Legislativa, do Senado
Federal, nº 136, out/dez/1997e diversos saites jurídicos.
[4] Mesmo na
era do atual Bush essa lição-constatação persiste, a exceção Iraque/2003 não
desautorizou essa verdade já clássica,
[5] Entre nós o chamamos de crime organizado é ainda a
fase primitiva da atividade criminosa (crime por opção “profissional, como
estilo de vida) sistematizada, articulada e organizada em bases racionais. O
“crime organizado” pós –moderno é tecnológico, globalizado/internacionalizado,
internético e movimento capitais volumosos, domina setores estratégicos da vida
de país, de uma cidade (freqüentemente serviços públicos de transporte coletivo
e seus derivativos), têm controle de algumas ou de muitas “autoridades”
administrativa e politicas e até militares. Enfim minam o tecido social e
politico e da segurança do Estado (polícia e em última instância as Forças
Armadas). Como se vê ainda não temos o crime organizado entre nós, apenas
arremedos vestígios alertantes .
[6] Cf. Alexander, John B. “Future War – Non lethal weapons in
twenty-first-Century Warfare”, 1999,
Informações Sobre o Autor
Luiz Otávio de O. Amaral
advogado militante há mais de 27 anos e professor de Direito há mais 25 anos. Já lecionou na UnB e UDF. Ex-Diretor de Faculdade de Direito em Brasília. Atualmente leciona na Universidade Católica de Brasília-UCB. Foi assessor de Ministros da Justiça; do Min. da Desburocratizarão/P. Rep. Secret. Nacional de Dir. Consumidor. Autor de “Relações de Consumo” (04 v.); “O Cidadão e Consumidor” (co-autor); “Comentários ao Código Defesa do Consumidor, coord. Prof. Cretela Júnior (Ed.Forense) e “Legislação do Advogado”, MJ, 1985. Autor de “Lutando pelo Direito” (Consulex, 2002); e de “Direito e Segurança Pública – juridicidade operacional da Polícia” (Consulex, agosto/2003) e ainda de “Teoria Geral do Direito” (Forense, mai/04).