União estável

Sumário: 1. Considerações preliminares. 2. Principiologia constitucional versus código civil de 2002. 3. Da etmologia a tentativa de um conceito. 3.1 diferença do termo concubinato e união estável. 3.2. Princípio da boa-fé: monogamia e direitos tutelados da concubina. 4. Como reconhecer a união estável. 5. Regramento da união estável. 5.1. Dos direitos e deveres. 5.2. Do impedimento. 6. Sucessão do companheiro. 6.1 crítica ao tratamento desigual do código. 6.2 crítica ao abandono do termo “estado civil”. 7. Conclusão


1 Considerações preliminares:


A união de pessoas de sexo diferentes, hodiernamente chamada de União Estavél, é conhecida desde o Direito Romano, e, naquela época era considerada uma união inferior ao casamento, já que patrícios e plebeus eram impedidos de casar entre si, restando a eles, a alternativa de unirem-se de fato. Para os romanos o que diferenciava o casamento da simples posse era a affectio maritalis[1].


Pode-se considerar que, o desprezo social existente à esta forma de união familiar, deve-se ao histórico patriarcal herdado pelo Direito Romano, de caráter individualista e de hierarquia patriarcal, e que acabou orientando o código civil de 1916[2].


A Igreja Católica acabou influenciando de maneira positiva o crescimento das relações de fato, pois, não reconhecia os avanços legislativos do código civil, proibindo o divórcio, desta maneira, o índice de uniões formada sem casamento só aumentavam. A única possibilidade de separação até 1977, era o desquite, que impedia novo casamento.


O Código civil de 1916, reflete o pensamento da burguesia que detinha o poder político e econômico e manipulava a política Nacional[3]. Por muito tempo, o legislador identificou o casamento como a única forma de constituir família, negando efeitos jurídicos a maioria de uniões formadas sem casamento.


Essas uniões surgidas fora do matrimônio ganharam nome de concubinato, expressão de caráter depreciativo, que traduz uma relação de menos-valia, menor, uma depreciação moral[4], devassidão, principalmente para as mulheres.


A medida que os companheiros começaram a buscar o judiciário para ver reconhecido alguns dos seus direitos, estes impulsionaram o judiciário a gerar uma doutrina concubinária[5], gerando apenas efeitos obrigacionais, já que eram tratados com se sócios fossem.


Exemplo claro, eram as situações em que, para as mulheres  que não exerciam atividade remunerada, os tribunais concediam alimentos sob o nome de “indenização por serviços domésticos” e eram reivindicados com base na teoria do enriquecimento sem causa ou locupletamento ílicito, para impedir que apenas um dos companheiros ficasse com o patrimônio constituído integralmente.


Devido à excessiva pressão exercida sobre o legislador para minimizar as injustiças que vinham ocorrendo no caso concreto, a jurisprudência ganhou prestígio e foi quem deu origem a formação do instituto da União Estavél.


Finalmente, a diversidade ganha relevância com o reconhecimento jurídico de novas formas de constituição familiar[6] tutelados pela Constituição Federal de 1988, onde a união duradoura e desimpedida é aceita como entidade familiar, consequentemente, merecedora da proteção do Estado.


A principiologia consticuional versus o código civil de 2002.


O Código civil de 1916 omitiu em regular qualquer relação extramatrimonial, portanto, totalmente despiciendo no tocante ao reconhecimento a união estável.


A Constituição Federal deu uma nova dimensão a concepção de família ao introduzir um termo generalizante: entidade familiar[7], alargou o conceito de família, passando a albergar relacionamentos além do laço matrimonial[8].


Somente com o surgimento de duas leis infraconstitucionais: 8.971/94 e 9.278/96 é que tivemos uma maior abrangência em relação ao reconhecimento deste outro instituto familiar.


A primeira, regulou o direito dos companheiros somente no tocante à alimentos e sucessão, destacando-se dentre os direitos sucessórios o usufruto de ¼ (um quarto) dos bens do falecido  se houver filhos e de ½ (um meio) caso não houvesse herdeiros e ainda, na existência de herdeiros necessário o concubino sobrevivente herdaria a totalidade dos bens do falecido[9].


A Segunda, além de regular o dispositivo constitucional do §3º do art. 226, (CF/88), reconhecendo como entidade familiar a união estável entre homem e mulher, estabelecida com o fim de constituir família, também permitiu, em seu artigo 8º,  a conversão da união estável em casamento, a qualquer tempo, sem exigência de qualquer formalidade legal e ainda, fixou a competência das varas de família para os litígios, saindo, então da esfera cívil, como era anteriormente.


Outro aspecto positivo da lei 9.278/96, é que definiu em seu artigo 5º, que os bens havidos na constância da união, são comuns aos conviventes.


Apesar de Constituição Federal dar tratamento igualitário, de mesma hierarquia entre as duas entidades familiares: casamento e união estável, não desigualando-as e não mostrando qualquer tipo de preferência ao instituto do casamento, não passou incólume as críticas quanto a disposição do código civil de 2002, pois não revelou a mesma simpatia pelo instituto.


A Atrofia intelectual existente no código civil de 2002, deixa nítido o preconceito e a patrimonialização do código, ao regular em apenas 5 pequenos artigos o instituto da União estável (do artigo 1723 ao 1727).


     Neste diapasão, menciona a União Estável, perfunctoriamente, no título de Direito Patrimonial, e não no título de Direito Pessoal, como mencionado o casamento e todas as suas formas de regulamentação.


     No nosso modo de pensar, não existem limites que possam medir o afeto, o sentimento humano de solidariedade , companheirismo, cooperação, assistência mútua e respeito, que imperam efetivamente na União Estável, e que portanto, deveria estar inserida no livro IV de Direito de Família, Título de Direito Pessoal[10]


Da etimologia a tentativa de um conceito


É implexo, hodiernamente conceituar e, mais complexo ainda é a conceituação de união estável, por isso a importância de começar pela etimologia, sendo mister que se traga à baila a idéia pura e simples do que seria o próprio conceito, para posteriormente se explanar uma compreensão da etimologia para chegarmos à tentativa de um conceito.


Conceito é derivado de conceptus, de concipere conceber, ter idéia, considerar, serve na terminologia para indicar o sentido, a significação, a interpretação, que se tem a respeito das coisas, dos fatos e das palavras.


O conceito da palavra indica, precisamente, o sentido etimológico e técnico em que é ela aplicada. É o certo entendimento que se possui a seu respeito, na posição em que se põe na linguagem[11].


No influxo do exposto, a expressão união, na terminologia do Direito Civil, está condensada no sentido de associação ou sociedade, desta forma encaminha-se para vislumbrar essa associação/sociedade para abarcar a vida em comum, ou seja, a vida conjugal, que ocorre entre homem e mulher.


Diante desta explanação é possível adentrarmos na esfera do Código Civil de 2002, onde este em seu art. 1.723 discorre:


 “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.


     Assim, começa a vir à tona uma idéia mais fulgente a cerca do conceito por ora analisado, desta forma, o que se inquiri é uma solidificação sem um engessamento do que seria a união estável, bem como compreender seu funcionamento diante das mutações aceleradas da sociedade. A hermenêutica é um norte que deve ser utilizado para trazer à luz aquilo que está oculto, ou seja, desvelar, revelar, expressar, como bem menciona a ilustre autora KELLY SUSANE ALFLEN DA SILVA em sua obra Hermenêutica Jurídica e Concretização Judicial .


     Isto posto, deve ser utilizado o cânon da congenialidade, para que o intérprete exponha a atualidade, ou seja, aquilo que realmente vivenciamos hodiernamente para realizar a correspondência com o dito que advém do objeto. Acreditamos desta forma, que o objeto seja a sociedade de pessoas que vivem em união, sendo estas homem e mulher e, a partir disto seja feito um liame com os acontecimentos sociais, com os fatos fenômenos sociais para a concretização do fato fenômeno jurídico.


     A união estável pode ser vislumbrada como sendo a convivência entre homem e mulher, que pode se dar sobre o mesmo teto ou não e, os vínculos não são ligados pelo matrimônio, mas nem por isso deixa de haver uma afetividade e cumplicidade entre ambos.


     Neste diapasão, encontra-se o vínculo entre homem e mulher, como bem disciplina o código civil e, que a partir disso devem ser analisados os demais aspectos concernentes à união estável e sua diferença do termo concubinato, o que será explorado a seguir.


É plausível que se chegue a um entendimento de união estável sem caracterizar um conceito certo e, isso para que não haja uma padronização de pensamentos, um engessamento equânime, mas sim uma tentativa de conceito para que cada indivíduo possa conceituar união estável através de seu próprio pensamento, ou seja, através de sua pré-compreensão e das mais diversas conceituações doutrinárias e jurisprudenciais, pois assim, e somente desta forma é que será possível enquadrar a união estável a cada caso concreto, diante das relações intersubjetivas dos sujeitos, visto ter cada um uma visão de mundo diferenciada, o que influi no seu modo de ser e, em seu relacionamento. Por isso, a importância de não ser estanque o conceito de união estável, mas sim aberto aos mais diversos pensamentos diante das mais diversas relações, tendo em vista que a partir deste sublime dimensionamento de conceito, é que é possível que sejam produzidos outros novos, visto dar desta forma, a possibilidade de não reproduzir, mas sim explorar o intelecto do jurista para uma nova dimensão de configuração de união estável acompanhando o desenrolar da sociedade acelerada.


3.1. Diferença do termo concubinato e união estável


Para principiar as diferenças entre concubinato e união estável, faz-se determinadas considerações preambulares a cerca do tema em epígrafe. Assim, cumpre deixar registrado que “há algum tempo”, as uniões estáveis eram vistas como algo à margem da lei, quando não contra a lei, sendo tidas como espúrias e pecaminosas. Todavia, não raro elas deixam bens, filhos e terminam em briga, e começaram a ser trazidas à Justiça não para serem penalizadas, mas para se definir como ficavam os bens e os filhos diante da ruptura”[12].


     Diante dessas evoluções, extrai-se o reconhecer desta espécie de relacionamentos primeiramente reconhecido pela jurisprudência para que a partir dela a lei amparasse tal união, como faz hodiernamente diante da previsão constitucional a cerca do tema em tela, qual seja, o reconhecimento da união estável. Assim, nasceu tal união, em virtude de aglutinações de acontecimentos idênticos que corroboraram e transformaram-se em jurisprudência para que então se pudesse vislumbrar tal hipótese com previsão legal, inclusive no âmbito Constitucional.


     No Brasil, encontramos na Magna Carta em seu art. 226, §6º, in verbis:


 “Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre homem e mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.


     Desta forma, as relações estáveis que ocorresse entre homem e mulher passariam então a ser consideradas como entidade familiar. E foi assim, com o advento da união estável consagrada constitucionalmente, que esta teve seus aspectos equiparados com o casamento, desta forma, tal união deixou de ser considerada como um “pecado” para que fosse amparada legalmente e despida de valores consuetudinários ultrapassados para adentrar na esfera de uma relação que não é mais condenável.


Ganha relevância jurídica a família não fundamentada no matrimônio, indicando a Carta Magna no art.226, §3º, a possibilidade de formação familiar embasada na união estável entre homem e mulher[13]. Enfim, passou-se, tanto a doutrina quanto a jurisprudência a avançar com os novos costumes sociais de forma a despir-se dos preconceitos arcaicos, os quais são incompatíveis com a época em que vivemos atualmente.


     Quanto ao concubinato, tal expressão tem certo estigma e preconceito. “Concubina significa mais que a indicação de um determinado tipo de relação amorosa. Em nossa cultura ocidental, a palavra concubina tem um significado depreciativo, e só é usada para as mulheres, pois ninguém fala em concubino. Historicamente, concubinato traduziu uma relação menor, uma depreciação moral [14].


     Essa expressão tem um certo estigma moral, torna-se necessário que seja realizada a distinção de concubinato adulterino para concubinato não-adulterino, cuja a importância encontra seu fulcro na distinção de manter-se a coerência em nosso ordenamento jurídico com o princípio já aludido, que é o princípio da monogamia.


O concubino não-adulterino é então a união estável e o adulterino continua sendo o concubinato, assim consoante o art.1.727 do Código Civil, este condiciona em seu corpo que “As relações não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”[15].


Nota-se que ao invés de ser utilizada a expressão “adulterino” preferiu-se a utilização de “impedidos de casar”, desta forma aquelas pessoas que são separadas judicialmente, será impedida de casar, mas não o serão para caracterizar a união estável.


A relação adulterina pode ser considerada como a união de pessoa casada com terceiro, concomitantemente à convivência conjugal sendo denominada na doutrina de “concubinato”. [16]


Com aduzido no item 3 a etimologia da palavra conceito, bem como de união, faz-se necessária a etimologia da palavra concubinato, onde esta deriva de concubitos (cópula, coito), que é uma palavra latina, a qual significa comunhão de leito, ou seja, amasiamento com caráter sexual entre o homem e a mulher.[17]


A essa relação não foi concedido o status constitucional a que se realizou quanto à união estável, e, ainda além de não amparada pelo Estado, nem pelo ordenamento jurídico, sendo desconsiderada perante os olhos da sociedade. Ocorreu uma evolução legislativa no sentido de reconhecer a união estável se a pessoa casada for separada judicialmente ou de fato, mas até mesmo no concubinato as relações jurídicas poderão ocorrer e serão resolvidas pelo Direito das Obrigações, desta forma sendo afastado do Direito de Família, pois em função disso poderá ocorrer efeitos jurídicos da sociedade de fato.


Neste diapasão, cumpre salientar que em tempos atrás o concubinato era reprimido socialmente, em virtude da concubina ser aquela mulher que se “deitava” com um homem casado com a finalidade carnal, ficando evidente o fim sexual e ilícito nestas situações e, é por este motivo que não foi tutelada legalmente.


3.2 Princípio da boa-fé: direitos da concubina e princípio da    monogamia


A Constituição Federal  de 1988 , em seu artigo 226, §3º, utiliza a expressão “união estável”, em substituição a “concubinato”.


Como já visto no item anterior, a diferença do termo concubinato e união estável, e ainda a distinção do termo concubinato adulterino do concubinato não-adulterino.


O qual aluzimos que o concubinato não-adulterino é a união estável e o concubinato adulterino é o próprio concubinato[18]. Essa distinção entre concubinato e união estável faz-se necessária para manter a coerência com o princípio jurídico ordenador da momogamia[19].


Assim, os direitos e deveres da união estável haverão de ser buscados no Direito de Família, enquanto que o concubinato, ou seja, o adulterino paralelo ao casamento ou a outra união estável, para que seja mantida a coerência do nosso ordenamento jurídico se valerá da Teoria das Sociedades de Fato, sendo assim, buscada no campo obrigacional.


O ponto chave deste tópico seria tentarmos tutelar os direitos de relações de concubinato adulterino e ao mesmo tempo em que estaremos tutelando o  princípio da monogamia.


A doutrina majoritária e a jurisprudência não identificam as uniões paralelas como união estável.


Para nossa admirável Desembargadora Maria Berenice Dias, a solução para as relações de concubinato adulterino, estaria em buscar em juízo o reconhecimento de união estável ou de sociedade de fato[20], ou ainda indenização por serviços prestados.


Como bem menciona a nobre julgadora[21], a maneira de as mulheres[22] conseguirem obter alguma coisa, é alegar que desconheciam o casamento ou a outra união estável mantida pelo parceiro e que só mediante este fundamento (artifício), é admitida a presença de um concubinato putativo de boa-fé.


Em que pese a opinião da prestigiosa Desembargadora, entendemos contrariamente, pois se a concubina utilizar-se de artifícios para ter seus direitos tutelados, não poderíamos utilizar a expressão: “concubinato adulterino putativo de boa-fé”, pois, jamais seria de boa-fé, mediante artifícios.


Data Vênia, a relação constituída por duas pessoas, capazes e responsáveis por seus atos, a mulher que opta por relacionar-se com um homem impedido de se casar, em razão de já ser casado, deverá responsabilizar-se por sua escolha e suas consequências[23].  A responsabilidade de manter  um relacionamento paralelo, é dos dois companheiros, e asseguramente não beneficia nem um, nem o outro[24].


 Quem aceita ser acessório, nunca será principal[25].


     Nesse sentido, deixamos claro não tratar-se de hipocrisia em não reconhecer-se os direitos de relações paralelas, mas sim em sobepesarmos o princípio da monogamia, pois se tivermos tutelados pelo Estado as relações de concubinato adulterino, podemos então esqueçer o princípio da monogamia e adotarmos a bigamia.


Ademais, a tutela destes direitos dependerá do caso concreto[26], a medida em que sempre haverá situações em que a mulher (ou o companheiro) poderá ser enganado pelo parceiro, omitindo seu verdadeiro estado civil de casado. Nestes casos, há de se buscar os seus direitos, pois a parte enganada, não precisará utilizar-se de artifícios para conseguir ter reconhecido o mínimo necessário que se busca: o justo.


Como reconhecer a união estável


A união de pessoas de sexos diferentes, a merecer tutela é aquela formada por homem e mulher[27], que se reveste de continuidade, durabilidade e de publicidade.


Vários são os requisitos para que se aborde o tema união estável, os quais desdobram-se em aspectos objetivos e subjetivos, sendo eles: ordem objetiva: a) continuidade; b) publicidade; c) estabilidade ou duração prolongada; d);diversidade de sexos e) inexistência de impedimentos matrimoniais; e f) relação monogâmica[28], e de ordem subjetiva: a) convivência more uxório; b) affectio maritalis: ânimo ou objetivo de constituir família.


No tocante aos pressupostos de ordem objetiva, deverá ser Contínua[29] porque, uma relação espaçada[30] perde o caráter de união estável, os conviventes deverão demonstrar a intenção de viver juntos, enfatizando a durabilidade, a quebra de convivência será causa para dissolução da união entre os companheiros.


A relação deverá ser pública, ou seja, as relações secretas e sigilosas não cabem, a clandestinidade afasta a constituição de família[31].


Quanto a diversidade dos sexos é requisito intrínseco a união estável a diversidade de sexos, sendo considerado doutrinariamente a heterossexualidade, assim, havendo união entre pessoas do mesmo sexo, estas não se enquadraram na concepção e enquadramento legal de união estável, isto porque a união estável tem como requisito legal a união entre homem e mulher, ou seja, a lei é claramente taxativa, e assim devendo ser respeitado, consoante art.1.723 do Código Civil supra mencionado.


Em que pese tal entendimento, isso não descaracteriza a possibilidade do reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo, o que é salutar é que pessoas do mesmo sexo não se enquadram no conceito e enquadramento legal de união estável, porém nada as impede que sejam, perante nosso ordenamento jurídico reconhecidas, mas não sob a denominação de união estável e, é em cima disso que se montam divergentes pensamentos, os quais para nós, diante desta justificativa, encontram-se superados.


 Existe a motivação de inexistência de impedimentos matrimoniais, onde no §1º do art. 1.723 do diploma acima referido, que “se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521”, ressalvado o inciso VI, o qual vem a proibir expressamente o casamento das pessoas casadas, se houver separação judicial ou de fato.


A relação monogâmica, que será posteriormente exarada, estabelece que o vínculo do companheiro deve ser único, em face do caráter monogâmico da relação. Não se admite que pessoa casada, não separada de fato, venha a constituir união estável, nem que aquela que convive com um companheiro venha a constituir outra união estável[32].


Os pressupostos de ordem subjetiva, como a convivência more uxório, refere-se a uma comunhão de vidas, as quais se equiparam a de pessoas casadas, desta forma envolvendo a mútua assistência, seja moral, material entre outros aspectos e, sob este prisma há inúmeros motivos que evidenciem uma união estável entre o casal e, que, no entanto não compartilham do mesmo teto em função da vida que levam, como, por exemplo, por necessidade profissional.


Este é o ponto nevasto da questão, ou seja, se a coabitação é requisito para união estável. Do ponto de vista legal não houve expressa exigência. Na jurisprudência, a sua desnecessidade encontra-se praticamente pacificada[33], pelo próprio entedimento do STF, ao editar a súmula 382, que menciona:


 “ A vida em comum sob o mesmo teto more uxorio, não é indispensável a caracterização do concubinato”.


É correto o entendimento jurisprudencial de não considerar ser conditio sine qua non a convivência sob o mesmo teto entre os companheiros, pois como bem menciona Rodrigo Moretto[34], estamos diante de uma sociedade de complexidade estrutural , na qual a tecnologia , que tinha dentre outros intuitos fazer render o tempo, e, consequentemente aumentar o aproveitamento temporal e o ganho mercantil , trouxe como consequência uma aceleração desenfreada, reduzindo o tempo para uma instantaneidade que nunca é satisfatória, já que nos dá a impressão de tempo escasso.


     Se adotássemos o posicionamento doutrinário que exige a coabitação como requisito para união estável, não poderíamos reconhecer aqueles conviventes que por situações diversas, não coabitam, exemplo claro, seria aquele que um dos companheiros reside em outra cidade, pelo exercício da profissão, por ter passado em algum concurso público, como também nos casos de contingência pessoal ou familiar, o que por sua vez não descaracteriza a relação do casal e, que não impede que o companheiro (a) tenham seus direitos assegurados por terem durante um período de suas vidas passados lado a lado.


     Ressalva-se que o mais importante é a união do casal e não suas moradias, visto que vivemos em uma sociedade que a cada dia que passa, devido à sua cultura e tecnologia tem modificado consideravelmente, sendo de suma importância que a união seja revestida de estabilidade, logo que tenha a “aparência” de casamento isto o impossibilita de conviver em domicílio comum com sua companheira, mas não significa que deixe de prestar assistência, ou que tenha perdido o respeito, por ela.


O período mínimo exigido, pela lei 8.971/94, de 05 anos para reconhecimento da união estável, deixa de ser exigido, pela lei 9.278/96, pois, não é o tempo que deverá caracterizar uma relação, mas sim, outros elementos, como e respeito e consideração mútuos[35], assistência moral e material recíproca, dever de guarda, sustento e educação dos filhos, enfim, uma convivência pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituir família.


     Quanto ao affectio maritalis, este se refere ao fito de constituir família, o que é indispensável para que seja realizado o enquadramento da união estável, sendo desta forma, indispensável que haja afeto, o ânimo, a intenção e o intuito de constituir família, ou seja, a affectio maritalis. Compreende-se que seja cogente o ânimo, que se tenha o propósito de constituição familiar.


A união estável existe diante de constituição de família e não de simples objeto de constituição de família , pois, se fosse assim, o mero noivado ou namoro, em que somente o objetivo de constituir família seria equiparado a união estável[36].


Outra característica importante da união estável é que dispensa o formalismo para a sua constituição. Enquanto o casamento é precedido de um processo de habilitação, com publicação dos proclamas e inúmeras outras formalidades, a união estável, ao contrário, independe de qualquer solenidade, bastando o fato da vida em comum[37].


     Porém, recomenda-se, embora não exigido, que seja formalizada a constituição de um contrato escrito de convivência entre as partes, que servirá como marco de sua existência, vem como propiciar a regulamentação de regime de bens[38].


     A celebração do contrato de convivência poderá ser por escritura pública ou instrumento particular, levado ou não a cartório de registro de títulos e documentos, estabelecendo as relações patrimoniais e o regime de bens, que será o de separação, mas o mais importante é a manifestação bilateral de vontade.


Com segurança  só se pode afirmar que a união estável se inicia por vínculo afetivo, devendo se constituir um ambiente de fidelidade recíproca, estabelecida com a  constituição de família.


5 Regramento da união estável


5.1 Dos direitos e deveres


Quando tratar-se de discorrer a respeito dos direitos e deveres da união estável, é praticamente impraticável que não se comente a cerca do casamento, pois ambos os institutos são alvos importantes para se tratar de seus direitos e deveres merecedores de uma tutela especial por parte do Estado. Verifica-se haver praticamente uma simetria entre ambas.


O casamento é mais que união estável, realidades distintas. A união estável é mais que a união livre. Equívoco dizer-se nos dias correntes, que a precariedade informa a união livre, despida do sentido da comunhão. A contrário, se o significado do casamento é determinado pela lei (embora deva ser dado pelo liame afetivo entre os cônjuges), é na ausência da imposição legal que pode localizar-se o sentido da vida em comum[39].


No concubinato era definido de forma jurídica quando este era desfeito, diversamente do que ocorre com o casamento e com a união estável. O concubinato não era reconhecido anteriormente como família, era apenas uma sociedade de fato, mas não conjugal. Enquanto que a união estável é considerada como família, de forma a ser reconhecido que não apenas com o casamento que se é possível de reconhecer como sendo uma família. Assim, é diáfano que a Constituição Federal estabeleça que as uniões estáveis são aquelas suscetíveis de conversão em casamento.


Aos companheiros são estabelecidos deveres de lealdade, respeito e assistência (1.724), enquanto, no casamento, os de fidelidade recíproca, vida em comum no domicílio conjugal e mútua assistência (1.566). As duas têm uma comum obrigação de guarda, sustento e educação dos filhos. Há quase uma simetria entre ambos. As duas são estruturas de convívio que tem origem em um elo afetivo. A divergência diz só com o modo de constituição. Enquanto o casamento tem seu início marcado pela celebração do matrimônio, a união estável não tem termo inicial estabelecido [40].


Assim, verifica-se que os direitos e deveres são um pouco diferenciados, pois um dos deveres do casamento é a vida em comum no domicílio conjugal, enquanto que na União Estável este requisito não é verificado, como já visto anteriormente, independe viver sob o mesmo teto para configurar uma União Estável, o que também não era disciplinado a cerca do reconhecimento do concubinato. A própria súmula 382 do STF[41] dispensou a necessidade dos concubinos viverem debaixo do mesmo teto. Ocorre que esta súmula deve ser estendida a União Estável, apesar da ausência de disciplina legal, isto porque a jurisprudência tem reconhecido o relacionamento quando o casal não residir no mesmo imóvel.


Na União Estável o que é imposto por nosso ordenamento jurídico é que o casal unido estavelmente tenha o dever de lealdade, inexistindo a obrigação de fidelidade, bem como a vida em comum sob o mesmo teto, e desta forma se não existe a obrigatoriedade de fidelidade na União Estável, em ocorrendo de um companheiro ter outra união paralela, isso não irá desconfigurar nenhuma delas.  Na desconstituição da União Estável não é necessário que aja interferência judicial, pois esta união terá sido considerada como extinta quando chegar ao término da convivência e, isso porque a sua extinção é exatamente igual ao seu início, cabendo salientar que na União Estável não perquiri a culpa, desta forma inexistindo a imposição de sanções. Em acontecendo dos deveres não terem sido cumpridos não haverá necessidade de afastar o reconhecimento da existência da entidade familiar.


No tocante aos deveres de guarda, sustento, educação dos  filhos, é possível de ser vislumbrado no Estatuto da Criança e do Adolescente, pois é despicienda novas referências se os genitores não forem casados, assim, o que se verifica é que independentemente de haver casamento, isso não irá diminuir a responsabilidade daqueles que são responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento da criança.


Encontramos certos regulamento no Código Civil, os quais são relativos aos deveres, como por exemplo, o art. 1724 que assim expressa:


 “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”


Os três primeiros são direitos e deveres recíprocos, vindo em seguida os de guarda, sustento e educação dos filhos. O dever de fidelidade recíproca está implícito nos de lealdade e respeito. Embora o Código Civil não fale em adultério entre companheiros, a lealdade é gênero de que a fidelidade é espécie. E o dispositivo em apreço exige que eles sejam leais[42].


Nesse sentido, temos o entendimento do ilustre Guilherme Calmon Nogueira da Gama, que assim se afere: “ao lado do casamento, o companheiro também impõe o dever de fidelidade a ambos os partícipes, e não apenas a um deles, ante a regra constitucional já analisada. Tal conclusão se afigura coerente com os contornos traçados pela doutrina e pela jurisprudência na caracterização do companheirismo que, repita-se, deve ser único vínculo que une o casal em perfeito clima de harmonia e estabilidade. Não haveria a configuração do companheirismo na hipótese de prática desleal perpetrada por um dos companheiros, mantendo conjunção carnal com terceiro, inexistindo a denominada affectio maritalis no caso específico[43].


Ao falarmos em dever de respeito, neste compreende-se o entendimento de que deve ser mútuo, e que consiste em se respeitar o espaço um do outro, não devendo haver ofensa aos direitos da personalidade do companheiro, os quais residem na seara da liberdade, intimidade, dignidade, honra, entre outros aspectos.


Quanto a assistência, esta também deverá ser mútua, como bem expressa o art. 1.566,III do Código Civil:


 “São deveres de ambos os cônjuges:


III- mútua assistência”[44].


Neste diapasão é que entende o Superior Tribunal de Justiça[45], que na obrigação de prestar alimentos quando for entre os companheiros que se encontrem necessitados, os alimentos deverão ser implementar a renda do cônjuge com dificuldade e, isso porque o dever de solidariedade não está vinculado apenas com os deveres do casamento, mas sim na convivência entre pessoas que não sejam do mesmo sexo e que mantenham um relacionamento afetivo, o qual não precisa necessariamente ser sob mesmo teto, como dito anteriormente.


Já a guarda, é ao mesmo tempo um direito e um dever que decorre dos pais, desta forma em havendo separação destes, aquele que tiver melhores condições, e aqui se inclui o binômio necessidade e possibilidade, ou seja, aquele que enquadrar-se neste binômio prestará assistência alimentar aquele que assim necessitar. A obrigação de sustento aos filhos irá subsistir após o rompimento da União Estável, e não apenas a obrigação de sustento que irá subsistir assim como a orientação moral e educacional, pois tal obrigação independe de casamento dos pais e da subsistência da união conjugal ou estável. Quando referida a obrigação de fornecimento de educação aos filhos, esta compreende o ensinamento escola, e não só ele, como também os cuidados com as lições e o aprendizado, como também o devido cuidado que os pais deverão ter no desenvolvimento e formação cultural, e moral da criança.


     Quanto aos direitos intrínsecos aos companheiros, para a entidade familiar da União Estável, ressaltamos, entre homem e mulher, abarca a complexidade dos direitos pessoais e aqueles de natureza patrimonial, entre outros, mas os que merecem certo destaque são os direitos fundamentais dos companheiros, no plano material, os concernentes a alimentos, meação e herança.


5.2 Do impedimento


Assim como ocorre impedimentos para algumas hipóteses de casamento, previsto no artigo 1521[46], CC/02, temos os mesmos impedimentos para a União Estável, previsto no artigo 1723, § 1º, do mesmo diploma legal.


Neste caso, temos um contra-senso pelo legislador, que colocou causas impeditivas para união estável, mesmo que a relação se constitua, pois, como vamos poder dar impedimentos para uma união, que ninguém poderá impedir que ocorra?


Exemplo claro, seria a relação de ascendentes ou descendentes se unirem estavelmente. Que esta relação seria imoral e ilegal, todos nós sabemos, mas não a meios para impedir sua formação, portanto não há de falar em impedimentos para estes casos, mas sim apenas para aqueles que levarem o reconhecimento da união estável  à registro ou ao judiciário.


No casamento, teríamos a anulação deste, e anulável, os efeitos da sentença retroagem à data da celebração. Na União estável, não temos como controlar estas uniões.


Ao nosso sentir, constitui posicionamento correto do judiciário, em não tutelar estas demandas, pois, como já explicado em tópico anterior, pessoas capazes que entram num relacionamento imoral (irmão que se relaciona com irmã, ou pessoas que já possuem vínculo matrimonial), não podem ser tratadas como se vítimas fossem, e sim, deverão responsabilizar-se por suas escolhas.


Sucessão do companheiro


Ao abordar a temática sucessória no âmbito da união estável, verifica-se que o código de 2002, preserva a meação, o que não deve ser confundido com a herança, daquele companheiro sobrevivente, em virtude de se tratar de regime de comunhão parcial de bens, como bem disciplina o art. 1.725. Assim, quanto à herança, os direitos sucessórios limitam-se, consoante art.1.790 ao seguinte:


 “aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável”


O direito sucessório, restrito a uma quota determinada por lei ao filho, se concorrerem com filhos comuns, ou à metade do que couber a cada um dos descendentes que forem exclusivos do autor da herança, e isso, se somente com eles concorrer, podendo ser a um terço daqueles bens se concorrer com parentes sucessíveis, como por exemplo, ascendentes, irmãos, sobrinhos, tios e primos do de cujos, ou à totalidade da herança no caso de não haver parentes sucessíveis, conforme dispõe o art. 1.790, I a IV do NCC.


O código de 2002 restringe o direito hereditário aos bens adquiridos de maneira onerosa durante a união estável, e impôs a concorrência do cônjuge sobrevivente com os descendentes, ascendentes, bem como até os colaterais do de cujos.


Assim, o que fica saliente é um enorme retrocesso no tocante a seara dos direitos relativos a união estável, e isso em função de pela Lei nº 8.971/94 ter estabelecido que o companheiro tinha direito a receber toda a herança na falta dos descendentes e ascendentes. Desta forma, o artigo supra citado, estabelece que apenas receberá a totalidade dos bens que forem adquiridos onerosamente durante a vigência da união estável, e isso, se não houver parentes, descendentes, ascendentes, bem como colateral até o quarto grau.


Esse tratamento não deixa de ser considerado com desigual, em relação as famílias matrimonializadas, onde o cônjuge  sobrevivente figura em terceiro lugar na ordem hereditária, afastando, desta forma, os colaterais do de cujus.


O código de 2002, estabelece que o companheiro que sobrevive, que tenha constituído família, irá herdar, sozinho, no caso de não existirem descendentes, ascendentes, e, nem colaterais até o quarto grau. E ainda, como se não fosse tão inoportuno tal entendimento legislativo exarado nas páginas do código, o cônjuge sobrevivente irá herdar o patrimônio apenas se este patrimônio tiver sido adquirido na constância da união estável. Do contrário, nada herdará, mesmo que não tenha, o de cujus parentes sucessíveis.


Isto posto, requeremos que tais desigualdades sejam estimuladas no sentido de se obter avanços no âmbito não só da união estável em si, mas dos relacionamentos como um todo, de forma a fazer com que os companheiros e companheiras, sejam a que título de relacionamento se encontrarem, não sejam desconsiderados perante uma lei que não atende as demandas sociais contemporâneas e, os avanços salutares do indivíduo.


6.1 Crítica ao tratamento desigual do código


O reconhecimento da união estável trata ser um reconhecimento de relevância, o qual não era contemplado pelo código civil de 1916, mas que foi amparado pela Lei nº 8.971/94 e alterada pela Lei nº 9.278/96 e foi definida como sendo uma união entre homem e mulher que convivam de maneira duradoura, contínua e pública e, que tenha o condão de constituir família.


Neste diapasão, verificamos que o legislador teve objetivo de legitimar apenas os indivíduos que se enquadrassem em tal conceito, de forma que as relações extramatrimoniais, ou seja, aquelas relações adulterinas não se enquadram em tal definição, mas somente aquelas que preencham os requisitos supra referidos e, que não tenham impedimentos.


Contudo, embora tratar-se de evolução no sentido de haver amparo legal e enquadramento da união estável no código civil de 2002, há que discutir o tratamento desigual do código, que é nada mais nada menos do que fruto de uma herança.


Em que pese tenha havido evoluções no âmbito do reconhecimento, verificamos que quanto aos homossexuais esta não ocorreu, com isso a evolução não foi completa, pois não abrangeu todas as necessidades sociais. Outro aspecto relevante é a atrofia legislativa em ter estabelecido que a união estável necessite de reconhecimento judicial. O código de 2002 manteve a possibilidade da celebração de um contrato escrito, que é um instrumento onde o casal de uma união estável promove os seus reflexos, e esse contrato, necessariamente precisa ser escrito, de forma a ser revelado como ato solene e, devendo ser levado ao Cartório de Títulos e Documentos, não que seja necessariamente obrigatório este procedimento, mas sim que em assim sendo, é mais fácil que depois, caso haja uma separação, se comprove a situação de convivência de união estável, ou seja, servirá para uma questão de prova.


Assim, o casal que vive em união estável poderá celebrar contrato por escritura pública ou instrumento particular, e desta forma, estabelecer quanto ao regime de separação.


Um dos tratamentos desiguais do código de 2002, é em função de que o contrato sendo escrito na união informal não comporta o mesmo caráter de peso que tem um contrato conjugal, e, esse contrato não abarca os bens anteriores a união, e isso porque um mero contrato escrito não equivale ao pacto antenupcial da comunhão total de bens das pessoas casadas. Neste diapasão, entendemos ser desigual tal tratamento, e além de desigual existe um vácuo deste entendimento, no sentido de existir para que é casado tal possibilidade e não existindo para aqueles que vivem em união estável.


Todo entendimento tem sua gênese na idéia primordial, a qual não vem sendo utilizada, de que as relações entre pessoas que configurarem união estável, deveriam ter os mesmos direitos, deveres e, obrigações daquelas que são casadas, isto porque não é o fato de mudar a nomenclatura que mudará o sentimento entre as pessoas e seu relacionamento, que por maioria das vezes pode ser considerado como sendo melhor do que aquelas pessoas casadas.


Um viés de suma importância reside na disposição do Código Civil quando ele menciona que a união estável é entre homem e mulher, pois isso afasta, no tocante a estrutura legislativa, a possibilidade de homossexuais viverem em união estável. É, tal situação desigual?


Cremos que sim, pois no influxo das necessidades e mudanças que ocorrem na sociedade atual, o Código fecha os olhos para as condutas humanas diversas daquelas estabelecidas e amparadas por ele, o que significa dizer que é um tratamento desigual.


Por que a necessidade de comprovar a união estável? Por que não comprovar o casamento? Por que ele já é comprovado por ser solene?


O casamento já é um ato em si que exige comprovação, e por isso diverge da união estável, ocorre que existem muitos casais, casados, mas que em realidade a convivência não é de um casamento, enquanto que na união estável, um casal, que não é casado, mas vive em união estável, pode viver em condições mais dignas e equiparadas a de um casamento. Para tanto é necessário se rever certos conceitos e tratamentos que o Código Civil dispõe.


O importante são os laços estreitados pelo relacionamento, seja ele entre pessoas casadas, seja ele entre pessoas que convivam em união estável, e até mesmo aqueles que são afastados de tal entendimento de união estável por se tratarem de pessoas do mesmo sexo.


Há que se rever os conceitos e acompanhar as evoluções geradas pela sociedade, para assim definir respectivos entendimentos.


6.2 Crítica ao abandono do termo “ estado civil”


A terminologia “estado civil” serve para expressar a situação atual em que a pessoa se encontra no tocante ao relacionamento, assim, se a pessoa é casada receberá a nomenclatura de casado(a), se a pessoa for solteira, a nomenclatura será solteira, em sendo “solteira” mas perante a lei ser casada, receberá o atributo de casada. E se o casal viver em união estável, que irá responder? Tal dúvida merece destaque, visto ter sido esquecida dentre os diversos aspectos tratados pela união estável.


Contudo, resta a nós tratar de tal questionamento, assim, se a pessoa vive em união estável a aproximadamente, por exemplo, vinte anos, dirá que é solteira. Ocorre que tal resposta não condiz com a realidade e, tal realidade deve ser atualizada.


Foi pensando nisso que, o deputado Fernando Giacobo do PL-PR apresentou o projeto de lei nº 1.779/03, para a possibilidade de alteração do termo criando o estado civil denominado “convivente” para aqueles que vivem em união estável, assim será possível que o casal registre em cartório a sua união e troque o regime de divisão de bens.


O projeto de lei nº 1.779/03 acrescenta dispositivo à lei nº 10.406/02, que dispões a respeito do estado civil dos companheiros que vivem em união estável e estabelece, em seu art. 1º que disporá a respeito do estado civil dos companheiros na união estável. No art. 2º, registra que o art. 1.723 da Lei nº 10.406/02, a qual instituiu o Código Civil, passando a vigorar acrescido do §3º, o qual dispõe que os companheiros adotarão o estado civil de conviventes.


Contudo, é de suma importância que seja realizada uma reflexão acerca do disposto na Constituição Federal de 1988, a qual garantiu a família a proteção por parte do Estado, de forma a pluralizar a entidade familiar, reconhecendo a dignidade jurídica a união estável, como resta demonstrado no art.226, §3º, CF/88.


A união estável que tem sua gênese originada no mundo dos fatos, é atualmente regulamentada pelo Código Civil de 2002, e tal regulamentação envolve a relação entre os companheiros, dando algumas características básicas para a configuração de tal nomenclatura, como exposto anteriormente ao mencionarmos a questão relativa aos requisitos básicos para configuração de uma união estável.


Assim, quando relacionamos o casal que vive estavelmente, com a s instituições, seja no plano econômico como na seara pessoal, observamos que inexiste um estado civil considerado específico para designar as situações que envolvam os companheiros unidos estavelmente, assim, ficam a mercê de denominação específica, e desta forma sendo considerados como solteiros, viúvos, divorciados, separados judicialmente.


Essa circunstância aborígene traz preocupações. E isso, porque necessitam de um estado civil específico, desta forma, o que se incita é que seja aprovado esse projeto de lei de forma a acompanhar a necessidade social, que por sua vez, carece de tal nomenclatura.


7. Conclusão.


O presente trabalho não consegue aprofundar-se em tema tão amplo e discutido atualmente.


Muito já foi feito, mas muito ainda resta a ser feito e consolidado, achamos de bom alvitre sugerir ao legislador algumas modificações pertinentes à relação estável entre homem e mulher.


Cremos que deveria existir um “estado civil” para as uniões estáveis, seria de grande valia para a sociedade, para os negócios jurídicos, para um terceiros de boa-fé , que por ventura tenha seu direito lesado ao adquirir algum tipo de patrimônio que possam estar com impedimentos, por desconhecer que o proprietário ,vive em união estável, e aliena o bem sem anuência da companheira.


A retirada do estabelecimento de no mínimo 5 anos para configuração da União Estável, é uma grande evolução, pois não é o tempo que dirá se a relação é ou não união estável, mas todos os seus requisitos, já vistos.


Não podemos esqueçer que o direito destina-se a disciplinar as relações humanas para o convívio harmônico e para o bem estar do homem, nada tem valor se não tiver em função do homem, por isso, as regras devem ter como foco principal o fato social, com três ferramentas fundamentais: humanismo, solidariedade e afeto.




Bibliografia:

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– RODRIGUES, Celso. Assembléia Constituinte de 1823- Idéias Políticas na Fundação do Império Brasileiro. Curitiba. Jiruá. 2004.

– SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica  e Concretização Judicial. Sérgio Antônio Fabris.



Notas:

[1] FEITOSA, Maria Luisa de Alencar. Concubinato e União Estável. Revista Âmbito Jurídico.

[2] GARCEZ, Christianne. Direito de Família. Rio de Janeiro. Elsevier. 2005. P.185.

[3] Nesse sentido: A condição fundamental para o exercício do poder patrimonial reside na existência de um grupo estamentalmente privilegiado. RODRIGUES, Celso. Assembléia Constituinte de 1823- Idéias Políticas na Fundação do Império Brasileiro. Curitiba. Editora Jiruá. 2004. P. 39.

[4] PEREIRA, Rodrigo da Cunha e DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o Novo Código civil. Belo Horizonte. 2005. P. 224.

[5] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Da União Estável. Belo Horizonte. 2005. P. 263.

[6] CARDOSO, Simone Tassinari. Do Contrato Parental à Socioafetividade. P. 94.

[7] Nesse sentido: A tecnologia, trazendo a conectividade, a hipertextualidade e a interatividade, inclui uma aceleração, que irá se refletir na velocidade com que se mudam as instituições sociais, desde a família até o Estado. MORETTO, Rodrigo. Crítica Interdisciplinar da Pena de Prisão- Controle do Espaço na Sociedade do Tempo. Editora Lumen Juris. Rio de Janeiro. 2005. P. 79.

[8] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. Livraria/editora do Advogado. 2005. P.162.

[9] COSTA JÚNIOR, Dijosete Veríssimo. União Estavel: o reconhecimento da existência do amor e da entidade familiar. (www.jusnavandi.com.br- acesso em 21/10/05  às 02:10h).

[10] Cabe mencionar: o princípio da interpretação conforme a constituição seja considerado como princípio de conservação dos textos de normas com fulcro no princípio geral vertical da hierarquia  das normas em principal, complementa de forma autônoma disposições normativas. A interpretação conforme a constituição não depende só, portanto, de se reclamar por princípios básicos de interpretação constitucional, porém, pela possibilidade para uma compreensão sobre a posição do trabalho dos juristas, tanto teórico, quanto prático, pois deve vincular o princípio do Estado Democrático de Direito. SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica e Concretização judicial. Editor Sérgio Antônio Fabris. P. 376.

[11] SILVA, De Plácido e, “Vocabulário Jurídico”. Ed: Forense,23º edição. Rio de Janeiro.

[12] JÚNIOR, Dijosete Veríssimo da Costa, bacharel em Direito em Natal (RN). União estável: o reconhecimento da existência do amor e da entidade familiar.( www.jusnavigandi.com.br . Acesso em 21/10/2005 às 2h10min).

[13] CARDOSO, Simone Tassinari- Do Contrato Parental à Socioafetividade. Estudos de Direito Civil-Constitucional. Vol.2 pg.95.

[14] DIAS, Maria Berenice- PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família e o Novo Código Civil.4º ed. rev. Atual. Pg.223 e 224. Belo Horizonte: Del Rey 2005.

[15] Com o advento do projeto de Lei nº 6.960/02, este trouxe uma nova redação, a qual reconhece a possibilidade da sociedade de fato ser reconhecida com a aplicação  das regras de contrato da sociedade.

[16] GARCEZ, Christianne. Direito de Família.pg.189. Rio de Janeiro:Elsevier,2005.

[17] Idem 8.

[18] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Da União Estável. p. 224.

[19] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Da União Estável. p. 224.

[20] Primeiramente a justiça começou a reconhecer  a existência de uma sociedade de fato, onde os companheiros eram considerados como sócios, dividindo somente os “lucros”, maneira de se dividir os bens.

[21] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito de Família. P. 184.

[22] Usa-se o gênero mulher, já que a maioria das relações paralelas é tida pelos homens.

[23] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Da União Estável. P. 225

[24] Verificar Jurisprudência STJ: 4º Turma. Nº 684407/RS.

[25] DAHER, Marlusse Pestana. União Estável (www.jusnavegandi.com.br- acesso em: 22/10/05)

[26] Jurisprudência: 4º Cartório de Família e Sucessões. Processo nº: 106994594.

[27] Nesse sentido: Na sociedade contemporânea evidencia-se a existência de relações homossexuais. Tais questões apesar de não normatizadas no nosso ordenamento jurídico brasileiro, necessitam de definições por parte do Poder público. O Poder judiciário vem construindo pela jurisprudência, conceitos jurídicos a serem aplicados. KRAEMER, Verno Eduardo. Graduando do curso de direito do Centro Metodista IPA. União Estável entre homossexuais. Publicado em 2002.

[28] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI, pg. 540. São Paulo, ed. Saraiva 2005.

[29] Relação contínua significa, preferencialmente, ininterrupta. GARCEZ, Christianne. Direito de Família. p. 193.

[30] O namoro na adolescência e o reencontro após 10, 15 anos, não contribuem com estabilidade, são relações distintas.

[31] Para o casamento é exigido o requisito de publicidade. Artigo 1534, CCB/02.

[32] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume VI, pg. 548. São Paulo, ed. Saraiva,2005.

[33] GARCEZ, Christianne. Direito de Família. P. 194.

[34] Crítica interdisciplinar da Pena de Prisão- Controle do Espaço na Sociedade do Tempo. P. 81

[35] Podemos incluir neste âmbito a fidelidade entre ambos.

[36] GARCEZ, Christianne, citando Regina Beatriz Tavares da Silva. Direito de Família. P. 194.

[37] GONÇALVES, Carlos Roberto. Da União Estável. Editora Saraiva. São Paulo. 2005. P. 538.

[38] Idem.

[39] FACHIN, Luiz Édson. Direito de família: Elementos críticos à luz do novo código civil brasileiro. Ed: Renovar. Rio de Janeiro- São Paulo. pg. 94. 2003.

[40] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias.2edição, pg 171 e 172, ed: Livraria do advogado, Porto Alegre,2005.

[41] Súmula 382 do STF: A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do concubinato.

[42] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. São Paulo, ed: Saraiva. 2005. pg 550.

[43] O companheirismo, p.232.

[44] Isto implica dizer que ambos os cônjuges deveram prestar assistência uns aos outros, o que significa que deverão se auxiliar reciprocamente, incluindo-se aqui a prestação de socorro material, bem como as demais assistências vindouras do cotidiano, e da relação de ambos. Há o dever de assistência imaterial, que compreende ser a solidariedade.

[45] STJ. REsp 186.013-SP,4ºT., rel. Min. Fernando Gonçalves,DJU,8-3-2004.

[46] “Não podem casar:

I-   Ascendentes com descendentes, seja o parentesco natural ou civil;

II-  Os afins em linha reta;

III- O adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;

IV- Os irmãos unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;

V- O adotado com o filho do adotante;

VI- as pessoas casadas;

VII- O cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte”.


Informações Sobre os Autores

Thais Zanetti de Mello

Estagiária da Justiça Federal do Rio Grande do Sul, Graduanda do 9º sem. do curso de Direito do Centro Universitário Metodista IPA.

Liziane dos Santos

Assessora Parlamentar na Assembléia Legisltiva do Rio Grande do Sul, Graduanda do 9º sem. do curso de Direito do Centro Universitário Metodista IPA


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