1-
Introdução: a identidade nacional
A formação do Estado moderno a
partir do século XV ocorre após lutas internas onde o poder do Rei se afirma
perante os poderes dos senhores feudais, unificando o poder interno, unificando
os exércitos e a economia, para então afirmar este mesmo poder perante os
poderes externos, os impérios e a Igreja. Trata-se de um poder unificador numa
esfera intermediária, pois cria um poder organizado e hierarquizado
internamente, sobre os conflitos regionais, as identidades existentes
anteriormente a formação do Reino e do Estado nacional que surge neste momento
e de outro lado se afirma perante o poder da Igreja e dos Impérios. Este é o
processo que ocorre em Portugal, Espanha, França e Inglaterra.[1]
Destes fatos históricos decorre o
surgimento do conceito de uma soberania em duplo sentido: a soberania interna a
partir da unificação do Reino sobre os grupos de poder representados pelos
nobres (senhores feudais), com a adoção de um único exército subordinado a uma
única vontade; a soberania externa a partir da não submissão automática à
vontade do papa e ao poder imperial (multi-étnico e descentralizado).
Um problema importante surge neste
momento, fundamental para o reconhecimento do poder do Estado, pelos súditos
inicialmente, mas que permanece para os cidadãos no futuro estado constitucional:
para que o poder do Rei (ou do Estado) seja reconhecido, este Rei não pode se
identificar particularmente com nenhum grupo étnico interno. Os diversos grupos
de identificação pré-existentes ao Estado nacional não podem criar conflitos ou
barreiras intransponíveis de comunicação, pois ameaçarão a continuidade do
reconhecimento do poder e do território deste novo Estado soberano. Assim a
construção de uma identidade nacional se torna fundamental para o exercício do
poder soberano.
Desta forma, se o Rei pertence a uma
região do Estado, que tem uma cultura própria, identificações comuns com a qual
ele claramente se identifica, dificilmente um outro grupo, com outras
identificações, reconhecerá o seu poder. Assim a tarefa principal deste novo
Estado é criar uma nacionalidade (conjunto de valores de identidade) por sobre
as identidades (ou podemos falar mesmo em nacionalidades) pré-existentes.[2]
A unidade da Espanha ainda hoje está, entre outras razões, na capacidade do
poder do Estado em manter uma nacionalidade espanhola por sobre as
nacionalidades pré-existentes (galegos, bascos, catalães, andaluzes,
castelhanos, entre outros). O dia que estas identidades regionais prevalecerem
sobre a identidade espanhola, os Estado espanhol estará condenado a dissolução.
Como exemplo recente, podemos citar a fragmentação da Iugoslávia entre vários
pequenos estados independentes (estados étnicos) como a Macedônia, Sérvia,
Croácia, Montenegro, Bósnia, Eslovênia e em 2008 o impasse com Kosovo.
Portanto a tarefa de construção do
Estado nacional (do Estado moderno) dependia da construção de uma identidade
nacional, ou em outras palavras, da imposição de valores comuns que deveriam
ser compartilhados pelos diversos grupos étnicos, pelos diversos grupos sociais
para que assim todos reconhecessem o poder do Estado, do soberano. Assim, na
Espanha, o rei castelhano agora era espanhol, e todos os grupos internos também
deveriam se sentir espanhóis, reconhecendo assim a autoridade do soberano.
Este processo de criação de uma
nacionalidade dependia da imposição e aceitação pela população, de valores
comuns. Quais foram inicialmente estes valores? Um inimigo comum (na Espanha do
século XV os mouros, o império estrangeiro), uma luta comum, um projeto comum,
e naquele momento, o fator fundamental unificador: uma religião comum. Assim a
Espanha nasce com a expulsão dos muçulmanos e posteriormente judeus. É criada
na época uma polícia da nacionalidade: a santa inquisição. Ser espanhol era ser
católico e quem não se comportasse como um bom católico era excluído.
A formação do Estado moderno está,
portanto, intimamente relacionado com a intolerância religiosa, cultural, a
negação da diversidade fora de determinados padrões e limites. O Estado moderno
nasce da intolerância com o diferente, e dependia de políticas de intolerância
para sua afirmação. Até hoje assistimos o fundamental papel da religião nos
conflitos internacionais, a intolerância com o diferente. Mesmo estados que
constitucionalmente aceitam a condição de estados laicos têm na religião, uma
base forte de seu poder: o caso mais assustador é o dos Estados Unidos,
divididos entre evangélicos fundamentalistas de um lado e protestantes liberais
de outro lado. Isto repercute diretamente na política do Estado, nas relações
internacionais e nas eleições internas. A mesma vinculação religiosa com a
política dos Estados podemos perceber em uma União Européia
cristã que resiste a aceitação da Turquia e convive com o crescimento da
população muçulmana européia.
O Estado moderno foi a grande
criação da modernidade, somada mais tarde, no século XVIII, com a afirmação do
Estado constitucional.
Ao contrário do que alguns
apressadamente anunciam, o Estado nacional não acabou, ainda será necessário
por algum tempo, assim como a modernidade está aí, com todas as suas criações,
em crise sim, mas sem podermos ainda visualizar o que será a pós-modernidade
anunciada e já proclamada por alguns. Estamos ainda mergulhados nos problemas
da modernidade.
A discussão da soberania e a sua
reconceituação diante do federalismo em um primeiro momento e agora diante da
União Européia, a globalização e o mega poder econômico das corporações
privadas é um dos grandes temas contemporâneos. Outro tema que permanece atual
com maior complexidade é a questão da identidade e das identificações dos
grupos sociais em grandes metrópoles e com a evolução das comunicações que
criam espaços e sociedades multidentitárias.
As grandes metrópoles se
transformaram em espaços cosmopolitas onde diversos grupos sociais com
diferentes valores de identificação coletiva convivem em uma cultura por vezes
de tão grande tolerância que se transforma em indiferença. Uma
mesma pessoa pode se identificar com grupos sociais diversos e muitas vezes
contraditórios como, por exemplo, a identificação criada a partir do gênero, da
cor, de classe, de trabalho e corporação, da origem étnica, de opções
religiosas ou filosóficas e assim por diante. A identificação com os valores
nacionais é apenas mais um dado.
Outro fator importante é que nas
sociedades democráticas e tolerantes, as identificações originais do Estado
nacional que foram fundadas sobre a intolerância com o diferente, a
intolerância religiosa, de cor, étnica, deve perder espaço para uma identidade
construída sobre a aceitação de valores comuns em meio a diferença como
especialmente deve ser a identificação com uma série de direitos fundamentais
ou mesmo de direitos humanos que se tornam cada vez mais aceitos pelas pessoas
em um maior numero de culturas e de sociedades.
Isto significa que a identidade em
sociedades democráticas e tolerantes, cosmopolitas, deve se dar em torno do
reconhecimento de direitos que são construídos sobre valores fundantes das
sociedades modernas como a vida, a liberdade, a igualdade e a justiça. Já
discutimos muito em outros textos, e não podemos ignorar isto agora, que estas
palavras que constituem princípios jurídicos, têm significados diferentes em
momentos históricos e culturas diferentes. Entretanto, ocorre cada vez com maior
intensidade a partir do crescimento urbano, da ampliação dos espaços
metropolitanos e o avanço das comunicações, a construção de significados que se
aproximam, como se ocorresse uma sintonia fina que vai evoluindo com o tempo, à
medida que a comunicação entre as culturas e os grupos sociais aumenta.
A identificação sobre a qual
construímos o nosso país, não é e não pode ser a religião, nem o idioma ou a
cor ou a etnia, mesmo porque somos um país plural em todos os sentidos. A
identificação sobre a qual podemos construir uma sociedade tolerante, livre e
justa é a identificação com o sistema de direitos fundamentais expressos em
nossa constituição. Neste momento surge um novo problema: isto ocorre? Se isto
não ocorre como conquistar?
É comum ouvirmos, muitas vezes, que
temos direitos demais e poucos deveres. Outras bobagens deste tipo surgem com
freqüência. Vivemos em uma sociedade onde ocorre o aumento da criminalidade e a
solução que surge de forma irresponsável na boca de muitos, seja porque
acreditam, seja porque querem votos, é de que devemos aumentar as penas,
reduzir a idade penal, criar novos tipos penais e outros absurdos. Neste
momento devemos nos perguntar em que as reflexões aqui desenvolvidas podem nos
ajudar a compreender e solucionar este problema. Ora, se não podemos, ou
melhor, não devemos mais construir uma identificação comum, que sustente o
reconhecimento do poder do estado e suas normas jurídicas de caráter geral,
fundada em identidades étnicas, cor, religião, pois estaríamos criando uma sociedade
excludente e intolerante; se devemos em sociedades democráticas, plurais e
tolerantes, construir uma identificação coletiva que permita o reconhecimento
da autoridade do Estado, e logo, o cumprimento de suas leis, fundada em um
pacto de respeito aos direitos fundamentais históricamente reconhecidos; logo,
para que nesta sociedade democrática haja coesão social e respeito é necessário
que todos participem da sua construção assim como todos tenham seus direitos
constitucionais respeitados.
Diante disto tudo, podemos
perguntar: todos os brasileiros têm seus direitos constitucionais respeitados?
Será que um brasileiro que nunca teve seus direitos respeitados, não teve
acesso à escola, e ou à saúde, não teve respeito a sua dignidade, uma moradia,
saneamento básico, uma família estável, um salário justo; será que um
brasileiro que é constantemente desrespeitado na sua liberdade de locomoção, é
preso arbitrariamente por ser pobre, é despejado por não ter salário, é
humilhado, jogado no chão, pisado na cara, revistado, chamado de vagabundo,
este brasileiro que nunca teve nenhum direito constitucional, vai se sentir
parte desta sociedade e vai se reconhecer neste sistema de direitos.
Não me refiro aqui a ruptura do
pacto social com a criminalidade. A questão da criminalidade não é só esta e a
grande criminalidade não é praticada pelos pobres, as comunidades mais simples
são, na sua esmagadora maioria formadas por pessoas que respeitam seu acordos e
pactos. Estou falando de reconhecimento ou não do sistema de direitos. Estou
falando de uma sociedade que parece cada vez mais cindida entre pobres e ricos.
Este fenômeno é mais claro em países como a Venezuela, Bolívia e Equador.
Recentemente governos identificados com as reivindicações dos pobres foram
eleitos nestes países. Obviamente, para a compreensão histórica da pobreza
nestes países e necessário levar em considerações questões étnicas e culturais
além do capitalismo corrupto e cartorial. A histórica exclusão dos povos
indígenas e dos negros em medidas diferentes nestes países levou ao fato de que
esta população pobre seja majoritariamente de indígenas (na Bolívia e Equador)
e indígenas e negros na Venezuela. A grave divisão da população entre pobres e
ricos faz com que, qualquer governo que queira reduzir a pobreza e gerar maior
igualdade e justiça social, tenha que tocar nos interesses da outra parte, os
ricos, uma vez que, mesmo que se gere mais riqueza para ser distribuída, a
diferença econômica é muito grande para que se promova igualdade e coesão sem
tocar na propriedade e riqueza do pequeno grupo que a acumula há muito tempo.
Enquanto esta brutal diferença social permanecer os governos destes países
serão sempre reconhecidos por uma ou outra parte, uma vez que se torna difícil
criar uma identificação comum entre estes dois grupos. Os conflitos
continuarão, contidos ou não, até a superação da diferença econômica radical
que impede qualquer coesão.
A seguir vamos compreender como a
sacralização da democracia e da economia liberal impedem muitas pessoas de pensarem
e participarem da construção de uma sociedade mais justa e não violenta. Para
isto vamos recorrer ao pensador italiano Giorgio Agambem e o seu conceito de
sacralização. Devemos repensar a democracia e a economia com liberdade e
coragem, e para que isto ocorra é necessário dessacralizar. Devolver para a
sociedade, para cada pessoa, a possibilidade de pensar livre. Não há liberdade
em sociedades construídas sobre mitos, dogmas, palavras e nomes proibidos.
2-
A sacralização da democracia e do estado de direito como impedimento da
construção de uma prática livre e includente de democracia social radical.
O pensador Giorgio Agamben[3]
faz uma importante reflexão a respeito da construção das representações e da
apropriação dos significados, o que o autor chama de sacralização como
mecanismo de subtração do livre uso das pessoas as palavras e seus
significados; coisas e seus usos; pessoas e sua significação histórica.
O Autor começa por explicar o mecanismo de
sacralização na antiguidade. As coisas consagradas aos deuses são subtraídas do
uso comum, do uso livre das pessoas. Há uma subtração do livre uso e do
comércio das pessoas. A subtração do livre uso é uma forma de poder e de
dominação. Assim consagrar significa retirar do domínio do direito humano sendo
sacrilégio violar a indisponibilidade da coisa consagrada.
Ao contrário profanar significa restituir ao livre
uso das pessoas. A coisa restituída é pura, profana, liberada dos nomes
sagrados, e logo, livre para ser usada por todos. O seu uso e significado não
estão condicionados a um uso especifico separado das pessoas. A coisa
restituída ao livre uso é pura no sentido que não carrega significados
aprisionados, sacralizados.
Concebendo a sacralização como subtração do uso
livre e comum, a função da religião é de separação. A religião para o autor não
vem de “religare”, religar, mas de “relegere” que significa uma atitude de
escrúpulo e atenção que deve presidir nossas relações com os deuses. A
hesitação inquietante (ato de relire) que deve ser observada para respeitar a
separação entre o sagrado e o profano. Religio não é o que une os homens aos
deuses mas sim aquilo que quer mantê-los separados. A religião não é religião
sem separação. O que marca a passagem do profano ao sagrado é o sacrifício.
O processo de sacralização ocorre com a junção do
rito com o mito. É pelo rito que simboliza um mito que o profano se transforma em sagrado. Os
sacrifícios são rituais minuciosos onde ocorre a passagem para outra esfera, a
esfera separada. Um ritual sacraliza e um ritual pode devolver ou restituir a
coisa (idéia, palavra, objeto, pessoa) à esfera anterior. Uma forma simples de
restituir a coisa separada ao livre uso é o toque humano no sagrado. Este
contágio pode restituir o sagrado ao profano.
A função de separação, de consagração, ocorre nas
sociedades contemporâneas em diversas esferas onde o recurso ao mito juntamente
com rito cumpre uma função de separação, de retirada de coisas, idéias,
palavras e pessoas do livre uso, da livre reflexão, da livre interlocução, criando
reconhecimentos sem possibilidade de diálogo. A religião como separação, como
sacralização, há muito invadiu a política, a economia e as relações de poder na
sociedade moderna. O capitalismo de mercado é uma grande religião que se afirma
com a sacralização do mercado e da propriedade privada. As discussões que
ocorrem na esfera econômica são encerradas com o recurso ao mito para impor uma
idéia sacralizada a toda a população. No espaço religioso do capitalismo não há
espaço para a racionalidade discursiva pois qualquer tentativa de questionar o
sagrado é sacrilégio. Não há razão e sim emoção no espaço sacralizado das
discussões de política econômica. Por isto os proprietários reagem com raiva à
tentativa de diálogo, pois para eles este diálogo é um sacrilégio, questiona
coisas e conceitos sacralizados há muito tempo.
Este recurso está presente no poder do estado e em
rituais diários do poder: a posse de um juiz, de um presidente, a formatura, a
ordenação de padres e outros rituais mágicos transformam as pessoas em poucos
minutos, separando a pessoa de antes do ritual para uma nova pessoa após o
ritual. Isto ganha tanta força no mundo contemporâneo que varias pessoas que
freqüentam um curso superior hoje não pretendem adquirir conhecimentos, o
processo de passagem por um curso não é para adquirir conhecimentos mas para
cumprir créditos (até a linguagem é econômica) para no final passar pelo rito
que o transformará de maneira mágica em uma nova pessoa. O objetivo é o rito, a
certificação da passagem por meio do diploma e não a aquisição do conhecimento.
O espaço universitário está sendo transformado pela religião capitalista em
algo mágico, onde o conhecimento a ser adquirido no decorrer de um processo que
deveria ser transformador perde importância em relação ao rito (a formatura) e
o mito (o diploma).
Como resistir a perda da liberdade. Como resistir a
sacralização das relações sociais, econômicas e logo a perda da possibilidade
de fazer diferente, de fazer livremente o uso das coisas, das palavras, das
idéias? Como se opor à subtração das coisas ao livre uso? Como se opor a
sacralização de parte importante de nosso mundo, de nossa vida? A palavra que
Agambem usa para significar esta possibilidade de libertação é “negligência”
que pode permitir a profanação da coisa sacralizada.
Não é uma atitude de incredulidade e indiferença
que ameaça o sagrado, isto pode até fortalecê-lo. Tampouco o confronto direto.
O que ameaça ao sagrado é uma atitude de negligência. Negligência entendida
como uma atitude, uma conduta simultaneamente livre e distraída face às coisas
e seus usos. Não é ignorar a coisa[4]
sacralizada mas prestar atenção na coisa sem considerar o mito que sustenta sua
sacralização. Negligência neste caso significa desligar-se das normas para o
uso. Adotar um novo uso descompromissado de sua finalidade sagrada, ou seja, de
sua função de separar. Logo profanar significa liberar a possibilidade de uma
forma particular de negligencia que ignora a separação, ou antes, que faz uso
particular da coisa.
A passagem do sagrado para o profano pode
corresponder a uma reutilização. Muitos jogos infantis (jogo de roda; balão;
brincadeiras de roda) derivam de ritos, de cerimônias para a sacralização como
uma cerimônia de casamento. Os jogos de sorte, de dados, derivam das práticas
dos oráculos. Estes ritos separados de seus mitos ganharam um livre uso para as
crianças. O poder do ato sagrado é a consagração do mito (a estória) e o rito
que o reproduz. O jogo (negligência) desfaz esta ligação. O rito sem o mito
vira jogo, é devolvido ao livre uso das pessoas. O mito sem o rito perde o
caráter sagrado, vira uma estória. Importante lembrar que negligência não
significa falta de atenção. Uma criança quando joga tem toda a atenção no jogo.
Ela apenas negligencia o uso sagrado ou o mito que fundamenta o rito. A criança
negligencia a proibição.
Devemos dessacralizar a economia, o direito, a
política devolvendo estas esferas ao livre uso do povo. Construir novos usos
livres.
Numa época onde a dessacralização é fundamental
diante da dimensão que a sacralização tomou, as pessoas, em meio ao desespero,
buscam um retorno ao sagrado em tudo, O jogo como profanação, como uso livre
está hoje decadente. As pessoas parecem incapazes de jogar e isto se demonstra
com a proliferação de jogos prontos, sacralizados, com regras herméticas, onde
os novos usos são quase impossíveis ou invisíveis. Os jogos televisados como
grandes espetáculos de massa acompanham a profissionalização e a mitificação
dos jogadores (os ídolos).
A secularização dos processos de sacralização que
dominam as sociedades contemporâneas permite com que as forças de separação
permaneçam intactas sendo apenas mudadas de lugar. A profanação de maneira
diferente neutraliza a força que subtrai o livre uso, neutraliza a força do que
é profanado. Tratam-se de duas operações políticas: a primeira mantém e garante
o poder por meio da junção do mito e rito agora em outro espaço; a segunda
desativa os dispositivos do poder; separa o rito do mito permitindo o livre
uso.
O capitalismo é mostrado por vários autores como um
espaço de secularização dos processos de sacralização. Max Weber mostra o
capitalismo como secularização da fé protestante; Benjamin demonstra que o
capitalismo se constitui em um fenômeno religioso que se desenvolve de forma parasitária
a partir do cristianismo.
Para Giorgio Agambem o capitalismo tem três fortes
características religiosas específicas:
a) É uma religião
do culto mais do que qualquer outra. No capitalismo tudo tem sentido
relacionado ao culto e não em relação a um dogma ou idéia. O culto ao consumo;
o culto a beleza; a velocidade; ao corpo; ao sexo; etc.
b) É um culto
permanente sem trégua e sem perdão. Os dias de festas e de férias não
interrompem o culto, mas, ao contrário o reforça.
c) O culto do
capitalismo não é consagrado à redenção ou a expiação da falta uma vez que é o
culto da falta. O capitalismo precisa da falta pra sobreviver. O capitalismo
cria a falta para então supri-la com um novo objeto de consumo. Assim que este
objeto é consumido outra falta aparece para ser suprida. O capitalismo talvez
seja o único caso de um culto que ao expiar a falta mais torna a falta
universal.
O capitalismo, por ser o culto, não da redenção e
sim da falta, não da esperança, mas do desespero, faz com que este capitalismo
religioso não tenha como finalidade a transformação do mundo mas sim sua
destruição.
Existe no capitalismo um processo incessante de
separação única e multiforme. Cada coisa é separada dela mesma não importando a
dimensão sagrado/profano ou divino/humano. Ocorre uma profanação absoluta sem
nenhum resíduo que coincide com uma consagração vazia e integral. Ou seja, o
capitalismo profana as idéias, objetos, nomes não para permitir o livre uso mas
para ressacralizar imediatamente. Um automóvel não é mais um objeto que é usado
para o transporte mas é um objeto de desejo que oferece para quem compra
status, poder, velocidade, emoção, reconhecimento. O consumidor em geral não
compra o bem que pode transporta-lo. O que o consumidor compra não pode ser
apropriado pois o que é consumível é inapropriável. O consumidor compra o
status, o reconhecimento, a ilusão de poder, a velocidade, e isto não pode ser
apropriado, isto desaparece na medida em que é consumido. Trata-se de um
fetiche incessante. Ao conferir um novo uso a ser consumido, qualquer uso
durável se torna impossível: está é a esfera do consumismo.
Na lógica da sociedade de consumo a profanação
torna-se quase impossível pois o que se usa não é o uso inicial do objeto mas o
novo uso dado pelo capitalista. Logo o que se consome se extingue e desaparece
e, portanto, não pode ser dado novo uso. Não há possibilidade de liberdade
dentro deste sistema. O novo uso o da liberdade exige enxergarmos este processo
de aprisionamento da lógica capitalista consumista.
O consumo pode ser visto como uso puro que leva a
destruição da coisa consumida. O consumo é, portanto, a negação do uso uma vez
que há a negação do uso que pressupõe que a substancia da coisa fique intacta.
No consumo a coisa desaparece no momento do uso.
A propriedade é uma esfera de separação. A
propriedade é um dispositivo que desloca o livre uso das coisas para uma esfera
separada que se converte no estado moderno em direito. Entretanto
o que é consumido não pode ser apropriado. Os consumidores são infelizes nas
sociedades de massa não apenas porque eles consomem objetos que incorporam uma
não aptidão para o uso, mas também, sobretudo, porque eles acreditam exercer
sobre estas coisas consumidas o seu direito de propriedade. Isto é insuportável
e torna o consumo interminável. Como não me aproprio do que consumi tenho que
consumir de novo e de novo para alimentar a ilusão de apropriação. Está
escravidão ocorre pela incapacidade de profanar o bem consumido e pela
incapacidade de enxergar o processo no qual o consumidor está mergulhado até a
cabeça.
2-
A questão da nomeação: como as identificações podem
desagregar, descriminar e justificar a violência.
Neste capitulo vamos ver como que as
nomeações de grupos, os nomes coletivos que serviram para a unificação do poder
do Estado serviu, históricamente, para desagregar, excluir e justificar
genocídios e outras formas de violência.
A construção dos significados que
escondem complexidades e diversidades é o tema do livro de Alain Badiou, La
portée du mot juif. Cita o autor um episódio ocorrido na França há algum tempo
atrás. O primeiro-ministro Raymond Barre comentando um atentado a uma cinagoga
comentou para a imprensa francesa o fato de que morreram judeus que estavam
dentro da cinagoga e franceses inocentes que passavam na rua quando a bomba
explodiu. Qual o significado da palavra judeu agiu de maneira indisfarçável na
fala do primeiro-ministro? A palavra “judeu” escondeu toda a diversidade
histórica, pessoal, e do grupo de pessoas que são chamadas por este nome. A
nomeação é um mecanismo de simplificação e de geração de preconceitos que
facilita a manipulação e a dominação. A estratégia de nomear facilita a
dominação.[5]
Badiou menciona que o anti-semitismo
de Barre não mais é tolerado pela média da opinião publica francesa. Entretanto
um outro tipo de anti-semitismo surgiu, vinculado aos movimentos em defesa da
criação do estado palestino. No livro Badiou não pretende discutir o novo ou o
velho anti-semitismo mas debater a existência de um significado excepcional da
palavra “judeu”, um significado sagrado, retirado do livre uso das pessoas.[6]
Assim como ocorre com varias outras
palavras mas de forma menos radical (liberdade e igualdade por exemplo), a
palavra “judeu” foi retirada do livre uso, da livre significação. Ela ganhou um
status sacralizado especial, intocável. O seu sentido é pré-determinado e
intocável, vinculado a um destino coletivo, sagrado e sacralizado, no sentido
que retira a possibilidade das pessoas enxergarem a complexidade, historicidade
e diversidade das pessoas que recebem este nome.
Badiou ressalta que o debate que
envolve o anti-semitismo e a necessidade de sua erradicação não recebe o mesmo
tratamento de outras formas de descriminação, perseguição, exclusão ou racismo.
Existe uma compreensão no que diz respeito à palavra “judeu” e à comunidade que
reclama este nome, que é capaz de criar uma posição paradigmática no campo dos
valores, superior a todos os demais. Não propriamente superior mas em um lugar
diferente. Desta forma pode-se discutir qualquer forma de discriminação, mas
quando se trata do “judeu” a questão é tratada como universal, indiscutível,
seja no sentido de proteção seja no sentido de ataque. Da mesma forma, toda
produção cultural, filosófica assim como as políticas de estado tomam esta
conotação excepcional. Talvez nenhum outro nome tenha tido tal conotação, ou
para Badiou, a força e a excepcionalidade do nome “judeu” só tenha tido
semelhança com a sacralização do nome Jesus Cristo. Não há, entretanto, um
medidor para esta finalidade. O fato é que o nome judeu foi retirado das
discussões ordinárias dos predicados de identidade e foi especialmente
sacralizado.
O nome “judeu” é um nome em excesso
em relação aos nomes ordinários e o fato de ter sido um vitima incomparável se
transmite não apenas aos descendentes mas a todos que cabem no predicado
concernente, sejam chefes de estado, chefe militares, mesmo que oprimam os
palestinos ou qualquer outro. Logo, a palavra “judeu” autoriza uma tolerância
especial com a intolerância daqueles que a portam, ou, ao contrário, uma
intolerância especial com os mesmos. Depende do lado que se está.
Uma lição importante que se pode
tirar da questão judaica, da questão palestina, do nazismo e outros nomes que
lembram massacres ilimitados de pessoas, é a de que, toda introdução enfática
de predicados comunitários no campo ideológico, político ou estatal, seja de
criminalização (como nazista ou fascista) seja de sacrifício (como cristãos e
judeus e mulçumanos), esta nomeação nos expõe ao pior.
Esta mesma lógica se aplica a
nomeação de um estado judeu. Primeiro, um estado democrático não pode ser
vinculado a uma religião. Segundo, porque esta nomeação pode gerar privilégios.
Uma democracia exige um estado indistinto do ponto de vista identitário.
Vários equívocos podem ser
percebidos quando da aceitação ou utilização do predicado radical para
significar comunidades, países, religiões, etec. Por exemplo, podemos encontrar
pessoas comprometidas com projetos democráticos, fechando os olhos ou mesmo
apoiando um anti-semitismo palestino, tudo pela opressão do estado judeu aos
palestinos, ou, ao contrário, a tolerância de outras pessoas, também
comprometidas com um discurso democrático, tolerarem praticas de tortura e
assassinatos seletivos por parte do estado de Israel, por ser este estado um
estado “judeu”.
Combater as nomeações, a
sacralização de determinados nomes, significa defender a democracia, o
pluralismo, significa o reconhecimento de um sujeito que não ignora os
particularismos mas que ultrapasse este; que não tenha privilégios e que não
interiorize nenhuma tentativa de sacralizar os nomes comunitários, religiosos
ou nacionais.
Badiou dedica o seu livro a uma
pluralidade irredutível de nomes próprios, o único real que se pode opor a
ditadura dos predicados.
O filme “trem da vida” é um
maravilhoso poema a pluralidade de nomes próprios que foram reduzidos a um
predicado “judeu” na segunda guerra mundial. O filme ressalta a pessoa, os
grupos dentro dos grupos, e como a identificação com determinados grupos dentro
de um outro grupo gera segregação. A introdução do tema identidade e
identificação com grupos, religiões, estados, partidos, idéias, como fator de
segregação, sempre irracional. Como anulação do sujeito livre, com a anulação
do nome próprio em nome de um nome do grupo.
4-
Múltiplas identidades: a cidade cosmopolita perdida em conflitos de micro
identidades.
Há uma forte diferença entre
bandidos e mocinhos no imaginário social e uma ausência desta diferenciação nas
práticas sociais diárias. A repressão policial diária é bandida, é
expressamente fora do Direito embora muitas vezes dentro da lei. Ela
desrespeita a privacidade, a dignidade, a repressão humilha pelo simples fato
da condição social ou da cor do sujeito. O problema da idéia da ordem
constitucional que pretende a democracia é que esta ordem não permite a polícia
trabalhar e logo esta tem que agir fora do Direito, contra o Direito.
O filme “crash” mostra até onde as
nomeações que tratamos anteriormente podem chegar em uma sociedade dita
cosmopolita. Se o problema da nomeação de um “estado judeu” que procura
unificar todos os grupos sociais, classes sociais, idades e outras diferenças
sociais, e todos os nomes próprios, em uma única denominação, pode justificar
privilégios e discriminações excepcionais, a fragmentação da sociedade em
pequenos grupos de identidades, em pequenas nomeações pode gerar outros tipos
de problemas. A sociedade cosmopolita de Los Angeles, Nova York, São Paulo,
Londres e Paris não está além das nomeações ou dos predicados radicais. Ela
está multi-fragmentada em diversos predicados radicais.
Negros, asiáticos, coreanos,
chineses, árabes, turcos, persas, nordestinos, brancos, góticos, cabeças
raspadas, nacionalistas, racistas, mexicanos, hispânicos, caucasianos e mais um
monte de nomeações convivem no espaço “democrático” da cidade. São obrigados
pela lei a se suportarem embora os que aplicam a lei pertençam a um grupo e
vejam o mundo limitados pela compreensão do seu grupo. Até mesmo nos nomes
próprios carregam a identidade do grupo a que pertencem mesmo sem querer
pertencer: Shaniqua é um nome negro; Saddam é um nome iraquiano; Hassan é um
nome muçulmano; Ezequiel é um nome evangélico; Pedro é um nome cristão; David é
um nome Judeu: o nome próprio é abafado pelo nome do grupo. O nome próprio é
condicionado pelo predicado radical. O filme mostra que é possível se libertar
do nome grupal e resgatar algo universal, algo humano, além das nomeações de
grupos, etnias, cores, países, religiões. Algo humano universal que resgate o
nome próprio.
A aposta de Badiou[7]
em um estado contemporâneo indistinto em sua configuração identitária pode não
ser a superação das nomeações e da sacralização de determinados nomes. Este
estado contemporâneo democrático plural que tenha um sujeito que não ignora os
particularismos mas que ultrapasse estes; que não tenha privilégios e que não
interiorize nenhuma tentativa de sacralizar os nomes comunitários, religiosos
ou nacionais talvez ainda não exista. O que o filme mostra é uma realidade
fragmentada por nomes grupais sacralizados mas não elimina a esperança de um
espaço livre de sacralizações.
Estes nomes grupais sacralizados podem gerar
novas guerras tribais, pois a construção de uma identidade nacional é
ultrapassada por diversas identidades grupais ou mesmo é construída justamente
sobre o reforço destas identidades grupais.
Isto se ressalta no caso estadunidense onde a identidade nacional é
construída em parte, pelo menos nos espaços cosmopolitas das grandes cidades,
sobre a idéia de uma democracia étnico-racial multi-identitária que se opõe às
identidades nacionais intolerantes e uniformes. Neste nome comprido faltou a
prática democrática. Pior quando se acredita poder fazer cumprir esta pretensa
democracia étnica-racial multidentitária por meio da lei e logo do controle
policial. A policia também é um grupo corporativo e logo preconceituoso que
anula os sujeitos quando estes estão fardados, quando estão no meio do grupo.
Este grupo que acredita simbolizar a própria lei se sente no direito muitas
vezes de ignorar o Direito para se auto-preservar e preservar a imagem
construída no grupo para o próprio grupo.
No filme citado prevalece a idéia da
sobrevivência dos nomes próprios encobertos pelos nomes grupais. O dado humano
universal sobrevive ao preconceito, às simplificações.
6-
Conclusão
Percorremos
um longo caminho da formação do estado nacional, da imposição de uma religião,
de um idioma, da construção artificial e violenta de uma identidade nacional
até as sociedades cosmopolitas, multidentitárias, plurais, tão tolerantes que
muitas vezes chega ao desprezo e tão individualistas que chega ao egoísmo.
Se
de um lado fomos capazes de trilhar um caminho de conquistas de direitos, de
afirmação do estado constitucional e mais importante, do discurso
constitucional, da efetividade de alguns direitos individuais e políticos e do
reconhecimento do poder pela legitimidade democrática e pela extensão das
liberdades individuais, muito ainda há por fazer pela superação das brutais
diferenças econômicas, pela indiferença à miséria, pela afirmação dos direitos
sociais e econômicos desconstruídos nas ultimas duas décadas pelo cruel projeto
neoliberal.
A
construção de uma sociedade democrática includente e não violenta depende da
superação destas diferenças sócio-econômicas. Para além da universalização dos
direitos sócio-econômicos uma nova cultura humana precisa ser discutida e o
reconhecimento de direitos humanos universais depende da nossa capacidade de
percebermos o ser humano único, esta singularidade coletiva que somos, esta
condição comum e ao mesmo tempo singular de sermos um nome próprio, construído
por uma história única da qual participam muitas pessoas. Devemos ser capazes
de enxergar, e lembrar de buscar sempre, esta singularidade escondida atrás dos
nomes coletivos. Uma pessoa é múltipla, dinâmica, cada pessoa é um ser em
constante transformação. Logo ninguém “é” apenas. As pessoas estão sempre se
transformando, estão sempre virando alguma outra coisa conforme o contexto que
se coloca diante delas. Não se pode reduzir uma pessoa a um nome coletivo,
fulano não é juiz mas uma pessoa que exerce aquela função; cicrano não é
bandido mas praticou determinados atos ilícitos; esta ou aquela pessoa são
muito mais do que sua condição social, que seu gênero, que sua opção sexual,
que sua cor, que sua religião, que seu grupo étnico ou sua nacionalidade.
Quando formos capazes de vermos esta imensa diversidade e complexidade humana
por detrás dos nomes coletivos, então não existirão mais genocídios, não
existirá mais a miséria ou exclusão pois ninguém suportará ver um igual na
diferença em condição tão desigual.
Quando
nos referimos às pessoas como “eles” estamos a um passo do genocídio: eles os
judeus; eles os muçulmanos; eles os hutus; etc. Quando resumimos uma vida a um
predicado como “bandido” estamos condenando uma pessoa a exclusão; quando
chamamos outras pessoas de judeus, cristãos, muçulmanos, estamos construindo
muros de difícil transposição. Somos todos pessoas. Pessoas únicas e complexas
que podem ser simultaneamente um monte de coisas, mas seremos no final sempre
uma pessoa como qualquer outra pessoa.
[1]
CREVELD, Martin van Creveld. Ascensão e declínio do Estado, Editora Martins
Fontes, São Paulo, 2004 e CUEVA, Mario de la. La idea del Estado, Fondo de
Cultura Econômica, Universidad Autônoma de México, Quinta Edição, México, D.F.,
1996.
[2]
Utilizaremos neste texto as palavras identidade e identificações quase com
sinônimos, ou seja, uma identidade se constrói a partir da identificação de um
grupo com determinados valores. Importante lembrar que o sentido destas
palavras é múltiplo em autores diferentes. Podemos adotar o sentido de
identidade como um conjunto de características que uma pessoa tem e que
permitem múltiplas identificações sendo dinâmicas e mutáveis. Já a idéia de
identificação se refere ao conjunto de valores, características e práticas
culturais com as quais um grupo social se identifica. Nesse sentido não
poderíamos falar em uma identidade nacional ou uma identidade constitucional
mas sim em identificações que permitem a coesão de um grupo. Identificação com
um sistema de valores ou com um sistema de direitos e valores que o sustentam,
por exemplo.
[3] AGAMBEM, Giorgio. Profanation, Paris, 2005, Editora Payot
et Rivages. As reflexões e interpretações livres desenvolvidas neste
tópico são todas a partir do texto do filósofio Giorgio Agambem.
[4] Coisa
aqui significa idéias, objetos, pessoas, palavras, animais, ritos, danças, etc.
[5] Um outro
mecanismo de dominação e manipulação do real é a estratégia amplamente
utilizada pela imprensa de explicar o geral pelo fato particular. Slavoj Zizek
no livro citado anteriormente (Plaidoyer em faveur de l’intolerance) menciona
dois exemplos norte-americanos. Cita o caso, por exemplo da jovem mulher de
negócios bem sucedida que transa com o namorado e engravida e resolve abortar
para não atrapalhar a sua carreira. Este é um caso que ocorre entre milhares,
talvez milhões de outras situações. Entretanto o poder toma este caso como
exemplo permanente para demonstrar o egoísmo que representa o aborto diante da
opinião pública. Ao explicar o geral pelo particular ou construir predicados
para grupos sociais, a tarefa de manipulação para a dominação se torna mais
fácil.
[6] É
fundamental ler Giorgio Agambem, especialmente o livro Homo Sacer, publicado
pela editora UFMG, Belo Horizonte. Ler também o texto Profanation, do mesmo
autor, publicado em Paris, 2005 pela editora Payot e Rivages. Neste ultimo
texto o autor explica o processo de sacralização como mecanismo que retira do
livre uso das pessoas determinadas coisas,
objetos, palavras, jogos, etc. Através da profanação, do rompimento do rito com
o mito, é possível devolver estas coisas, palavras, ao livre uso.
[7] BADIOU,
Alain. Circonstances, 3 – portées du mot “juif”.,Editions Lignes e manifeste,
Paris, 2005,15.
Informações Sobre o Autor
José Luiz Quadros de Magalhães
Especialista, mestre e doutor em Direito Constitucional pela UFMG Professor da graduação, mestrado e doutorado da PUC-MINAS e UFMG.